sumário executivo e recomendações
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sumário executivo e recomendações
Sem Restrições Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico 21 de Março de 2003 DIRETORIA DE GOVERNANÇA PÚBLICA E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL COMITÊ DE GESTÃO PÚBLICA COERÊNCIA NAS POLÍTICAS 27a Sessão do Comitê de Gestão Pública 3-4 de Abril de 2003 Château de la Muette Este é o relatório final da atividade sobre Coerência nas Políticas realizada de 2000 a 2002. Este relatório é apresentado ao Comitê para discussão e revisão. Para informações adicionais, favor entrar em contato com Frédéric Bouder, Tel. +33-1 45 24 90 75, E-mail: [email protected]. JT00141348 Documento completo disponível em OLIS no formato original SUMÁRIO EXECUTIVO E RECOMENDAÇÕES 1. A necessidade de se obter maior efetividade e eficiência nas políticas públicas contribuiu para aumentar a importância da coerência nas políticas, de forma a garantir um sistema de governança eficiente. Esse foco na coerência está relacionado à tentativa de superar a dificuldade de estimar custos de processos cada vez mais complexos de formulação de políticas, que resultam da percepção nacional e internacional a respeito da complexidade desses processos. Um dos desafios fundamentais para os governos é encontrar maneiras de abordar interesses e objetivos conflitantes sem abrir mão da capacidade de desenvolver políticas consistentes. Diante da importância dessas preocupações, o objetivo deste relatório é ajudar os formuladores de políticas a compreender os desafios relacionados à falta da coerência nas políticas e destacar algumas das principais experiências de países da OCDE que poderiam ser usadas para preencher essa lacuna. O relatório examina especificamente os processos envolvidos na formulação de políticas que poderiam contribuir para o alcance desse objetivo. Definições 2. O conceito de coerência é diferente dos conceitos de coordenação e de consistência. A coordenação é um processo formal de formulação de políticas conduzido dentro do aparelho do governo. A consistência é definida como o processo que assegura que os objetivos das políticas sejam atingidos e que não sejam contraditórios. A coerência assegura a promoção sistemática de ações mutuamente reforçadoras realizadas pelos atores governamentais e não-governamentais visando criar e manter sinergias para atingir o objetivo definido. A necessidade de coerência nas políticas requer que as dimensões horizontal, vertical e temporal sejam abordadas; os desafios da coerência são a complexidade de desenvolver políticas transetoriais, a dificuldade de abordar as questões entre os diferentes níveis do governo e a excessiva importância atribuída a ações reativas de curto prazo em detrimento da realização de compromissos de médio e longo prazo. As ferramentas da coerência 3. A esfera política é responsável por identificar as questões políticas, elaborar estratégias, estabelecer metas e prioridades, formular respostas, alocar recursos, avaliar resultados e adequar as políticas conforme a necessidade. Por isso, um componente essencial da coerência nas políticas é um compromisso político sólido. Esse compromisso deve ser complementado por uma interface eficiente entre o nível político e o nível administrativo, para desenvolver as visões e estratégias necessárias. 4. Para dar forma a esses compromissos e estratégias, mecanismos específicos de integração das políticas devem ser desenvolvidos. As "ferramentas para a coerência" incluem mecanismos formais de coordenação, que contribuem para solucionar conflitos envolvendo políticas entre as instituições, como por exemplo, reuniões de coordenação no nível mais alto do governo ou em unidades nacionais e subnacionais de coordenação. Requerem também a capacidade de aprimorar a consistência do processo de formulação de políticas no governo como um todo, por exemplo, com o desenvolvimento sistemático de um estilo de governo voltado para projetos, ou assegurando que o núcleo do governo esteja conduzindo um processo de desenvolvimento de reflexão conjunta entre as organizações. 5. As "ferramentas para a coerência" incluem também mecanismos específicos voltados para a integração das políticas. A integração das políticas é definida como a criação de instituições, recursos e ferramentas de políticas que permitam que os atores econômicos respondam positivamente às pressões para melhorar o desempenho a custos mais baixos. Embora seja tentador seguir o caminho tradicional, que é de criar novas instituições para integrar questões emergentes nos processos de formulação de políticas, a integração das políticas poderá obter mais êxito se contar com a reengenharia dos processos existentes de formulação de políticas (comitês-chave permanentes ou projetos transversais promissores) e a adaptação de ferramentas de políticas tradicionais (por exemplo, orçamento, regulamentação, avaliação). Superando barreiras à coerência 6. Por mais eficientes que sejam essas ferramentas, a coerência continuará sendo um desafio difícil de abordar no contexto do desenvolvimento e implementação de políticas transversais ou de longo prazo. A coerência é uma "fronteira móvel" que exige melhorias constantes, não um objetivo precisamente definido e quantificado. Além disso, as políticas para aprimorar a coerência enfrentam limitações concretas. Um dos limites práticos mais significativos para a coerência resulta da dificuldade de avaliar desenvolvimentos mais complexos nas políticas. Sistemas de avaliação que se concentrem em políticas específicas ou em programas específicos e que realizem avaliação qualitativa podem funcionar melhor do que tentativas de avaliar a "coerência do sistema como um todo", mas não existem panacéias nessa questão. Outros limites estão relacionados às dificuldades tradicionais de realizar mudanças organizacionais e a uma tendência emergente de processos decisórios complexos e fragmentados resultantes das atuais práticas de governança. 7. Políticas de apoio à coerência requerem mecanismos específicos de adaptação ao novo ambiente de governança caracterizado por processos que envolvem múltiplos interessados e pelo surgimento de novos riscos e incertezas. Especificamente, a capacidade de gerar e confrontar o conhecimento, bem como a gestão firme dos processos de participação dos cidadãos são fundamentais. Recomendações Recomendação I: Deve haver um entendimento comum das questões envolvidas 8. O fato das políticas estarem se tornando cada vez mais multisetoriais e multidimensionais requer que mais atenção seja dedicada à inserção adequada das questões no debate político geral e nas agendas políticas setoriais, desde o estágio de formulação das políticas. Os governos devem assegurar que as complexas realidades de uma determinada política sejam bem compreendidas. Particularmente, as conseqüências econômicas, sociais ou ambientais de curto, médio e longo prazo de uma determinada política devem ser esclarecidas e comunicadas. Isso implicaria em responder as seguintes perguntas: • Que esforços foram empreendidos para estabelecer objetivos políticos claros, amplamente aceitos e operacionais? • Os objetivos da política são suficientemente claros e compreendidos pelo público? • O objetivo é bem compreendido pelas organizações públicas e nos diversos níveis do governo? • Os benefícios da proposta da política são apresentados com exemplos claros baseados em estatísticas? Recomendação II: Deve haver clareza em relação ao compromisso e à liderança 9. A clareza em relação ao compromisso e à liderança dentro do governo é essencial para se atingir um objetivo específico. A comunicação desse compromisso também é essencial para apoiar o desenvolvimento de uma estratégia concreta e da ação subseqüente. Esse compromisso deve vir de cima, mas também é fundamental desenvolver a liderança e a capacidade em todas as organizações do setor público. 10. O desafio é maior quando as políticas são multisetoriais ou de longo prazo, devido ao potencial de conflito entre os diversos interesses, tanto no setor público quanto no privado. Uma forte liderança política é necessária para dar forma ao debate sobre o desenvolvimento das políticas. Essa liderança, por sua vez, deve abordar os problemas que resultam do pensamento de “silo” (isolado, compartimentalizado), da relutância em ceder à autoridade decisória e do foco no curto prazo. As perguntas a seguir devem ser investigadas para se obter um compromisso claro. • Há um compromisso claro no nível mais alto com a formulação e implementação dos objetivos e estratégias das políticas? • Esse compromisso é comunicado efetivamente aos diversos setores do governo e transversalmente em todos os níveis do governo? • Onde existem diferenças entre a agenda administrativa e a agenda política, são realizados esforços específicos para conciliá-las? • A liderança é manifestada através de uma seqüência estabelecida de prioridades que são monitoradas ao longo do tempo? • No caso de questões que requererem um compromisso de longo prazo, o governo mantém um sentido de urgência ao longo do tempo? Recomendação III: As condições para conduzir a integração das políticas devem estar estabelecidas 11. Deve ser feita uma avaliação crítica da formulação de estratégias setoriais e de sua implementação, inclusive do ponto de vista das ferramentas de execução empregadas (acordos voluntários, etc.). Quando um objetivo de política se transforma numa prioridade nacional, é particularmente importante que a execução da estratégia seja monitorada através de uma instituição abrangente que atue como um "catalisador". 12. A descentralização crescente de poder é uma característica da maioria dos países da OCDE e manter o equilíbrio correto entre a autonomia local e a capacidade central de condução é um desafio importante para a gestão transversal do governo. É preciso dar uma atenção específica à conversão de diretrizes políticas estratégicas internacionais, nacionais e subnacionais em medidas que possam ser implementadas nos níveis inferiores. Isso requer atenção ao risco de fragmentação e sobreposição de responsabilidades, assim como a criação de incentivos e apoio para a promoção das mudanças comportamentais necessárias. Além disso, a descentralização não deve ocorrer em detrimento da responsabilização e da estabilidade institucional. As perguntas a seguir devem ser contempladas para se obter a integração política de um objetivo específico. • Há um "catalisador institucional" (ministério, comitê selecionado, etc..) responsável pela execução da estratégia transetorial? • Esse "catalisador" está estrategicamente situado dentro do aparelho do governo (por exemplo, no gabinete Primeiro Ministro)? • São realizadas revisões específicas das leis e regulamentos para verificar se existem conflitos com as prioridades globais e se os principais objetivos estão inseridos na nova legislação e regulamentação? • Existem mecanismos para assegurar feedback efetivo entre os diferentes níveis do governo? • As organizações estão ampliando as perspectivas estritamente setoriais (ex. agricultura, indústria, transporte, etc.) para uma agenda "voltada para questões" (ex. mobilidade, redução da pobreza, etc.)? • Exercícios regulares do governo (ex. processo orçamentário) são utilizados para promover a coerência? • Há uma estrutura clara para avaliar o desempenho das organizações públicas com relação aos objetivos globais? • Existem mecanismos de avaliação e elaboração de relatórios para apoiar a "avaliação da coerência" no setor público (como indicadores de progresso, análise de custo/benefício, avaliação de impacto)? • O governo emprega efetivamente esses mecanismos de avaliação e de elaboração de relatórios? • Os mecanismos externos e independentes de elaboração de relatórios e de auditoria são suficientes? Recomendação IV: A gestão do conhecimento deve ser incentivada e suficientemente aberta 13. São necessários subsídios científicos para o desenvolvimento de políticas, o que requer investimentos em áreas específicas de pesquisa que carecem de evidência científica. Além disso, é essencial melhorar os vínculos entre a comunidade científica e os formuladores de políticas. Isso demandará mudanças nas práticas do governo para avaliar as opções possíveis antes da tomada de decisão. Também são necessários esforços para desenvolver uma avaliação multidisciplinar e holística de custos e benefícios. • Os mecanismos são transparentes, baseados em processos de arbitragem para a gestão de conhecimento complexo e conflitante? • O governo garante a existência de uma estrutura para permitir que as discussões focalizem construtivamente as áreas de divergência, desenvolvendo cenários e opções? • É dedicada atenção suficiente a assegurar que os fluxos de informação entre a comunidade científica e os responsáveis pelas decisões sejam eficientes e efetivos? • As políticas de pesquisa incentivam e facilitam redes de cientistas e apóiam o desenvolvimento de pesquisa articulada entre disciplinas? • São empregados esforços específicos para apoiar o conhecimento voltado para o futuro e relevante para as políticas, especificamente assegurando equilíbrio entre investimentos públicos e privados em pesquisa? INTRODUÇÃO Coerência nas políticas: Um desafio para o governo 14. O desafio de atingir maior efetividade e eficiência nas políticas públicas contribuiu para acentuar a importância da coerência nas políticas num sistema eficaz de governança. A formulação de políticas e os processos envolvidos estão se tornando cada vez mais complexos e a falta de coerência tem um custo. A finalidade do relatório sobre Coerência nas Políticas, que é o produto final da atividade sobre Coerência nas Políticas realizada por GOV em 2000 e 2002, é ajudar os formuladores de políticas a compreender os desafios relacionados à falta de coerência nas políticas e destacar algumas experiências-chave dos países da OCDE. O relatório enfatiza especificamente: • a necessidade de melhorar as práticas de governança para enfrentar os desafios horizontais e de médio e longo prazo; • a necessidade de cumprir objetivos de desenvolvimento sustentável; • o desenvolvimento imperativo de práticas de gestão de riscos. 15. Um observador de debates sobre políticas em países da OCDE poderia facilmente argumentar que a coerência nas políticas tornou-se um conceito da moda desde o fim da década de 90 (ODI 2000) ou, no mínimo, que a necessidade de alcançar maior efetividade e eficiência contribuiu para ressaltar a importância da coerência nas políticas para um sistema eficaz de governança. Foi estabelecida uma ligação direta entre a recente "indústria de indicadores de governança em expansão " e a preocupação de assegurar a coerência nas políticas (PNUD, 2002). O Banco Mundial, com seus indicadores de volatilidade das políticas, por exemplo, tentou introduzir uma medida objetiva de coerência nas políticas. 16. Esse foco na coerência pode muito bem estar ligado à tentativa de compensar a dificuldade de estimar custos de processos mais complexos de formulação de políticas, que resultam da percepção de que a formulação de políticas está se tornando mais complicada. A complexidade da formulação de políticas não é um fenômeno novo mas há um sentimento de que ela está assumindo uma nova dimensão. Um olhar superficial sobre a história da administração fornece evidências suficientes de que governos sempre enfrentaram prioridades conflitantes, diferentes lógicas setoriais e dificuldades em implementar compromissos efetivamente. Todos esses elementos estão no centro dos debates sobre coerência nas políticas. Entretanto, apelos recentes e persistentes por maior coerência nas políticas vêm surgindo nas arenas nacionais e internacionais, sugerindo que há questões em jogo que vão além da dificuldade tradicional de se tomar e implementar decisões. Embora esses debates paralelos no nível nacional e internacional estejam voltados para suas próprias questões particulares, também abordam várias características comuns. Contudo, os formuladores de políticas nem sempre estão cientes desses elementos comuns e portanto os diversos debates não são necessariamente fundamentados numa definição clara do que se entende por coerência nas políticas. 17. Essa necessidade difusa de maior coerência está se transformando numa fonte de interesse mundial. Por exemplo, os Objetivos do Milênio das Nações Unidas fazem referência explícita ao fortalecimento da coerência nas políticas. A Organização Mundial do Comércio (OMC) também assumiu um compromisso com a maior coerência na formulação de políticas econômicas mundiais. Uma maior cooperação entre o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) foi expressa em vários acordos, decisões e declarações ministeriais. Diante da importância das preocupações com os vínculos entre o comércio e o desenvolvimento, a coerência nas políticas foi reafirmada pelos fundadores da OMC. Vários textos-chave fazem referência específica à coerência nas políticas, por exemplo, o "Acordo da Ata Final da Rodada Uruguai" que estabelece a OMC; a decisão adotada pelo Conselho Geral, em Novembro de 1996, sobre "Acordos entre a OMC, o FMI e o Banco Mundial”; a "Decisão de alcançar maior coerência na formulação de políticas econômicas mundiais" da Ata Final da Rodada Uruguai; e a "Declaração da Contribuição da Organização Mundial de Comércio para o Fundo Monetário Internacional " da Ata Final da Rodada Uruguai. 18. Além desses desenvolvimentos, as discussões sobre a necessidade de ações mais coerentes também estão se tornando um objetivo central de governos nacionais. Em anos recentes, a maior parte dos países da OCDE experimentou ineficiências nas suas políticas e tem se preocupado em dar respostas mais coerentes às questões emergentes, como políticas para idosos, políticas de desenvolvimento sustentável e políticas agrícolas. Esforços têm sido empreendidos para melhorar a coerência em diversos campos das políticas e para promover compromissos específicos nas áreas onde as conseqüências negativas da falta da coerência são mais aparentes. Muitos desses esforços ainda têm que ser analisados e avaliados. 19. Preocupações semelhantes também foram expressas no nível regional, por exemplo, no âmbito da União Européia. Por uma década, as instituições européias empregaram o conceito da coerência. Desde 1992, após a assinatura do tratado de Maastricht (artigo 130 V), o princípio de políticas européias coerentes foi incluído na agenda de trabalho da Comissão Européia. Desde então, a necessidade de coerência nas políticas tem sido reconhecida como um fator fundamental para melhorar o resultado dos processos políticos europeus em vários campos, como agricultura, desenvolvimento, comércio e proteção ambiental. Mais recentemente, uma das propostas de mudança contida no White Paper de 2001 sobre a Reforma da Governança Européia é: "A Comissão deverá: reforçar as tentativas de assegurar a coerência nas políticas e de identificar objetivos de longo prazo". 20. A OCDE reiterou essas preocupações, em diversos setores e com foco em objetivos transversais e de longo prazo. A agenda do desenvolvimento é uma das áreas onde os países da OCDE também sentem a necessidade de um esforço específico para promover a coerência nas políticas. A estratégia de desenvolvimento da OCDE enfatiza que "devemos visar nada menos do que garantir que todas as políticas relevantes dos países industrializados sejam consistentes com os objetivos do desenvolvimento e que não os comprometam"i. O desenvolvimento sustentávelii também se caracteriza como um exemplo típico. Para realizar a difícil tarefa de equilibrar seu desenvolvimento econômico, social e ambiental, os governos devem garantir que suas políticas sejam consistentes com o objetivo do desenvolvimento sustentável e que não sejam comprometidas por outras políticas (OCDE 2002d). Na Reunião Ministerial de 2001 da OCDE, os ministros foram incentivados a "melhorar a coerência e a integração para o desenvolvimento sustentável "iii. 21. Melhorar a capacidade dos sistemas de governança de atender a interesses e objetivos conflitantes tornou-se um componente central da boa governança. A boa governança para a coerência nas políticas tornou-se, portanto, uma prioridade da OCDE. Em 2002, uma lista de verificação para Melhorar a Coerência e a Integração das Políticas Para o Desenvolvimento Sustentável (OCDE 2002 d) forneceu orientações aos formuladores de políticas para a melhoria da coerência e da integração das políticas visando o desenvolvimento sustentável. Essas orientações são baseadas na experiência de países da OCDE e na preocupação de que para se alcançar o objetivo do desenvolvimento sustentável é necessário dar atenção específica às práticas de governança. Elas também destacam os principais obstáculos a serem superados no nível nacional para enfrentar os desafios institucionais que surgem na busca do desenvolvimento sustentável. 22. Dada a importância das preocupações mencionadas acima, relativas à coerência nas políticas, a finalidade deste relatório é ajudar os formuladores de políticas a compreenderem os desafios relacionados à falta da coerência nas políticas e destacar algumas experiências-chave dos países da OCDE que podem ser utilizadas para aprimorar a coerência. O objetivo do relatório não é tanto avaliar a capacidade do governo de melhorar a coerência, mas sim examinar quais processos de formulação de políticas podem oferecer maior contribuição para se alcançar esse objetivo. 23. Este relatório começa examinando porque os desenvolvimentos concretos das políticas tornaram a coerência nas políticas um tema tão importante. O relatório analisa, através de exemplos selecionados de diversas áreas-chave de políticas, porque os limites de eficiência do governo estão se tornando cada vez mais críticos (capítulo I). O relatório destaca não somente as implicações para as políticas de questões de magnitude sem precedentes enfrentadas pelos governos, ele também fornece um diagnóstico das tendências e tensões atuais, bem como ferramentas concretas que os governos podem utilizar para desenvolver políticas voltadas para a coerência (capítulo 2). E examinando as restrições para o alcance da coerência (capítulo 3), também destaca os fatores críticos que necessitam ser abordados para melhorar a capacidade de governança de forma a superar as barreiras existentes. CAPÍTULO I A busca pela Coerência: Definições, questões e tensões 24. Desde meados da década de 90, parece que o progresso foi limitado, a julgar pelos apelos regulares e intensos pelo aumento da coerência. O fato interessante é que a natureza do debate evoluiu em parte: passou de considerações "internas" um tanto limitadas sobre como os governos poderiam tornar suas políticas mais consistentes e coordenadas, para preocupações mais gerais sobre a capacidade das sociedades de responder coerentemente aos desafios globais, como a redução da pobreza ou o desenvolvimento sustentável. O debate foi ampliado, passando de considerações sobre a eficiência para uma grande preocupação global sobre a capacidade de regimes nacionais e internacionais de assegurar respostas adequadas e oportunas aos desafios mais urgentes. Além das preocupações nacionais sobre como melhorar a coerência nas políticas, a dimensão internacional da coerência nas políticas também emergiu. 25. Existem duas maneiras de considerar a coerência nas políticas. Uma é "holística" e examina os processos para obtenção da coerência do "sistema" do governo como um todo. A outra abordagem é "específica", pois examina principalmente a capacidade de melhorar a coerência de processos e resultados específicos das políticas. Após examinar possíveis definições de coerência, este capítulo tentará esclarecer esses dois aspectos sob ponto de vista das questões e das tensões que emergem no nível nacional e internacional. Definições 26. O que é exatamente coerência nas políticas? Uma definição preliminar da coerência é que ela "implica que as políticas devem idealmente apoiar umas às outras, ou pelo menos não devem ser contraditórias, e esse conceito pode ser considerado um padrão para a avaliação de sistemas políticos e conjuntos de políticas. Como tal, pode fornecer diretrizes para a mudança e o desenvolvimento das políticas, bem como para a adaptação a uma sociedade em mutação." (OCDE, 2000iv). Entretanto, essa definição pode ser muito geral, no sentido em que faz uma distinção entre a coerência e outras noções, tais como a consistência das políticas ou a coordenação das políticas. 27. Em 2001, a OCDE apresentou uma explicação dos conceitos de coordenação, consistência e coerência nas políticas. Tal definição foi desenvolvida para aprimorar a coerência nas políticas de desenvolvimento, mas é suficientemente geral para servir a propósitos mais amplos. (OCDE 2001 a): 28. "O desafio da coerência tem várias dimensões que necessitam ser abordadas de modo sincronizado, ao mesmo tempo reconhecendo que a coerência plena nunca é um resultado realista: • A coordenação nas políticas significa fazer com que os diversos sistemas institucionais e gerenciais que formulam políticas trabalhem juntos. • A consistência nas políticas significa assegurar que as políticas individuais não sejam internamente contraditórias e que as políticas que se opõem ao alcance de um determinado objetivo sejam evitadas (...). • A coerência nas políticas vai mais longe; envolve a promoção sistemática de ações que se reforcem mutuamente nos diferentes órgãos do governo, criando sinergias para a realização dos objetivos definidos. 29. Com base nessa conveniente distinção, a coerência nas políticas implica não somente em assegurar as pré-condições da coordenação e da consistência, requer também a promoção sistemática de ações políticas que se reforcem mutuamente. Essa distinção entre coordenação, consistência e coerência é particularmente relevante porque oferece uma descrição bastante conveniente dos diferentes graus de esforços específicos para a realização de um objetivo definido. Quadro 1: As três dimensões da coerência Para simplificar esse conceito, concorda-se, geralmente, que a coerência nas políticas tem uma dimensão horizontal, uma vertical e uma temporal. • Coerência horizontal – assegurar que os objetivos individuais e as políticas desenvolvidas por várias entidades se reforcem mutuamente. Fortalecer a interconectividade das políticas e promover uma perspectiva do "governo como um todo" são maneiras de promover a perspectiva horizontal da coerência nas políticas. • Coerência vertical -- assegurar que as práticas das agências, autoridades e órgãos autônomos, bem como o comportamento dos níveis subnacionais do governo, se reforcem mutuamente com os compromissos políticos mais amplos. Por exemplo, a provisão de bens e serviços aos cidadãos não deve se opor aos objetivos nacionais. A “eficiência dos programas" é uma forma de enfatizar a necessidade da coerência vertical e a questão de assegurar a conformidade em todos os níveis do governo é uma expressão típica desta dimensão. • Coerência temporal -- assegurar que as políticas continuem a ser efetivas ao longo do tempo e que as decisões de curto prazo não se oponham aos compromissos de longo prazo. Assegurar a "eficiência dinâmica" é outra forma de expressar essa perspectiva. Está relacionada à maneira através da qual as políticas interagem com outras políticas ou outras forças da sociedade, analisando inclusive se os custos futuros são levados em conta na formulação das políticas de hoje. O desenvolvimento sustentável é típico da necessidade de coerência temporal. Um outro desafio temporal fundamental é a necessidade de melhoria na administração da coerência econômica e social de sistemas previdenciários. 30. Entretanto, as três noções não devem estar em oposição. Até certo ponto elas devem ser percebidas como um continuum de processos que contribuem para a realização de objetivos semelhantes (ver figura 1). A complexidade também é uma característica comum às três. Todas têm dimensões horizontais, verticais, temporais e territoriais (ver quadro 1). As diferenças que exibem são principalmente diferenças relacionadas à intensidade do processo de integração subjacente e à qualidade dos processos envolvidos. Enquanto a coordenação, geralmente, é um conjunto de arranjos formais para promover a cooperação, a consistência vai além e está baseada em processos de formulação de políticas compatíveis. A coerência consiste em avançar esse processo de integração e examinar a qualidade do produto resultante desse processo. Implica em dedicar atenção às decisões vitais tomadas dentro e fora do governo. Coerência Consistência De menos para mais integração De resultados formais para qualitativos Figura 1: A coerência como um processo Coordenação 31. Esta seção do relatório não pretende fornecer uma avaliação das instituições formais sob o ponto de vista da conformidade com os objetivos de coerência. Em vez disso, contribui para um esclarecimento da terminologia no que se refere aos conceitos distintos, mas relacionados, de coordenação, consistência e coerência. O relatório abordará esses conceitos a partir da seguinte perspectiva: • A coordenação é um processo formal de formulação de políticas conduzido de dentro do aparelho do governo. • A consistência será considerada como o processo que garante que os objetivos das políticas sejam alcançados e que essas não sejam contraditórias. • A abordagem adotada no presente relatório empregará o termo coerência de modo um pouco mais amplo, quando comparado à definição de 2001v. Aqui, o termo coerência está relacionado a assegurar a promoção sistemática de ações que se reforcem mutuamente, realizadas pelo governo e pelos atores não governamentais interessados de forma a criar e manter sinergias para a realização do objetivo definido. Os países da OCDE enfrentam cada vez mais desafios de coerência 32. A coerência nas políticas é cada vez mais necessária para a realização dos objetivos de políticas nos níveis nacional, regional e subnacional. O apelo para uma maior coerência tornou-se mais evidente na década de 90, quando os países da OCDE se conscientizaram da necessidade de melhorar sua capacidade de administrar desafios de longo prazo. Por exemplo, foram solicitadas políticas específicas para administrar a complexidade de questões transetoriais e intergeracionais, como as populações de idosos e o desenvolvimento sustentável. Tornou-se cada vez mais óbvio que o processo decisório tradicional necessitava ser adaptado para abordar as questões emergentes. Isso foi amplificado pela crescente incerteza relativa ao impacto econômico e social de um número maior de riscos, a saber, graves desastres naturais, terrorismo, degradação ambiental, novos riscos tecnológicos como a clonagem humana ou o impacto de organismos geneticamente modificados (OGMs) etc. Com a opinião pública expressando preocupação e demonstrando uma diminuição da confiança nas instituições públicas, a capacidade de mecanismos tradicionais de tomada de decisão para lidar com os riscos emergentes foi questionada. Tendências da coerência e da governança 33. Portanto, a coerência está no centro do debate sobre como melhorar a qualidade da governança. Em 2000, a OCDE ressaltou que " o problema da coerência está intimamente ligado à governança – que é a maneira através da qual as sociedades organizam seu processo decisório para garantir que sirva ao interesse público ao longo do tempo e que proteja os valores compartilhados que mantêm a sociedade coesa." A governança contemporânea, em resumo, é caracterizada pelas seguintes tendências (OCDE 2001 c): • A globalização das questões e respostas torna as decisões mais interrelacionadas e as escolhas mais complexas. Além de garantir a coerência nos diferentes órgãos e serviços, há uma necessidade crescente de garantila nas políticas através das diferentes fronteiras organizacionais, setoriais e de níveis de governo, bem como ao longo do tempo (Bovaird & Loeffler 2002). • Apesar da re-alocação de recursos, os gastos do governo continuam estáveis em níveis relativamente altos (ver tabela 1), o que torna essencial a eficiência e a efetividade dos diversos serviços prestados pelo governo. • Os cidadãos têm estilos de vida mais diferenciados do que antes e, ao mesmo tempo, os interessados estão dispostos a intervir ativamente nos debates públicos, inclusive em escala global. Como resultado, os cidadãos são mais exigentes e suas expectativas são mais diversas. • Na maioria dos países da OCDE, há uma necessidade de melhorar a gestão da segmentação das políticas que resulta de quase vinte anos de realocação das responsabilidades entre os setores público e privado e da descentralização/transferência. Tabela 1. Gastos gerais dos governos, por país Porcentagem do PIB 1970 1975 1980 37,2 47,1 46,5 25,2 31,3 32,3 38,0 44,4 47,2 39,7 47,6 53,4 33,8 38,9 39,1 1 Alemanha Austrália Áustria Bélgica Canadá 1965 35,3 24,6 36,6 35,0 27,8 1985 45,6 37,8 50,1 57,3 45,4 1990 43,8 33,0 48,5 50,8 46,0 1995 46,3 35,4 52,4 50,3 45,3 2000 43,0 31,4 48,8 46,7 37,8 Coréia 2 Dinamarca Espanha Estados Unidos Finlândia 14,5 31,8 19,5 25,6 30,3 14,8 40,1 21,7 29,6 29,7 16,9 47,1 24,1 32,3 37,0 19,2 55,0 31,3 31,3 37,1 17,6 58,0 39,4 33,8 42,3 18,3 53,6 41,4 33,6 44,4 19,3 56,6 44,0 32,9 54,3 23,4 51,3 38,5 29,3 44,8 França Grécia Itália Japão México 37,6 22,0 32,8 19,0 .. 37,6 23,3 32,7 19,0 .. 42,3 27,1 41,0 26,8 .. 45,4 29,6 41,8 32,0 .. 51,9 42,3 50,6 31,6 .. 49,6 47,8 53,1 31,3 .. 53,6 46,6 52,3 35,6 21,4 51,2 43,7 46,7 38,2 .. Noruega Países Baixos 2 Portugal Suécia 2 Reino Unido 29,1 34,7 18,1 33,5 33,5 34,9 37,0 18,0 41,7 36,7 39,8 45,7 25,2 47,3 44,4 43,9 50,9 28,1 56,9 43,0 41,5 51,9 42,9 59,9 44,0 49,7 49,4 44,2 55,8 41,9 47,6 47,7 41,2 62,1 44,4 40,6 41,5 42,1 53,9 38,4 Área Euro OCDE 33,1 26,9 33,9 29,2 40,9 34,4 43,0 35,5 47,2 38,1 46,3 38,0 49,1 39,4 45,1 36,5 1. Estimativas. 2. Antes de 1988 no caso da Dinamarca, 1995 para Portugal e 1987 para o Reino Unido os dados são extrapolações retroativas baseadas nas séries anteriores de Contas Nacionais. Fonte: OCDE Economic Outlook 68, dezembro 2000, Contas Nacionais da OCDE e cálculos da OCDE. 34. As tendências-chave de governança descritas acima requerem maior coerência, inclusive através de uma direção central mais efetiva (Peters, 1997). O aumento do foco na coerência parece ter surgido por várias razões. 35. A primeira razão é a crescente escassez de recursos no setor público, que requer uma melhoria no estabelecimento de prioridades e que escolhas difíceis sejam feitas. Os efeitos negativos específicos que resultam de uma falta de estabelecimento de prioridades foram destacados recentemente em estudos de caso de Governança para o Desenvolvimento Sustentável (OCDE 2002 a). No Canadá e nos Países Baixos, foram observados cortes de orçamento sem melhoria da alocação de recursos em meados da década de 90. As reduções no orçamento afetaram as novas instituições de desenvolvimento sustentável em vez dos elementos mais estabelecidos, prejudicando o objetivo geral da política. Argumenta-se que o estabelecimento de prioridades se transformou numa atividade crucial para qualquer governo contemporâneo (Peters e Savoie, 1996). 36. A segunda razão para um foco maior na coerência é a percepção de que o estilo de governo está se tornando mais complexo e essa visão está sendo reforçada pela interconectividade crescente dos debates sobre políticas e pela multiplicidade dos atores envolvidos nos processos de formulação de políticas. 37. Por fim, foi ressaltado que a própria importância do mercado internacional torna a coerência no setor público mais importante. As instituições competem umas com as outras e a avaliação da boa governança está se tornando um critério essencial para o mercado. A competitividade internacional requer que os setores do governo, que anteriormente podem ter tido muito pouco contato, se é que algum, desenvolvam programas coordenados. Isso é reforçado pelo fato de que os compromissos mais importantes são assumidos pelos países no nível internacional e devem ser implementados nos níveis nacional e subnacional. Um exemplo típico dessa evolução é a agenda de desenvolvimento sustentável, acordada no nível internacional, mas que, para ser implementada efetivamente, requer um nível mais alto de coerência no nível nacional e na relação entre países e organizações internacionais (ver OCDE 2001 b). 38. Além desses desafios, os padrões estruturais também representam um obstáculo específico para o progresso na direção da coerência: • A orientação de curto prazo do processo decisório, devido à curta duração dos ciclos eleitorais (4 a 5 anos). Os políticos focalizam os interesses de curto prazo, quando a análise e os compromissos devem ser de longo prazo (OCDE 2002 a). • A regulação de várias áreas não é adaptada aos novos padrões de governança, o que complica a execução. Os países da OCDE, por exemplo, se defrontam com os limites de estruturas regulatórias tradicionais em vários campos e setores (gestão ambiental, saúde), onde percepções e interesses contraditórios emergentes questionam o desenho e a capacidade de execução das ferramentas regulatórias tradicionais. • A insuficiência de mecanismos transparentes de informação e de avaliação das questões no processo de formulação de políticas constitui a terceira grande barreira, apesar do progresso alcançado na ampliação do acesso à informação (2001e). E • Os problemas de implementação num contexto de fragmentação institucional,resultantes dos efeitos colaterais da descentralização e da transferência. 39. Nesse contexto, os esforços observados nos países da OCDE ao longo dos últimos vinte anos para promover uma agenda de modernização do setor público (OCDE 2001 c) devem ser analisados a partir da perspectiva específica de sua capacidade de melhorar a habilidade do governo de lidar com as questões da coerência. A OCDE, fornecendo uma perspectiva de dez anos sobre a modernização do setor público, destacou recentemente que "o desafio principal não é tanto como conduzir reformas, mas como apoiar a capacidade do governo de se adaptar às circunstâncias novas e em constante mudança, sem colocar em risco valores mais profundos de governança"vi. 40. Um retrospecto das experiências de modernização dos países da OCDE nos últimos dez anos sugere que a premissa usual da Nova Escola de Administração Pública, de que as reformas do setor público das décadas de 80 e 90 resultaram num estado mais enxuto e mais simples, não corresponde totalmente à realidade. Um dos efeitos específicos das “reformas administrativas pode ser um setor público relativamente estável associado a sistemas mais fragmentados e mais complexos de governançavii. Nós observamos que uma das características da agenda de modernização introduzida em muitos países da OCDE é um alto nível de fragmentação, resultante da descentralização e da privatização. Se por um lado essa tendência trouxe alguns benefícios econômicos, parece que essa fragmentação ainda não foi equilibrada pelo surgimento de mecanismos "para manter o todo coeso" (ver capítulo III do presente relatório). Incidentalmente, há uma grande evolução que pode seguir para outra direção, que é o surgimento de novas redes tecnológicas (ex. a generalização do acesso à Internet). A Internet está conectando pessoas e instituições. Contudo, o impacto pleno da revolução da Internet ainda precisa ser analisadoviii. Desafio horizontal, vertical e temporal 41. Os países da OCDE enfrentam tensões e desafios específicos que afetam as três dimensões da questão: a dimensão horizontal, a vertical e a temporal (ver quadro 1). Melhorar a coerência nas políticas requer examinar as evoluções que ocorrem dentro do governo, mas também os padrões de mudança da governança entre o governo e a sociedade civil. Esta seção se concentrará em problemas internos do governo, enquanto as tendências sociais mais gerais serão analisadas no capítulo III. Questões horizontais 42. Cada vez mais, setores e políticas específicas enfrentam o desafio concreto de administrar a complexidade e a interconectividade. Algumas tensões resultam da inabilidade dos arranjos e processos estabelecidos de introduzir a coerência. O setor agrícola oferece um exemplo típico dessa evolução. 43. No final da década de 90, muitos países da OCDE, particularmente os membros da União Européia, perceberam que a sustentabilidade dos padrões agrícolas poderiam ser questionados. Desde o fim da 2a Guerra Mundial, os países da OCDE conseguiram aumentar a produtividade de seus setores agrícolas e atender as demandas de suas populações e de uma parcela crescente da população do mundo. Entretanto, isso trouxe custos econômicos, ambientais e sociais significativos. Por exemplo, o desempenho econômico do setor foi afetado pelos altos níveis de subsídio, que atualmente (média 1998-2000) representa aproximadamente 35% do total das receitas dos agricultores para a OCDE como um todo (OCDE 2001 b). A degradação ambiental que resulta da produção agrícola também tem sido uma preocupação de países da OCDE desde a década de 70ix, além disso, a enorme redução da força de trabalho empregada nesse setor também é óbvia: o setor agrícola representa hoje menos do que 7% do emprego total na maioria dos países da OCDE (OCDE 2001b). Como resultado, na virada do século XXI parecia que a maior parte do setor agrícola se mostrava cada vez menos capaz de atender a critérios econômicos, ambientais e sociais. Ao mesmo tempo, uma série de eventos conduziu ao questionamento da qualidade dos produtos do setor agrícola (sendo o mais emblemático a crise da Encefalopatia Espongiforme Bovina EEB). 44. Poderia uma solução puramente setorial ser criada para superar essa crise e para reformar a agricultura? Parece bastante difícil pois, como já foi ressaltado pela OCDE em 2001, "assegurar que elementos externos que causam aumentos de custos na agricultura sejam levados em conta pelos responsáveis por sua geração é tanto uma questão de coerência nas políticas quanto de formulação de política. As áreas prioritárias que necessitam de maiores esforços para alcançar a coerência incluem o manejo do lixo, a geração de eletricidade, o planejamento territorial (inclusive o estabelecimento de estruturas que afetam a qualidade da paisagem), o transporte e a política social ". (OCDE 2001 b). 45. Além dos interesses setoriais, a necessidade de melhorar a coerência para uma gestão mais efetiva de agendas transetoriais também está se tornando óbvia. É particularmente difícil monitorar a integração de várias políticas setoriais para alcançar objetivos específicos. Como já foi mencionado em partes anteriores do relatório (ver Introdução), o desenvolvimento sustentável ilustra a necessidade de processos decisórios coerentes. Mas, apesar de esforços institucionais específicos, os países da OCDE ainda são caracterizados por uma falta de consciência e compromisso e, apesar das inovações específicas (ver capítulo II), os procedimentos para o estabelecimento de prioridades e a arbitragem de prioridades conflitantes permanecem um tanto fracos (OCDE 2002 b). O projeto COMPSUS, desenvolvido pela ProSus na Noruega representou uma primeira tentativa de analisar a implementação do desenvolvimento sustentável no âmbito de um projeto comparativo transnacional de pesquisa. A conclusão desse estudo foi que houve um progresso apenas limitado no desafio específico de integrar as políticas ambientais. Quadro 2: Integração das Políticas Ambientais: Resumo das Conclusões do Estudo de COMPSUS "Com relação à integração intraministerial há evidência de que os processos foram mais formais do que substantivos e que os interesses ambientais continuam sendo rotineiramente subordinados aos interesses do desenvolvimento. Em algumas jurisdições, a "integração" ficou quase inteiramente no nível da retórica -- no Japão, por exemplo, os ministérios e planos voltados para a produção funcionam em paralelo com as organizações e planos centrados na conscientização ambiental; e na União Européia o meio ambiente continua essencialmente excluído dos principais programas de gastos tais como a Política Agrícola Comum e os Fundos Estruturais. Mesmo onde se buscou o ideal da integração intraministerial mais ativamente -- como na Noruega ou no Canadá -a qualidade do engajamento ministerial com interesses ambientais ou com a agenda mais ampla de desenvolvimento sustentável é tipicamente baixa. Com respeito à questão mais complexa da integração setorial, pode-se fazer o mesmo tipo de crítica. Na maioria das áreas de tomada de decisões sociais o meio ambiente ainda é uma consideração "adicional". É verdade que é freqüentemente entendida como uma consideração necessária (mais do que meramente opcional); mas não se pode dizer que os impactos ambientais estão sendo levados em conta em processos setoriais desde o início." Implementing Sustainable Development: Strategies and Initiatives in High Consumption Societies William M. Lafferty e James Meadowcroft (2002) 46. A limitada "capacidade de ação” tem que ser reconhecida como um fator inerente que dificulta o avanço no sentido da coerência no processo decisório público. Um aspecto característico destacado pelo relatório do Conselho Científico para a Política Governamental dos Países Baixos (WRR) em 2002 é precisamente que a questão da capacidade de ação não está realmente formalizada (WRR, 2002, p 27). O relatório também ressaltou que "a capacidade cognitiva e condutiva do governo está sujeita a limitações significativas". 47. Em anos recentes, os problemas específicos ligados a essa "capacidade de ação" deficiente tornaram-se aparentes com uma série de crises, por exemplo, a crise do sangue contaminado, a febre aftosa, enchentes, terremotos, tufões, EEB, terrorismo e degradação ambiental global acelerada. Esses eventos revelaram que um dos principais aspectos das tendências contemporâneas de gestão de risco foi subestimado: a gestão de risco requer não apenas capacidades técnicas, requer também uma capacidade de controlar um ambiente político complexo. Ao mesmo tempo em que se demandam respostas rápidas e custo-efetivas, a "capacidade do governo de se adaptar aos riscos tradicionais e a novos riscos parece cada vez mais desafiada pelas complexidades modernas"x. Essas capacidades são particularmente desafiadas pelo ambiente mais complexo em que as decisões são tomadas e são ilustradas na Figura 2. 48. O desafio que o risco representa para a coerência interna poderia ser resumido da seguinte forma: “Os formuladores de políticas podem usar uma ampla gama de ferramentas para gerenciar riscos, incluindo a provisão de bens, serviços, infra-estrutura e informações; normas e padrões; legislação sobre delitos civisxi; regulamentação para seguros e re-seguros; incentivos econômicos, principalmente incentivos fiscais e subsídios. A eficiência e a efetividade das políticas requerem que cada instrumento seja usado no contexto onde tem maior impacto e onde apóia a ação de outros instrumentos. Na prática, entretanto, as políticas de risco freqüentemente carecem dessa coerência". (OCDE 2003) Figura 2: políticas A complexidade da Gestão de Risco: um desafio à coerência nas Cidadãos Transparência Envolvimento Avaliação de risco científica Percepções de risco Prioridades políticas • cidadãos • a mídia Restrições orçamentárias • conseqüências • probabilidade Imperativos políticos • iminência de eleições • imagem TOMADA DE DECISÃO E IDENTIFICAÇÃO DE RISCO GESTÃO DE RISCO Prever e mobilizar capacidades Agir e reagir Fonte: OCDE [ PUM/MPM (2001)1 ] Comunicar Aprender lições Questões verticais 49. Alguns desafios significativos de governança surgiram da evolução dos países da OCDE na transferência e descentralização funcional de responsabilidades e poderes. Esses desafios suscitam questões importantes sobre a coerência vertical. 50. A "descentralização" é um fenômeno muito complexo e certamente seria difícil apresentar uma única explicação geral sobre as várias experiências praticadas por países da OCDE em anos recentes. Em alguns casos a descentralização certamente trouxe ganhos de eficiência, em outros a alocação de recursos públicos parece ser menos eficiente em conseqüência do processo de descentralização. Especificamente, muitos países da OCDE expressaram preocupação quanto à coerência da alocação de tarefas e recursos nos diferentes níveis de governo (OCDE 1997). 51. Por exemplo, a efetividade e a eficiência dos mecanismos do federalismo fiscal foram questionadas. Algumas complexidades estruturais parecem ser inerentes à existência de responsabilidades compartilhadas para a arrecadação e administração fiscal entre níveis de governo. Na Suíça, os cantões têm a obrigação legal de arrecadar o imposto direto federal (FDT) sobre a renda individual, lucros empresariais e ganhos de capital. Há 26 leis de imposto cantonal e o mesmo número de administrações fiscais e nenhuma responsabilidade por parte do governo federal sobre a administração fiscal ou a Além disso, argumenta-se com freqüência que os administração do Estadoxii. mecanismos específicos para assegurar a "coerência", como esquemas de equalização entre as entidades estaduais de sistemas federais, causam um nível de complexidade fiscal desproporcional quando comparados com seus benefícios previstos (OCDE 1997). 52. Assim como a alocação de responsabilidade fiscal, a alocação de tarefas é geralmente caracterizada por um alto grau de complexidade e as tentativas de "racionalizar” a alocação de responsabilidades geralmente não são muito bem-sucedidas. Na França, as leis de descentralização de 1982-1983 estabeleceram "blocos” de competências bem definidas. Entretanto, a necessidade de associar vários níveis de governo para financiar projetos específicos pode confundir os contornos da alocação teoricamente bem definida. 53. Disputas sobre a alocação de recursos e tarefas são muito comuns. Isso tende a tornar questões já complexas, como o desenvolvimento sustentável, ainda mais difíceis. No Canadá, por exemplo, disputas jurisdicionais, principalmente sobre posse e controle de recursos nacionais, desgastaram as relações entre os níveis federal e local (OCDE 2002 a). Mas a simplificação também não é uma tarefa fácil. Deve-se ressaltar que em vários casos a descentralização resulta não somente do desejo de melhorar a alocação de recursos mas também reflete um equilíbrio político específico. Esse fator certamente deve ser incluído numa abordagem gerencial coerente. 54. Em comparação com a transferência de poder em níveis mais baixos de governo, a descentralização de tarefas para agências vinculadas resultou mais claramente da preocupação com a eficiência. Entretanto, embora houvesse interesse em criar um governo mais efetivo e simples, isso também trouxe tensões específicas. A complexidade, em particular, foi um dos aspectos principais do processo de reorganização. Em 2002, o Comitê de Gestão Pública da OCDE publicou uma revisão do desenvolvimento, em países selecionados da OCDE (Alemanha, Canadá, Espanha, Estados Unidos, França, Nova Zelândia, Países Baixos, Reino Unido, Suécia), com relação à governança das agências e autoridades públicas (OCDE 2002). O relatório destacou que "revisões do governo revelam que diferentes objetivos foram alcançados através dessas diversas formas organizacionais [agências etc.], incluindo eficiência e inovação (...). Ao mesmo tempo, na maioria dos países, as prioridades se moveram da necessidade de criar novos órgãos separados, para o desafio de encontrar o equilíbrio correto entre a responsabilização e a autonomia, abertura, gestão de desempenho, além do fortalecimento da capacidade de direção dos ministérios centrais (...). Em alguns países, questões do "governo como um todo", tais como qual a melhor forma de garantir a coerência nas políticas e um serviço público coerente, ou como manter a clareza do sistema organizacional administrativo, também surgiram como questões fundamentais. Coerência Temporal 55. Um dos maiores desafios para o governo é equilibrar pressões de curto prazo e objetivos de longo prazo. Muitas áreas de políticas públicas, como o envelhecimento da população, saúde, educação, infra-estrutura urbana, o meio ambiente, só podem ser abordadas adequadamente a longo prazo. Para promover o desenvolvimento sustentável em termos sociais, econômicos e ambientais, os políticos devem colocar os objetivos de curto prazo numa perspectiva de longo prazo, dentro do contexto das realidades orçamentárias. 56. Devido às pressões para encontrar soluções rápidas para os problemas, os processos de formulação de políticas tendem a negligenciar o longo prazo. A tendência para o curto prazo resulta principalmente dos imperativos da agenda política e dos ciclos eleitorais (aproximadamente 5 anos). Num contexto caracterizado por uma circulação mais rápida de informações, de intercâmbio de conhecimento e por maior participação dos grupos de interesse na formulação de políticas, também há uma pressão crescente para acelerar os processos de formulação de políticas a fim de encontrar soluções rápidas para questões complexas. O governo parece frequentemente obsecado por atitudes de curto prazo e "reativas", bem como pela pressão da opinião pública e da mídia que desejam soluções rápidas para os problemas. Portanto, a inter-relação entre os desafios do desenvolvimento de respostas coerentes para o novo ambiente com múltiplos interessados está se tornando crucial. 57. A gestão de risco também requer mais atenção à coerência temporal. A gestão de risco pode visar controlar um risco em vários estágios de seu desenvolvimento, quando é uma possibilidade hipotética, quando é inicialmente observado, ou quando é bem conhecido. Quando as incertezas são reduzidas e os fatores de risco se revelam, a regulamentação tem que ser aperfeiçoada, ou às vezes significativamente modificada. Tais mudanças podem ser extremamente dispendiosas se a regulamentação do risco não for criada de forma a se manter coerente ao longo do tempo (OCDE 2003). 58. Em 2001, a OCDE fez uma análise dessa questão específica da produção do conhecimento e de como tal questão poderia contribuir para desenvolvimento sustentávelxiii. Ficou claro que os sistemas de gestão tradicionais estão se tornando cada vez menos eficazes para a definição do sentido estratégico coerente de longo prazo. Em especial, as seguintes deficiências estruturais devem ser destacadas. 59. Os limites de abordagens unidiciplinares e ex post: Os sistemas tradicionais de gestão do conhecimento são caracterizados por uma predominância de ciências naturais e uma abordagem paradigmática unidisciplinar. As incertezas são consideradas reduzíveis por meio do progresso tecnológico. Conseqüentemente, os sistemas de gestão do conhecimento focalizam na redução do risco que pode ser obtida através das inovações tecnológicas, intervindo principalmente por meio da regulamentação posterior. Isso assume a forma da regulamentação ou da intervenção somente após a ocorrência de um incidente. A ascensão de procedimentos técnicos de avaliação desde a década de 70 é um exemplo desse desenvolvimento. Essa abordagem causou um alto grau de especialização nos sistemas de gestão do conhecimento por causa da complexidade crescente das incertezas dentro de uma matéria. Por exemplo, a pesquisa sobre matérias de desenvolvimento sustentável no Ministério da Agricultura, Gestão da Natureza e Pesca holandês é conduzida por 12 institutos de pesquisa altamente especializados com mais de 3000 empregados especializados. O alto grau de especialização pode resultar em conhecimento para a tomada de decisões e pode também produzir informações em excesso, o que complica ainda mais o processo decisório final. Além disso, a abordagem unidisciplinar às vezes não atende os objetivos cada vez mais holísticos do governo. Finalmente, a natureza ex-post desse método pode prejudicar o desenvolvimento de regulamentos de qualidade, o que é de importância central na criação de políticas mais sustentáveis. 60. Arquiteturas inflexíveis baseadas em hierarquias rígidas não podem resolver todos os problemas: Uma outra deficiência resulta das hierarquias rígidas advindas da abordagem de cima para baixo. Essas hierarquias são especialmente visíveis nos processos de planejamento e nos sistemas de avaliação baseados na revisão por pares, mais uma manifestação da abordagem unidisciplinar. Os projetos de pesquisa, geralmente, são realizados pelas universidades, levando a uma predominância da pesquisa primária em detrimento da aplicabilidade. Similarmente, esse foco na pesquisa primária pode conduzir à negligência das inovações estabelecidas, pois muitas organizações de pesquisa preferem "reinventar a roda" em vez de trabalhar com teorias previamente desenvolvidas. Assim, a "síndrome de NIA" (não inventado aqui) pode levar à duplicação e à ineficiência na utilização dos recursos. As tentativas do setor privado de neutralizar esse desenvolvimento enfrentam dificuldades semelhantes. A maior participação do setor privado cria conflitos fundamentais a respeito da neutralidade científica, da maximização do lucro e do papel da ciência como um bem público. O processo decisório resultante tem sido freqüentemente classificado como autista e não transparente. Devido à falta de participação das diferentes disciplinas científicas e de grupos sociais relevantes, a legitimidade de algumas decisões tem sido questionada. 61. A oferta de conhecimento não é adequada ao nível da demanda por conhecimento: Um resultado das deficiências estruturais mencionadas acima é a incompatibilidade entre a oferta de conhecimento e a demanda. O problema fundamental dos sistemas de gestão de conhecimento está na oferta de informações relevantes para a formulação de políticas em apoio ao processo decisório, uma vez que nem todas as formas de conhecimento são relevantes. Os resultados científicos podem levar a avanços no conhecimento geral, mas sua relevância ou utilidade em debates sociais pode ser pequena. As abordagens unidisciplinares podem negligenciar o conhecimento das diferentes disciplinas, assim tornando a oferta de conhecimento ineficaz e incompleta. Da mesma forma, a demanda por conhecimento pode incluir a necessidade de metodologias e dados que não estão disponíveis ou confirmados, ou ainda, que são controversos. Esse, por exemplo, é o caso das políticas relacionadas ao desenvolvimento sustentável: tópicos como desvincular o crescimento econômico da degradação ambiental, mudanças no padrão de consumo, desenvolvimento social ou reforma dos subsídios são assuntos altamente complexos e controversos e, portanto, a implementação de políticas relacionadas requer conhecimento específico adequado. O apelo global por coerência: cumprindo os compromissos internacionais com mais afinco 62. A inabilidade dos regimes internacionais de resolver, num horizonte de tempo razoável, problemas graves como a guerra, a pobreza e a degradação ambiental é assunto de debate diário e acalorado. Contudo, mesmo os críticos mais veementes geralmente admitem que o "sistema internacional" precisa ser reformado e não abolido. A natureza global das questões em jogo e a internacionalização da economia e da política tornam imperativo encontrar soluções globais coerentes no nível internacional. Particularmente, uma das deficiências do "sistema internacional" é precisamente a dificuldade de lidar com a coerência horizontal, vertical e temporal. Esse problema é em parte o resultado da especialização das tarefas nas organizações internacionais, que ainda reflete as necessidades do período pós-guerra, mas não tem nenhuma flexibilidade interna para ajustar-se aos desafios emergentes. Não existem, por exemplo, mecanismos efetivos entre as organizações (e às vezes nem dento das organizações) para assegurar que as prioridades (por exemplo: crescimento e meio ambiente) não estejam em conflito umas com as outras. Além disso, o cumprimento de compromissos mais amplos e de longo prazo geralmente é fraco comparado ao cumprimento de acordos internacionais pontuais relativamente simples. A coerência e as preocupações fundamentais com a governança global 63. A necessidade de mecanismos específicos para aprimorar a coerência nos processos internacionais de formulação de políticas para algumas questões transversais e de longo prazo recentemente revelou-se com maior clareza. A primeira, quase mínima, preocupação manifestada foi a necessidade de assegurar melhor coordenação de processos internacionais de formulação de políticas. As Metas de Desenvolvimento para o Milênio das Nações Unidas, por exemplo, enfatizam a necessidade de "Assegurar maior coerência nas políticas e melhorar a cooperação entre as Nações Unidas, suas agências, as Instituições de Bretton Woods e a Organização Mundial do Comércio, assim como entre outros órgãos multilaterais, visando uma abordagem plenamente coordenada para os problemas da paz e do desenvolvimento". (VII parágrafos. 30). 64. Entretanto, ainda é necessário um diagnóstico da magnitude da questão. Existe material específico sobre a boa governança do sistema internacional, mas geralmente é limitado a uma análise um tanto estática de desenvolvimentos institucionais. Portanto, falta uma avaliação geral, sob ponto de vista das políticas, da capacidade do sistema internacional de dar respostas coerentes às questões prioritárias. Geralmente, as análises focalizam as barreiras legais, jurisdicionais e políticas à implementação de medidas internacionais acordadas, enquanto uma análise profunda das questões sociológicas e organizacionais que afetam a governança internacional tem sido negligenciada. Diante dessa falta de conhecimento, seria possível questionar seriamente a premissa de que é suficiente combinar maior compromisso político com regimes legais mais favoráveis (por exemplo para arbitragem dos conflitos entre estados), de forma a se chegar a decisões internacionais coerentes sobre políticas. 65. A governança ambiental ilustra a complexidade envolvida em se trazer mecanismos coerentes para o nível internacional. A comunidade internacional aprovou um número considerável de acordos ambientais multilaterais (AAMs). Contudo, argumenta-se que a implementação desses acordos está sendo retardada pela complexidade de processos internacionais de formulação de políticas. Por exemplo, os AAMs não têm mecanismos efetivos para garantir a conformidade e resolver disputas. As sinergias e os ganhos substantivos na eficiência da implementação não são alcançados devido aos processos decisórios desconexos. Essas deficiências levaram a apelos por um sistema mais coerente de instituições ambientais, envolvendo os principais AAMs e organizações como o CSD, UNEP e outras partes do sistema das Nações Unidas que tratam das questões ambientais (UNESCO, WMO, OMS, etc.). Esse sistema poderia ser uma Organização Ambiental Mundial. Para ser efetiva, a criação de tal organização teria que superar as dificuldades técnicas da cooperação, do financiamento, da coordenação e da legalidade (OCDE 2001 b). 66. Compromissos específicos foram assumidos para melhorar a coerência nas políticas em alguns campos difíceis mas emblemáticos (redução da pobreza, desenvolvimento sustentável), precisamente onde as deficiências do sistema internacional se tornaram mais evidentes. (ver o quadro 3). Mas ainda é muito cedo para se prever qual será o resultado desse processo. Quadro 3: Redução da Pobreza: o Compromisso do Comitê de Assistência ao Desenvolvimento da OCDE com a Coerência nas Políticas Redução da pobreza e coerência nas políticas: Um Desafio Global. O consenso na comunidade internacional sobre a redução da pobreza como um objetivo global fundamental foi ampliado e aprofundado ao longo do ano passado. As estruturas de desenvolvimento baseadas em estratégias de redução da pobreza no nível do país são agora a base para a cooperação bilateral e multilateral. As novas diretrizes acordadas pelo Comitê de Assistência ao Desenvolvimento (DAC) e a liberação da assistência para países menos desenvolvidos contribuem com elementos adicionais importantes para essa abordagem abrangente. Esse avanço foi aprovado pelos participantes. Agora, o principal desafio é a implementação. Essa fase requer novas abordagens e capacidades nas agências de cooperação para o desenvolvimento , além de melhor coordenação institucional, inclusive entre agências bilaterais e multilaterais no nível do país. Nesse contexto, os membros do DAC reconheceram que é necessário um avanço significativo na sua contribuição de forma a colocar em prática os princípios de parceria - incluindo o apoio a estratégias de redução da pobreza no médio prazo. Os níveis de apoio terão que refletir as necessidades de estratégias efetivas de redução da pobreza. Apesar da maioria dos Membros do DAC terem aumentado seu apoio em 2000, a razão entre a assistência externa ao desenvolvimento e o PIB diminuiu. Os participantes enfatizaram a importância de construir um consenso mais amplo com Parlamentos e a opinião pública sobre a necessidade de inverter essa tendência, no esforço de atingir as metas internacionais de desenvolvimento. Fonte: OCDE 2002 O desafio de implementar as metas acordadas internacionalmente 67. Alcançar um processo coerente de formulação de políticas no nível internacional continua sendo um desafio, mas a implementação de metas acordadas internacionalmente por parte das autoridades no nível nacional também é motivo de preocupação. Isso cria um problema típico de coerência vertical. 68. No nível formal não há nenhuma contradição aparente entre objetivos internacionais e nacionais. As metas e os princípios acordados internacionalmente são negociados e ratificados pelas autoridades nacionais e são tomadas medidas jurídicas para assegurar que a nova legislação internacional seja convertida em lei nacional. Geralmente existem dispositivos para dar à lei internacional precedência sobre a legislação nacional. 69. Na prática as coisas são muito mais complicadas. Para seguir um caminho mais sustentável de desenvolvimento, muitos países da OCDE têm, por exemplo, se comprometido a reduzir seus subsídios à produção de energia (como combustível ou carvão), ou a reduzir e a mudar a estrutura de seu apoio em alguns setores (ex. agricultura) para diminuir os efeitos negativos sobre o comércio, a economia e o meio ambiente. O progresso, entretanto, tem sido lento e algumas inconsistências permanecem (veja a tabela 2). Tabela 2 : Tendências dos níveis de subsídio em países da OCDE Bilhões US$ 1990 Dados mais Comparação recentes [data] Agricultura 351 311 [2001] Equivalente a 1.3% do PIB Pesca marinha .. 6 [1999] Equivalente a 18% do valor no destino Produção de carvão 11 6 [1998] Indústria 44 .. Notas: Os dados não são comparáveis entre setores. Agricultura: estimativa total de apoio à agricultura. Inclui apoio ao preço de mercado e apoio a serviços gerais. Pesca: as transferências financeiras do governo para a pesca marinha não incluem apoio ao preço de mercado. A estimativa de dados para 1999 exclui dados para Austrália, Bélgica, Canadá, México, Países Baixos, Polônia e Turquia. Produção de carvão: apoio equivalente a produtores nos países selecionados da OCDE (Alemanha, Japão, Espanha, Turquia e Reino Unido). Indústria: despesas líquidas do governo com a indústria conforme informadas. Fonte: OCDE 2002 c 70. A implementação da agenda de desenvolvimento fornece outro bom exemplo. O desenvolvimento está no cerne do sistema internacional. A necessidade de desenvolvimento e erradicação da pobreza é reafirmada regularmente pela comunidade internacional (vide as metas para o milênio da ONU) e foi reafirmada como o objetivo central da Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (Johanesburgo, setembro de 2002). Esse objetivo, porém, não se tornou central nas políticas regionais e nacionais, e geralmente fica em segundo plano em relação a interesses econômicos de prazo mais curto. De fato, um dos principais desafios das metas de desenvolvimento é que, embora o desenvolvimento seja um objetivo de alta prioridade no nível internacional, essa agenda não tem o mesmo nível de prioridade no nível nacional. As instituições que têm um papel central no aparelho do governo, geralmente, não são as responsáveis por questões de desenvolvimento. As agências de desenvolvimento têm um papel bem menos central no sistema decisório do que, por exemplo, um Ministério das Finanças. Além disso, os mecanismos tradicionais de coordenação tendem a favorecer os "ministérios grandes e estabelecidos" versus os "novos e pequenos" (ver capítulo 3) e essa realidade não facilita a implementação de prioridades internacionais. 71. Portanto, a coerência entre o compromisso internacional e as políticas nacionais foi reconhecida por governos e por ONGs como um fator determinante para o avanço da agenda do desenvolvimento. Organizações regionais como a União Européia também reafirmaram a necessidade de desenvolvimento mais coerente. Há uma necessidade crescente de se promover a coerência geral de políticas nacionais no que diz respeito a seu impacto na redução global da pobreza. Em 2002, os membros do Comitê de Assistência ao Desenvolvimento da OCDE (DAC) assumiram o compromisso, ao endossar as Diretrizes para Redução da Pobreza do DAC, de promover a coerência nas políticas de desenvolvimento como uma preocupação geral e de desenvolver os meios necessários para promovê-la em todo o governo. As medidas necessárias para promover a coerência nas políticas sugeridas por esse comitê incluíram o mais alto nível de compromisso político com a redução da pobreza, mecanismos para intercâmbio e consulta dentro dos ministérios e entre eles, verificação sistemática da legislação para assegurar sua coerência com a redução da pobreza e recursos humanos adequados para empreender a análise necessária. Exemplos de tendências e questões específicas no nível nacional na Espanha, Reino Unido e no nível regional na União Européia são apresentados no quadro 4. Quadro 4: Desafios específicos para melhorar a coerência para o desenvolvimento - Exemplos selecionados A Espanha é um dos poucos membros do DAC a ter a coerência nas políticas explicitamente integrada em sua estrutura jurídica. A Lei determina que os princípios e os objetivos da cooperação espanhola para o desenvolvimento devem ser refletidos em todas as outras políticas que afetam países em desenvolvimento. A Lei também indica que ao mesmo tempo em que a promoção das relações políticas, econômicas e culturais com países em desenvolvimento continua sendo um aspecto importante da cooperação espanhola para o desenvolvimento, ela deve ser consistente com os objetivos de desenvolvimento sustentável e redução da pobreza. A Espanha progrediu muito no fortalecimento da coordenação interna, mas ainda precisa abordar a coerência nas políticas de modo sistemático. As estruturas institucionais de coordenação implementadas recentemente desempenharam um papel bastante útil na promoção de maior sinergia entre os diferentes instrumentos e diversos atores no âmbito da cooperação espanhola para o desenvolvimento. Algumas dessas estruturas poderiam ser usadas para apoiar uma abordagem mais sistemática das questões de coerência nas políticas, indo além da cooperação para o desenvolvimento. O debate sobre a coerência nas políticas parece ainda estar num estágio inicial. Para promover o debate dentro e fora da administração pública, a Espanha precisa primeiro fortalecer suas capacidades analíticas para determinar o impacto de diversas políticas de redução da pobreza. Para isso seria necessário alocar recursos humanos adequados ao Ministério das Relações Exteriores para realizar a análise das políticas e propor as opções necessárias a outras comunidades envolvidas com formulação de políticas. O Reino Unido fez uma série de ajustes que reforçam sua reputação como doador na comunidade internacional para o desenvolvimento. Muitas dessas mudanças constituem uma alteração significativa das práticas anteriores e alinham os programas do Reino Unido com as boas práticas internacionais. O objetivo das novas abordagens e idéias é tornar os esforços internacionais para o desenvolvimento mais efetivos. Quanto a outros membros do DAC, alcançar a coerência nas políticas é uma tarefa difícil e continuará a exigir atenção constante. O Ministério Britânico para o Desenvolvimento Internacional (DFID) trabalha ativamente com outras comunidades de formulação de políticas no governo britânico nas questões da coerência nas políticas e do processo decisório. Os sistemas de monitoramento e avaliação do DFID evoluíram significativamente em anos recentes. Em muitas áreas de atividade, esses sistemas são novos e ainda não tiveram sua eficácia comprovada. Onde os sistemas existem, a conformidade a eles é um problema porque, de modo geral, parece haver pouco sentimento de propriedade em relação a esses processos por parte dos funcionários do DFID. Uma outra questão para consideração é a independência institucional das avaliações ex-post, cujo programa atualmente é determinado por um comitê composto por altos funcionários do DFID. No longo prazo, a realização dos objetivos internacionais de desenvolvimento em cada país em desenvolvimento fornecerá uma base para a avaliação do desempenho do DFID. Essa não é uma tarefa fácil devido às dificuldades de coletar dados sobre mudanças em países em desenvolvimento e de estabelecer as ligações entre essas mudanças e as ações de doadores individuais. Apesar da implementação de sistemas para melhorar a avaliação do desempenho, continua sendo um desafio conciliar os objetivos estabelecidos nos três anos do Acordo de Serviço Público com os objetivos de desenvolvimento de longo prazo do DFID. União Européia A Comunidade Européia é um grande doador com alcance global e potencialidades específicas através de seus acordos regionais de parceria, ligando os aspectos de comércio e políticas com a cooperação para o desenvolvimento. A Comunidade Européia melhorou substancialmente suas políticas e estratégias de desenvolvimento desde a última revisão em 1998 e continua comprometida com a implementação de todos os elementos de suas reformas nos próximos anos. As reformas ambiciosas da Comissão Européia também visam melhorar sua capacidade de cumprir seu objetivo principal de reduzir a pobreza através do programa de apoio da Comunidade Européia. Além das medidas positivas já adotadas para a coerência nas políticas, o DAC destacou a necessidade de melhorar a coerência de uma ampla gama de políticas da Comunidade com objetivos de desenvolvimento, trazendo benefícios claros para as populações carentes ao redor do mundo. Ao elogiar os esforços empregados nas políticas de desenvolvimento e na reforma gerencial, o DAC recomendou que a Comissão promova mais sua vantagem comparativa, aumente sua visibilidade e focalize em resultados mensuráveis nos seus programas regionais e programas para países. Fonte: Comitê de Assistência ao Desenvolvimento (DAC) 2002 CAPÍTULO II Estratégias e Ferramentas do Governo para a coerência nas políticas 72. Enquanto a coerência nas políticas se torna uma preocupação cada vez maior nos níveis nacional e internacional, a natureza extremamente complexa das questões envolvidas nos coloca uma pergunta: que ações poderiam contribuir para melhorar a coerência nas políticas? Várias surgiram e levaram a desenvolvimentos específicos para melhorar a liderança política, fomentar a integração das políticas e aproveitar efetivamente as ferramentas tradicionais de formulação de políticas. 73. Qual deve ser o papel do governo no esforço para alcançar a coerência? Ao examinar as capacidades existentes de cumprir compromissos de longo prazo foi ressaltado que "entre os supostos concorrentes a fontes de governança parece claro que o mercado, as redes e os governos subnacionais não são bons candidatos para fornecer esse tipo de direção coerente. Essas instituições poderiam talvez administrar a implementação das políticas e poderiam estabelecer uma direção para suas próprias ações, mas talvez não possam fornecer uma direção mais ampla"xiv. Embora os governos encontrem grandes dificuldades para assegurar a coerência, talvez eles representem o único conjunto de instituições capaz de assegurar a coerência desejável nas políticas públicas. Quando comparado a outras instituições seria possível argumentar que não há nenhuma razão para considerar as capacidades do estado menos "coerentes" do que as de mercados ou outros regimes. Por isso, é tarefa dos governos nacionais manter unidos os elementos da governança e integrar o que está sendo feito em todas as áreas de formulação de políticas. 74. O que pode ser feito para melhorar a capacidade do governo de assegurar maior coerência? O relatório sobre “Coerência” de 1996 da OCDE (OCDE, 1996) destacou as dificuldades para se atingir a coerência, mas identificou ao mesmo tempo "ferramentas específicas da coerência". O relatório apresentou as seguintes conclusões (OCDE pp.8-9 1996): • Há uma lacuna entre a necessidade de coerência e a capacidade de alcançála. • Governar num sistema democrático necessariamente envolve um certo grau de incoerência. • Não existe um sistema de formulação único que possa garantir melhor coerência. • No entanto, existem boas práticas e “ferramentas da coerência”. • A principal ferramenta da coerência é a tomada de decisões informada.. 75. O relatório também forneceu uma lista das "ferramentas específicas da coerência": • Compromisso por parte da liderança política é uma pré-condição necessária para a coerência e uma ferramenta para aperfeiçoá-la. • Estabelecer uma estrutura estratégica para a formulação de políticas ajuda a garantir que as políticas individuais sejam consistentes com as metas e prioridades do governo. • Os responsáveis pelas decisões precisam de assessoria baseada na definição clara e na boa análise das questões, com indicações explícitas das possíveis inconsistências. • A existência de uma visão geral central, bem como de uma capacidade de coordenação central é essencial para assegurar a consistência horizontal entre as políticas. • Mecanismos para antecipar, detectar e resolver conflitos entre as políticas no início do processo ajudam a identificar inconsistências e reduzir a incoerência. • O processo decisório deve ser organizado para alcançar a conciliação efetiva entre as prioridades nas políticas e os imperativos orçamentários. • Os procedimentos de implementação e mecanismos de monitoramento devem ser projetados para assegurar que as políticas possam ser ajustadas de acordo com o progresso, com novas informações e com circunstâncias em transformação. • Uma cultura administrativa que promova a cooperação transetorial e o diálogo sistemático entre as diferentes comunidades de formulação de políticas contribui para fortalecer a coerência nas políticas. 76. Esses pontos oferecem, num relance, uma visão bastante abrangente para melhorar a coerência interna do governo. Tendo em mente que essa abordagem está estritamente limitada ao processo interno do governo, esses elementos constituirão a base do presente capítulo. Os impactos de questões mais amplas de governança, que são características essenciais dos padrões modernos de governança, serão analisados no capítulo IV. A necessidade de visão e liderança 77. As questões das políticas estão se tornando cada vez mais complexas pelas razões já destacadas: a maioria das questões na agenda do governo é multidimensional com numerosos elementos e vínculos. Elas poderiam ser abordadas com sucesso se as diversas ferramentas de formulação de políticas extraídas de várias áreas fossem combinadas. O ambiente em constante mudança requer flexibilidade. O governo atua sob pressões de tempo e os problemas freqüentemente exigem ações imediatas – as decisões não podem ser adiadas para permitir a coleta de mais informações, uma preparação mais minuciosa e mais negociações entre as partes envolvidas. Entretanto essa complexidade e a necessidade de ação rápida em questões difíceis não devem ser motivos para diluir a responsabilização do governo. Afinal, o governo será responsável pelas decisões tomadas e seus resultados. Esse dever de ação e a responsabilidade pelo ajuste a padrões complexos exigem atenção específica à melhoria da formulação de políticas. 78. Há dois elementos diferentes que poderiam ajudar a garantir uma formulação de políticas mais coerente: esforços para fortalecer a interface política e administrativa e esforços para apoiar a capacidade de desenvolver visões e estratégias. Uma interface mais eficaz entre o nível político e o administrativo 79. A formulação de políticas não é um procedimento previsível com tempo determinado, mas um processo contínuo e complexo com diversos fatores de intervenção internos e externos. A formulação, implementação e monitoramento das políticas são processos contínuos que se influenciam mutuamente. Por causa de mudanças rápidas nos contextos nacionais e internacionais e de informações contraditórias sobre problemas sociais emergentes, o responsável pelas decisões tem que enfrentar a incerteza quando decide quais as melhores soluções para as questões. A participação de uma ampla gama de atores sociais de diferentes jurisdições no processo de formulação de políticas e as pressões da sociedade civil e da mídia representando interesses em competição e conflito trazem a implicação de que o governo tem que atender demandas múltiplas e deve considerar metas e medidas incoerentes, até mesmo conflitantes. A primazia da política e a necessidade de uma boa interface política e administrativa 80. O nível político é responsável por identificar questões de políticas, elaborar estratégias, ajustar objetivos e prioridades, formular respostas, alocar recursos, fazer julgamentos sobre resultados e ajustar as políticas de acordo com as necessidades. Essa primazia da política é crucial num sistema democrático onde os políticos são os responsáveis pelo que acontece e têm que prestar contas disso. Por isso alcançar a coerência depende muito dos processos políticos, que não são muito previsíveis. Conseguir a coerência interna de políticas públicas será, conseqüentemente, mais do que uma tarefa puramente técnica. 81. Geralmente, organizações diferentes desenvolvem abordagens e pontos de vista diferentes sobre as questões. Isso vale tanto para o nível político quanto para o administrativo. A maioria dos países da OCDE é governado por governos de coalizão onde diferentes opções são manifestadas, embora geralmente seja mantido um consenso mínimo. Dentro do aparelho do governo, a análise desenvolvida pelo ministério das finanças geralmente difere dos pontos de vista desenvolvidos nos ministérios setoriais. A falta da criação integrada de políticas geralmente é derivada dos resultados contraditórios das políticas (ver abaixo, mecanismos para a integração). Para qualquer reforma ou programa de políticas, o compromisso é vital não somente por parte dos políticos no nível mais alto, mas também dos gerentes do setor público, como os ministros, os chefes das agências centrais e outros funcionários influentes. Para garantir a manutenção do momentum da mudança, o relacionamento entre o nível político e o administrativo deve sustentar o desempenho de alto nível das políticas de modo flexível. Uma interface que funcione bem entre políticos e funcionários também é um pré-requisito para a integração da estratégia, da política e da gestão descrita mais adiante. 82. Iniciativas específicas foram desenvolvidas em alguns países para fortalecer a eficiência da interface entre o nível político e o administrativo. Na Bélgica, o gabinete ministerial era a estrutura principal que tradicionalmente traduzia a política em administração. Essa equipe de especialistas, escolhida a dedo pelo ministro e geralmente da mesma persuasão política, ajudava a elaborar as políticas. Esses gabinetes ministeriais foram abolidos recentemente e substituídos por unidades estratégicas que preparam as opções das políticas, passando mais responsabilidade à administração. Anteriormente, não havia regras claras que determinassem como esses gabinetes ministeriais deveriam interagir com as equipes permanentes dentro do ministério. Além disso, os gabinetes tendiam a exercer um controle muito mais amplo sobre as operações dos ministérios e desempenhavam um papel mais direto na formulação de políticas. Isso freqüentemente afetava a auto-estima dos servidores públicos e às vezes levava a atritos entre um ministro e os serviços sob sua responsabilidade. Também levou a uma falta de continuidade na formulação de políticas, uma vez que os gabinetes ministeriais iam e vinham com os ministros após as eleições. Os ministros agora têm somente uma pequena secretaria para assessorá-los pessoalmente e lidar com tarefas administrativas. A formulação de políticas é hoje tarefa de dois novos órgãos dentro de cada FPS – Federal Public Service (Serviço Público Federal, antigo Ministério): • A unidade estratégica de políticas, que realiza o trabalho de formular, analisar e avaliar as políticas atuais, além de fornecer opções de abordagens às políticas. • O conselho de políticas – a ponte entre política e administração – que assessora o ministro quanto à estratégia e quanto às políticas e monitora o modo como o plano estratégico do FPS está sendo colocado em prática. O conselho de políticas é composto pelo ministro, o presidente do FPS, os diretores gerais de cada departamento dentro do FPS, o chefe da Unidade Estratégica de Políticas e especialistas externos para questões específicas (Fonte: Copernicus. Reform of the Belgian Administration. Bruxelas 2002) 83. A Suécia é caracterizada por mecanismos específicos no nível da formulação de políticas, que associam os níveis político e administrativo mais estreitamente e asseguram a consistência na formulação de políticas (ver quadro 5). Quadro 5: Formulação de políticas na Suécia Existem negociações dentro do governo para se estabelecer a política a ser seguida pelo governo. Apesar da ausência de dispositivos constitucionais sobre a preparação das questões (exceto que as decisões devem ser tomadas em reuniões do Gabinete), as negociações dentro do governo são conduzidas de acordo com determinadas regras tradicionais. As reuniões formais do Gabinete geralmente são realizadas ao menos uma vez por semana. Essas reuniões do Gabinete são formalizadas rigidamente e constituem um registro simples das decisões já tomadas. O governo normalmente toma várias centenas de decisões em pouco mais de 30 minutos. As negociações reais dentro do governo ocorrem durante sessões informais do Gabinete. A convocação para essas sessões informais é emitida pelo Gabinete do Primeiro Ministro. A votação é rara em tais reuniões e o procedimento normal é o Primeiro Ministro resumir o debate após a discussão geral e estabelecer a política do governo. É difícil estimar o número de matérias levantadas durante as sessões informais do Gabinete mas provavelmente atinge algo em torno de 1% a 2% do número total de decisões anuais. Deve-se ressaltar, entretanto, que a maioria das decisões do governo são de importância limitada; por isso negociações coletivas são freqüentemente desnecessárias. Aproximadamente duas vezes por ano, o governo se reúne para reuniões mais longas que podem durar um ou dois dias. A existência de outras formas de negociação coletiva é o motivo do reduzido número de questões apresentadas durante as sessões informais do Gabinete. A maioria dos ministros se encontra para o almoço diariamente durante a semana de trabalho e discute questões de interesse comum – por exemplo, nomeações. O método da preparação conjunta indica as negociações onde dois ou mais ministérios participam. Esse tipo de negociação bilateral, entre ministros e ministérios, é obrigatória quando há mais de um ministério envolvido e, geralmente, inclui o Ministério das Finanças. Isso se deve a um regulamento interno do governo que determina que a preparação conjunta com o Ministério das Finanças sempre deve ser realizada para questões que envolvam ou possam envolver despesas ou mudanças organizacionais. Além disso, é prática comum do governo e seus departamentos divulgar todas as contas do governo, respostas a interpelações e perguntas levantadas no Parlamento, comunicações escritas ao Parlamento e instruções às comissões do governo. Isso significa que as decisões preliminares devem circular em todos os ministérios antes de serem abordadas nas reuniões do Gabinete. Se um servidor público ou ministro, que receba uma matéria sendo circulada dessa forma, tiver alguma objeção a seu conteúdo, ele ou ela deverá escrever comentários nesse sentido na margem da cópia e assiná-la. Fonte: Distributed Public Governance. Agencies, Authorities and other Government Bodies. OCDE 2002 Desenvolvendo visões e estratégias 84. Dar forma ao futuro, encontrar opções para políticas sustentáveis e estar preparado para o imprevisível são elementos integrantes da vida política. Isso requer uma visão clara no topo do sistema político para garantir o ímpeto necessário para as mudanças previstas. As organizações públicas também devem poder desenvolver capacidades estratégicas suficientes para dar forma a essa visão. Visões... 85. A visão do futuro de uma nação pode ser definida como uma visão estratégica equilibrada do interesse público. Quanto mais complexas as questões, maior a necessidade de uma visão relativamente simples e de fácil compreensão. É a base para estabelecer a direção. A visão do governo, para ser aceitável, tem que ser compartilhada por uma maioria clara dos atores relevantes e ir além do ciclo eleitoral e do programa do governo. Ela deve se referir a questões futuras de forma transgovernamental e ser revisada freqüentemente à luz de novos conhecimentos. As estratégias devem considerar respostas alternativas às principais questões futuras antes que elas se tornem urgentes e devem traduzir as visões em programas e projetos de políticas sustentáveis. 86. Para traduzir uma visão em medidas efetivas, ela deve ser sustentada pelo compromisso e pela liderança. Por exemplo, um compromisso claro de alcançar o desenvolvimento sustentável é reconhecido por países da OCDE como essencial para apoiar uma estratégia concreta e uma ação subseqüente. Nesse contexto, uma liderança política mais forte é necessária para dar forma ao debate sobre como levar adiante o desenvolvimento sustentável. Conseguir compromisso e liderança claros implica emxv: • Um compromisso claro e do mais alto nível com a formulação e a implementação de objetivos e estratégias de desenvolvimento sustentável. • Uma divulgação efetiva desse compromisso para os diversos setores e em todos os níveis do governo. • Esforços específicos para preencher as lacunas entre a agenda administrativa e a política. • Expressão de liderança através de uma seqüência de prioridades ao longo do tempo. • Manutenção de um sentido de urgência apesar da natureza de longo prazo das questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável. 87. Alguns desses pontos poderiam ser relevantes para qualquer política transversal e de longo prazo e conclusões muito parecidas foram desenvolvidas recentemente no campo do desenvolvimento e no da redução da pobreza (OCDE 2001 a). 88. Desenvolver "visões" também é necessário numa escala mais operacional. O ciclo de vida de muitos investimentos, incluindo o investimento em capital humano, é longo e deve ser orientado por uma visão que vá além do mandato do governo. Deve também resistir a pressões políticas de curto prazo dos partidos, de grupos de interessados, da opinião pública e da mídia. Nesse sentido, políticas bem coordenadas para o futuro nem sempre são politicamente compensadoras, pois podem ser avaliadas por alguns observadores como medíocres e dispendiosas, até mesmo como fúteis ou prejudiciais. Por outro lado, para melhorar a confiança pública nas políticas do governo, como no caso de políticas previdenciárias, os responsáveis pelas decisões têm que manter políticas consistentes com a continuidade das decisões e encontrar soluções de longo prazo. ... e estratégias 89. A experiência recente de reforma do setor público em países da OCDE demonstrou que a maior parte dos esforços de modernização em anos recentes foi focalizada na prestação de serviços. "Entretanto, está cada vez mais evidente que algumas das mudanças mais importantes na adaptação dos governos às necessidades sempre em transformação da sociedade são relacionadas à "direção" – especialmente a partir da perspectiva do governo como um todo. Uma questão central é : que capacidade estratégica um governo na sociedade moderna precisa ter e como as agências centrais de diferentes países estão se adaptando para desenvolver tal capacidade? (OCDE 2002)xvi". O setor público deve poder aperfeiçoar suas capacidades estratégicas dentro da estrutura da visão desenvolvida no nível político. 90. Na Irlanda, o Programa de Modernização do Serviço Público (também conhecido como Iniciativa de Gestão Estratégica) foi lançado originalmente em 1994. O objetivo do processo era prestar um excelente serviço para o público. O programa focalizava particularmente nas questões transversais entre ministérios e departamentos. De acordo com uma avaliação independente, publicada em 2002xvii, o serviço público é mais bem administrado e mais efetivo do que a uma década atrás. Os ministérios do serviço público possuem hoje uma melhor capacidade de analisar seu ambiente de negócios, avaliar alternativas estratégicas e apresentar sua análise de forma convincente e fácil de entender. Todos os ministérios e departamentos cumpriram a exigência de produzir uma Declaração de Estratégia, um documento que serve de estrutura para sua ação. Integração das Políticas 91. Entretanto, as visões e estratégias são apenas pré-requisitos básicos para a coerência. Tradicionalmente, os procedimentos e mecanismos usuais têm sido suficientes para cumprir a agenda acordada. Mas quando se trata de políticas complexas com alto grau de detalhes verticais, horizontais e temporais, são necessários mecanismos específicos para integrar os diversos objetivos e políticas. Os países da OCDE aplicaram três tipos de instrumentos de formulação de políticas que têm um papel fundamental na integração: introduziram novos mecanismos de coordenação, experimentaram com processos específicos para conduzir a integração e adaptaram ferramentas tradicionais de formulação de políticas. Mecanismos para melhorar a coordenação e a consistência 92. Um dos pontos destacados na avaliação do Programa de Modernização do Serviço Público na Irlanda mencionado acima foi precisamente que, embora a direção estratégica tivesse sido estabelecida claramente, a coordenação transdepartamental ainda estava faltando. Ela teria que ser fortalecida para garantir que os vínculos apropriados e as questões transversais fossem efetivamente incluídas no contexto do "Programa para o Governo". Similarmente, o Governo finlandês comissionou em 1999 uma análise comparativa internacional da administração central. De acordo com essa avaliação, a Finlândia administrou com sucesso a recessão econômica da década de 90. Entretanto, o estudo revelou também que há diversos desafios pela frente. Ele destacou que a capacidade e a flexibilidade da administração central serão no futuro fatores determinantes para a competitividade nacional e, para tanto, a promoção da coordenação transversal é fundamental. De acordo com o Grupo Diretor Ministerial, para melhorar a flexibilidade é necessário que se tenha uma abordagem abrangente e uma coordenação eficiente das atividades, além de uma habilidade de responder aos desafios de longo prazo. Os objetivos e estratégias futuros devem ocupar um lugar central e o governo deve ser capaz de atingir os objetivos estabelecidos através de uma cooperação que atravesse os limites tradicionais. Mecanismos formais de coordenação 93. Os países da OCDE têm uma longa tradição de mecanismos formalizados para a coordenação das políticas, que contribuem principalmente para apoiar as dimensões horizontais e verticais da coerência. 94. No nível nacional esses mecanismos incluem (OCDE 1996): • Mecanismos de coordenação no comando do governo, por exemplo órgãos centrais de apoio (ex. Secrétariat Général du Gouvernement na França). • Conselhos de ministros, que são reunidos regularmente. • Comitês de conselhos de ministros, para coordenar as áreas de políticas definidas ,como por exemplo as políticas econômicas ou sociais. • Unidades coordenadoras, sendo algumas de caráter ad hoc, como comitês consultivos, forças-tarefa, etc. 95. Na maioria dos países da OCDE, essa estrutura é espelhada por uma estrutura relativamente semelhante no nível subnacional. Os mecanismos de coordenação no nível subnacional são especialmente sofisticados nos países federativos (OCDE 1997). Seria difícil fornecer uma única avaliação desse universo de mecanismos e órgãos. Eles geralmente servem para reunir os diferentes setores e interesses para a tomada de decisões finais. A pergunta é se a qualidade das decisões finais e arbitragens alcançadas através desses mecanismos horizontais contribui efetivamente para a resolução coerente de conflitos nas políticas (ver capítulo III). 96. Os mecanismos tradicionais de coordenação vertical existem também para garantir o nível desejado de consistência nos dois níveis do governo. Os mecanismos do “federalismo executivo" do Canadá ilustram os sistemas altamente desenvolvidos de coordenação entre o nível federal e o nível das províncias. O sistema do Canadá para a coordenação entre o nível nacional e o nível subnacional é baseado em mecanismos de "federalismo funcional" e de "federalismo de cúpula" (0ECD 1997; 0ECD 2002 a) • Federalismo funcional: ministros e oficiais, geralmente de departamentos federais e provinciais correspondentes, se reúnem para compartilhar pontos de vista sobre empreendimentos específicos que exijam negociação. Essas reuniões são às vezes multilaterais, envolvendo o governo federal e todas as províncias. Em outras ocasiões são multilaterais-regionais, reunindo várias províncias com o governo federal; e às vezes são bilaterais – envolvendo o governo federal e um governo de província. Há mais de 500 reuniões intergovernamentais por ano envolvendo conselhos federais e provinciais de ministros e comitês de oficiais. Quase todas as reuniões são "departamentais", focalizando questões específicas que exigem a coordenação de posições de políticas ou mecanismos de realização de programas. As reuniões tratam de assuntos diversos, desde a execução de leis, turismo, até políticas orçamentárias. • Federalismo de cúpula: se refere às reuniões de Primeiros Ministros (o termo usado para designar o Primeiro Ministro do Canadá e os dez Presidentes das Províncias e três líderes territoriais). Essas reuniões de cúpula sempre recebem muita publicidade – às vezes são televisionadas – e às vezes são bons fóruns para problemas horizontais difíceis, a saber aqueles que se passam por mais de um departamento de governo. Foram realizadas mais de 60 Conferências de Primeiros Ministros desde a Confederação. 97. Instituições formais também asseguram a coordenação vertical entre as unidades centrais e órgãos semi-autônomos. Dada a natureza hierárquica do relacionamento entre as agências centrais e as subordinadas, a consistência (mais do que a coordenação) geralmente é assegurada através de inspetorias específicas ou de representantes locais do governo central (ex. o Préfet na França). Os mecanismos de controle orçamentário também são essenciais. Incluindo a dimensão do "governo como um todo" 98. De qualquer modo, a "estrutura, apesar de importante, não pode garantir o êxito da coordenação. A boa coordenação requer processos eficientes" (OCDE 1996). Um dos limites dos mecanismos de coordenação formais tradicionais é que esses mecanismos requerem um sistema relativamente simples de tomada de decisão. Uma tendência geral no setor público de muitos países da OCDE é um grau crescente de especialização organizacional, além de uma proliferação de autoridades e agências independentes e semi-independentes. Essa tendência é justificada pela necessidade de lidar com questões emergentes. A necessidade crescente de conhecimento especializado aumentou a fragmentação dentro das organizações, e, por exemplo, unidades especializadas dentro de ministérios/departamentos tendem a ter uma cultura profissional forte que desencoraja a cooperação horizontal. 99. Já foi ressaltado que quando se trata de questões complexas e transversais, a capacidade do governo de fornecer soluções adequadas aos problemas é cada vez mais testada. O setor público deve conseqüentemente melhorar sua capacidade de ir além dos mecanismos formais de coordenação que focalizam geralmente em objetivos relativamente estreitos e não abordam o "contexto mais amplo". Em conseqüência, houve uma tendência crescente em países da OCDE de iniciar abordagens inovadoras à tomada de decisão, chamadas às vezes de "abordagem do governo como um todo". Essas abordagens focalizam vários elementosxviii: • Criação de "superministérios" que integram vários programas estreitamente ligados, os quais de outro modo seriam administrados por organizações separadas. "Uma dificuldade com essa abordagem é que ela envolve mais do que uma reorganização formal, mas deve ser a base para a integração das políticas. • Criação de vigilantes ministeriais que impõem algum controle sobre seus colegas. Isso poderia ser implementado através da nomeação de ministros coordenadores dentre os ministros no governo, ou com o estabelecimento de novos ministros que atuem como vigilantes dentro dos ministérios setoriais (por exemplo, "ministros verdes" para conduzir o desenvolvimento sustentável). • Criação de um estilo de governo orientado para projetos, com um conjunto de programas de políticas orientados para resultados e baseados em desempenho. • Fortalecimento do papel de coordenação e liderança do gabinete do Primeiro Ministro e do centro do governo, que na maioria dos países da OECD realiza tarefas como garantir a coerência, olhar para o futuro, apontar possíveis problemas futuros e inconsistências nas políticas. • Garantir que o serviço público tenha uma visão ampla e experiência em diferentes setores. Isso pressupõe o desenvolvimento da reflexão "conjunta" entre organizações. 100. O fortalecimento da coordenação das políticas públicas apresenta um dilema organizacional. Enquanto a descentralização e a transferência de responsabilidades ocorreram em instituições do governo, mecanismos como os mencionados acima sugerem que um "centro mais forte" garantirá a coordenação efetiva das políticas. O fortalecimento do centro para conduzir a coordenação, na verdade, tem sido um modelo comum em muitos países da OCDE. O centro do governo (Gabinete do Primeiro Ministro, Ministérios das Finanças, Departamentos de Serviço Público e seus equivalentes) desenvolveu um papel fundamental no exercício do grau necessário de controle geral e orientação estratégica central, assim contribuindo para melhorar a consistência nas políticas (ver quadro 6). Quadro 6: O papel estratégico do centro do governo para melhorar a consistência nas políticas Os centros (Gabinete do Primeiro Ministro, Ministérios das Finanças, Departamentos de Serviço Público e seus equivalentes) contribuem para a consistência nas políticas através de diversos mecanismos. Suas tarefas geralmente incluem: • Promover uma visão abrangente, que inclua todo o governo e criar uma estrutura estratégica para apoiar a ação transversal. • Administrar as questões do presente numa estrutura estratégica e de longo prazo. • Administrar eventos não previstos, incluindo riscos e crises. • Reunir os atores e construir pontes entre os setores administrativos, interface setor público/privado, etc. 101. O crescente papel do centro reflete o fato de que "a orientação de uma autoridade central é considerada necessária para que o governo mantenha uma visão ampla do interesse público, além de assegurar a equidade em todas as regiões e grupos demográficos". (Bouckaert et al 2000). Manter o equilíbrio correto entre o monitoramento central e a autonomia necessária às organizações parece portanto ser um critério fundamental para a coordenação efetiva. Na direção da integração das políticas 102. A adoção de uma abordagem de coerência é particularmente difícil no caso de problemas complexos como questões transversais ou intergeracionais. Uma abordagem de coerência requer que se vá além das práticas tradicionais de coordenação, que, em geral,são moderadamente inovadoras: os métodos arbitrários interministeriais tradicionais mal realocam o equilíbrio de poder estabelecido entre os departamentos. Eles tendem a ser mais eficientes para encontrar "as soluções usuais para os problemas usuais". Conseqüentemente, pode ser difícil para processos formalizados lidar com questões emergentes. 103. Portanto, se faz necessária a capacidade de se desenvolver uma "gestão da qualidade".. Isso exige métodos para equipar o governo com mais adaptabilidade. Considerando que um dos desafios mais importantes é a necessidade de integrar melhor os processos e as políticas (ver capítulo I), os países da OCDE aplicaram diversas ferramentas para alcançar esse objetivo. A integração das políticas poderia ser definida como a criação de instituições, recursos e ferramentas de políticas que permitam que os atores econômicos respondam positivamente às pressões por melhor desempenho a custos mais baixosxix. Uma das conclusões a partir das práticas observadas é que as soluções puramente organizacionais podem ser úteis mas não são suficientes. A adaptabilidade requer uma reengenhariadas instituições e uma capacidade de aproveitar melhor as ferramentas tradicionais de políticas para monitorar a integração das políticas. Desenvolvimento institucional 104. A reorganização formal de estruturas do governo é uma resposta tradicionalmente tentadora às circunstâncias em transformação e às novas demandas, particularmente quando a pressão resulta da opinião pública e a política exige ação urgente. 105. A criação de um novo ministério é, por exemplo, uma resposta tradicional para questões emergentes. Políticas ambientais e, mais recentemente, de desenvolvimento sustentável fornecem um bom exemplo de desenvolvimento institucional. Ministérios do meio ambiente, por exemplo, têm sido introduzidos gradualmente desde a década de 70, quando o meio ambiente se tornou uma questão crítica. Recentemente, no Japão, um Ministério do Meio Ambiente (2001) foi estabelecido para substituir a ex-Agência do Meio Ambiente. Em 2002, a França substituiu o Ministério do Meio Ambiente por um Ministério da Ecologia e do Desenvolvimento Sustentável para adaptar-se a circunstâncias em mutação (Ministère de l'Écologie et du Développement Durable). Os resultados de tais processos de políticas são desiguais. O impacto de um novo departamento dependerá de como as leis e os regulamentos são adaptados às novas circunstâncias, do nível de autoridade exercido por esse novo departamento e se ele é capaz de desempenhar um papel estratégico no aparelho do governo. 106. Novas comissões ou comitês seletos também foram introduzidos em vários campos emergentes. Um dos principais processos de desenvolvimento institucional voltado para o desenvolvimento sustentável é, em muitos países, a criação de MesasRedondas (ver tabela 3). Deve-se também destacar que o impacto de novas instituições dependerá de como o novo órgão está posicionado estrategicamente no sistema administrativo de um determinado país e se é audacioso o suficiente para causar um impacto (compensado por ter que prestar contas). É interessante notar que geralmente leva um certo tempo para uma instituição nova tornar-se operacional e esse fator não deve ser subestimado. 107. Outra mudança institucional formal usada para a integração é a fusão ou cisão de entidades já existentes para melhorar a gestão de questões inter-relacionadas. A fusão das pastas da agricultura e da conservação da natureza teve, por exemplo, um impacto positivo na reforma da agricultura holandesa (OCDE 2002 a). Entretanto, os resultados esperados desse tipo de reestruturação não devem ser superestimados. No Reino Unido, por exemplo, os observadores destacaram que "a criação de um Departamento para o Meio Ambiente, Alimento e Questões Rurais (DEFRA) reuniu as responsabilidades do governo com a agricultura e o meio ambiente, mas ao mesmo tempo separou a área ambiental de outras funções do DETRxx , como o transporte. Conseqüentemente, se a sustentabilidade foi promovida pela fusão das áreas de políticas ambientais e setoriais, a sustentabilidade agrícola pode ter sido promovida à custa de outros setores, como o transporte. Isso destaca a necessidade de promover a sustentabilidade em todos os departamentos, uma vez que é claramente impossível fundir todos os departamentos setoriais com o departamento do meio ambientexxi". Tabela 3: Desenvolvimento Institucional para o desenvolvimento sustentável: tendências recentes em cinco países da OECD Canadá Mesa-redonda Nacional sobre o Meio Ambiente e a Economia (1993). Comissionado para o Meio Ambiente e o Desenvolviment o Sustentável (1995). Agência Canadense para a Avaliação Ambiental (1995). Alemanha Conselho Nacional para Desenvolviment o Sustentável (2000). “Gabinete Verde” (2000). Agência Federal de Energia. Japão Países Baixos Reino Unido Ministério do Meio Ambiente (2001) Reorganização Agência do Meio do Ministério Ambiente (1996). da Agricultura. Comissão de Comitê Especial Reorganização Desenvolvimento para Meio do Ministério Sustentável (2001). Ambiente e do Meio Reorganização do Comércio. Ambiente DETR para DEFRA (1991). Comitê Especial incluindo assuntos de Inspetoria nutricionais dos Acompanhamen Ambiental consumidores to do UNCED. (1991). (2001). Conselho de Ministros para a Conservação Ambiental Global (1989). Comitê dos “Ministros Verdes”. Comitê Ministerial do Meio Ambiente. Secretaria Federal para o Clima (1998). Conselho para o Desenvolviment o Sustentável (1996). Comitê de Seleção de Auditorias Ambientais. Comissão de Biotecnologia Ambiental e Agrícola (2000). Ministério de Desenvolvimento Internacional - DFID (1997). 108. Também é usual criar um novo órgão para lidar com uma questão emergente. Por exemplo, os países da OCDE estabeleceram uma série de entidades para lidar com o desafio emergente do desenvolvimento sustentável, como mesas-redondas e comissões, mas na maioria dos casos esse processo não levou a resultados conclusivos. A ausência de mecanismos complementares e de processos para orientar essa integração e torná-la efetiva teve conseqüências negativas na implementação dos compromissos de desenvolvimento sustentável (OCDE 2002 a). Reengenharia das instituições e das políticas 109. Num contexto caracterizado por um nível crescente de complexidade, pela interconectividade das políticas e por riscos emergentes, a reestruturação incremental, como forma de adaptar-se a cada nova questão que emerge no debate das políticas, poderia se tornar um método questionável. Em particular, a estimativa do custo de introduzir mudanças abrangentes - incluindo mudanças legislativas e regulatórias, redistribuição de tarefas e desenvolvimento institucional – é, freqüentemente, negligenciada, enquanto os benefícios potenciais não são avaliados claramente. Além disso, a reestruturação deve ser real, mais do que formal, e seu custo deve ser estimado. O custo da reestruturação contínua pode ser muito alto e poderia gerar ineficiências, que são inerentes a qualquer mudança administrativa. Do mesmo modo, os riscos que resultam da instabilidade organizacional não devem ser subestimados. Em vários casos a reorganização abrangente ajudará somente por um tempo limitado, especialmente porque as fronteiras entre as áreas de políticas mudam continuamente e um desajuste entre as estruturas administrativas e as áreas de políticas seria um fenômeno constante, exigindo ajustes freqüentes. Os ganhos obtidos podem ser relativamente modestos. 110. A questão primordial parece ser o desenvolvimento de capacidades para que as ligações entre as opções e as decisões de políticas se tornem mais evidentes e administrar a integração entre as atividadesxxii. O Reino Unido está implementando uma abordagem holística ao desenvolvimento sustentável, que visa equilibrar mecanismos formais e práticos para tornar o governo mais coeso (ver quadro 7). Quadro 7: Abordagens institucionais holísticas aplicadas ao desenvolvimento sustentável: a experiência britânica Várias medidas concretas foram adotadas no Reino Unido no sentido de se desenvolver o marco de referência institucional para o desenvolvimento sustentável e os papéis dos diferentes atores, incluindo: • Governo Central: a estratégia de desenvolvimento sustentável de 1999 para o Reino Unido destacou a importância de questionar os processos de “silo” (isolados) tradicionais de formulação de políticas e de tomada de decisões. O conceito de ‘pensamento conjunto' foi promovido, embora tenha sido difícil de atingir. Um comitê parlamentar de investigação, o Comitê de Auditoria Ambiental, foi estabelecido; a esfera de atuação do Comitê Ministerial e do comitê interdepartamental de ‘Ministros Verdes' foi fortalecida; e o órgão consultivo multisetorial, a Comissão de Desenvolvimento Sustentável, foi estabelecido. A intenção é aproximar o desenvolvimento sustentável ao centro da formulação de políticas do governo e à tomada de decisão em outros setores. • Governo Regional: depois da transferência de responsabilidades, houve um bom avanço no País de Gales, na Escócia e na Irlanda do Norte. Na Inglaterra, todas as regiões têm agora estruturas regionais de desenvolvimento sustentável implementadas. Estas foram acordadas em parcerias entre órgãos regionais incluindo os Escritórios do Governo, Agências de Desenvolvimento Regional, governo local e o setor empresarial e de voluntários. Fornecerão um foco estratégico para a região e formam um elo entre a política nacional e a local. • Governo local: tem novas responsabilidades e oportunidades através de iniciativas como o New Deal for Comunities (que lida com a exclusão social), o Best Value (que melhora serviços da autoridade local) e estratégias comunitárias preparadas por Parcerias Locais Estratégicas envolvendo a população local na definição de prioridades (desenvolvendo a Agenda 21 Local). Fonte: OCDE (2002 c). 111. Mas essa reengenharia institucional deve ser controlada? Certamente não há uma resposta geral a esta pergunta, embora se deva destacar o grau de sofisticação das iniciativas que introduzem uma combinação de soluções formais e "comportamentais". Para serem operacionais, elas exigirão uma capacidade de orientação específica, conforme observado nas iniciativas específicas voltadas para a implementação do desenvolvimento sustentável (ver 2002 a). Para tornar consistentes esses objetivos múltiplos de formulação de políticas, os países já têm um registro das práticas que aumentam a cooperação entre instituições. Algumas formas de abordagem conjunta a questões transetoriais podem visar a criação de um estilo de governo orientado para projetos (ver seção acima) e poderiam ser contempladas para orientar a integração: • Comitês ministeriais permanentes e grupos ministeriais com mandatos fixos; • Abordagem conjunta das questões prioritárias por todos os Ministros; • Ferramentas como diretrizes de políticas e listas de verificação; • Coordenação através de comitês e conselhos; • Projetos e equipes transadministrativas; • Forças-tarefa especiais; • Gestão de programas e pastas; 112. A integração também requer mecanismos de orientação eficientes em todos os níveis do governo (como sugerido no quadro 7) para assegurar um nível suficiente de coerência vertical entre esses níveis, assim como coerência horizontal no nível subnacional, tanto dentro dos limites de um governo subnacional específico quanto entre entidades do mesmo nível de governo. Para superar "a falta de cooperação e estratégia entre jurisdições", "o desajuste entre papéis e objetivos em níveis diferentes do governo", e "as abordagens compartimentalizadas em cada nível", a OCDE sugeriu um conjunto de instrumentos e mecanismos de formulação de políticas no nível local. Além da avaliação e dos mecanismos de boa governança, os mecanismos específicos incluem, em particular, a promoção de abordagens integradoras em vez de setoriais, sistemas de planejamento espaciais flexíveis, a captação e a coordenação de recursos públicos, privados e da comunidade, bem como a promoção de abordagens baseadas em áreas (ver OCDE 2001b capítulo 16). 113. No caso de questões transversais como a redução da pobreza ou o desenvolvimento sustentável, as experiências dos países da OCDE apontam no sentido da necessidade de um "ponto focal" para orientar a integração vinda do centro do governo. Por exemplo, o papel principal do Gabinete deve ser claro e aceito por todos os ministérios. Isso deve incluir uma avaliação crítica da elaboração de estratégias setoriais e de sua implementação para a realização de um objetivo definido, inclusive do ponto de vista das ferramentas de execução utilizadas (acordos voluntários etc.). Os ministérios setoriais devem introduzir órgãos pluralistas e mecanismos de monitoramento para a discussão "interna" inicial de suas estratégias setoriais de desenvolvimento sustentável, utilizando as ferramentas de políticas mais apropriadas. As agências líderes (por exemplo, o ministério do meio ambiente no caso do desenvolvimento sustentável) poderiam desempenhar um papel importante, principalmente de suporte, nesse processo. 114. Na verdade, embora a reengenharia de organizações existentes, assim como de processos institucionais e de políticas, possa ter sido no passado uma opção secundária, ela parece também ter um impacto mais positivo na coerência temporal. A preferência pela reengenharia institucional e de políticas versus mudança organizacional aumentou durante a experiência de introdução de políticas para lidar com questões de equilíbrio intergeracional. No caso de políticas de desenvolvimento sustentável, espera-se que a ampliação de instituições já influentes, por exemplo, o escritório do Auditor Geral no Canadá, além da criação de ferramentas financeiras, regulatórias e orçamentárias específicas, constituam um forte impulso para a mudança. Adaptando ferramentas tradicionais de políticas 115. Ferramentas de políticas públicas tradicionais, especialmente as que fornecem uma forte direção central, como por exemplo processos orçamentários, mecanismos regulatórios e de avaliação, têm um papel fundamental no apoio à integração das políticas. Na Finlândia, uma das recomendações concretas de reforma do governo central emitida em 2002, foi precisamente que o processo político de monitoramento e revisão das diretrizes estratégicas e programas de políticas do governo fosse vinculado ao método de estrutura orçamentária, para que o governo possa lidar com seus programas de políticas e alocação de recursos como uma só entidade, uma vez por ano (Reforma do Governo Central. Memorando de 28 de Junho de 2002). Na França, a lei orgânica de 1º de agosto de 2001 modificou as condições básicas de elaboração e implementação do Orçamento Nacional Francês estabelecidas desde 1959. Um dos objetivos da reforma foi racionalizar os gastos públicos, inclusive com o uso de indicadores de desempenho vinculados aos gastos públicos. O objetivo de assegurar maior coerência nas políticas foi parte do espírito da reforma. Orçamento 116. Até o presente, os orçamentos dos países da OCDE têm uma capacidade apenas moderada de promover a coerência temporal. Ainda são promulgados anualmente. Esse horizonte de curto prazo é freqüentemente criticado por impedir a gestão efetiva dos gastos, o que motivou a introdução ou o fortalecimento de mecanismos de médio prazo, como planos orçamentários plurianuais. O objetivo principal da introdução do orçamento plurianual (3 a 5 anos) é, obviamente, aumentar a disciplina nos gastos do governo. Entretanto, numa perspectiva mais ampla de coerência temporal, pode-se prever que a melhoria do processo orçamentário confira maior peso às metas e objetivos de médio prazo. Um processo orçamentário de longo prazo (geralmente uma década ou mais) fornece uma estrutura estratégica e cria uma estrutura para a reflexão de longo prazo sobre as questões primordiaisxxiii. O objetivo do processo orçamentário de longo prazo é "identificar e expor tendências adversas nos gastos na fase inicial, isto é, atuar como um sistema de alarme precoce". Portanto, potencialmente, o processo orçamentário de longo prazo tem um papel fundamental para o objetivo de melhorar a coerência de longo prazo. Quadro 8: Balanço intergeracional, um exemplo de planejamento de longo prazo Na década de 90, vários países começaram a apresentar cálculos padronizados de balanço intergeracional para medir a sustentabilidade de longo prazo das finanças públicas. O balanço intergeracional consiste no cálculo do valor presente dos pagamentos líquidos de tributos que indivíduos irão fazer ao longo de suas vidas sobre benefícios recebidos do governo, por idade e sexo. Para calcular esses valores, são necessárias informações sobre os gastos atuais e futuros do governo por faixa etária. Por isso, as exigências em termos de dados são substanciais e suposições importantes têm que ser feitas. Em particular, o balanço intergeracional geralmente visa demonstrar as conseqüências de se manter a política fiscal vigente. Portanto, as taxas tributárias e os níveis de gastos por faixa etária são considerados inalterados. Se a soma do balanço intergeracional para todos os indivíduos atuais e futuros for igual ao valor atual dos gastos não específicos por idade e os ativos financeiros líquidos, então a limitação orçamentária intertemporal do governo é atendida e as taxas tributárias atuais e os programas do governo podem ser mantidos inalterados no futuro. Se o balanço for negativo, entretanto, a implicação é que a política fiscal atual é insustentável e as gerações atuais e futuras terão que pagar impostos mais altos ou receber benefícios individuais mais baixos. Levantamentos Econômicos da OCDE: Noruega. OCDE 2002 117. A qualidade das "previsões" que resultam do processo orçamentário de longo prazo não deve ser superestimada. As numerosas incertezas científicas, econômicas e sociais podem tornar o longo prazo bastante imprevisível. Entretanto, uma das vantagens do processo orçamentário de longo prazo é que ele constrói cenários concretos e estimativas financeiras que podem ser fundamentais para uma análise estratégica da ação do governo ao longo do tempo e para prevenir a tentação da tendência à visão de curto prazo. 118. O processo orçamentário reflete principalmente as prioridades dos ministérios das finanças e do tesouro na estrutura de acordos gerais feitos nos níveis ministeriais mais altos. Conseqüentemente, os processos orçamentários têm uma tendência de focalizar nos objetivos restritivos da estabilidade econômica. Entretanto, dada a sua natureza central no processo de formulação de políticas, o processo orçamentário poderia desempenhar um papel maior na integração de objetivos abrangentes no trabalho diário do governo, por exemplo, apoiando objetivos multisetoriais como aqueles implicados na meta de desenvolvimento sustentável. Para examinar a capacidade do governo de promover uma agenda mais ampla, poderia-se começar pela investigação da capacidade dos sistemas e procedimentos orçamentários de integrar prioridades ambientais e sociais. Uma pergunta fundamental seria quais são os critérios adotados pelos governos para justificar propostas feitas aos parlamentos para deslocar recursos dos objetivos econômicos para os objetivos ambientais ou sociais, ou vice versa. Iniciativas específicas foram introduzidas para incluir o componente ambiental na tributação, no orçamento e na contabilidade de países da OCDE (ver exemplos selecionados na tabela 4) Tabela 4: Inclusão do componente ambiental na tributação, no orçamento e na contabilidade. Experiências selecionadas Canadá Propostas feitas pelo NRTEE para tornar os orçamentos de 2000 mais “verdes” usados como base para melhorar a sustentabilidade do orçamento federal. Alemanha No Ministério das Finanças, o conceito de sustentabilidade foi aplicado principalmente à consolidação de longo prazo do orçamento. Países Baixos A inclusão do componente ambiental no processo orçamentário, considerada um desafio primordial para o futuro. Novo sistema tributário (desde 1º de janeiro de 2001). Os objetivos dessa revisão incluem a promoção do desenvolvimento econômico sustentável (“verde”). Também introduziu no processo orçamentário um foco em resultados e produtos e uma que envolve envolvendo todas as agências do governo. Reino Unido O Orçamento de 2001 anunciou um pacote abrangente substancial de medidas fiscais visando a reforma urbana. As medidas orçamentárias também foram complementadas por medidas tributárias locais incluídas para consulta no Green Paper Financeiro do Governo incluindo Planos de Melhoria das Cidades e um programa de reinvestimento local dos impostos. Fonte: OCDE 2002 Instrumentos regulatórios 119. Na década de 80, quando a desregulamentação era um conceito da moda, era possível imaginar uma situação em que os formuladores de políticas considerariam a regulamentação uma ferramenta pouco adequada. Na verdade, uma evolução na direção da “re-regulamentação” de vários setores (ex. meio ambiente, regulamentos de segurança) junto com a busca por soluções regulatórias alternativas (por exemplo, acordos negociados) demonstraram que diversos instrumentos regulatórios fazem parte do kit de ferramentas dos reguladores. O impacto de instrumentos regulatórios de qualidade na coerência nas políticas é potencialmente muito significativo. 120. A utilização de instrumentos de impacto regulatório demonstrou, por exemplo, que "a regulamentação de alta qualidade é cada vez mais considerada como aquela que produz os resultados desejados do modo mais custo-efetivo possível." (OCDE 2002b). A Análise de Impacto Regulatório (AIR) tem potencial para destacar mais explicitamente as interligações entre várias opções de políticas e para contribuir para a análise de custobenefício mais ampla. Como ferramenta da decisão, a análise de impacto regulatório contribui para (OCDE 2002 b): • Examinar sistematicamente e consistentemente os impactos potenciais selecionados que resultam de ações do governo; • Comunicar as informações aos formuladores de políticas. 121. A melhoria da coerência através de instrumentos regulatórios é facilitada pelo uso mais disseminado da AIR em países da OCDE: mais da metade dos países da OCDE já havia adotado programas de AIR em 1996, comparado com apenas dois ou três em 1980. Na utilização da avaliação de impacto para melhorar a coerência, o desafio naturalmente será desenhar ferramentas que não sejam demasiado complexas e sobrecarregadas (por exemplo, estabelecendo critérios e exigências excessivamente amplos e contraditórios). Quadro 9: Obtendo o máximo benefício da AIR: boas práticas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. Maximize o compromisso político com a AIR. Tenha cautela ao atribuir as responsabilidades pelos elementos de programas de AIR Treine os reguladores. Use um método analítico consistente mas flexível. Desenvolva e implemente estratégias de levantamento de dados. Focalize as ações da AIR. Integre AIR com o processo de formulação de políticas, desde o início. Divulgue os resultados. Envolva o público extensivamente. Aplique AIR à regulamentação existente além da nova. Fonte: OCDE (1997), Análise de Impacto Regulatório. Boas práticas em países da OCDE, Paris. 122. Um aspecto do movimento em direção à “regulamentação de qualidade” é o número crescente de instrumentos regulatórios ou semi-regulatórios específicos que podem ser usados para alcançar uma meta definida, tais como acordos voluntários, autoregulação de um setor específico e acordos negociados. Isso reflete o fato de que a regulamentação tradicional tem sido cada vez mais percebida como não sendo o instrumento mais efetivo para resolver algumas questões. Um exemplo disso surgiu claramente da revisão de ferramentas de política para alcançar o desenvolvimento sustentável no Japão (OCDE 2002 a). Para melhorar a capacidade regular questões de longo prazo como o desenvolvimento sustentável, a experiência de alguns países da OCDE sugere explorar o uso racional de uma variedade de instrumentos regulatórios, desde os menos restritivos aos mais restritivos (ver quadro 10). Quadro 10: Desenvolvendo a gestão cooperativa efetiva: a experiência dos Países Baixos O setor ambiental Desde a formulação do primeiro Plano Nacional de Política Ambiental, novos instrumentos surgiram para o desenvolvimento de políticas ambientais. Esses levariam a um novo “estilo de política”, mais aberto, contribuindo para as metas de desenvolvimento sustentável. Esses instrumentos contribuem para uma revisão da relação entre o governo e os grupos interessados e entre os próprios interessados. Os instrumentos principais incluem: • • • Consulta aos grupos focados. Convênios. Comércio de emissões. A política ambiental visa melhorar um sentido de responsabilidade em vez de conformidade (por exemplo, responsabilidade empresarial e pessoal, obrigações de pesquisa e informação) e criar um marco de referência para melhorar as decisões informadas e imparciais, principalmente através de: • • • Regulamentos exigindo que as empresas empreguem funcionários capacitados. Avaliações de impacto ambiental. Sistemas de gestão ambiental nas empresas. O setor agrícola Historicamente, o setor agrícola era um setor altamente regulado e os produtores tinham que cumprir numerosas regras. No início da década de 90 esse modelo gerencial começou a ser questionado devido a três falhas graves do governo. Primeiro, aproximadamente dez anos de regulamentação não foram suficientes para resolver o problema dos fertilizantes (fosfatos). Segundo, um ministro teve que renunciar por causa da falha no sistema de quotas na área de pesca. Terceiro, o uso de hormônios na indústria da vitela não podia ser controlado por regulamentos e o ativismo das organizações de consumidores tinha efeitos mais concretos do que a intervenção do governo. Essas falhas exigiram novas modalidades de intervenção do governo no setor e especialmente uma orientação mais adequada. A reforma do sistema decisório implicou numa nova metodologia para desenvolver regulamentos. Esses regulamentos eram elaborados tradicionalmente com base em acordos entre o Ministério da Agricultura, Manejo da Natureza e Pesca e os produtores. Uma consulta mais ampla foi introduzida, reunindo organizações de produtores, organizações ambientais e autoridades centrais e locais, para se chegar a uma visão comum da magnitude dos problemas. Com base nessas discussões, cabia ao governo a responsabilidade de estabelecer metas claras. Contudo, a consulta a diversos grupos interessados também foi desenvolvida para implementar as metas e foi introduzida a implementação descentralizada pelos próprios interessados. Cada vez mais, os fazendeiros e os grupos ambientais se reúnem e discutem as questões juntos. O processo de descentralização assumiu a forma de maior intervenção da província nas políticas rurais e de transferências orçamentárias do governo central para as províncias. Parte da lógica por trás dessa mudança é a idéia de que o governo não deve assumir os problemas sozinho quando na verdade a solução dos problemas exige a participação de toda a sociedade. Um dos benefícios do processo é que ele permitiu a evolução da posição tradicional dos Sindicatos de Produtores. O desafio principal relacionado a essa nova abordagem é o de como manter as funções de orientação e supervisão, ao mesmo tempo dando mais responsabilidades aos grupos de interessados no processo de formulação das políticas. As lições para o governo incluem a necessidade de formular metas claras, o foco em processos racionais e a necessidade de manter a pressão, de forma a manter um equilíbrio entre a ambição e a viabilidade. Avaliação 123. O papel determinante da avaliação é às vezes subestimado ao se analisar os mecanismos da integração. Os instrumentos apresentados abaixo foram identificados como ferramentas essenciais para melhorar a integração das políticas para o desenvolvimento sustentável (OCDE 2002 a). 124. Mecanismos de elaboração de relatórios, revisão de programas e avaliação são na verdade os mecanismos tradicionais principais para assegurar a coordenação temporal. Uma combinação racional de avaliações internas e externas é um componente essencial da coerência embora tenha algumas implicações específicas. Uma recomendação feita pelo governo finlandês em 2002 foi sobre a necessidade de avaliação. "Uma revisão da estratégia e da estrutura avaliará os resultados alcançados e comparará a relação custo-efetividade de diferentes modelos de ação. O exame será a base para qualquer realocação de atividades e recursos". (Reforma do Governo Central. Memorando de 28 de Junho de 2002) 125. Alguns desenvolvimentos institucionais estão se voltando para uma maior integração das políticas através da avaliação externa e interna. Para assumir melhor o desenvolvimento sustentável, a criação do Comissariado Canadense para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável é uma novidade. Esse órgão federal independente é responsável por elaborar anualmente um relatório “Verde” a ser apresentado ao parlamento federal, sobre o desempenho do governo federal em questões relacionadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável, especialmente a implementação e o alcance das metas de desenvolvimento sustentável do governo. Ele não se limita a monitorar o governo, mas pode também recomendar boas práticas. Outras instituições também podem cumprir atribuições especializadas como a Agência de Avaliação Ambiental Canadense, que é responsável pela realização de estudos de impacto ambiental e assessora o governo federal. Órgãos independentes como os diversos conselhos nacionais para desenvolvimento sustentável são fóruns de discussão entre múltiplos interessados projetados para iniciar debates públicos e assessorar o governo em matérias relacionadas a políticas. 126. No Reino Unido, junto com o Comitê de Ministros "Verdes", a Unidade da Inovação no Desempenho também é responsável pela avaliação interna específica do setor. Mesmo não sendo especificamente ligado a questões de desenvolvimento sustentável, essa unidade é responsável por revisar a coerência departamental geral das políticas sob o título de “Joined-Up Government” (“Governo Coeso”). 127. Para lidar melhor com o desafio da coerência, sugere-se a utilização equilibrada de diversos instrumentos de formulação de políticas para promover a integração de acordo com contextos setoriais e nacionais específicos. No caso do desenvolvimento sustentável sugere-se, por exemplo, que os seguintes instrumentos sejam usados em combinação para assegurar impacto suficiente. • Inclusão do componente ambiental nas contas e no orçamento • Inclusão do componente ambiental nas operações do governo • Sistemas de gestão de desempenho • Análise de impacto ambiental • Avaliação e análise sistemática de custo-benefício • Mecanismos de responsabilização 128. Se a direção for relativamente clara, resta a questão de fornecer uma avaliação confiável do progresso alcançado. Isso implicaria em desenvolver mecanismos para avaliar a integração. Uma estrutura preliminar para a integração implicaria em combinar a revisão dos principais instrumentos à disposição dos responsáveis pelas decisões, com relação aos diversos estágios de um ciclo de política, da seleção preliminar à avaliação (ver tabela 5). Tal estrutura poderia ser o primeiro passo para uma avaliação mais abrangente da coerência. Isso será discutido no capítulo III. Tabela 5: Avaliando a integração: uma estrutura preliminar Ferramentas Coordenação Orçamento Regulamentação Avaliação Seleção Foco Instituições Avaliação Quantitativa CAPÍTULO III Superando barreiras à coerência 129. Manter um nível suficiente de coerência nas políticas é um objetivo que deve ser considerado caso a caso. Não há nenhum "modelo" que ajude a definir o nível ideal de coerência a ser aplicada em todas as circunstâncias. Vários mecanismos que contribuem para a coerência nas políticas foram destacados no capítulo anterior: práticas de coordenação efetivas, integração das políticas através de ferramentas orçamentárias e regulatórias, avaliação direcionada das políticas e avaliação de impacto. Todos contribuem para melhorar a coerência de políticas específicas e podem ajudar a garantir que as escolhas e as práticas sejam mais coerentes. Entretanto, não se deve esperar demais do impacto "automático" destes instrumentos de política. 130. Algumas das barreiras à coerência derivam do fato de que é um desafio técnico alcançar a coerência interna de processos e instituições do governo. Isso resulta da dificuldade de avaliar a coerência nas políticas e de provocar mudanças organizacionais. Embora possam parecer difíceis de transpor, essas barreiras à coerência poderiam ser parcialmente superadas com práticas de governança mais receptivas aos interesses sociais, através de maior abertura nas práticas de tomada de decisão e da melhoria da gestão do conhecimento. Coerência a que preço? 131. Em muitos casos, alcançar a coerência "requer um consenso sobre níveis inaceitáveis de incoerência" (Loquai 1996). Parece que quanto mais a questão é complexa, multidimensional e requer avanço urgente para aumentar a coerência nas políticas, menos aceitáveis são os custos associados aos esforços para conseguir a coerência. Nesse contexto, tentar alcançar um nível perfeito de coerência nas políticas entre organizações, em todos os níveis do governo e ao longo do tempo, seria simplesmente ambicioso demais. O fracasso do planejamento de políticas na década de 70 ilustra bem as dificuldades práticas enfrentadas na busca de uma agenda "burocrática" pouco realista. Em vários casos, aspectos externos relacionados a esforços pouco realistas para se obter a coerência, através de mecanismos de controle mais rígidos, criariam mais danos do que o abandono do controle. Portanto, é essencial definir o limite entre esforços realistas e esforços excessivamente ambiciosos para se alcançar a coerência. Os problemas da avaliação 132. Uma das principais barreiras práticas à coerência resulta da dificuldade de avaliar desenvolvimentos de política complexos. Embora não haja nenhuma panacéia para isso, os sistemas de avaliação que se concentram em políticas específicas ou em programas específicos e que desenvolvem a avaliação qualitativa, podem ser mais bem-sucedidos do que tentativas de avaliar a “coerência do sistema como um todo" e de desenvolver a avaliação quantitativa. 133. Esforços para promover uma "abordagem do governo como um todo" levaram à possibilidade de introduzir a avaliação da coerência geral das políticas de um determinado "sistema". Até o presente, há pouca evidência de que esse tipo de avaliação seja confiável e alguns limites bastante óbvios devem ser considerados com cuidado. Em primeiro lugar, é preciso destacar que, dado o nível de complexidade associado com a noção da coerência, pode ser difícil gerar um conjunto de dados para apoiar processos de avaliação. Segundo, as iniciativas para promover uma abordagem do governo como um todo geralmente surgem da percepção difusa de que o "sistema" não funciona bem e não de evidência estatística. Terceiro, como não se sabe ao certo a magnitude das questões, os esforços para avaliar a coerência no governo como um todo podem se tornar um exercício de comunicação política em vez de um processo confiável de avaliação. Em todo o caso, a relação custo/efetividade de tais processos de avaliação deve ser calculada. 134. Até o presente, o tipo mais comum de avaliação focaliza a coerência de determinadas políticas e programas. Um uso sistemático da avaliação de políticas e programas pode ter mais êxito do que a avaliação específica da coerência no governo como um todo. Existem dois tipos diferentes de avaliação, a avaliação interna da coerência e a avaliação externa da coerência: • A avaliação da coerência interna examina a coerência “interna” das diversas partes do programa, a consistência entre necessidades e objetivos gerais e entre necessidades e objetivos específicos/operativos. Ela também examina a coerência entre os objetivos a serem alcançados e a disponibilidade de recursos (o plano financeiro), além da coerência entre os objetivos e os diversos meios de implementação (instrumentos previstos para disseminação, critérios de seleção, etc.). • A avaliação da coerência externa é baseada nos diversos níveis de implementação da política, ou seja, internacional, regional, nacional e subnacional. O objetivo da avaliação é verificar a compatibilidade entre as prioridades e a lógica das outras políticas, além da observância de compromissos nacionais e internacionais. 135. É importante considerar a forma dessa avaliação, principalmente, saber se ela pode ser de natureza quantitativa. É um desafio singular produzir dados quantitativos suficientemente abrangentes para avaliar a coerência de programas setoriais e transversais específicos. Um dos obstáculos principais na coleta de dados quantitativos para avaliar a coerência dos programas é o fato de que estimar o grau de coerência de uma política requer necessariamente a capacidade de reunir alguns dados que podem não parecer, à primeira vista, relacionados. Para algumas questões, isso pode não ser um problema, como por exemplo no caso das inconsistências do modelo agrícola da União Européia, que se tornaram tão óbvias na década de 90, que a necessidade de uma abordagem mais coerente foi amplamente aceita. Por outro lado, no caso de políticas horizontais, como o desenvolvimento sustentável, já é tão difícil estabelecer metas quantitativas detalhadas que avaliar o nível de coerência nas políticas em relação a objetivos quantificados específicos de coerência pode ser um desafio bastante grande. 136. Ao longo do tempo, obstáculos à avaliação quantitativa podem certamente se tornar uma barreira para a análise da coerência nas políticas. Uma opção alternativa seria incentivar abordagens mais qualitativas à avaliação da coerência das políticas e dos programas. Mas isso naturalmente traz seus próprios problemas, particularmente o fato de que informações sobre a qualidade do processo de formulação de políticas devem ser suficientemente validadas e confiáveis. No Canadá, a revisão da Estrutura Preliminar de Avaliação Ambiental para Negociações Comerciais em 2000 ilustrou os desafios relacionados à avaliação da coerência nas políticas de uma perspectiva tanto quantitativa quanto qualitativa (ver quadro 11). Quadro 11: Lições da revisão da Estrutura Preliminar de Avaliação Ambiental para Negociações Comerciais do Canadá (2000) No final de 2000, o Canadá organizou um processo de consulta para sua Estrutura Preliminar de Avaliação Ambiental para Negociações Comerciais que proporcionou a vários grupos interessados a oportunidade de oferecer comentários ao governo canadense. Também foram organizadas reuniões. Esse processo evidenciou muito claramente a dificuldade de introduzir a avaliação da coerência nas políticas. Por exemplo, muitos interessados reconheceram a dificuldade de realizar uma avaliação ambiental das negociações comerciais devido à limitada disponibilidade de dados a respeito do impacto do comércio no meio ambiente e da variedade de métodos analíticos para avaliar tais impactos. Apesar da Estrutura apresentada aos interessados enfatizar a análise quantitativa, vários indivíduos e organizações indicaram que os dados qualitativos também devem ser considerados. Isso corresponde também a vários comentários indicando que a Estrutura deveria adotar "o princípio da precaução” na análise. Também houve vários entrevistados que afirmaram que a estrutura deveria ser aplicada somente usando dados científicos comprovados e estabelecidos e que o "princípio da precaução" deveria ser evitado. Várias opiniões sugeriram também áreas adicionais de pesquisa de dados tais como a análise dos padrões de comércio e consumo, estudos sobre o impacto ambiental positivo do comércio, análise setorial e pesquisa sobre questões específicas relacionadas ao comércio e ao meio ambiente (por exemplo, subsídios). Alguns recomendaram a realização de análises ex ante e ex post, além de que o conhecimento local e indígena deveria ser usado como uma forma de análise adicional. Alguns indivíduos afirmaram que, independente da forma da análise empreendida, os objetivos econômicos e ambientais não podem ser analisados separadamente e deve-se reconhecer a complexa interconexão entre eles. Reconhecendo muitas das dificuldades associadas a dados limitados e a problemas de análise, os interessados ressaltaram que existem dificuldades conceituais na implementação prática da Estrutura. Isso levou alguns grupos a indicar que seria improvável que a Estrutura conduzisse à identificação de impactos ambientais significativos, assim questionando a credibilidade de todo o exercício. Fonte: Website do Departamento de Relações Exteriores e Comércio Internacional, Canadá http://www.dfait-maeci.gc.ca/tna-nac/comments_report-e.asp 137. Uma pré-condição para qualquer avaliação qualitativa seria a inclusão de uma atenta análise ex ante dos custos e benefícios do projeto de avaliação. As características específicas das várias políticas certamente não permitem o uso de uma única "receita" para todas. Um primeiro passo para desenvolver uma estrutura de avaliação seria examinar, num dado contexto, a qualidade das diferentes ferramentas apresentadas nos Capítulos I e II. Sugere-se uma revisão dos instrumentos jurídicos, orçamentários, regulatórios e de coordenação, sob ponto de vista de como eles poderiam contribuir para aprimorar a coerência. Na maioria dos casos, parece que uma utilização cumulativa dos vários instrumentos poderá contribuir ainda mais para se alcançar a coerência. 138. Na realização dessa revisão de instrumentos de formulação de políticas, deve ser dedicada uma atenção especial não apenas à qualidade e efetividade intrínsecas dos próprios instrumentos. A natureza dos processos de formulação de políticas nos quais os instrumentos serão aplicados também é importante e seria fundamental abordar as seguintes questões: • • • • 139. Há um entendimento comum do propósito de se utilizar esse instrumento específico? Há uma liderança clara no governo e um “catalisador” encarregado de monitorar a utilização do instrumento de política? Qual é a natureza do envolvimento dos grupos interessados no processo de formulação da política? O conhecimento é bem gerido para garantir o progresso? A Figura 3 apresenta uma matriz que combina esses diferentes elementos. Figura 3: Avaliação qualitativa da coerência: estrutura proposta Processo Gestão conhecimento Envolvimento interessados De menos para mais sofisticado Catalisador Liderança Entendimento comum Ferramentas Leis Coordenação Integração orçamento Ferramentas e incentivos financeiros regulatórias inovadoras 140. Embora ainda não haja uma estrutura geral para a avaliação qualitativa, avanços concretos já foram obtidos em áreas específicas de política. Uma estrutura de avaliação para a coordenação de políticas da União Européia, por exemplo, foi sugerida na década de 90. Foi criada uma escala de coordenação de políticas (Metcalfe 1994) com o objetivo de medir e comparar capacidades de coordenação de políticas em estados membros da União Européia, especialmente para estabelecer posições nacionais em questões internacionais. Essa estrutura não é limitada à política internacional da União Européia e sugeriu-se que a escala de coordenação também poderia ser usada em outras áreas de políticas públicas, onde as organizações devem trabalhar juntas para realizar políticas que transcendem seus próprios objetivos particulares (ver também Metcalfe 1996). Essa escala de coordenação de políticas foi usada na Figura 4. Nós a chamamos de "escala de integração de políticas" porque ela vai além da definição estreita de coordenação prevista no presente relatório (ver capítulo I). Figura 4: Escala de Integração de Políticas 9. Estratégia governamental geral 8. Estabelecendo prioridades governamentais 7. Estabelecendo parâmetros para os ministérios 6. Arbitragem de diferenças interministeriais 5. Busca interministerial de acordo 4. Evitando divergências entre ministérios 3. Consulta com outros ministérios 2. Comunicação com outros ministérios 1. Formulação de políticas independente pelos ministérios Estratégia unificada Estabelecendo prioridades em comum Estabelecendo parâmetros em comum Arbitragem de conflitos organizacionais Busca de consenso nas políticas Evitando divergências de políticas Consulta entre organizações Intercâmbio de informações entre organizações Organizações independentes dentro de suas jurisdições Nota: A escala de coordenação das políticas foi construída após uma pesquisa realizada pelo Prof. Metcalfe (1994). É cumulativa no sentido em que as funções de coordenação no nível mais alto (topo da escala) dependem da existência e da confiabilidade das funções no nível mais baixo (base da escala). Por exemplo, o estabelecimento de prioridades governamentais depende das práticas interministeriais de comunicação e consulta e da abertura dos ministérios para buscar consenso e resolver conflitos. A coordenação consome tempo e recursos e se um método simples de coordenação for suficiente, não há necessidade de se utilizar um mais complexo. No entanto, quando surgem problemas de coordenação mais complexos, deve haver uma reserva de capacidade de coordenação de nível mais alto para lidar com esses problemas. Restrições à mudança organizacional 141. A Escala de Integração das Políticas (ver figura 4) sugere que uma pré-condição para a coerência é assegurar uma mudança na cultura de trabalho dentro das organizações. Isso se opõe à observação de que a capacidade das iniciativas atuais de produzir efeitos significativos nas organizações permanece limitada. Esses limites resultam em parte da própria natureza das organizações, que foi intensamente analisada desde Max Weberxxiv. 142. Uma das tendências que surgem da análise contemporânea de organizações e realidades organizacionais é que não se trata de um fenômeno funcional ou “mecânico” simples (como na visão de Taylor, onde a gestão das organizações seria um exercício de engenharia), mas sim um "sistema auto-organizativo” sofisticado. Há cada vez mais consenso em torno da idéia de que uma "organização" implica em interação complexa de pessoas, atividades, estruturas formalizadas e informais (OCDE 2001a). Os valores, as normas e as premissas sobre a missão e a condução de uma determinada organização, que são compartilhados por seus membros, constituem a base da cultura subjacente de uma organização. 143. A existência de tal ”subcultura” não deve ser minimizada ao se examinar a natureza das organizações, pois esses elementos podem ter um impacto decisivo no desempenho. A dimensão cultural torna-se especialmente relevante no processo de transformação de uma organização e as tentativas de realizar grandes mudanças provavelmente exigirão mudanças na cultura dessa organização. Uma das pré-condições para um processo de transformação bem-sucedido é o compromisso de todas as partes e níveis envolvidos. 144. Uma das implicações da coerência é que a qualidade da interação entre diversas organizações seja eficaz. Ao tentar fazer diversas organizações trabalhem bem juntas, a inércia de práticas já estabelecidas na subcultura de uma organização deve ser levada em conta. Ao mesmo tempo, o fato de que alguma mudança decisiva pode ocorrer devido à agenda interna de uma organização, o que afetaria a coerência de todo o processo de interação, também deve ser levado em conta. Infelizmente, um elemento comum dos diversos esforços para melhorar a coerência nas políticas e cumprir as agendas em áreas específicas de políticas é que as "reformas" ainda focalizam a mudança de práticas institucionais formais em vez de examinar a interação das diversas organizações. As iniciativas concretas destacadas no Capítulo II geralmente consolidaram ou estabeleceram a coordenação formal de processos de formulação políticas ou criaram instrumentos de políticas inovadores. Entretanto, as práticas das organizações tendem, geralmente, a não ser afetadas por essas inovações institucionais formais. 145. Os geradores de mudança são provavelmente mais sutis: incluem a modificação de normas e padrões da sociedade, etc. Geralmente essas mudanças resultam de desenvolvimentos específicos na sociedade que têm mais impacto na cultura das organizações do que a reestruturação institucional formal. Os responsáveis pelas decisões terão que entender a dinâmica da mudança dentro das organizações para assegurar que seus próprios esforços para promover a mudança combinem com a nova realidade. Quadro 12: O impacto potencial do governo eletrônico nas práticas de governança O crescimento do uso de tecnologia da internet no trabalho e nas transações do governo está afetando o relacionamento entre os diversos atores governamentais e não-governamentais. Isso pode modificar algumas práticas profundamente enraizadas e ter um impacto mais decisivo na governança do que algumas das mudanças formais introduzidas para modernizar o setor público. Em termos de governança, práticas eficazes de e-governo (governo eletrônico) podem especificamente: • apoiar a formulação de serviços eletrônicos voltados para o cidadão, com o efeito de agregar serviços de vários órgãos públicos num mesmo portal. • incentivar novos serviços, na forma de um único menu que direcione os usuários ao ator certo, sem que o cidadão tenha que se preocupar com a organização do governo. • oferecer portais com acesso a serviços públicos e privados. Essa evolução exigirá práticas que promovam processos coerentes dentro do governo. Uma pré-condição para serviços eletrônicos integrados é, por exemplo, a reestruturação de funções e processos de apoio nos órgãos responsáveis pelos serviços. Portanto, são necessários o compromisso dos níveis mais altos da organização e a intensa cooperação. Essa evolução poderá exigir mais do que a reestruturação institucional formal. Ela poderá exigir uma mudança nos métodos de trabalho entre as organizações (e através delas) e, ao mesmo tempo, poderá fornecer o ímpeto para essa mudança. No nível local, o governo eletrônico fornece também uma ferramenta para o desenvolvimento local e requer, ao mesmo tempo, novos métodos de governança. Poderiam ser oferecidos portais reunindo diversos serviços do governo na internet, voltados para grupos específicos – investidores e especuladores -- para facilitar o trânsito pela burocracia urbana. Especialmente, o governo eletrônico deve atender às necessidades de empresas locais de pequeno e médio porte, que são limitadas em termos de seus próprios recursos e informações para realizar negócios. (DT/TDPC/URB(2002)2). As organizações são sistemas sociais sofisticados baseados em arranjos institucionais formalizados, mas incluem também uma dimensão informal. A necessidade de processos flexíveis é ainda maior nas sociedades em rede. 146. Essa realidade sugere que, em muitos casos, esforços institucionais específicos para alcançar a coerência devem ser apoiados por mudanças na gestão e nas práticas que levem em conta as tendências e questões sociais mais amplas. Isso inclui aumentar a capacidade de prever o desenvolvimento futuro, administrando melhor os riscos e as oportunidades e realocando recursos mais rapidamente para atender prioridades emergentes. Pode ser mais promissor prestar atenção às mudanças culturais necessárias do que apenas examinar "estruturas". Porém, avaliar a magnitude das mudanças a serem realizadas é um enorme desafio, assim como entender os efeitos de mudanças auto-sustentáveis da sociedade sobre a governança. 147. Nesse contexto, administrar a mudança organizacional envolve principalmente manter um equilíbrio entre o custo da incoerência e o custo de medidas específicas para a coerência. O exemplo da política agrícola ilustra bem a dificuldade em atingir esse equilíbrio. Em muitos países da OCDE a agricultura é, por exemplo, subsidiada com recursos públicos (na Europa, mais da metade do orçamento da União Européia é destinada à agricultura), mesmo com um questionamento cada vez maior a respeito da sua capacidade de atender às necessidades da geração atual e de futuras gerações com produtos de qualidade. Em anos recentes sugeriu-se que as sociedades, na verdade, pagam duas vezes o custo da agricultura, primeiro como contribuintes e depois como consumidores, pagando pelo alimento um preço mais alto do que aquele que seria estabelecido pelo mercado. Essa análise exigia a reforma dos modelos existentes, particularmente do modelo agrícola europeu, para introduzir algum tipo de obrigação de gestão de alta qualidade e competitividade. A reforma da Política Agrícola da União Européia oferece um bom exemplo de reforma impulsionada pelo reconhecimento de que o custo da incoerência nesse setor havia se tornado mais alto do que o custo da mudança. Tomada de decisão mais complexa e mais fragmentada 148. A fragmentação da formulação de políticas está acrescentando complexidade à rigidez das organizações. As políticas são geralmente desenvolvidas em "silos” setoriais, com uma comunicação apenas limitada entre setores no estágio de formulação das políticas. Os diversos órgãos públicos têm seus próprios clientes, com diferentes antecedentes, objetivos e subculturas. Os processos de coordenação menos rígidos que visam a consistência entre diversos objetivos de políticas (ver capítulo I) afetam decisões num estágio posterior de desenvolvimento das políticas e são impulsionados principalmente por preocupações com a eficiência. As arbitragens entre ministérios e organizações, geralmente conduzidos no nível nacional pelo Gabinete do Primeiro Ministro e pelo Ministro das Finanças e no nível sub-nacional por suas contrapartes, funcionam relativamente bem para assegurar o controle da alocação de recursos, mas não são suficientes para apoiar a formulação de políticas integradas para alcançar objetivos centrais. 149. A tendência de fragmentação no setor público tem dimensões verticais e horizontais. Dificuldades na obtenção da coerência são evidentes entre ministérios e agências, assim como entre os níveis do governo. As questões relacionadas à fragmentação horizontal num mesmo nível de tomada de decisão já foram revisadas em seções anteriores deste relatório. Esta seção focalizará na fragmentação paralela da formulação de políticas que ocorre entre níveis do governo e entre setores. 150. A tendência geral de transferência de responsabilidades ao nível subnacional geralmente é motivada por uma combinação de interesses políticos e preocupações com a eficiência (OCDE 1997). Embora a descentralização possa ter contribuído para a promoção de inovações nas políticas e para melhorar a efetividade, ela também criou uma série de desafios, dos quais as questões fiscais e de coordenação são as mais urgentes. Ao implementar políticas de descentralização, vários países da OCDE tiveram que enfrentar um desafio de coerência, a saber a dificuldade de manter o equilíbrio entre relacionamentos estabelecidos e práticas emergentes entre os níveis do governo. O grau de coesão de seus sistemas políticos e administrativos já foi questionado algumas vezes. 151. Argumenta-se com freqüência que um controle demasiado rígido exercido pelo centro pode limitar a capacidade dos atores locais de desenvolver soluções que atendam às suas necessidades, o que é um argumento a favor de reformas de descentralização. Entretanto, em vários casos, a realocação formal das responsabilidades pode não ser suficiente para provocar uma mudança rápida de práticas já estabelecidas. Exemplos recentes de desenvolvimentos territoriais na Coréia ressaltam a dificuldade de administrar relacionamentos entre níveis de governo. Tradicionalmente, o governo da Coréia é altamente centralizado. Na década de 90 a Coréia foi submetida a um processo de descentralização. A transferência de responsabilidades do nível central para o nível subcentral do governo foi acompanhada de uma reforma fiscal que conferiu autonomia tributária limitada aos governos locais. Entretanto, apesar da descentralização formal, foi mantida a tradição profundamente enraizada de que o governo central e os governos locais não se encontram como parceiros iguais e os mecanismos complexos de controle do governo central continuam sendo uma característica significativa da governança em múltiplos níveis na Coréia. Essa situação de um processo de descentralização em paralelo a práticas de controle rígido criou um tipo de "instabilidade institucional" que tem sido fonte de inconsistências, apesar das expectativas de que o processo de descentralização seria um fator que contribuiria para a eficiência e a coerência. 152. A descentralização deve ser levada mais adiante? A tendência deve ser revertida? O exemplo coreano sugere que mecanismos específicos para garantir a coesão podem ser mais determinantes, em muitos casos, do que mais reformas numa ou noutra direção. Uma das conclusões da revisão territorial da Coréia publicada em 2001 é que, para administrar a mudança de um sistema centralizado para um sistema descentralizado, podem ser necessárias abordagens horizontais inovadoras que introduzam um estilo novo de governança, particularmente para criar uma ponte entre o desenvolvimento espacial e o desenvolvimento social e econômico. "Uma estrutura institucional para uma melhor coordenação transetorial precisa ser elaborada para intensificar a coordenação horizontal e vertical, além disso as parcerias no nível local também precisam ser institucionalizadas." (OCDE 2001d). 153. Apenas recentemente foram introduzidas iniciativas para abordar especificamente o desafio da coerência causado pela descentralização. De acordo com a Revisão Territorial do México, OCDE 2002, "a atual administração do México mostra sinais de um compromisso para priorizar, pela primeira vez de modo abrangente, o desenvolvimento regional (de longo prazo) na agenda de políticas públicas e de conferir mais peso às políticas territoriais, no lugar da abordagem setorial tradicional (que é segmentada e voltada para o curto prazo). Isso é mais claramente exemplificado pela incorporação significativa de políticas de desenvolvimento regional no Plano de Desenvolvimento Nacional, pela criação do Escritório de Planejamento Estratégico e Desenvolvimento Regional dentro do Escritório Executivo do Presidente, bem como pela apresentação do Programa Nacional de Desenvolvimento Urbano e Planejamento Territorial (PNDU-OT)". Naturalmente, ainda é muito cedo para avaliar os resultados dessa iniciativa. 154. Essa tendência para a complexidade e a fragmentação dos processos de tomada de decisão também são visíveis no relacionamento entre organizações do setor público e do setor privado. Além do número crescente de organizações privadas que executam tarefas públicas, uma tendência significativa é o surgimento de um "terceiro setor" (organizações sem fins lucrativos). Embora o governo tenha se removido progressivamente da prestação de serviços, ele desempenha um papel significativo como comprador, regulador, gestor do contrato e avaliador. A atribuição de tarefas a entidades públicas, privadas e sem fins lucrativos representa um desafio para o governo, que precisa continuamente identificar zonas indefinidas e áreas de risco. A previsão e a prevenção de possíveis problemas e falhas causadas pela realocação ineficaz de tarefas também são uma preocupação primordial de países da OCDE. Por exemplo, em serviços financiados com recursos públicos o governo tem que se garantir contra riscos, tais como a má qualidade do serviço, o aumento do custo, a dominação do fornecedor do serviço e descontinuidades na prestação do serviço, além de problemas de segurança e integridade. Essa função de "cão de guarda" pode ser muito cara de se implementar, na medida em que a alocação de responsabilidades se torna cada vez mais fragmentada. Desenvolvendo conhecimento para a tomada de decisão 155. Em várias áreas cruciais onde a coerência tem sido difícil de alcançar (por exemplo, o desenvolvimento sustentável) sugeriu-se que um dos motivos para a dificuldade de superar as inconsistências está ligado às deficiências na produção e circulação de conhecimento (ver OCDE 2001b e OCDE 2002a). O conhecimento rigoroso e confiável é uma condição fundamental para que os responsáveis pelas decisões tomem decisões e façam escolhas. Em vários casos críticos, o conhecimento que deveria apoiar a mudança necessária nas práticas de governança ainda é insuficiente para fornecer a base para decisões lógicas, confiáveis e amplamente aceitas. Os esforços devem ser concentrados nos estágios iniciais da formulação de políticas, precisamente quando as prioridades e a direção estão sendo estabelecidas. O fortalecimento da base de conhecimento nos estágios iniciais do processo decisório poderia: • Estabelecer melhor as condições para a produção de conhecimento relevante para as políticas, inclusive através da incorporação das percepções e pontos de vista dos cidadãos. • Consolidar o acesso ao conhecimento através do desenvolvimento das capacidades internas do governo de lidar com o conhecimento. Melhorando a produção e a divulgação do conhecimento Projetando mecanismos específicos para gerar e confrontar o conhecimento 156. Comparada à complexidade dos ambientes institucional e social, a mudança tecnológica poderia ser encarada como um modo de simplificar esses complexos ambientes. Seria uma questão de bom senso considerar a mudança tecnológica como uma fonte de simplificação para processos de formulação de políticas. Há alguma verdade nessa visão. Por exemplo, o fato de que os serviços do governo estão cada vez mais disponíveis na Internet poderia ajudar a agilizar processos e simplificar procedimentos (ver quadro 12). Entretanto, a ampliação e a rapidez do acesso à informação não conduz automaticamente a uma melhor compreensão das questões em jogo. Uma quantidade maior de informação pode levar a mais incerteza, em vez de mais conhecimento: "A incerteza é o resultado principal do que veio a ser chamado de explosão da informação. Com um grande pool de informações, interpretadas de diversas maneiras (e, poderia-se acrescentar, por diversos atores), pode-se criar a impressão, entre as pessoas que não se dedicam a uma interpretação particular, de que ninguém sabe realmente o que está acontecendo, nem o que fazer a respeito" (Donald 1988). Quadro 12: Principais Tipos de Conhecimento necessários para a Formulação de Políticas • • • • • • Estratégico: análise, previsões, cenários, modelos. Interesses públicos e prioridades. Conhecimento científico e técnico. Conhecimento do que funciona, avaliações. Conhecimento emergente, ferramentas para fazer previsões, sistemas de alarme precoce. Dados, feedback e avaliações de desempenho para ajustar a política. Fonte: [ PUMA/HRM(2001)3 ]: 157. Para enfrentar os problemas na agenda política com sucesso, recomenda-se que os governos mobilizem rapidamente conhecimento de alta qualidade para apoiar as escolhas cruciais. Para moldar visões e traçar esboços de longo prazo de fatores de sucesso nacionais (os componentes essenciais da coerência), os governos devem dispor de ferramentas para detectar e prever novas tendências. Ou seja, o governo necessita de capital intelectual e capacidade estratégica e analítica para compreender, assimilar e utilizar o conhecimento científico. Contudo, dificuldades básicas resultam de: • Os responsáveis pelas decisões formulam e reformulam as políticas em situações freqüentemente caracterizadas pela incerteza em relação ao problema. • As comunidades científicas estabelecidas tendem a minimizar a importância das inovações. • Os responsáveis pelas decisões operam com prazos apertados e vivem sob constante sobrecarga de informações, o que dificulta a tomada de decisões. • A divulgação de conhecimento especializado – ou seja, a acessibilidade geral e o uso do conhecimento científico por todos os grupos interessados – levou a uma corrida ao conhecimento que não necessariamente aumenta a qualidade do debate e pode comprometer a credibilidade dos dados científicos. 158. Há cada vez menos "evidência” científica disponível para administrar a complexidade e a imprevisibilidade dos efeitos de longo prazo de muitas questões cruciais. Além disso, a maior parte das decisões envolve interessados que têm valores, antecedentes e objetivos diferentes. A capacidade limitada das instituições de lidar com as diversas perspectivas da questão, assim como uma inabilidade de absorver a complexidade e administrar a mudança, vai contra a necessidade de uma compreensão recíproca entre as diversas disciplinas, os diversos públicos ou clientes envolvidos em escolhas estratégicas. 159. A tomada de decisão informada, portanto, é um grande desafio. O conhecimento científico deve ser a base para conscientizar os diversos clientes a respeito das soluções para um determinado problema, mas não se deve esperar que a ciência forneça todas as respostas. Como não haverá evidência científica conclusiva disponível para muitas das decisões a serem tomadas, inclusive decisões com conseqüências globais significativas (um exemplo típico é a mudança climática), é fundamental garantir suficiente debate para confrontar valores, percepções e visões. Desse modo, as decisões tomadas serão mais universalmente aceitáveis. Os relatórios sobre a encefalopatia espongiforme bovina e a febre aftosa ressaltaram essa falha. A resultante perda de confiança, em particular, a falta de confiança em argumentos científicos, levou a mudanças importantes na utilização de recomendações científicas e ao desejo de tornar o debate científico mais transparente. Isso é exemplificado pela abordagem adotada pela Comissão de Biotecnologia Agrícola e Ambiental sobre Modificação Genética do Reino Unido (Quadro 13). Quadro 13: Comissão de Biotecnologia Agrícola e Ambiental A Comissão de Biotecnologia Agrícola e Ambiental (AEBC), fornece um marco de referência para a integração do conhecimento em um novo campo de política. A comissão foi instituída em junho de 2000, para assessorar o governo em qualquer questão envolvendo modificações genéticas que tenham impacto na agricultura e no meio ambiente. A comissão também examina questões éticas e de aceitabilidade da tecnologia de modificação genética. Os membros da Comissão têm ampla experiência com questões relacionadas a consumidores e ao meio ambiente, além de experiência com agricultura, ciência, ética e a indústria de biotecnologia. As competências da Comissão são: • • • • • Oferecer assessoria estratégica ao governo em questões de biotecnologia que têm impacto na agricultura e no meio ambiente. Articular-se com os outros órgãos que, junto com a AEBC, formam uma nova estrutura estratégica de assessoria. Esses órgãos são: a Comissão de Genética Humana (HGC), que faz recomendações sobre tecnologias genéticas e seu impacto sobre seres humanos, e a Agência de Normas para Alimentos (FSA), que é responsável por todos os aspectos relacionados à segurança e à utilização de alimentos e rações animais geneticamente modificados. Fazer revisões constantes de desenvolvimentos atuais e de possíveis desenvolvimentos futuros em biotecnologia com implicações reais e potenciais para a agricultura e o meio ambiente. Assessorar o governo nas implicações éticas e sociais que resultam desses desenvolvimentos, bem como da sua aceitabilidade pública. Considerar e fazer recomendações sobre questões específicas relacionadas a aspectos relevantes da biotecnologia quando solicitado pelo governo. Como parte desse processo espera-se que a Comissão: • • • • • • • Identifique quaisquer lacunas na estrutura regulatória e consultiva. Considere as implicações mais amplas das lições a serem aprendidas com os casos individuais que requerem decisão regulatória. Recomende as mudanças necessárias nas diretrizes governamentais que os órgãos regulatórios devem observar. Faça recomendações a respeito de mudanças na estrutura atual de órgãos regulatórios e consultivos. Coordene e troque informações com os órgãos regulatórios e consultivos relevantes. Busque envolver e consultar regularmente os interessados e o público nas questões que estiver examinando. Opere de acordo com as boas práticas para órgãos públicos no que diz respeito à abertura, transparência, acessibilidade, intercâmbio de informações e ação oportuna. Fonte: Estudo de Caso Britânico sobre Governança para o Desenvolvimento Sustentável, OCDE, 2001 160. Para se obter melhores subsídios a partir da pesquisa científica nas decisões sobre políticas, será necessário que os governos estimulem a produção de dados científicos em várias disciplinas centrais e que estabeleçam regras claras e transparentes para "avaliar conhecimento". Os governos devem portanto: • Financiar pesquisa baseada em uma série de paradigmas e opções, incluindo “opiniões dissidentes”; • Estipular que os institutos científicos reflitam as preocupações mais amplas da sociedade, quando apropriado; e • Organizar o debate público orientado por cenários concretos de informações e conhecimentos conflitantes. 161. A obtenção de melhores subsídios científicos no desenvolvimento de políticas no longo prazo requer investimento em áreas específicas de pesquisa. Além de melhorar as ligações entre a comunidade científica e os formuladores de políticas, serão necessárias mudanças nas práticas do governo para avaliar opções possíveis antes de tomar decisões em questões complexas, de longo prazo e transversais. Os limites metodológicos das abordagens, como a avaliação contingente, assim como o fato de que a incerteza científica às vezes é ignorada na avaliação de efeitos, podem exigir a adoção de uma abordagem "defensiva" em algumas áreas. Também são necessários esforços para desenvolver uma avaliação multidisciplinar e holística de custos e benefícios. Portanto, é fundamental implementar os seguintes pontos: • Os mecanismos de produção de conhecimento devem ser suficientemente transparentes, e, se possível, apoiados por processos de arbitragem para administrar conhecimentos conflitantes. • O governo deve assegurar que haja uma estrutura estabelecida para permitir que as discussões focalizem construtivamente nas áreas de conflito, desenvolvendo cenários e opções. • Deve ser dedicada atenção suficiente a garantir que os fluxos de informação entre a comunidade científica e os responsáveis pelas decisões sejam eficientes e efetivos. • As políticas de pesquisa devem incentivar e facilitar redes de cientistas e apoiar o desenvolvimento de pesquisa conjunta entre disciplinas. • Devem ser empregados esforços específicos para apoiar o conhecimento orientado para o futuro e relevante para as políticas, especialmente garantindo a ‘melhor combinação’ de investimentos públicos e privados em pesquisa.. Quadro 14: Fortalecendo a Política Estratégica no Ministério Holandês da Agricultura, Gestão da Natureza e Pesca Em 1994, o Ministério Holandês da Agricultura, Gestão da Natureza e Pesca estabeleceu uma pequena Divisão de Política Estratégica (atualmente composta de 6 pessoas) para ajudar a desenvolver uma visão para o longo prazo. O papel dessa unidade é questionar o modo usual de fazer as coisas, a fim de gerar um pensamento inovador e incentivar as diversas partes do ministério a lidarem com as questões emergentes. Seu papel evoluiu. Nos primeiros cinco anos a divisão era muito mais voltada para processos, focalizando em como integrar questões novas no processo de formulação de políticas e em ajudar as equipes de gestão dentro das diversas diretorias (principalmente por meio de reuniões) a desenvolver cenários e relacionar melhor as pressões externas com as opções de políticas. A divisão está agora iniciando uma nova fase, pois a equipe está suficientemente capacitada para analisar sinais externos. O foco agora está mais no conteúdo e a divisão está tratando de tópicos específicos, onde sente que desenvolvimentos importantes estão acontecendo, ou de “tópicos tabus" que exigem discussão. Diretamente ligada ao nível mais alto, ela tem um papel essencial na promoção de novos conceitos. Um exemplo recente foi a questão sensível da segurança de alimentos. A Divisão desenvolveu argumentos avançados para a co-gestão da segurança de alimentos entre os setores público e privado. A Divisão de Política Estratégica é fundamental para o desenvolvimento da agenda futura do Ministério da Agricultura, Gestão da Natureza e Pesca. Entre as principais questões identificadas estão: • Tecnologia da informação e governança. • Interesses do consumidor. • Agenda de alimentos para o futuro. • Política da inovação (papel do governo na inovação). • Desenvolvimento de áreas rurais nos Países Baixos e no exterior (inclui cooperação com países em desenvolvimento). • Gestão de crise (principalmente como ler os sinais de uma crise em potencial) Fonte: OCDE 2002 162. Dentro dessa estrutura, uma maneira concreta de avançar a agenda de "integração do conhecimento" é desenvolver a avaliação integrativa. Definida como o "processo interdisciplinar de combinar, interpretar e comunicar conhecimento de diversas disciplinas científicas", o objetivo principal dessa abordagem é fornecer informações mais adequadas aos responsáveis pelas decisões através da provisão de conhecimento com valor agregado, em vez da avaliação unidisciplinar tradicional. Nesse contexto, o papel do Estado muda, do tradicional, direto e ativo para um papel mais indireto e passivo onde o Estado age "dos bastidores" como um incentivador e diretor, negociando consenso entre os diferentes interesses presentes na sociedade (Kasemir et al. pp. 1999 3-6). Já existe alguma experiência com a abordagem da avaliação integrativa, por exemplo, no alcance de um desenvolvimento mais sustentável. O projeto ULYSSES e o projeto VISIONS desempenharam um papel piloto na estrutura da União Européia. 163. A natureza internacional da maioria das questões, junto com as limitações das capacidades nacionais de lidar com "mega questões", também exige urgentemente uma cooperação internacional mais efetiva em questões tais como desenvolvimento sustentável, migrações, desenvolvimento, envelhecimento, principais riscos à saúde, combate ao terrorismo, etc. O objetivo é reunir recursos e criar uma capacidade de produção de conhecimento em escala global. Melhorar a qualidade de processos internacionais pode exigir o início de diálogos internacionais entre comunidades científicas, instituições políticas e grupos interessados para consolidar a tomada de decisões relativas a essas "mega questões". No momento, geralmente prevalecem nas negociações internacionais apenas os interesses setoriais e estreitamente definidos. Maior transferência de conhecimento e um papel mais forte para as organizações internacionais e multinacionais, que poderiam atuar como fóruns e iniciadores nesse processo de comunicação internacional, devem se tornar uma dimensão essencial na agenda da coerência. Também poderiam constituir potenciais motivadores de mudança. Envolvendo a sociedade civil de maneira mais eficaz 164. Uma das conseqüências da criação de mecanismos apropriados de produção de conhecimento é a necessidade de envolver os cidadãos mais efetivamente a fim de melhorar a qualidade da receptividade do governo às necessidades da sociedade. Uma das características da governança moderna é a participação dos cidadãos nos debates nacionais e globais de políticas, através de organizações que parecem comprometer os mecanismos de consulta estabelecidos entre o governo e os parceiros sociais. O fato de que os diversos interesses estão cada vez mais presentes no debate, nos níveis subnacional, nacional e global, requer capacidades específicas, não somente para administrar melhor as interações com a sociedade civil, mas também para compreender a complexidade que resulta de uma nova "sociedade em rede". 165. Em anos recentes, um dos desafios da modernização do setor público tem sido o ajuste às múltiplas,às vezes contraditórias, demandas dos cidadãos. Parece haver uma lacuna crescente entre as expectativas dos cidadãos e as políticas e essa tendência poderia ser considerada um fator de “fragmentação social”. Essa complexidade é reforçada por vários fatores, inclusive as novas expectativas relacionadas a estilos de vida mais diferenciados, novos métodos de trabalho, etc. A gestão dessas novas tendências sociais tem sido uma preocupação primordial dos países da OCDE em anos recentes (OCDE 1996, OCDE 2001a). 166. A situação é parecida no setor privado (que está cada vez mais desempenhando tarefas públicas) já que uma pré-condição para a competitividade e o sucesso na economia baseada no conhecimento é a colaboração e a formação de redes. Os sistemas de inovação do setor privado mostram que a velocidade da mudança nos mercados internacionais e na ciência e tecnologia, junto com a diversidade e a especialização do conhecimento, criam ambientes incertos e em rápida mutação. Em ambientes estáveis pode ser suficiente que as empresas estabeleçam relacionamentos com um número reduzido de parceiros, mas as empresas em ambientes dinâmicos precisam explorar continuamente múltiplos contatos e até aceitar um certo grau de redundância em seus vínculos externos, para lidar com necessidades de conhecimento crescentes, porém em grande parte imprevisíveis. (OCDE 2002 x) 167. Num contexto complexo de política, como o envelhecimento ou o desenvolvimento sustentável, pode ser cada vez mais difícil obter equilíbrio de interesses ou consenso para políticas horizontais de longo prazo, principalmente porque os valores e as percepções dos indivíduos se tornam diferenciados. Freqüentemente surgem conflitos dessa complexidade, dificultando qualquer decisão num ambiente de múltiplos interessados. Nesse contexto também, atender às diversas expectativas dos cidadãos exige não apenas uma capacidade de garantir a coordenação formal de processos de política, mas também requer uma maior integração das percepções dos cidadãos sobre questões e respostas. Um dos desafios de um ambiente de múltiplos interessados é que o governo precisa atuar como ator e diretor. Num ambiente onde a tomada de decisão está se tornando complexa e fragmentada, o governo deve ser um ator dinâmico na construção de consenso entre a multiplicidade de atores. 168. "Não há mais um princípio que articula o objetivo, os desejos e as atribuições, mas em vez disso há um número de princípios que dirigem o processo" (WRR 2002, p. 40 referindo-se a Hazeu 2000: 98ff). Isso torna ainda mais problemático alcançar a coerência. Parece claro que estruturas mais flexíveis tornam a integração das políticas muito mais difícil e o governo tem que dirigir redes compostas de diferentes grupos e parceiros de uma ampla escala de jurisdições formais, em vez de contar com o estilo mais direto de comando e controle. "O estabelecimento de relacionamentos cooperativos informais entre organizações pode ser considerado uma alternativa útil, além disso, as organizações tripartite que querem desempenhar um papel mais ousado localmente podem representar um recurso útil na promoção de uma abordagem integrada às políticas." (OCDE 2001f). A formação de redes é necessária para reunir as entidades de conhecimento relevante em entidades organizacionais díspares. A formação de redes e o compartilhamento de informação e compreensão que facilitam a cooperação dentro dos grupos e entre os grupos são vitais em todos os níveis do governo e da administração. 169. A revisão da experiência de cinco países da OCDExxv com relação a suas práticas de governança para o desenvolvimento sustentável mostrou que: • Grandes obstáculos à coerência no longo prazo estão fortemente enraizados nas diferentes percepções dos grupos interessados em relação às questões envolvidas. • Interesses conflitantes freqüentemente estão em jogo nas discussões vitais sobre políticas e equilibrar esses interesses continua sendo uma característica importante da formulação de políticas. • Já foram empregados esforços para lidar com esse problema, sobretudo quando o consenso sobre um interesse comum pode ser identificado, mas essa evolução continua incipiente na maioria dos casos. • Os governos têm um papel importante na abordagem dos grandes conflitos de interesses entre grupos interessados, especialmente envolvendo-os em discussões construtivas sobre essas questões. • Há uma demanda por mecanismos decisórios inovadores que associem os setores privado e público, bem como as ONGs. • Informação e comunicação sobre as medidas adotadas pelo governo não são suficientes para tranqüilizar os grupos interessados em relação à complexa e controversa agenda de desenvolvimento sustentável. • As empresas, os sindicatos, as ONGs e as associações de cidadãos devem ser incentivados a participar ativamente e os governos são responsáveis por garantir que esses processos de consulta e participação sejam efetivamente aproveitados nos processos decisórios. • A consulta e a participação públicas não devem ser transformadas em exercícios formais, nem devem ser usadas para justificar o adiamento de decisões quando existem conflitos de interesses nas escolhas das políticas. • A ‘cultura’ do governo ainda está evoluindo na direção de abordagens mais participativas, com maior transparência nos processos decisórios (OECD 2002a). 170. Os países da OCDE têm empregado esforços para melhorar a resolução de questões controversas, especialmente quando é difícil obter um acordo em questões de interesse comum ou quando as inconsistências de algumas escolhas se tornam óbvias. Esse foi, por exemplo, o caso no Canadá, onde a análise divergente resultante de interesses ambientais e econômicos conflitantes não foi capaz de impedir a queda dramática dos níveis existentes de pesca na costa do Atlântico. Para resolver a crise, foi feito um esforço para incentivar uma resposta pública mais coerente por meio de melhor coordenação entre as administrações do estado e das províncias. A Environment Canada e a Fisheries and Oceans Canada iniciaram sete acordos ambientais entre o nível federal e as provinciais. Esses foram firmados sob o Ato Canadense de Proteção Ambiental (CEPA) e o Ato da Pesca e incluem atividades tais como a inspeção, aplicação da legislação, monitoramento e apresentação de relatórios. Dois dos acordos incluíram a proteção ambiental como um objetivo declarado. Outros cinco acordos mencionaram a proteção ambiental em seus preâmbulos. Outro exemplo de cooperação entre os níveis federal e provincial é o Conselho Canadense de Ministros da Pesca e da Aqüicultura. Também foram firmados subacordos para Avaliação Ambiental em base bilateral com as províncias de British Columbia, Alberta, Saskatchewan e Manitoba e estão sendo conduzidas negociações com Ontário e New Brunswick. Um segundo esforço foi feito para lançar processos com múltiplos grupos interessados para aumentar a visibilidade da questão e conscientizar os produtores. Um dos efeitos é que a indústria pesqueira canadense tem o compromisso de alcançar a sustentabilidade na pesca marinha e de água doce. Por exemplo, foi desenvolvido um Código de Conduta, consistente com o código da FAO, para Operações Pesqueiras Responsáveis como um passo essencial para a realização desse objetivo. 171. Uma situação de crise também pode criar a oportunidade para o desenvolvimento de soluções de longo prazo: na agricultura holandesa, a complexidade no problema do estrume na década de 1980 foi um incentivo para encontrar uma solução sustentável. O problema era tão difícil que um acordo de curto prazo entre o governo e os produtores não era mais socialmente aceitável. A política do suíno passou por três fases que ilustram os diferentes modelos de tomada de decisão: • Fase 1 (o modelo “não tão consensual”): Colusão entre produtores e o governo, sem soluções sustentáveis. Por trás do consenso formal, forte oposição dos Ambientalistas e outros grupos. • Fase 2 (o modelo “autoritário”): Imposições do governo para realizar o que seria a “solução certa”. A oposição dos produtores e as negociações ex-post resultantes acabaram paralisando a implementação. • Fase 3 (o modelo da “governança moderna”): Início de novos métodos de decisão baseados na cooperação e negociação ex-ante entre os grupos interessados, seguido de uma clara decisão e compromisso e um plano de implementação de longo prazo. Este modelo funcionou porque o processo foi administrado com suficiente antecedência. Quadro 15: Estabelecendo uma infra-estrutura sólida para o envolvimento dos cidadãos: algumas questões essenciais Uma infra-estrutura sólida para o envolvimento dos cidadãos no processo de consulta e participação de múltiplos interessados deve abordar as seguintes questões: • A estrutura legal foi revisada e adaptada para incluir dispositivos jurídicos claros para consulta e participação? • Existem diretrizes claras sobre quando, com quem e como as consultas devem ser realizadas? • A abordagem aplicada ao desenvolvimento das políticas em todos os níveis e nas várias dimensões das questões é a de considerar cada caso individualmente? O público também está sendo envolvido nisso? • Existem mecanismos implantados para a avaliação, o feedback da consulta e para monitorar a influência da participação na tomada de decisão? • A transparência está garantida? Por exemplo, informações restritas são a exceção e não a regra, tanto em princípio quanto na prática? • Os mecanismos da transparência estão sendo reforçados nos diferentes níveis do governo para as principais decisões? • Existem mecanismos efetivos dentro do governo ou organizações independentes para informar os cidadãos/consumidores sobre as conseqüências das decisões? Fonte: Lista de Verificação da OCDE para Melhorar a Coerência e a Integração para o Desenvolvimento Sustentável, OCDE 2002 172. Finalmente, deve ser ressaltado que o aumento da participação exige maior transparência no processo decisório. Em muitos casos, resultados intermediários de soluções para uma questão poderiam gerar o debate público entre os responsáveis pelo projeto e o público geral. Isso permitiria a redefinição do projeto com base nas opiniões e pontos de vista do público. Também poderia levar à conscientização do público nas questões relacionadas aos problemas críticos de longo prazo (desenvolvimento sustentável, principais riscos, envelhecimento, etc.) que são freqüentemente esquecidos pelo público geral e pela mídia. O aumento da transparência também contribuiria para legitimar as decisões e fortalecer o compromisso político com decisões mais consistentes. Apoio das práticas governamentais internas 173. A mudança para processos de formulação de políticas mais abertos e participativos na produção do conhecimento deve ser acompanhada de uma mudança de atitude e de cultura dentro do governo em si. Essa é uma condição necessária para melhorar a circulação e a utilização desse conhecimento relevante para as políticas. A cultura organizacional é um fator importante para o êxito da implementação das políticas que cruzam as fronteiras organizacionais tradicionais e a mudança para medidas coordenadas deve ser combinada com a renovação da cultura administrativa. 174. Uma mudança no ambiente de formulação de políticas muitas vezes requer coragem e uma abordagem radical. O desafio é superar fatores tais como antigas tradições, atitudes e expectativas historicamente desenvolvidas – a mudança cultural não acontece rapidamente ou facilmente. Ainda mais difíceis são os obstáculos como a rivalidade entre departamentos, agências e indivíduos que podem se sentir tentados a esconder informações relevantes. Por exemplo, uma cultura organizacional que apóie um bom desempenho na agência, mas apenas na agência, pode minar o desempenho geral do governo e constituir portanto uma barreira ao processo decisório coerente. 175. Os gerentes não têm o monopólio sobre o trabalho horizontal realizado por todo o pessoal. Além disso, uma abordagem holística não pode ser comandada do nível gerencial, mas deve ser adaptada a todos os níveis de governo / agência. Para ser efetiva, a coordenação tem que ocorrer “de baixo para cima”, permitindo e promovendo a reflexão compartilhada e o trabalho conjunto desde o nível mais operacional e desde a fase de formulação das políticas. Tal mecanismo contribui também para uma responsabilização em relação aos resultados. 176. O governo deve fortalecer suas capacidades de aprendizagem e colaboração internas ao tentar introduzir um relacionamento mais efetivo com outros atores, especialmente num ambiente de múltiplos fornecedores. A “gestão de relacionamentos" torna-se uma competência básica no serviço público. Isso requer o uso das seguintes ferramentas: • Redes entre setores administrativos. • Habilidades e treinamento para lidar com problemas transversais. • Capacidade de refletir sobre questões intersetoriais e avaliar as implicações gerais das políticas setoriais. • Novas tecnologias como facilitadoras dos processos. • Incentivos e recompensas (remuneração, planos de carreira) que reforcem uma abordagem horizontal. • Adaptação de sistemas de gestão de conhecimento e qualidade da informação para os responsáveis pelas decisões. 177. Em 2002 a OCDE realizou um levantamento de Práticas de Gestão de Conhecimento para Ministérios/Departamentos/Agências do Governo Central, que passou algumas mensagens aos responsáveis pelas decisões sobre práticas de gestão de conhecimentoxxvi. Parte do aprendizado apresentado no levantamento revela algumas tendências que podem ser fundamentais para melhorar a qualidade das fases iniciais dos processos de formulação de políticas. As mensagens principais para melhorar o apoio do governo ao aperfeiçoamento da gestão do conhecimento são: 1. A Gestão de Conhecimento (GC) é uma prioridade na agenda gerencial da maioria das organizações do governo central. 2. As organizações do governo central estão empreendendo esforços concretos para melhorar suas práticas de GC (através de ferramentas tradicionais como o treinamento e de ferramentas inovadoras como a colaboração na elaboração das políticas). 3. A mudança cultural está ocorrendo através de um impacto mais positivo de compartilhamento de conhecimento sobre o desenvolvimento de carreira, a abertura de práticas gerenciais e a abertura do setor público para o setor privado. 4. As boas práticas de GC podem ser aperfeiçoadas através do comportamento de longo prazo, refletindo confiança entre servidores públicos, espírito de equipe e altruísmo. 5. A GC deve ser apoiada por um ambiente organizacional e cultural relativamente estável e não por mudança institucional. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES 178. Alcançar a coerência parece ser um processo que envolve, por um lado, instrumentos específicos para melhorar a coordenação e, por outro, a consistência das políticas selecionadas. As ferramentas precisam ser aplicadas às políticas com cuidado para evitar que uma política possa comprometer a efetividade de outra. Deve-se dedicar atenção ao nível de ambição e à rigidez dos instrumentos. Isso requer critério e paciência num contexto caracterizado cada vez mais pela percepção de que soluções rápidas devem ser encontradas. 179. Ferramentas específicas de políticas devem ser complementadas por uma capacidade de conceber ações mais abrangentes. Para ser efetiva, a coerência requer a promoção de mudanças comportamentais dentro do governo. Isso se torna possível através de um compromisso com a melhoria dos métodos de gestão de conhecimento, inclusive através de uma interação mais aberta com a sociedade civil. 180. Diante da natureza complexa e multiforme da coerência nas políticas, esta seção não pretende fornecer recomendações prescritivas, mas oferecer sugestões aos formuladores de políticas baseadas na análise apresentada no relatório. A OCDE já desenvolveu diretrizes para a realização de objetivos específicos, especialmente para a redução da pobreza e para o desenvolvimento sustentável. As diretrizes fornecem inspiração, mas não cobrem todo o leque de questões para as quais a coerência nas políticas é essencial. 181. Embora seja difícil fornecer ao leitor uma prescrição detalhada para lidar com a coerência “de forma geral”, a experiência dos países da OCDE reflete seu interesse em que seja dada atenção específica às práticas de governança para realizar objetivos complexos de políticas. Isso ressalta os obstáculos principais a serem superados no nível doméstico e fornece apoio para se lidar com os desafios institucionais que resultam da busca pelo desenvolvimento de políticas sustentáveis. Esses desafios institucionais envolvem não somente o governo, mas todos os grupos interessados, incluindo a comunidade empresarial, organizações da sociedade civil e outras associações de cidadãos. Recomendações Principais 182. As "lições" apresentadas neste relatório constituem alguns dos elementos fundamentais que precisam ser considerados ao se tentar desenvolver uma agenda de coerência nas políticas. Com base nessa análise, são apresentadas abaixo orientações na forma de um esboço apresentando diferentes recomendações dirigidas principalmente aos governos nacionais: Recomendação I: Deve haver um entendimento comum das questões envolvidas 183. O fato das políticas estarem se tornando cada vez mais multisetoriais e multidimensionais requer que mais atenção seja dedicada à inserção adequada das questões no debate político geral e nas agendas políticas setoriais, desde o estágio de formulação das políticas. Os governos devem assegurar que as complexas realidades de uma determinada política sejam bem compreendidas. Particularmente, as conseqüências econômicas, sociais, ou ambientais de curto, médio e longo prazo de uma determinada política devem ser esclarecidas e comunicadas. Isso implicaria em responder as seguintes perguntas: • Que esforços foram empreendidos para estabelecer objetivos políticos claros, amplamente aceitos e operacionais? • Os objetivos da política são suficientemente claros e compreendidos pelo público? • O objetivo é bem compreendido pelas organizações públicas e nos diversos níveis do governo? • Os benefícios da proposta da política são apresentados com exemplos claros baseados em estatísticas? Recomendação II: Deve haver clareza em relação ao compromisso e à liderança 184. Haver clareza em relação ao compromisso e à liderança dentro do governo é essencial para atingir um objetivo específico. A comunicação desse compromisso também é essencial para apoiar o desenvolvimento de uma estratégia concreta e da ação subseqüente. Esse compromisso deve vir de cima, mas também é fundamental desenvolver a liderança e a capacidade em todas as organizações do setor público. 185. O desafio é maior quando as políticas são multisetoriais ou de longo prazo, devido ao potencial de conflito entre os diversos interesses, tanto no setor público quanto no privado. Uma forte liderança política é necessária para dar forma ao debate sobre o desenvolvimento das políticas. Essa liderança, por sua vez, deve abordar os problemas que resultam do pensamento de “silo” (isolado, compartimentalizado), da relutância em ceder à autoridade decisória e do foco no curto prazo. As perguntas a seguir devem ser investigadas para se obter um compromisso claro. • Há um compromisso claro no nível mais alto com a formulação e implementação dos objetivos e estratégias da política? • Este compromisso é comunicado efetivamente aos diversos setores do governo e transversalmente em todos os níveis do governo? • Onde existem diferenças entre as agendas administrativa e política, são empregados esforços para conciliá-las? • A liderança é manifestada através de uma seqüência estabelecida de prioridades que são monitoradas ao longo do tempo? • Quando as questões requerem um compromisso de longo prazo, o governo mantém um senso de urgência ao longo do tempo? Recomendação III: As condições para conduzir a integração das políticas devem estar estabelecidas 186. Deve ser feita uma avaliação crítica da formulação de estratégias setoriais e de sua implementação, inclusive do ponto de vista das ferramentas de execução empregadas (acordos voluntários, etc.). Quando um objetivo de política se transforma numa prioridade nacional, é particularmente importante que a execução da estratégia seja monitorada através de uma instituição abrangente que atue como um "catalisador". 187. A descentralização crescente de poder é uma característica da maioria dos países da OCDE e manter o equilíbrio correto entre a autonomia local e a capacidade central de condução é um desafio importante para a gestão transversal do governo. É preciso dar uma atenção específica à conversão de diretrizes políticas estratégicas internacionais, nacionais e subnacionais em medidas que possam ser implementadas nos níveis inferiores. Isso requer atenção ao risco de fragmentação e sobreposição de responsabilidades, assim como a criação de incentivos e apoio para a promoção das mudanças comportamentais necessárias. Além disso, a descentralização não deve ocorrer em detrimento da responsabilização e da estabilidade institucional. As perguntas a seguir devem ser contempladas para se obter a integração política de um objetivo específico. • Há um "catalisador institucional" (ministério, comitê selecionado, etc..) responsável pela execução da estratégia transetorial? • Esse "catalisador" está estrategicamente situado dentro do aparelho do governo (por exemplo, no gabinete Primeiro Ministro)? • São realizadas revisões específicas das leis e regulamentos para verificar se existem conflitos com as prioridades globais e se os principais objetivos estão inseridos na nova legislação e regulamentação? • Existem mecanismos para assegurar feedback efetivo entre os diferentes níveis do governo? • As organizações estão ampliando as perspectivas estritamente setoriais (ex. agricultura, indústria, transporte, etc.) para uma agenda "voltada para questões" (ex. mobilidade, redução da pobreza, etc.)? • Exercícios regulares do governo (ex. processo orçamentário) são utilizados para promover a coerência? • Há uma estrutura clara para avaliar o desempenho das organizações públicas com relação aos objetivos globais? • Existem mecanismos de avaliação e elaboração de relatórios para apoiar a "avaliação da coerência" no setor público (como indicadores de progresso, análise de custo/benefício, avaliação de impacto)? • O governo emprega efetivamente esses mecanismos de avaliação e de elaboração de relatórios? • Os mecanismos externos e independentes de elaboração de relatórios e de auditoria são suficientes? Recomendação IV: suficientemente aberta A gestão do conhecimento deve ser incentivada e 188. São necessários subsídios científicos para o desenvolvimento de políticas, o que requer investimentos em áreas específicas de pesquisa que carecem de evidência científica. Além disso, é essencial melhorar os vínculos entre a comunidade científica e os formuladores de políticas. Iso demandará mudanças nas práticas do governo para avaliar as opções possíveis antes da tomada de decisão. Também são necessários esforços para desenvolver uma avaliação multidisciplinar e holística de custos e benefícios. • Os mecanismos são transparentes, baseados em processos de arbitragem para a gestão de conhecimento complexo e conflitante? • O governo garante a existência de uma estrutura para permitir que as discussões focalizem construtivamente as áreas de divergência, desenvolvendo cenários e opções? • É dedicada atenção suficiente a assegurar que os fluxos de informação entre a comunidade científica e os responsáveis pelas decisões sejam eficientes e efetivos? • As políticas de pesquisa incentivam e facilitam redes de cientistas e apóiam o desenvolvimento de pesquisa articulada entre disciplinas? • São empregados esforços específicos para apoiar o conhecimento voltado para o futuro e relevante para as políticas, especificamente assegurando equilíbrio entre investimentos públicos e privados em pesquisa? 189. Os grupos interessados também devem ser envolvidos nos sistemas de apreciação e avaliação, quando necessário. Informação e comunicação sobre medidas do governo não serão suficientes para tranqüilizar os grupos interessados sobre agendas cada vez mais complexas e controversas. Empresas, sindicatos, ONGs e associações de cidadãos devem ser incentivados a participar ativamente e os governos são responsáveis por garantir que esses processos de consulta e participação sejam efetivamente aproveitados nos processos decisórios. 190. A consulta e a participação públicas não devem ser transformadas em exercícios formais, nem devem ser usadas para justificar o adiamento de decisões quando existem conflitos de interesses nas escolhas das políticas. A ‘cultura’ do governo ainda está evoluindo na direção de abordagens mais participativas, com maior transparência nos processos decisórios. Uma infra-estrutura sólida para a participação do cidadão deve contemplar as seguintes perguntas: • A estrutura legal foi revisada e adaptada para incluir dispositivos jurídicos claros para consulta e participação? • Existem diretrizes claras sobre quando, com quem e como as consultas devem ser realizadas? • A abordagem aplicada ao desenvolvimento das políticas em todos os níveis e nas várias dimensões das questões é a de considerar cada caso isoladamente? E o público também está sendo envolvido nisso? • Existem mecanismos implantados para a avaliação,o feedback da consulta e para monitorar a influência da participação na tomada de decisão? • A transparência está garantida? Por exemplo, informações restritas são a exceção e não a regra, tanto em princípio quanto na prática? • Os mecanismos da transparência estão sendo reforçados nos diferentes níveis do governo para as principais decisões? 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A importância de mecanismos para múltiplos níveis e o papel-chave de aspectos parecem bastante óbvios, por exemplo, quando se considera a agenda de desenvolvimento sustentável. vi Public Sector Modernisation: A ten year perspective, documento da OECD PUMA(2001)13 vii Essa conclusão começa a surgir a partir das recentes considerações da agenda de modernização do Setor Público nos países da OCDE. Ver, por exemplo, o documento da OCDE COV/PUMA(2002)2 viii A OECD está, por exemplo, desenvolvendo um projeto de governo eletrônico que ajudará a identificar algumas das principais conseqüências da revolução da internet para a governança. ix Uma ilustração recente dessa evolução foi fornecida no relatório do governo do Reino Unido sobre “Quality of Life Counts” (2001). Esse relatório pode ser acessado no endereço http://www.sustainable-development.gov.uk/sustainable/quality99/pdf/index.htm x Ver por exemplo documento da OCDE PUM/MPM (2001)2. xi Lei de responsabilidade civil. xii Contudo, essa complexidade institucional é em parte compensada por fórmulas específicas para cooperação entre os três níveis de governo (Confederação, Cantões, e Comunas). Para mais informações: www.desequilibrefiscal.gouv.qc.ca/en/pdf/dafflon.pdf xiii Seminário organizado pela OECD nos dias 22-23 de novembro de 2001 sobre “Melhorar a Governança para o Desenvolvimento Sustentável”. xiv Ver “Adapting Government Practices to the Goals of Sustainable Development” por William M. Lafferty , em documentos do Seminário sobre Melhorar a Governança para o Desenvolvimento Sustentável (22-23 Novembro 2001): http://www.oecd.org/oecd/pages/home/displaygeneral/0,3380,EN-home-333-9-no-no--no,00.html xv Ver, por exemplo, o Checklist on Improving Policy Coherence and Integration for Sustainable development. da OCDE, Op. Cited. xvi Referência: GOV/PUMA/MPM(2002)5 xvii Evaluation of the Progress of the Strategic Modernisation Initiative/ Delivering Better Government Modernisation Programme, Dublin. http://www.taoiseach.gov.ie/department/publications.asp?lang=ENG&loc=21 xviii Os primeiros quatro pontos são sugeridos também em Bouckaert et.al., 2000 xix Ver, por exemplo, a definição de integração de políticas ambientais em ADB 2001 : “A integração de políticas é definida aqui como a criação de instituições, recursos e ferramentas de políticas que permitam aos atores econômicos responder positivamente às pressões por melhor desempenho ambiental a custos econômicos e sociais mais baixos”. xx O antigo Departamento para o Meio Ambiente e o Transporte xxi Esse ponto foi ressaltado num documento de apoio a este relatório “Sustainable agriculture in the UK” (por J. Medhurst, GHK, Birmingham, RU). xxii Esse ponto também foi ressaltado numa contribuição a este relatório “critical factors for improving policy coherence” (por P. Virtanen, Net Effect, Helsinque, 2002). xxiii a Ver, por exemplo, o documento preparado para as discussões na 26 reunião do Comitê de Gestão Pública [GOV/PUMA(2002)1] xxiv É difícil captar uma definição universalmente aceita de organizações. Uma definição comum de organizações é a de um grupo de pessoas que trabalham juntas para atingir objetivos específicos. A literatura também sugere que as organizações são mais do que uma mera coleção de pessoas e processos, mais do que a soma de suas partes. xxv Estudos de caso de governança para desenvolvimento sustentável revisaram as experiências do Canadá, Alemanha, Japão, Países Baixos e Reino Unido (2002a) xxvi Ver documento da OECD: GOV/PUMA/HRM(2003)2
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