Direito eleitoral e democracia
Transcrição
Direito eleitoral e democracia
M arcus Vinícius F u rta d o Coelho W alber de M o u ra A g ra (Coordenadores) Prefácio: O phir Cavalcante Junior DIREITO ELEITORAL E DEMOCRACIA Desafios e Perspectivas Editora CONSELHO FEDERAL J O r d e m d o s A d v o g a d o s d o B r a s i l - C o n s e l h o F ed eral Gestão 2010/2013 D ir e t o r i a O p h i r C a v a lc a n te J unio r P r e s id e n te A l b e r t o d e Pa u la M a c h a d o V ic e - P r c s id c n t e M arcus V in ic iu s Fu rtado C o ê lh o S e c r e lá r io - G e r a l M ár c ia M el a r é S e c r e tá r ia - G e r a l A d j u n t o M iguel  n gelo Cançado D ir e to r - T e s o u r e i r o C o n s e l h e i r o s Fe de r a is AC: C e s a r A u g u s to B a p tis ta d e C a r v a lh o , R e n a to C a s te lo d e O liv e ira e T ito C o s ta d e O liv e ira ; AL: F e lip e S a r m e n to C o r d e ir o , M a r c e lo H e n r i q u e B ra b o M a g a lh ã e s e P a u lo H e n r i q u e F a lc ã o U rêda; A P: A d a m o r d e S o u z a O liv e ira , S a n d r a d o S o c o r r o d o C a r m o O liv e ira e V e ra d e Jesu s P in h e ir o ; A M : Jean C le u te r S im õ e s M e n d o n ç a , José A lb e r to R ib e iro S im o n e tti C a b r a l c M iq u c i a s M a tia s F e r n a n d e s ; BA: D u r v a l J u lio R a m o s N e to , L u iz V ia n a Q u e i r o z e M a r c e lo C i n t r a Z a r i f ; C E: H é r c u l e s S a r a i v a d o A m a r a l , J o s é D a n i l o C o r r e i a M o t a e P a u l o N a p o l e à o G o n ç a l v e s Q u e z a d o ; D F : D a n i e l a R o d r i g u e s T e i x e i r a , D é l i o F o r t e s l . i n s e S ilv a c M e i r e L ú c i a G o m e s M o n t e i r o M o t a C o e l h o ; ES: D j a l m a F r a s s o n , L u i z C l á u d i o S ilv a A l l e m a n d e S e te m b rin o Id w a ld o N e tto P elissari; G O : F e lic ís s im o S en a, lo ã o B ez e rra C a v a lc a n te e M ig u e l  n g e lo C a n ç a d o ; M A : José G u ilh e r m e C a r v a l h o Z a g a llo , R a i m u n d o F e rr e ir a M a r q u e s e U lis se s C é s a r M a r tin s d e S o u s a ; M T: F r a n c is c o A n is F a la d , F r a n c is c o E d u a r d o T o r r e s H s g a ib e j o s é A n t o n i o T a d e u G u i l h e n ; M S : A f e i f e M o h a m a d H a jj, C a r m e l i n o d e A r r u d a R e z e n d e e José S e b a s tiã o E s p ín d o la ; M G : José M u rilo P r o c ó p io d e C a r v a lh o , P a u lo R o b e r t o d e G o u v e a M e d i n a e R a i m u n d o C â n d i d o J u n i o r ; P A: A n g e l a S e r r a S a le s , F r e d e r i c o C o e l h o d e S o u z a e R o b e r t o L a u ria ; P B : G e n i v a l V e l o s o d e F r a n ç a F i l h o , V i t a l B e z e r r a L o p e s e W a l t e r A g r a J ú n i o r ; PR : A l b e r t o d e P a u l a M a c h a d o , R e n é A r i e l D o t t i e R o m e u F e lip e B a c e l l a r F i l h o ; PE : J a y m e J e m i l A s f o r a F i l h o , L e o n a r d o A c c i o l y d a S il v a e P e d r o H e n r i q u e B r a g a R e y n a l d o A lv e s ; PI : J o s é N o r b e r t o L o p e s C a m p e i o , M a r c u s V i n i c i u s F u r t a d o C o ê l h o e W i l l i a n G u i m a r ã e s S a n t o s d e C a r v a l h o ; RJ: C a r l o s R o b e r t o S i q u e i r a C a s t r o , C l á u d i o P e r e i r a d e S o u z a N e to e M a r c u s V in ic iu s C o r d e ir o ; RN: L u c io T e ix e ira d o s S an to s, S érg io E d u a rd o d a C o s t a F r e i r e e W a g n e r S o a r e s R i b e i r o d e A m o r i m ; RS : C l e a C a r p i d a R o c h a , L u i z C a r l o s L e v e n z o n e R e n a t o d a C o s t a F i g u e i r a ; RO : C e l s o C e c c a t t o , G i l b e r t o P i s e l o d o N a s c i m e n t o e O r e s t e s M u n i z F ilh o ; RR: E d n a ld o G o m e s V id a l, F r a n c is c o d e A ss is G u i m a r ã e s A lm e id a e M a r y v a l d o B a s s a l d e F r e i r e ; SC: P a u l o M a r c o n d e s B r i n c a s . R a f a e l d e A s s is H o r n e W a l t e r C a r l o s S e y t f e r t h ; SP: A r n o l d o W a l d F i l h o , G u i l h e r m e O c t á v i o B a t o c h i o e M á r c i a M e l a r é ; SE: H e n r i C la y S a n t o s A n d r a d e . V a l m i r M a c e d o d e A r a u j o e M i g u e l L d u a r d o H r i t t o A r a g ã o ; TO : A n to n i o P im e n te l N e to , M a n o e l B o n fim F u r t a d o C o r r e i a e M a u r o José R ib a s. E x - P r e si d e n te s I. L e v i C a r n e i r o ( 1 9 3 3 / 1 9 3 8 ) 2. F e r n a n d o d e M e l o V i a n a ( 1 9 3 8 / 1 9 4 4 ) 3. R a u l F e r n a n d e s ( 1 9 4 4 / 1 9 4 8 ) 4. A u g u s t o P i n t o L i m a ( 1 9 4 8 ) 5. O d i l o n d e A n d r a d e ( 1 9 4 8 / 1 9 5 0 ) 6. H a r o l d o Valladão (1950/1952) 7. A ttílio V iváqua (1952/1954) 8. M iguel Seabra Fagundes ( 1 9 5 4 / 1 9 5 6 ) 9 . N e h e m i a s G u e i r o s ( 1 9 5 6 / 1 9 5 8 ) 10. A l c i n o d e P a u l a S a l a z a r ( 1 9 5 8 / 1 9 6 0 ) I I . J o s é E d u a r d o d o P. K e l l y ( 1 9 6 0 / 1 9 6 2 ) 12 C a r l o s P o v i n a C a v a l c a n t i ( 1 9 6 2 / 1 9 6 5 ) 13. T h e m í s t o c l e s M . F e r r e i r a ( 1 9 6 5 ) 14. A l b e r t o B a r r e t o d e M e l o ( 1 9 6 5 / 1 9 6 7 ) 15. S a m u e l V i t a l D u a r t e ( 1 9 6 7 / 1 9 6 9 ) 16. L a u d o d e A l m e i d a C a m a r g o ( 1 9 6 9 / 1 9 7 1 ) 17. *J os é C a v a l c a n t i N e v e s ( 1 9 7 1 / 1 9 7 3 ) 18- J o s é R i b e i r o d e C a s t r o F i l h o ( 1 9 7 3 / 1 9 7 5 ) 19. C a i o M á r i o d a S i l v a P e r e i r a ( 1 9 7 5 / 1 9 7 7 ) 20. R a y m u n d o F a o r o ( 1 9 7 7 / 1 9 7 9 ) 21, ^ E d u a r d o S e a b r a F a g u n d e s ( 1 9 7 9 / 1 9 8 1 ) 22. *J. B e r n a r d o C a b r a l ( 1 9 8 1 / 1 9 8 3 ) 2 3 . ' M á r i o S é r g i o D u a r t e G a r c i a ( 1 9 8 3 / 1 9 8 5 ) 24. ■ " H e r m a n n A s s i s B a e t a ( 1 9 8 5 / 1 9 8 7 ) 2 5 . ' M á r c i o T h o m a z B a s t o s ( 1 9 8 7 / 1 9 8 9 ) 26. " O p h i r F i l g u e i r a s C a v a l c a n t e ( 1 9 8 9 / 1 9 9 1 ) 2 7 . ‘ M a r c e l l o L a v e n è r e M a c h a d o ( 1 9 9 1 / 1 9 9 3 ) 2 8 . *J os é R o b e r t o B a t o c h i o ( 1 9 9 3 / 1 9 9 5 ) 2 9 . ‘ E r n a n d o U c h o a L i m a ( 1 9 9 5 / 1 9 9 8 ) 30. * R e g Í n a I d o O s c a r d e C a s t r o ( 1 9 9 8 / 2 0 0 1 ) 31. ’ R u b e n s A p p r o b a t e M a c h a d o ( 2 0 0 1 / 2 0 0 4 ) 32. ' R o b e r t o A n t o n i o B u s a t o ( 2 0 0 4 / 2 0 0 7 ) 33. * C e r a r B r i t t o ( 2 0 0 7 / 2 0 1 0 ) M e m b r o s H o n o r á r i o s V italício s Ordem dos Advogados do Brasil Conselho Federal DIREITO ELEITORAL E DEMOCRACIA Desafios e Perspectivas 9Ái Editora CONSELHO FEDERAL © Ordem dos Advogados do Brasil Conselho Federal, 2010 Setor de A utarquia Sul - Q uadra 5, Lote 1, Bloco M Brasília, DF - C E P 70070-939 E ditoração e distribuição G erência de Relações Externas/Biblioteca Fones; (61 )2 1 9 3 -9 6 6 3 e 2 193-9605 Fax: (61 )2 1 9 3 -9 6 3 2 e-mail: biblioteca@ oab.org.br Tiragem: 500 exem plares Capa Sergio Ricardo da C unha Freitas O rganização A line M achado C osta Timm Im pressão N o va Letra Gráfica e Editora FIC H A CA TA LOG RÁ FICA Direito eleitoral e dem ocracia: desafios e perspectivas / Marcus Vinícius Furtado Coêlho, Walber de M oura A gra (coordenadores). - Brasília: OAB, Conselho Federal, 2010. 326p. ISBN 978-85-7966-004-7 O A B -C F/G R E /B IB L IO TE C A Sumário P R E F Á C I O ..................................................................................................................................... 7 A IN E L E G IB IL ID A D E C O M O C O N S E Q Ü Ê N C IA D A R E JE IÇ Ã O DAS CONTAS A d r i a n o S a n tA n a P e d r a / A n d e r s o n S a n t A n a P e d r a .................................................. 9 A A R E N A I N C L U S IV A C O M O M O D E L O D E D E M O C R A C I A A n d r é R a m o s T a v a r e s .............................................................................................................41 O P IN Ià O LEGA L C a rlo s M á r io d a Silva V e l l o s o ............................................................................................69 A R E P Ú B L IC A E O S F IC H A S SUJA S D ja l m a P i n t o ...............................................................................................................................75 I N C L U S à O E L E IT O R A L D A S P E S S O A S C O M D E F I C I Ê N C I A F áb ia L im a d e B rito D a m i a / L u iz A lb e r to D a v id A r a u j o ...................................... 95 BREVES A N O T A Ç Õ E S SOBRE O EXCESSO D E D O A Ç Õ E S DE REC UR SO S P A R A C A M P A N H A S E L E IT O R A I S F e r n a n d o N ev e s d a S i l v a .....................................................................................................121 A O R I G E M D O S IS T E M A E L E IT O R A L P R O P O R C I O N A L N O B R A SIL G ilb e r t o B e r c o v i d .................................................................................................................. 127 P O L ÍT IC A , S O N E G A Ç Ã O E F IN A N C IA M E N T O D E C A M P A N H A S H é lio Silvio O u r é m C a m p o s / G u s ta v o P o n t e s ........................................................ 139 P A R L A M E N T A R IS M O E P R E S ID E N C IA L IS M O Ives G a n d r a d a Silva M a r t i n s ............................................................................................ 149 L EI C O M P L E M E N T A R N . 135. E SUA A D E Q U A Ç Ã O A O P R I N C Í P I O C O N S T IT U C IO N A L P R E S U N Ç Ã O DE IN O C Ê N C IA Jan ine A c c io ly ............................................................................................................................ 159 R E F L E X Õ E S D O U T R I N Á R I A S E J U R I S P R U D E N C I A I S S O B R E O ART. 4 1 - A D A L EI N . 9 .5 0 4 /9 7 José A u g u s to D e l g a d o ..........................................................................................................171 S U S PE N Sà O E PE R D A D O S D IR E IT O S P O L ÍT IC O S Luiz V ia n a Q u e i r o z ................................................................................................................189 o PROBLEM A D A ( S U B )R E P R E S E N T A Ç Ã O P O L Í T I C A D A M U L H E R : U M T E M A C E N T R A L N A A G E N D A P O L ÍT IC A N A C IO N A L M a r ia C la u d ia B u c c h ia n e ri P in h e i r o ........................................................................... 209 O S L IM IT E S D A P R O P A G A N D A E L E IT O R A L E SU A F U N Ç Ã O N A D E M O C R A C IA M a r c u s V in ic iu s F u r ta d o C o ê l h o ................................................................................... 221 F I N A N C I A M E N T O D O S P A R T ID O S P O L Í T I C O S E D A S C A M P A N H A S E L E IT O R A IS P a lh a re s M o r e ir a R e is........................................................................................................... 227 F I D E L I D A D E P A R T ID Á R IA R ic a rd o L e w a n d o w s k i.......................................................................................................... 263 IN V E S T IG A Ç Ã O JU D IC IA L E L E IT O R A L POR ABUSO DE PODER E C O N Ô M IC O O U A B U SO D E P O D E R P O L ÍT IC O Silvio R o m e r o B e l t r ã o .......................................................................................................... 269 E L E IÇ Õ E S 2 0 1 0 - “F I C H A SUJA” & Q U E S T Õ E S C O N S T I T U C I O N A I S T h ales T ác ito P o n te s L u z d e P á d u a C e r q u e i r a .......................................................... 287 C A P T A Ç Ã O I L ÍC IT A D E A R R E C A D A Ç Ã O E G A S T O S . A N Á L IS E D O ART. 3 0 - A D A L EI E L E IT O R A L W a lb e r d e M o u r a A g r a ........................................................................................................2 97 IN F E D E L ID A D E P A R T ID Á R IA : A T IV IS M O JU D IC IA L E FE IT O S E C O N S E Q Ü Ê N C IA S PA R A OS SU PL E N T E S W a lte r d e A g r a J ú n i o r ......................................................................................................... 311 PREFÁCIO São inúm eras as contribuições a que se presta a presente obra no contexto dos intensos debates acerca das mais recentes transformações políticas e sociais de nosso País. C om referências doutrinárias dos mais renom ados formuladores do Direito Eleitoral contem porâneo, este será, sem dúvida, um im portante instrum ento para quem lida diaria m ente com dem andas nessa área, além de constituir fonte perm anente de pesquisa junto à com unidade jurídica, o que só enaltece a iniciativa de publicação do Conselho Federal da OAB, com o apoio da Escola Judiciária do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Deve-se ressaltar que a escolha do tem a em ano eleitoral de um a das maiores democracias do planeta, levando às urnas cerca de 150 milhões de brasileiros, é particularm ente oportuna, adotandose, na formulação do conjunto da obra, um a zetética abrangente, di versificada, sob o prism a crítico de advogados de intensa militância, alguns dos quais com passagem na atividade julgadora do TSE, além daqueles cujo trabalho é marco referencial entre os operadores de Direito. Questões teoréticas de profunda im portância para com pre ensão da legislação eleitoral aqui são analisadas com peculiar sabe doria p o r mestres com o A ndré Ramos Tavares, ao tratar da dem o cracia; Ives G andra M artins, num a análise dos sistemas parlam enta rista e presidencialista; Gilberto Bercovici, sobre a origem do siste m a proporcional de votos; e, da lavra do Secretário-Geral de nossa entidade, M arcus Vinicius Furtado Coêlho, os Hmites da propaganda eleitoral e sua função para o postulado da igualdade dem ocrática. Não podem os deixar de mencionar, ainda, as preciosas reflexões do exm inistro Carlos M ário Velloso acerca da possibilidade de reeleição de quem ocupa cargo de governador seis meses antes da eleição; a inves tigação judicial eleitoral, de Silvio Romero; além do excesso de doação nas cam panhas, do tam bém ex-m inistro Fernando Neves. Nesse rol de contribuições inclui-se o atual presidente do TSE, m inistro Ricardo Lewandoswski. Desse modo, o trabalho se insere inevitavelmente no grande de bate dem ocrático cujo envolvimento da sociedade organizada, num 7 m ovim ento de baixo para cima, tem sido fundam ental para dar mais transparência e legitimidade às eleições. São exemplos notáveis a legis lação que refreia o abuso do poder econômico, a com pra de votos, os excessos da propaganda eleitoral, e, mais recente, a que desmascara os malfeitores disfarçados de políticos, apropriadam ente batizada de Lei da Ficha Limpa. Todas essas medidas resultaram de proposições de iniciativa p o p u lar encabeçadas p o r entidades representativas da sociedade civil, dentre as quais, com sobeja honra, a O rdem dos Advogados do Brasil. Com segurança, pode-se afirm ar que raras publicações reúnem, com o esta, um a cátedra tão diversificada de mestres do Direito com en tando matérias consideradas essenciais ao pleno exercício da cidadania, ao desenvolvimento de nossa dem ocracia e ao aprim oram ento do ar cabouço jurídico eleitoral. Se após sua leitura novos entendim entos se firmarem, respeitando-se as opiniões divergentes, como é peculiar (e necessário) nos embates intelectuais democráticos, então o objetivo da obra terá sido alcançado. O PH IR CAVALCANTE JUNIOR Presidente do Conselho Federal da OAB A IN EL EG IB ILID A D E C O M O CO NSEQ Ü ÊN CIA DA REJEIÇÃO DAS CONTAS A d r i a n o S a n t ’A n a P e d r a ' A n d e r s o n S a n t ’A n a P e d ra - SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 A elegibilidade com o direito político e a m oralidade administrativa; 3 Conceito e natureza da inelegibilidade; 4 Inelegibilidade decorrente da rejeição das contas; 5. Requisitos configuradores da inelegibilidade prevista no art. 1°, I, g, da LC 64; 5.1 Rejeição das contas; 5.2 Decisão proferida p o r órgão competente; 5.3 Irrecorribilidade da decisão; 5.4 Irregularidade insanável; 5.5 Prazo qüinqüenal; 5.6 Inexistência de ação judicial questionando a rejeição das contas; 6 Considerações Anais; 7 Referências bibliográficas. PALAVRA-CHAVE: direitos fundam entais; inelegibilidade; rejeição de contas. 1. IN TR O D U Ç Ã O Aproximando-se as eleições, os Tribunais e Conselhos de Contas de todo o país têm um a incum bência de extrem a relevância determ ina da pelo art. 11, § 5°, da Lei n" 9.504, de 30.09.1997, de tornar disponível à Justiça Eleitoral, até o dia 05 de julho do ano em que se realizam as eleições, a relação daqueles que tiveram suas contas relativas ao exer cício de cargos ou funções públicas rejeitadas p o r irregularidade insa nável e por decisão irrecorrível do órgão com petente, ressalvados os casos em que a questão estiver sendo subm etida à apreciação do Poder Judiciário, ou que haja sentença judicial favorável ao interessado. 1 2 D o u tu r e m D ireito d o E stado (P U C -S F). M estre em D ireitos e G a ra n tia s C o n stitu c io n a is E u n d a m e n tais (FDV-ES). M estre e m Física (UFES). Pro fesso r d e D ire ito C o n stitu c io n a l d a F a cu ld ad e d e D ireito d e V itória (g radu ação , especialização e m e stra d o ). Professor d a Escola d a M ag istra tu ra d o Espírito Santo (EMES). P r o c u r a d o r Federal. E-mail: a d ria n o p e d ra @ ig .c o m .b r; D o u to ra n d o e m D ireito d o E sta d o (P U C -S P). M estre em D ireito (FD C -R J). Especialista e m D ireito P ú b lico pela C o n s u ltim e /C á n d id o M endes/ES. Pro fesso r e m p ó s -g ra d u a ç ã o d e D ireito C o n stitu cio n al e A dm in istrativ o. C o o r d e n a d o r A c ad ê m ic o d a Escola S u p e rio r d a PGEES. Ex -C hefe d a C o n su lto ria Jurídica d o TCEES. P r o c u r a d o r d o E sta d o d o E sp írito Santo. A dvogado. E-mail: a sp ed ra@ ig .co m ,br 9 o cum prim ento deste com ando visa a inform ar à Justiça Eleitoral os cidadãos que estão com sua elegibilidade com prom etida p o r força do art. 1®, L ^ d a Lei C om plem entar n" 64, de 18.05.1990 (LC 64). C o n tudo, p o r mais que possa parecer claro este com ando, vários requisitos deverão ser analisados para sua execução até que a Justiça Eleitoral con signe com o inelegível determ inado candidato. Dessa forma, sem a pretensão de esgotar o assunto, buscar-se-á fazer um a abordagem do tem a de acordo com a visão doutrinária e jurisprudencial, analisando os requisitos configuradores da inelegibilidade prevista no art. 1°, I, g, da LC 64. De partida, deve-se esclarecer que não se está aqui a visitar o art. 37, § 4° da Constituição brasileira de 1988 (CRFB), que prevê a suspensão dos direitos políticos caso ocorra a prática de atos de improbidade administra tiva, um a vez que este dispositivo trata de condenações em processos judi ciais cuja decisão deixe claro a sanção aplicada (art. 12 da Lei n° 8.429/92). Afirma-se isto pois, para alguns, p o r força dos arts. 15, V e 37, § 4°, da CRFB, um a conduta proba já é requisito essencial para a elegi bilidade, não se podendo considerar elegível um cidadão que teve suas contas rejeitadas pelo Órgão Legislativo^ e/ou pelo Tribunal de Contas, simplesmente porque ajuizou ação ordinária de anulação (ou desconstituição) de prestação de contas." 2. A ELEGIBILIDADE COMO D IR E IT O P O L ÍT IC O E A M ORALIDADE A DM INISTRATIVA Os direitos políticos constituem o p od er que os cidadãos ativos têm de participar direta ou indiretam ente das decisões do seu Estado. Os direitos políticos são direitos públicos subjetivos que investem o in divíduo no status activae dvitatis, constituídos de instrum entos que vi sam disciplinar as formas de atuação da soberania popular, perm itindo o exercício da liberdade de participação nos negócios políticos do Estado. N a lição de Pim enta Bueno, direitos políticos são 3 4 N este tra b a lh o será utilizada a ex p ressão “Ó rg ã o Legislativo” p a ra re p re s e n ta r as C â m a r a s M unicipais, as A ssem blcias Legislativas o u o C o n g re ss o N acional, e sp e c ia lm e n te c o m o p ro p ó s ito d e n ã o d a r azo à d iscu ssão d e q u e os Tribunais d e C o n ta s in te g ra m (o u n ã o ) o P o d e r l egislativo - d iscu ssão estéril para 0 q u e p re te n d e esse trabalho. FIN T O , D jalm a. Direito eleitoral: a n o ta çõ e s e tem as polêm icos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 94-96. 10 prerrogativas, atributos, faculdades, ou p o d er de intervenção dos cidadãos ativos no governo de seu país, intervenção direta ou indireta, m ais ou m enos ampla, segundo a intensidade do gozo desses direitos. São o Jus Civitatis, os direitos cívicos, que se referem ao Poder Público, que autorizam o cidadão ativo a participar na form ação ou exercício da autoridade nacional, a exercer o direito de vontade o u eleitor, o direito de d eputado ou senador, a o cu p a r cargos politicos e a m anifestar suas opiniões sobre o governo do E sta d o \ Conform e preceitua a Constituição brasileira de 1988, em seu art. 14, caput, a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto esecreto, com valor igual para todos e, nos term os da lei, m ediante plebiscito, referendo e iniciativa popular. Nos term os da Constituição brasileira, é possível elencar com o direitos políticos o di reito de sufrágio, o direito de votar em eleições, plebiscitos e referendos, a iniciativa popular, a ação popular, a organização e participação de partidos políticos, bem com o a elegibilidade. A elegibilidade é o direito subjetivo público que detém o cida dão para subm eter o seu nom e à apreciação dos seus iguais, postulando a designação para um m andato político no Legislativo ou no Executivo, m ediante a sufragação popular. Na lição de Luiz Pinto Ferreira, a elegibilidade é a capacidade de ser eleito, a qualidade de u m a pessoa que é elegível nas condições perm itidas pela legislação. A elegibilidade é, n a restrita precisão legal, o direito do cidadão de ser escolhido m ediante votação direta ou indireta p ara representante do povo ou d a com unidade, segundo as condições estabelecidas pela Constituição e pela legislação eleitoral^ A verificação da elegibilidade de um cidadão é conditio sine qua non para a efetivação de u m a candidatura, sendo necessária ainda a conveniência pessoal do cidadão e do partido político ao qual se ache filiado, que deverá subm etê-lo à convenção partidária para a escolha dos seus candidatos. Todavia, com o não existem direitos absolutos, a elegibilidade 5 6 BUF.NO, P im en ta . Direito público brasiieiro e análise da constituição do império. Rio d e laneiro: N ova Edição. 1958, p. 459. FERREIRA, Luiz Pinto. Princípios gerais do direito constitucional m oderno. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1983,v. l , p . 364. 11 tam bém não o será. A própria Constituição brasileira de 1988 prescre ve a possibilidade de serem estabelecidos casos de inelegibilidade a fim de proteger a probidade adm inistrativa e a m oralidade para o exercício do m andato (art. 14, § 9“). Deve-se esclarecer que a hipótese de inelegibilidade pela rejeição das contas não tem por efeito a suspensão dos direitos políticos^. São institutos com conseqüências totalm ente diferentes. A suspensão dos direitos políticos é a privação tem porária do direito de votar e de ser vo tado, enquanto que a inelegibilidade é a sanção que im pede a obtenção da elegibilidade (direito de ser votado). Assim, não há superfície para se falar em suspensão dos direitos políticos quando se tratar de rejeição das contas nos term os do art. 1®, I, g da LC 64, sob pena de lhe atribuir efeito jurídico que ela é despida.^ Essa distinção é importante, pois a rejeição das contas em razão de irregularidades insanáveis não autoriza a perda do cargo ou mandato, mas apenas a suspensão da participação nas eleições nos cinco anos seguintes. 3. C O N C E ITO E NATUREZA DA INELEGIBILIDADE Nas palavras de Luiz Pinto Ferreira, “a inelegibilidade é o con trário da elegibilidade”^ A inelegibilidade"^ se configura pela inaptidão jurídica para receber voto, obstando, dessa forma, a existência da can didatura. Segundo a lição de Carlos M ário da Silva Velloso e W alber de M oura Agra, “inelegibilidade é a impossibilidade de o cidadão ser eleito para cargo público, em razão de não p od er ser votado, im pedindo-o de exercer seus direitos políticos de form a passiva"", não obstante p erm a necer intacto sua cidadania ativa, ou seja, o direito de votar nas eleições. 7 8 9 10 11 N a tu ra lm e n te q u e o a to q u e e n sejo u a rejeição das c o n ta s p o d e rá e n se ja r a a ção p rev ista n o art. 17 d a Lei n° 8.429/92, c o m a finalidade d e d e clarar a im p ro b id a d e a d m in istra tiv a d o agente público. O o rd e n a m e n to ju ríd ic o b rasileiro a trib u i d iversos efeitos à im p ro b id a d e a d m in istra tiv a , d e n tre os quais se p o d e c ita r o d a s u sp e n sã o d e d ire ito s políticos pelo p ra z o prev isto n a sen te n ç a judicial. Cf. nesse sentido: C OSTA, A d ria n o Soares. Instituições de direito eleitoral. 3. ed. Belo H orizonte: Del Rey, 2000, p. 161, q u e registra a in d a n a m e s m a págiiia: "Afirmar, c o n so a n te fez o a r e s t o d o STlque essa n o r m a d a LC 64/90 im p u ta a p e rd a d o s d ire ito s políticos, é e m p o lg á -la in d e v id a m e n te, a trib u in d o -lh e efeito q u e ela n ã o tem.” FERREIRA, Luiz Pinto. Princípios gerais do direito íonstifuciona! m o derno , p. 364. N ã o se deve c o n fu n d ir inelegibilidade c o m in c o m p atib ilidad e. A p rim e ir a im p e d e a lg u é m de scr c a n d id ato , a seg u n d a p e rm ite a c a n d id a tu ra , m a s im p õ e a e sco lh a e n tre o m a n d a to eletivo e a atividade tid a p o r incom patível. VELLOSO, C arlo s M ário d a Silva; A G RA , W alber d e M o u ra . Elem entos d e direito eleitoral. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 36. 12 Pode-se afirmar que a inelegibilidade é a ausência de capacidade eleitoral passiva, ou seja, a inexistência do direito de ser votado, consti tuindo assim um a restrição ao status de cidadania ativa. As hipóteses de inelegibilidade estão elencadas diretam ente na Constituição ou rem etidas p o r ela a um elenco a ser trazido em lei com plem entar - Lei C om plem entar n “ 64, de 18.05.1990 (LC 64). Merece ser destacado que “as inelegibilidades devem ser expressas. As inelegibilidades, que são vedações ou proibições constitucionais ao direito de ser eleito ou à capacidade eleitoral passiva, devem ser expressas"'^. As norm as constitucionais concernentes à inelegibilidade são de eficácia plena, o que perm ite a sua im ediata aplicação. C ontudo a C ons tituição brasileira de 1988, no seu art. 14, § 9°, autorizou que lei com plem entar prescrevesse outras causas de inelegibilidade. Nesse passo, merece que sejam lançadas luzes sobre a LC 64, que traz hipóteses infraconstitucionais de inelegibilidade. Antes, contudo, é imprescindível a verificação das situações de inelegibilidade previstas constitucionalmente. Calha frisar que a norm ativa infraconstitucional somente p o d e rá criar novas hipóteses de inelegibilidade se estas m ostrarem -se como desdobram entos daqueles originariam ente previstos na CRFB. Tais restrições não podem implicar norm as violadoras do princípio d em o crático, mas, pelo contrário, devem servir de aprim oram ento da d em o cracia, sob pena de inconstitucionalidade a ser expurgada do o rdena m ento jurídico. Para o que interessa para análise, é trazido o seguinte trecho do texto constitucional: Art. 14. A soberania p o p u lar será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, co m valor igual para todos, e, nos term os da lei, mediante: [...] § 9" Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de m andato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.” 12 13 FERREIRA, Luiz Pinto. Princípios gerais do direito constitucional m odern o, p. 371. R ed a ç ã o d a d a pela E m en d a C o n stitu cio n al d e R ev isão n" 4, de 0 7 d c ju n h o de 1994. 13 Com o se pode perceber, o legislador constituinte atribuiu à lei com plem entar a possibilidade de estabelecer outros casos de inelegibilidade a fim de proteger a probidade adm inistrativa, a m oralidade para exercício de m andato considerada a vida pregressa do candidato. Com supedâneo no texto do art. 14, § 9° da CRFB, alguns juristas vêm extraindo um entendim ento de que basta um a rejeição das contas, sem a necessidade de verificar se foi p o r órgão com petente ou não, ou que haja um a ação civil pública p o r im probidade adm inistrativa, m es m o sem que haja condenação com o trânsito em julgado, para se ter configurada a inelegibilidade do cidadão, tendo em vista que a CRFB repudia a elegibilidade de pessoas ímprobas em hom enagem ao princí pio da m oralidade administrativa. Não se nega que a Constituição brasileira realmente repudie a elegibilidade de pessoas ímprobas. Contudo, ao assim dispor, o legis lador constituinte fez nítida opção em atribuir à lei com plem entar o condão de estabelecer os casos de inelegibilidade. Alguns juristas'^ ainda entendem que, em razão do art. 14, § 9° da CRFB prescrever que para a elegibilidade deve ser “considerada a vida pregressa do candidato”, existiria razão de per si para que a Justiça Elei toral considerasse inelegível aquele candidato que estiver envolvido (ou que seja suspeito) em qualquer ato de improbidade, pouco im portando se há ou não condenação com trânsito em julgado. Com todo o respeito àqueles que advogam tese em contrário, deve-se considerar que, do mesm o m odo que a CRFB homenageia o princípio da m oralidade adm inistrativa, tam bém festeja os princípios da legalidade, da presunção de inocência e do devido processo. Dessa forma, não se pode fazer um a leitura fracionada da C ons tituição, perscrutando apenas dispositivos constitucionais isolados (art. 14, $ 9^*; art. 15, V; art. 37, § 4°), para se “buscar” um a conclusão de que o texto constitucional abom ina um com portam ento ímprobo, e pronto. É certo que a Constituição brasileira repudia u m com portam ento ímprobo. Contudo, essa m esm a Constituição tam bém estabelece que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido p ro cesso legal” (art. 5°, LIV), que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar 14 PIN T O , D jaim a. Direito eleitoral', an o ta çõ e s e te m a s polêm icos, p. 109-111, 14 de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (art. 5°, II), e que “n in guém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5°, LVII). Por tudo isso, é necessário que sejam ponderados os interesses trazidos pela Constituição brasileira de 1988, e é isso que será feito no tópico que se segue. 4. INELEGIBILIDADE DECORRENTE DA REJEIÇÃO DAS CONTAS As hipóteses de inelegibilidade elencadas pela LC 64 decorrem de situação jurídica personalizada que devem ser verificadas com zelo de m odo a não com prom eterem n enhum valor sobranceiro do Texto Constitucional. Neste trabalho a hipótese de inelegibilidade a ser anali sada é a do art. 1°, I, g da LC 64. Q ualquer pessoa que tenha exercido cargo, emprego ou função pública e que tenha tido suas contas rejeitadas pode se subsum ir ao enunciado norm ativo prescrito no art. P , I, g, da LC 64, senão vejamos: Art. 1" São inelegíveis: I - p ara qualquer cargo; 1...1 g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas p o r irregularidade insanável e p o r decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se a questão houver sido o u estiver sendo subm etida à apreciação do Poder ludiciário, para as eleições que se realizarem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir d a data da decisão; De partida, pode-se afirm ar que a inelegibilidade prevista no dis positivo trasladado é efeito anexado à decisão irrecorrível de natureza não judicial, cujo conteúdo rejeita contas prestadas por quem exerceu fun ção pública, contaminadas que estavam por irregularidade insanável.*' Vê-se tam bém que se trata, na verdade, de um manancial n or mativo, já que do enunciado retro extrai-se inúm eras norm as que m e recem ser analisadas dentro de um sistema norm ativo sistematizado, já que a norma pode ser expressa p or meio de diferentes enunciados 15 CO STA , A d ria n o Soares. Instituições de direito eleitoral, p. 158. 15 normativos'^y e de um enunciado norm ativo podem ser extraídas diver sas norm as/^ A norma é na verdade o significado de um ou de vários enunciados normativos. Nesse passo, cuidar-se-á agora das norm as que podem ser extra ídas do art. 1 ,1, g da LC 64, que serão abordadas aqui com o requisitos que devem ser verificados para se ter configurada a inelegibilidade p re vista no m encionado dispositivo. 5. REQ U ISITOS CO N FIG U R A D O R ES DA INELEGIBILIDADE PREVISTA N O ART. 1«, I , ^ d a LC 64 Para se ter configurada a hipótese de inelegibilidade não basta simplesmente que as contas tenham sido rejeitadas, mas se m ostra for çoso verificar os requisitos cumulativos a seguir analisados. 5.1. REJEIÇÃO DAS CONTAS O prim eiro ponto que merece destaque é a delimitação do que vem a ser “contas rejeitadas”. Analisando o Texto Constitucional, nota-se que aos Tribunais de C ontas'^ incubem , dentre outras, as seguintes competências: Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do T ribunal de Contas d a União, ao qual compete: I - apreciar as contas prestadas anualm ente pelo Presidente d a República, m ed ian te parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento; 16 É n ã o é in c o m u m q u e a n o r m a seja e n c o n tra d a a p a r tir d e e n u n c ia d o s n o rm a tiv o s c o n stantes d e d i p lo m a s legislativos diferen tes (CRFB, Leis C o m p le m e n tares , Leis O rd in á ria s e d e m a is in s tru m e n to s n o rm a tiv o s) - é o q u e se intitula d e interpretação sistemática. N esse s e n tid o cf.i PE D RA , A n d e rso n Sant’A na. O controle da proporcionalidade dos atos legislativos: a h e rm e n ê u tic a co n stitu cio n al c o m o in s tru m e n to . Belo H orizo nte: D el Rey, 2006, p. 144-148, p a ra q u e m ; “A in te rp re ta ç ã o d o d ire ito é a in te rp reta ç ã o d o direito e m seu to d o . n ã o d e textos isolados - n ã o se in te rp re ta o d ire ito e m tiras, aos pedaços; s e n d o u m d o s p o stu la d o s d a m e to d o lo g ia ju ríd ic a o d a existência f u n d a m e n ta l d a u n id a d e d o D ireito (p. 145). 17 Cf. nesse sentido: LARHNZ, Karl. Metodologia d a ciência do direito. 3. ed. Trad. José Lamego. Lisboa; C alo u ste G u lb e n k ia n , 1997, p. 270; ALEXY, R o b e r t Teoria de los derechos fu n d a m e n ta le s. Trad. E rn e s to G a rz ó n Valdés. M ad rid ; C e n tro d e E stú d io s Politicos y C o n stitu cio n ale s, 2002, p. 50. 18 Registre-se q u e o STF te m c o n sid e ra d o c o m o n o rm a s d e o b s e rv â n c ia ob rig ató ria (p rin cip io d a s im e tria c o n stitu cio n al) as n o rm a s referentes a o T rib u na l d e C o n ta s d a U n iã o (arts. 71 a 73) (v. A D I 1.140/ RR e A D I 9 I6 /M T ) . N este passo n ã o h á q u e se fazer d is tin ç ão e n tre T rib u n a l d e C o n ta s d a U nião, T rib u n a is d e C o n ta s d o s Estados e T rib u n a is (o u C o n se lh o s ) d e C o n ta s d o s M u n icip io s, o n d e houver. 16 II - julgar as contas dos adm inistradores e demais responsáveis p o r dinheiros, bens e valores públicos da adm inistração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e m antidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou o utra irregularidade d e que resulte prejuízo ao erário público; Tem-se ainda a seguinte com petência do Congresso Nacional'^: Art. 49. É d a com petência exclusiva do Congresso Nacional: [ -] IX - julgar anualm ente as contas prestadas pelo Presidente d a República e apreciar os relatórios sobre a execução dos planos de governo; Assim, para um aprofundam ento naquilo que se pretende neste trabalho, é indispensável analisar os incisos I e II do art. 71 da CRFB, já que se tratam de com petências díspares: "apreciar as contas” e “ju l gar as contas”^®. Além disso, essas com petências repercutem , de forma bem peculiar, no Tribunal de Contas, no Órgão Legislativo e na Justiça Eleitoral. Com o bem salienta Antônio Carlos Mendes^', há de se ter p re sente que o art. 7 1 ,1, da CRFB outorga aos Tribunais de Contas a co m petência para deliberar sobre as contas do Chefe do Poder Executivo, e, assim, a decisão adm inistrativa apresenta-se com o parecer prévio ao Órgão Legislativo, a quem incum be a faculdade de acolher ou não a prestação de contas. Com o o parecer prévio do Tribunal de Contas não tem conteúdo decisório, mas opinativo, sugerindo ao Órgão Legislati vo a decisão a ser tom ada, não poderia, p o r si só, obter a anexação da ilegitimidade com inada. Apenas à decisão do Órgão Legislativo, sobre a rejeição das contas do Chefe do Poder Executivo, é que se anexam os efeitos da inelegibilidade. 19 20 21 Pelo principio da sim etria constitucional as C o n stitu iç õ es dos H stad o s-M em b ro s e as Leis O rgâ n ic as M u nicip ais estão c o m p e lid o s a re p e tire m os p a ra d ig m a s tra ç a d o s p e la CRFB, salvo q u a n d o esta d is p u s e r em c o n trário . M u ito e m b o ra n ã o esteja expresso n o tex to co n stitu cio n al, este p rin c íp io p o d e ser d e d u z id o a p a rtir d a exegese d o s arts. 25 e 29 d a CRFB, b e m c o m o d o art. 11 d o A to das D isposições C o n stitu cio n ais Transitórias. N ã o foi p o r c ap ric h o q u e o legislador c o n stitu in te utilizou v e rbos diferentes; “a p reciar” e “ju lg a r”. Cf. e m id ê n tic o sentido: G O M E S JÜ N IO R , Luiz M anoel. Tribunais d e contas-, a sp e c tos c o n tro v e rtid o s. Rio d e Janeiro: Forense, 2003, p. 28. A p u d CO STA , A d ria n o Soares. Instituições d e direito eleitoral, p. 159. 17 Registre-se que nos M unicípios a situação é sui generis, u m a vez que, por força do art. 31, § 2° da CRFB^^, o parecer prévio em itido pelo Tribunal de Contas só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos m em bros da Câm ara Municipal. Voltando à visitação do art. 71 da CRFB, observa-se que seu inci so II conferiu aos Tribunais de Contas o p od er de julgar as contas dos agentes responsáveis por direitos ou bens públicos, devendo, inclusive, esse julgam ento recair sobre os Chefes do P oder Executivo, quando es tes atuarem com o “ordenadores de despesas” Inexistindo outro órgão juridicamente qualificado para exercer essa competência constitucional, a deliberação da Corte de Contas é ver dadeira decisão, sujeitando o ordenador das despesas à inelegibilidade.^^ Mas não foi esse o entendim ento do STF no Recurso Extraordi nário n® 132.747-DF^\ que proclam ou a com petência da C âm ara M u nicipal, e não do Tribunal de Contas, para rejeitar as contas do Prefeito^^. Contudo, essa decisão, e tantas outras manifestações doutrinárias e jurisprudenciais que daí partiram , m erecem ser revisitadas em face do equivocado entendim ento acerca do conteúdo norm ativo do art. 7 1 ,1 e II da CRFB p o r parte do STF. Tal balizam ento é im portante, já que a p artir dessa manifestação do STF, os Tribunais Regionais Eleitorais, em todos os Estados, aderi ram ao entendim ento ali consagrado, segundo o qual a inelegibilidade somente se configura com a rejeição das contas pela Câm ara M unici pal^. Contudo, esposam tal entendim ento sem a necessária verificação da temática, pois se pode ter tanto um a decisão polítko-adm inistrativa com o um a decisão político-legislativa que ensejará a inelegibilidade. Merece destaque que a decisão deve ser motivada, bem como deve ser assegurada a ampla defesa. Nos julgamentos pelos Tribunais de 22 23 24 25 26 Art. 31, § 2" da C R tB : "O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará d e prevalecer p o r decisão d e dois terços dos m em bros da C âm ara Municipal.” M EN D ES, A n tô n io C arlos, a p u d COSTA, A d ria n o Soares. Instituições de direito eleitoral, p. 159. ■■[,..!. IN ELEG IBILID A D E ■ PR EFEIT O - REJEIÇÀO D E C O N T A S - C O M P E T Ê N C IA . Ao P o d e r Le gislativo c o m p e te o ju lg a m e nto das contas d o C hefe d o Executivo, c on sid e ra d o s os três níveis - federal, estadual e m unicipal. O Tribunal d e C o n ta s exsurge c o m o sim ples órgão auxiliar, a tu a n d o n a esfera opinativa - inteligência d o s artigos i I d o Ato das Disposições C onstitucionais Transitórias, 2 5 , 3 1,4 9 , inciso IX, 71 e 75, to d o s d o c o rp o p e rm a n e n te d a C arta d e 1988. A utos conclusos pa ra confecção d o acó rd ão em 9 de n o v e m b ro d e 1995. (DJ 07.12.1995)”. C a p tu ra d o em http ://w w w .stf.ju s.b rem 13 d e ju n h o d e 2009. N esse ju lg a m e n to e n te n d e u -se q u e so m e n te à C â m a r a M u n icip al c o m p e te o ju lg a m e n to d o Prefeito. O s de m a is agentes públicos, q u e n ã o Prefeitos, é q u e p o d e ria m ser ju lg a do s p e lo T rib u n a l d e C ontas. P IN T O , D jalm a. Direito eleitoral: a n o ta çõ e s e te m a s p o lê m ic o s, p, 87. 18 Contas, há m uito que se tem com o imprescindível no processo adm i nistrativo a obediência das garantias constitucionais do devido proces so legal, da ampla defesa, do contraditório, da motivação das decisões e da publicidade dos atos. Contudo, esses mesmos princípios também devem ser verificados nos julgamentos realizados pelo Órgão Legislativo. Como se trata de julgamento (competência prevista no art. 49, IX, CRFB) e “decisão” (art. 31, § 2“, CRFB), não há como se afastar de tal procedimento. No julgamento das contas, é indispensável a aplicação das garantias constitucionais previstas no art. 5°, LV, combinado com o art. 93, IX e X, todos da CRFB, ensejando assim a obe diência aos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, da motivação (fundamentação) das decisões e da publicidade dos atos.^’ José Nilo de Castro risca com pena forte no sentido de que, m es m o sendo o órgão julgador o Legislativo, não pode este Órgão deixar de m otivar seu julgam ento no juízo político de controle externo de fiscali zação, quer seja pela aplicação por sim etria (e aplicação analógica) das disposições do art. 93, IX e X da CRFB, quer seja em razão da garantia de ampla defesa insculpida no art. 5^, LV da CRFB.^^ 5.2. DECISÃO PRO FERID A P O R Ó RGà O CO M PETEN TE É indispensável, para que ocorra a hipótese de inelegibilidade, que a decisão da rejeição das contas tenha sido proferida pelo órgão com petente para apreciar as contas. Nesse passo, a prim eira questão que se deve buscar responder neste tópico é: quem é o órgão com petente para o julgam ento das co n tas: 0 Tribunal de Contas ou o Órgão Legislativo? A resposta é: depende. Pela simples leitura do Texto Constitucional (art. 7 1 ,1 e II), e tam27 Cf. RE 261.885-SP: P R E F E IT O M U N IC IPA L . C O N T A S REJEITADAS PELA C  M A R A DE V E R EA D O RE S, A L E G A D A O FE N S A A O P R IN C IP IO D O D IR E IT O D E DEFESA (IN C . LV D O A R T 5" DA CF). S e n d o o ju lg a m e n to das co n tas d o reco rren te, c o m o ex-C hefe d o E xecutivo M unicipal, realizado pela C â m a ra d e V ereadores m e d ia n te pa re ce r prév io d o T rib u n a l d e C o n ta s, q u e p o d e rá d eix ar d e prevalecer p o r d ecisão d e d o is terços d o s m e m b ro s d a C a s a Legislativa (arts. 31, ^ e 71 c/c 0 75 d a CF), é fora d e d ú v id a que, n o p re sen te caso, e m q u e o p a re c e r foi pela rejeição das contas, não p o d e ria ele, em face d a n o r m a co n stitu cio n al so b referência, te r sido ap ro v ad o , sem q u e se houvesse p ro p ic ia d o a o in teressad o a o p o r tu n i d a d e d e o p o r-se ao referid o p ro n u n c ia m e n to técnico, d e m a n e ira am p la, p e ra n te o ó rg ã o legislativo, c o m vista a sua a lm e ja d a reversão. R ec u rso c o n h e c id o e provido. 28 CA STR O , José N ilo de. ju lg a m e n to das contas municipais. 3. ed. Belo H o rizo n te: Del Rey, 2003, p. 33. [-]. 19 1 í ! i bém do a r t 49, IX, vê-se que os Tribunais de Contas ora têm a com petên cia para em itir parecer prévio nas contas do Chefe do Poder Executivo (inc. I), ora para julgar as contas dos ordenadores de despesas^^ (inc. II). Carlos Ayres de Britto, em voto na A DI-M C 3715-TO, consignou que se trata de função fiscalizatória única, contudo exercida p o r dois órgãos distintos e independentes, cada qual com suas competências, com seu rol de inconfundíveis com petências constitucionais. Q uando os Tribunais de Contas exercem a com petência elencada no inc. I do art. 71 da CRFB - em itir parecer nas contas prestadas pelo Chefe do Poder Executivo^" - fica ao Ó rgão Legislativo a com petência para julgar as contas a partir do parecer em itido pelo respectivo Tribu nal de Contas (art. 71,1 c/c art. 49, IX (e art. 31, § 2°)). A com petência delimitada neste parágrafo cham ar-se-á de “julgam ento da prestação de contas” - decisão político-legislativa. Ao apreciar as contas na form a do art. 7 1 ,1, da CRFB, os Tribu nais de Contas analisam o balanço orçam entário, o balanço financeiro, o balanço patrim onial, os limites legais e constitucionais (aplicação em saúde e educação), o m ontante das despesas com pessoal, a averiguação se os projetos, as metas, as prioridades e os investimentos estabelecidos na lei orçam entária foram atingidos etc. Não entra nesta análise aquilo que se cham a de “atos de gestão”, que com preende o objeto das audito rias in locu dos técnicos dos Tribunais de Contas, que analisam: a folha de pagamento, os procedim entos licitatórios, os convênios, os contratos administrativos, a disponibilização de agentes públicos etc. Contudo, os Tribunais de Contas tam bém exercem a com petência elencada n o inc. II do art. 71 da CRFB e julgam as contas dos ordenado res de despesas. Neste caso, o órgão com petente para julgar as contas é o próprio Tribunal de Contas, que não fica a mercê de qualquer atuação do Órgão Legislativo, atuando com o autêntica instância julgadora. É 29 30 U sar-se-á a qu i a ex p ressão “o rd e n a d o re s d e d esp esas” p a r a d e sig n a r “os a d m in is tra d o re s e d em ais responsáveis p o r d in h e iro s, b e n s e valores p ú b lic o s d a a d m in is tra ç ã o d ire ta e in d ireta, inclu íd as as fu n d a ç õ es e so cied ad es instituídas e m a n tid a s pelo P o d e r Público federal [e ta m b é m d a s o u tra s esferas federativas], e as c o n ta s d a q u eles q u e d e re m cau sa a p e rd a , extrav io o u o u tr a irreg u larid ad e d e que resulte preju ízo a o e rá rio público”, m e n c io n a d o s n o a r t 71. II d a CRFB. O STF já d e cid iu q u e n ã o é possível as C on stitu iç õ es e stad u ais a la rg a re m a c o m p e tê n c ia p a ra ju lg a m e n to d a s prestações d e c o n ta s p o r pa rte d o P o d e r Legislativo. Cf. nesse s e n tid o a A D I-M C n ” 1964ES, e m q u e o STF ju lg o u in c o n stitu c io n al dispositivo d a C o n stitu iç ão d o E sta d o d o Espírito Santo q u e incluiu c o m o c o m p e tê n c ia d o P o d e r Legislativo, e n ã o d o T rib u n a l d e C o n ta s, o ju lg a m e n to da p re staç ã o d e c o n ta s d a M esa D ire to ra d a A ssem bléia Legislativa e d a s M esas D ire to ra s d a s C âm aras M unicipais. N o m e s m o s e n tid o a A D I 849-M T. 20 no exercício desta com petência (art. 71, II, CRFB) que os Tribunais de Contas julgam os ordenadores de despesa acerca dos “atos de gestão”. A com petência delim itada neste parágrafo cham a-se de “julgam ento dos atos de gestão” - decisão poHtico-administrativa^K Não obstante as afirmações retro, o STF, quando da apreciação do Re curso Extraordinário n° 132.747-DF, marchou em sentido contrário para afirmar que “só com relação às contas dos Chefes do Executivo é que o pro nunciamento do Tribunal de Contas constitui mero parecer prévio, sujeito à apreciação da Câmara Municipal, antes do qual não há inelegibilidade” O TSE, infelizmente, indo no m esm o sentido apontado pelo STF no RE 132.747-DF, tam bém já abordou essa distinção de com petência para julgam ento no Ac. TSE 13.174, de 30.09.1996, consignando que só com relação às contas do Chefe do Poder Executivo é que o pro n u n ciamento do Tribunal de Contas constitui m ero parecer prévio, sujeito à apreciação final da C âm ara Municipal, antes do qual não há inele gibilidade. As contas de todos os dem ais responsáveis p o r dinheiro e bens públicos são julgados pelo Tribunal de Contas, e suas decisões a respeito geram inelegibilidade (art. 7 1 ,1 da CRFB). Contudo, um a situação m uito interessante e corriqueira que ocorre nos m unicípios brasileiros, e que foi deixada de lado pelo STF quando da apreciação do RE n® 132.747-DF^^ é que o Prefeito M unici pal, além de agente político (Chefe do Poder Executivo), tam bém pode atuar com o ordenador de despesa (responsável p o r bens, dinheiro e valores públicos)^^. Assim sendo, é subm etido a u m duplo julgamento 31 32 33 E n te n d e m o s q u e as decisões d o s Trib u nais d e C o n ta s p o s su e m n a tu re z a po lítico -ad m in istrativ a, u m a v ez que, n o Rrasil, n ã o existe u m c o n te n c io s o a d m in is u a ü v o q u e o u to rg u e o caráter d e definitividade às decisões d a lavra d a A d m in is tra ç ã o Pública, pois, p o r força d o art. 5", X X X V d a CRFB, n e n h u m a lesão o u a m e aç a a direito p o d e rá ficar excluída d e apreciação d o P o d e r Judiciário. A ssim , q u a lq u e r decisão d o s Trib u nais d e C o n ta s p o d e ser s u b m e tid a ao re ex am e d o P o d e r Judiciário se o interessado c o n sid e ra r q u e seu d ire ito so freu lesão o u e n c o n tra -se am e aç a d o . As decisões d o s Trib u n ais d e C o n ta s n ã o d e tê m a característica d a d e fin itiv id ad e o u im u ta b ilid ad e d o s efeitos in e re n te s aos atos jurisd icio nais, m u ito e m b o ra p o ssu a e sta tu ra c o n stitu cio n al. N este tem a, p o r to d o s, face a p e squ isa im p le m e n tada, re c o m e n d a -se a leitu ra de: G O M E S JÚ N IO R , Luiz M an o el. Tribunais de contas p. 23-37; e, B R ITT O , C arlos Ayres. 0 R egim e co n stitu cio n al d o s trib u n a is d e contas. In: O novo tribunal de contas: ó rg ã o p ro te to r dos d ire itos fu n d a m e n ta is. 3. ed. Belo H o riz o n te : F ó r u m , 2005, p. 59-75. Registre-se que n o julgam ento d o RE 132.747-DF, o Min. Carlos Velloso, voto vencido, lançou luzes d o que viria a ser “prestação d e contas anuais” e a possibilidade d o prefeito atu ar c o m o “o rd e n a d or de despesas”. N a m a io ria d o s m u n ic íp io s brasileiros é c o m u m ver o Prefeito M u n icip al e x erce n d o ta m b é m a f u n ç ão d e “o rd e n a d o r d e d esp esa”, a ss in a n d o c o n tra to s, cheq u es, d e t e r m in a n d o o p a g a m e n to d e folha de pessoal, h o m o lo g a n d o e a d ju d ic a n d o p ro c e d im e n to s licitatórios etc., c o m p o rta m e n to s estes q u e não re c ae m so b re o P resid e n te cia R epública o u sobre os G o v e rn a d o re s d e Estado. N a U n iã o e nos Estados F ed erad o s a fu n ç ã o d e “o rd e n a d o re s d e d esp esa”, e m geral, recai sobre o s escalões d a e s tr u tu ra a d m i nistrativa, e n ã o so b re o C hefe d o P o d e r Executivo. 21 das contas^*’: um pelo Tribunal de Contas (art. 71, II, CFRB) e outro pela C âm ara M unicipal (art. 7 1 ,1 c/c a r t 31, § 2°, CFRB). O que se está aqui a defender, em entendim ento oposto ao aci m a delineado, é que o Prefeito M unicipal será julgado pelo Tribunal de Contas quando agir com o ordenador de despesas. Nesta hipótese, o Tribunal de Contas aprecia atos pessoais do Prefeito que atuou como ordenador de despesas, vale dizer, julgará a legitimidade dos contratos administrativos, dos convênios, das licitações e dos pagam entos que o Prefeito M unicipal atue pessoalm ente em um a das fases dos procedi m entos administrativos. É aqui que o Tribunal de Contas verificará se o Prefeito/ordenador praticou ato lesivo ao erário e julgará suas contas. Contudo, se o Prefeito não atuar com o ordenador de despesas^^ ao Tri bunal de Contas com petirá, tão-som ente, apreciar as contas e em itir parecer prévio-'^, ficando a cargo da C âm ara M unicipal o julgamento das suas contas. Não se pode conceder ao art. 7 1 ,1 e II da CRFB um a interpreta ção liberalizante com o fez o STF no RE 132.747-DF, sob pena de se estar enfraquecendo um dispositivo que veio a lum e pelo poder constituinte objetivando a proteção do dinheiro, dos bens e dos valores públicos, sob pena de ver o reflexo da advertência de Augustin Gordillo: “de nada vale que Ias personas digan que son dem ocráticas y están al servicio de Ia Constitución, si sus acciones no respaldan tales afirmaciones.”’" Em sentido contrário ao decidido no RE 132.747-DF, e na mes34 35 36 37 Q u e fique claro q u e n ã o sc tra ta d e d o is ju lg a m e n to s so b re o m e s m o co nteú d o . R n te n d em o s q u e o M u n icíp io p o s su i a u to n o m ia p o lítico -ad m ín istrativ a (art. lé , caput. c/c art. 29, a m b o s d a C RFB) p a ra estabelecer a q u e m c o m p e te o r d e n a r despesas, p o d e n d o tal a irib u iç ã o restar especificada e m Lei O rg â n ic a o u e m o u tra legislação m u n ic ipa l. P o d e e n tã o c ad a M u n icíp io especificar a q u c n i c o m p e te o m ister d e o rd e n a r d esp esa - se ao Prefeito M u n icip al o u a o u tro agente público. C o n tu d o , c aso haja p revisão n o o rd e n a m e n to ju rid ico m u n ic ip a l q u e c o m p e te a o Prefeito o rd e n a r dcspesa.s, e este, p o r ato n o rm a tiv o s e c u n d á rio (p o rtaria , d e creto etc.), delegar esta c o m p e tê n c ia a o u tre m , p e rm a n e c e rá ele r e s p o n d e n d o c o m o o rd e n a d o r d e d esp esas - resp o n sab ilid ad e solidária c o m p e tin d o a in d a a o Tribunal d e C o n ta s o ju lg a m e n to d e su as contas. Cf- nesse m e sm o sentid o ; G O M E S fÚ N IO R , Luiz M anoel. Tribunais de co n ta s .... p. 32; “A tu a n d o c o m o o rd e n a d o r de d esp esas (c e leb ran d o convênio, p.ex.) é de to d o claro q u e a a tuação d o T rib u n a l d e C o n tas se d a rá c o m f u n d a m e n to n o inciso II d o art. 71 d a C F-88, n ã o h a v e n d o a m an ifestação d o P o d e r Legislativo e te n d o c aráter definitivo n o â m b ito a d m in is tra tiv o ” Em id ê n tic o sentido; G O M E S, José Jairo. Direito eleitoral. 2. ed. Belo H o rizo n te: D el Rey, 2008, p. 155: “O u tr o a sp ecto a ser c o n sid e ra d o reside n o fato d e q u e o Prefeito, m o r m e n te n o s p e q u e n o s e m é d io s M u n icíp io s, a c u m u la as fu nçõ es de executor do orçam ento e ordenador de despesas. Isso n ã o o c o rre nas esferas estad ual e federal, e m que os chefes d o executivo n ã o o rd e n a m despesas, z elan d o ap en a s pela e x ecu ção geral d o o rçam en to . D e s tarte, o p refeito p o d e ser ju lg a d o d ire ta m e n te p e lo T rib un a l d e C o n ta s c o m o o rd e n a d o r d e d esp esas e, ainda, pela C â m a ra M unicipal, c o m o e x ec u tor d o orçam ento.” G O R D IL L O , A u gu stin A. La adm inistración paralela: el p a ra lis tem a ju ríd ico -ad m in istra tiv o . M ad rid; Civitas, 1982, p. 65. 22 m a linha crítica de Augustin Gordillo, o Ministro Carlos Velloso, no RE 132.747-DF (voto vencido), registrou que interpretar o art. 71, I e II da CRFB da forma pretendida pela maioria do Plenário do STF - de que o Prefeito Municipal só pode ser submetido a julgamento perante a Câmara Municipal - é anular muito o que se pretendia fazer contra a corrupção que lavra, infelizmente, milhares de administrações públicas municipais deste país, pois a influência política de um Prefeito Municipal sobre os Vereado res pode comprometer a lisura do julgamento das contas municipais. Pode-se assim afirmar, em síntese, o seguinte; a) caso se esteja falando do julgam ento da prestação de contas do Prefeito M unicipal, o órgão com petente para julgam ento é a C âm ara M unicipal, não sendo suficiente o parecer em itido pelo Tribunal de Contas do Estado (ou do Município, onde houver)"'^; b) caso se esteja falando do julgam ento da prestação de contas do G overnador de Estado, o órgão com petente para julgam ento é a Assembléia Legislativa, não sendo suficiente o parecer em itido pelo Tribu nal de C ontas do Estado; c) caso se esteja falando do julgam ento da prestação de contas do Presidente da República, o órgão com pe tente para julgam ento é o Congresso Nacional, não sendo suficiente o parecer em itido pelo Tribunal de Contas da União; d) caso se esteja falando do julgam ento dos atos de gestão do Prefeito M unicipal, do G overnador de Estado, do Presidente da República^'^, ou de qualquer outro agente público que atue com o ordenador de despesa, o órgão com petente para julgam ento é o Tribunal de Contas^^; 38 Krise-se n o v a m e n te que, p o r força d o art. 31, § 2'’ d a CRFB. o p a re c e r d o T rib u n a l d e C o n ta s acerca d a p re staç ã o d e c o n ta s d o Prefeito M u n icipal p o ssu i aqui u m “p eso ” maior, te n d o e m vista que o pa re ce r prév io d o T rib un a l d e C o n ta s só d e ix ará d e prevalecer p o r q u o r u m qualificado (2 /3 ) da C â m a ra M u n i cipal. 39 C o n s o a n te a firm ad o a n te rio rm e n te , o P residen te d a R epública n ã o a lu a c o m o o rd e n a d o r de despesa, e se crc q u e a m a io ria dos G o v e rn a d o re s ta m b é m não. 41) C aso SC tra te d e re c u rso s federais, a c o m p e tên c ia será d o T ribu n a l d e C o n ta s d a U nião. Se os recursos forem e stadu ais o u m u n ic ip a is, a c o m p e tên c ia será d o T rib u n a l d e C o n ta s d o Estado, salvante a exis tê n cia de Tribu n ais (o u C o n se lh o s ) d e C o n ta s d o M u n icíp io e o re c u rs o seja m unicip al. 23 C orroborando o entendim ento aqui esposado, o próprio TSE, quando cuida de convênios firmados entre M unicípio e ente da federa ção, parece cambiar o raciocínio ao entender que o órgão com petente para julgar as contas prestadas pelo Prefeito é o Tribunal de C o n ta s/' 5.3. IRRECO RRIBILID A DE DA DECISÃO A princípio^^ a decisão, para acarretar a inelegibilidade, deve ser irrecorrível, isto é, não deve mais caber recurso perante a instância p ró pria, nem deve haver recurso pendente de julgamento. A “decisão irrecorrível” a que se refere é a do órgão adm inistrati vo que, no caso, são os Tribunais de Contas, na form a da iei que regula esses órgãos e sua atividade fiscalizadora, frisando que o julgamento tem natureza político-administrativa. Mas assim tam bém deve ser con siderada a do Órgão Legislativo, cuja apreciação é política, não cabendo aqui falar em “decisão irrecorrível”‘^^ Calha ainda registrar que, segundo o TSE, os recursos adm inis trativos que podem ser interpostos, ou que estão pendentes de julga mento, devem possuir o efeito suspensivo, ou então, se não possuem automaticam ente, deve ser reconhecido este tipo de efeito p or parte do órgão administrativo, sob pena que a inelegibilidade já se estabeleça/^ Não obstante, um problem a que se verifica, p o r vezes, na expe riência brasileira é a protelação do julgam ento pelo Órgão Legislativo. Com o regra tem -se que, enquanto não julgadas pelo Órgão Le gislativo as contas prestadas pelo Chefe do Poder Executivo as quais 41 42 43 44 Ac. TSE n° 24.848 d e 07.12.2004. P or incrível q u e p areça, verifica-se neste A c ó rd ã o a seg u in te em enta; “ [...) 3. A c o m p e tê n c ia d a s C o rte s de C o n ta s n a a p reciação d a s co ntas d e co n v ên io é d e ju lg am en to , e n ã o opinativa, o q u e significa d ir e r q u e o ag en te p ú b lico n ã o é ju lg a d o p e lo T rib un a l d e C o n ta s na q u a lid a d e d e chefe d o P o d e r Executivo, m a s tã o -s o m e n te n a c o n d iç ã o d e gestor público, u m a v ez que os re c u rso s n ã o p e rte n c e m a sua ó rbita federativa. Cf. e m id ên tico s e n tid o o Ac. TSE n° 23.345 de 24.09.2004, q u e assinala: “(...| 1. A te o r d a s e d im e n ta d a ju ris p ru d ê n c ia d o Tribunal S u p e rio r EJeitoral, o ó rg ã o c o m p e ten te, o rig in ariam cn te , p a ra ju lga r a re g u la rid a d e d a ap licação d e v erbas pro v en ien tes d e c o n v ênio s c eleb rad o s e n tre o m u n ic ip io e o e sta d o é o T rib un a l d e C o n ta s d o E sta d o (Ac. n “ 13.935, d e ]°.10.96, R Espe n" 13.935, rei. M in istro N ilson Naves; Ac. n ” 13.299, d e 30.9.96, R Espe n ” 13.299, rei. M in istro E d u a rd o Ribeiro; Ac. n “ 20.437, d e 25.9.2002, R Espe n “ 20.437, rei. M in istro Sepulveda P ertence). [...]” D eve-se d e sta c a r q u e c o n so a n te será a d ia n te a firm ad o , e n te n d e o TSE q u e alg u n s re c u rso s existentes jías Leis O rg â n ic as o u n o s R eg im en to s In te r n o s d o s T rib u n a is d e C o n ta s q u e n ã o p o s su e m efeito s u s pensivo, e q u e e m m u ito se asse m elh am a u m a a ção rescisória, n ã o té m o c o n d ã o d e a fa sta r/su sp en d e r a decisão q u e rejeitou as contas. M ais a d ia n te v o lta re m o s nesse a ss u n to d e sta c a n d o a po ssibilid ade d e Lei O rg â n ic a M u n icip al fr a n q u e a r re c u rs o e m face d a sua a p reciação politica. Cf. Ac. TSE 12.132 d e 06.08.1994 e Ac, TSE 12.192 d e 10.08.1994. 24 obtiveram o parecer prévio do Tribunal de Contas pela rejeição, p erm a nece elegível este agente político. Contudo, caso o Órgão Legislativo protele de form a exacerbada sua apreciação, prevalecerá a conclusão do Tribunal de Contas até que ocorra o julgam ento pelo Órgão Legislativo."^ Interessante solução a fim de afastar a situação colocada no p a rágrafo anterior é apresentada em algumas Leis Orgânicas, que estabe lecem prazo perem ptório para que a C âm ara M unicipal aprecie a pres tação de contas do Chefe do Poder Executivo, sob pen a de prevalecer a conclusão do parecer em itido pelo Tribunal de Contas. José Nilo de Castro não com unga de tal solução, um a vez que, para seu magistério, não há julgam ento ficto de contas, como não há aprovação ficta."*^ Com a devida vênia, tal raciocínio do professor m ineiro parece não restar om breado com a idéia de que o Tribunal de Contas se apre senta no ordenam ento jurídico brasileiro vigente com o um órgão de envergadura constitucional e garantidor dos valores político-constitucionais de um Estado D em ocrático de Direito, já que exerce funções indispensáveis para a observância dos princípios republicano e dem o crático. O TSE, no Ac. N° 23.921, de 09.11.2004, entendeu que prevale cerá a decisão da Corte de Contas se o parecer p o r ela em itido não for apreciado e julgado pela C âm ara M unicipal no prazo estipulado na Lei O rgânica do Município. Pelo m esm o motivo, tam bém não seria compatível com as dis posições da Constituição brasileira de 1988 enunciados norm ativos de leis orgânicas municipais que prescrevessem que, caso a C âm ara M u nicipal não aprecie em determ inado prazo o parecer prévio em itido pelo Tribunal de Contas, as contas seriam consideradas aprovadas, não im portando a conclusão do parecer prévio em itido - se pela aprovação ou pela rejeição. Já no que tange ao sistema de aprovação ficta em caso de omissão dos Tribunais de Contas, não em itindo o parecer prévio dentro do p ra zo legal, entendeu o STF, na ADI 215-PB, que essa hipótese não seria compatível com as disposições da CRFB. 45 46 Ac. TSE n M 7 .4 0 9 d e 28.09.2000. CA STR O , José N ilo de. J u lg am en to das co n tas m u n ic ip a is, p. 47. 25 Mas se deve considerar, ainda, a possibilidade de retratação do julgamento. Não é incom um no Brasil, país de dim ensão continental, verificar Câmaras Municipais julgarem (ir)regulares as contas do Prefeito e, p o s teriorm ente, m udarem o próprio entendim ento. Na m esm a legislatura, ou em outra, optam p o r exercer um juízo de retratação e procedem a novo julgamento, favorecendo ou prejudicando o Prefeito Municipal. O julgam ento pelo Órgão Legislativo é um julgam ento político, em instância única, em regra irrecorrível^\ Contudo, em hom enagem ao princípio da autotutela^^, pod e ocorrer que este julgam ento seja re visto p o r meio de um a retratação.'^'' Assim, caso a Câm ara M unicipal aprove as contas que anterior m ente tinham sido rejeitadas, em um juízo de retratação, essa decisão últim a deve ser acatada para fins de registro de candidatura. E, como não com pete à Justiça Eleitoral exam inar a motivação da decisão da C âm ara M unicipal que rejeita contas, tam bém não é possível exam inar os motivos que levaram à retratação. E quanto à possibilidade do com portam ento inverso? O u seja, o que dizer em relação a contas aprovadas que, em um juízo de retratação do Órgão Legislativo, restem rejeitas? Entendem os que esse com porta m ento seria lesivo a um dos princípios mais caros num Estado D em o crático de Direito: o princípio da segurança jurídica. Contudo, na possibilidade da prim eira hipótese, deve-se sempre observar, no mínim o, os princípios constitucionais da motivação (fun dam entação) das decisões, da ampla defesa, do contraditório e da p u blicidade. 5.4. IRREGULARIDADE INSANÁVEL Deve-se destacar que, para que ocorra a inelegibilidade, não basta que as contas tenham sido rejeitadas. H á a necessidade de um plus, ou 47 48 49 50 N a d a o b sta q u e u m a Lei O rg â n ic a v e n h a possibilitar a im p e tra ç ã o d e inii recurso. Cf. Sú m u la n" 473 d o STF; “A a d m in is tra ç ã o p o d e a n u la r seus p ró p r io s atos, q u a n d o eivados dc vícios q u e os to r n a m ilegais, p o rq u e deles n ã o se o rig in a m direitos; o u revogá-los, p o r m o tiv o d e c o n v e n iê n cia o u o p o rtu n id a d e , resp eitad o s os direitos a d q u irid o s , e ressalvada, e m to d o s os casos, a apreciação judicial.” Para ou tro s, so m e n te c o m p revisão n a Lei O rg â n ic a seria possivel a retratação. Cf. nesse sentido; C ASTRO, José N ilo de. Julgam ento das contas niunicipais, p. 49. Ac. TSH 18.847 de 24.10.2000. Ac. TSE n" 18.847 d e 24.10.2000. 26 seja, devem ainda as irregularidades que com inaram tal resultado se rem consideradas insanáveis pelo órgão julgador (Tribunal de Contas ou Órgão Legislativo). A prim eira grande dificuldade que se tem é definir o conceito norm ativo da expressão “irregularidade insanável”. Para Gomes Júnior, irregularidade insanável é aquela que vai além de um a falha m eram ente formal, devendo existir um prejuízo para a Administração, em regra dolosa e que não p ode ser corrigida."' José Jairo Gomes assevera que irregularidade insanável é aquela grave, decorrente de conduta perpetrada com dolo ou má-fé, contrárias ao interesse público; pode causar dano ao erário, enriquecim ento ilícito ou ferir princípios constitucionais reitores da A dm inistração Pública.^" Adriano Soares da Costa registra que, p o r irregularidade insa nável, devem ser com preendidas “tam bém aquelas irregularidades que não tragam prejuízo ao erário, mas que atentem contra a m oralidade adm inistrativa, a econom icidade, a razoabilidade, a publicidade, ou qualquer outro valor tutelado pelo ordenam ento jurídico. Para Pedro Niess, a expressão “irregularidade insanável” deve ser utilizada apenas para os atos que causem “prejuízo irreparável, quer ao erário, quer ao adm inistrado, não mais adm itindo correção”.^* Talvez pelo fato de o legislador não ter preenchido o conteúdo semântico"^ do que vem a ser “irregularidade insanável”, alguns doutrinadores pegam em prestado noções relativas aos atos tidos como ímprobo pela Lei Federal n° 8.429 para servir com o caracterizador de um a insanabilidade. O STF já se m anifestou no sentido de que a rejeição das contas públicas a ensejar a inelegibilidade do art. 1 ,1, ^ da LC 64 é aquela que vier tam bém com “notas de im probidade” administrativa.^® Cobra relevo sublinhar que esse entendim ento vem sendo repe tido sem maiores reflexões pela d ou trin a e pelos Tribunais Eleitorais^^ 51 52 53 54 55 56 57 G O M E S IC N ÍÜ R , Luiz M anoel. Tribunais de cotitas p. 133. G O M E S, José lairo. D ireito eleitoral, p. 153. C O STA , A d ria n o Soares. J«5tifuiçôes de direilo eleitoral, p. 158. NIESS, P e dro H e n riq u e Távora. Direitos políticos: co n d iç õ es d e elegibilidade e inelegibilidade. São P a u lo: Saraiva, 1994, p. 76. N ã o se está a q u i a d e fe n d e r q u e seja p a p el d o legislador e la b o ra r co n ceito s Jurídicos. RE 129.392, Rei. M in. SE PÜ l.V E D A PE R T E N C E , julg.: 17.06.1992. A c . T S E n ” 11.145 d e 15.08.1990 e Ac. TSE n° 11.238 d e 27.08.1990. 27 olvidando, inclusive, que o m esm o fora construído sem considerar^* a Lei n" 8.429, de 02.06.1992 (Lei de Im probidade Administrativa). Entendem os que tal posicionam ento deve ser analisado com cui dado, pois não se deve fazer confusão entre a inelegibilidade pela rejei ção das contas e a existência ou não de improbidade administrativa^ já que se está diante de institutos jurídicos distintos, bem com o de campo material de aplicação diverso. O que se pode afirm ar é que a verificação de insanabilidade das irregularidades deve levar em conta tam bém a gravidade da conduta e suas conseqüências, analisando-a sob o prism a da probidade, ou seja, se há constatação de que o agente agiu com improbidade. Mas isso não quer dizer que dependa de ação p o r im probidade administrativa.^^ F irm ando posicionamento, deve-se entender que a conduta ir regular do agente público, para tipificar ato de im probidade adm inis trativa, deve ter os seguintes traços com uns ou característicos de todas as m odalidades de im probidade administrativa: desonestidade, má-fé e falta de probidade no trato da coisa pública. Afinal, irregularidade não é sinônim o de improbidade e a ocorrência daquela, p o r si só, não confi gura ato de improbidade, até porque o vocábulo latino improbitate tem o significado de “desonestidade”.^® Mas não serão apenas as condutas ím probas e/ou dolosas que e n sejarão a inelegibilidade. N em m esm o pode-se afirm ar que, em virtude do legislador não ter delim itado a expressão “irregularidade insanável”, poderia a jurisprudência adotá-lo naquele sentido.^* Não se pode coadunar com este raciocínio, um a vez que a respublica deve ficar protegida daqueles que, m esm o po r culpa (negligência, im prudência ou imperícia), lesem o erário, ou dele não cuidem. Assim, deve-se ter cuidado ao ler os entendim entos daqueles que advogam a tese de que as meras irregularidades formais, ou de que os atos que com portem convalidação, não ensejariam a insanabilidade e, p o r conseguinte, a inelegibilidade. Em suma: é difícil apontar de form a definitiva qualquer parâm e58 59 60 61 Pode ser verificado pelos ju lg a d o s citados q u e os p rim e iro s ju lg a m e n to s neste s e n tid o d a ta m d e m o m e n to anterior, o u logo ap ó s, a edição d a Lei de Im p ro b id a d e A d m in istrativ a. Ac. T S E n M 9 .0 2 7 d e 20.10.2000. PE D RA , A n d e rso n SantA na. A d e lei im p ro b id a d e a d m in is tra tiv a e o p rin c ip io d a p rop o rcio n a lid a d e . R evista interesse público. P o rto Alegre; N o ta Dez. A n o 7, n. 34, nov./dez. 2005, p, 86-87. COSTA. A d ria n o Soares. Instituições de direito eleitoral, p. 158. 28 tro que se configure a priori com o ensejador de inelegibilidade p o r con tas rejeitadas em virtude de irregularidade insanável Apesar da dificuldade, pode-se entender com o irregularidade insanável aquela irremediável, que não pode mais ser corrigida, convalidada, sanada, mas que tam bém seja oriunda de desonestidade, de intenção em lesar o erário. Inadmissível atribuir tal adjetivação a equí vocos m eram ente formais, sem considerar a gravidade da conduta e suas conseqüências, até porque, a contrario sensu, quase toda irregulari dade já seria insanável caso restasse ultrapassado o exercício financeiro, e não foi isso o que foi objetivado e escrito na LC 64.^ Mas tam bém se configura com o irregularidade insanável aquela oriunda de atecnias formais, que m esm o praticadas sem dolo, sem a intenção de lesar o erário, dem onstrem que o ordenador de despesa não foi zeloso e que colocou 0 erário, mesm o que indiretamente^^ em risco. Explica-se. Imagine a situação em que um agente público m un i cipal não tenha atingido o percentual m ínim o com despesas em ed u cação (25%) em determ inado exercício, e o percentual real só tenha sido verificado n u m exercício posterior. Esse ato não é mais possível de convalidação. O gasto verificado foi de 24,97% e a diferença percentual foi verificada tendo em vista entendim entos divergentes entre a equi pe técnica da adm inistração m unicipal e a do Tribunal de Contas, que em itiu parecer sugerindo a rejeição das contas e que foi aprovado pela Câm ara M unicipal. Acresce-se ainda o fato de que o investimento com a educação tenha suprido todas as necessidades locais. Restaria intato o princípio da proporcionalidade^"*, ao entender com o “insanáveis” essas contas, e ficar o responsável inelegível? Entendem os que, com o ocorre nesta situação, e em tantas outras, não são todas as irregularidades in sanáveis que conduzem à inelegibilidade.^^ 62 63 64 65 Tem -se a in d a q u e o g ig a n tis m o e a excessiva b u ro c ra c ia d a A d m in is tra ç ã o P ú b lica é o am b ie n te p ro p í cio pa ra o c o m e tim e n to d e toleráveis, m a s n ã o aceitáveis, p e q u e n o s e q u ív o co s formais. E n te n d e m o s q u e o e rá rio fica e m risco de fo rm a in d ir e ta q u a n d o a p a r tir d e irreg u larid ad e s form ais reste p re ju d ic a d o o co n tro le d a A d m in is tra ç ã o P ú b lica c o m o n o s ex em p lo s q u e serão a p re se n ta d os logo em seguida. Está-se a q u i falan d o d o p rin c íp io d a p ro p o rc io n a lid a d e e m sua fu n ç ã o negativa, c o m o ved ação à "p ro i b iç ã o d e excesso d e p o d e r ”. Cf. PE D RA , A n d e rso n Sant’A na. O controle da proporcionalidade dos atos legislativos, p. 196: “P o d e-se d iz e r q u e o principio da proporcionalidade ta m b é m te m u m a fu n ç ã o n e g a tiva p a rtic u la rm e n te relevante, p rin c ip a lm e n te a fim d e o b stac u liz a r o excesso de p o d e r ’”. Cf. ta m b é m : C A N O T IL H O , 5osé )o a q u im G o m e s. D ireilo constitMcional e teoria da constituição. 4. ed. C o im bra: A lm e d in a , 1998, p. 1128-129. E n te n d im e n to diferente será e n c o n tra d o em: NIESS, Pedro H e n riq u e Távora. Direitos políticos, p. 76, que 29 Outra situação seria se as contas de um agente público fossem re jeitas pelo Tribunal de Contas em razão de ausência de publicidade em diversos atos administrativos, ou porque diversas despesas foram efetiva das sem o necessário empenho. Mas, em ambas as circunstâncias, nenhum prejuízo ou “nota de improbidade” foi verificada. Então, seria possível que este agente fosse atingido pela inelegibilidade, mesmo sendo os atos elencados passíveis de saneamento?^ Entendemos que sim, pois não se pode perm itir que a administração da res publica fique nas mãos de uma pessoa que tratou com menoscabo o controle da Administração Pública.^^ Imagina-se ainda a situação em que um ordenador de despesas municipal, após manifestação favorável da assessoria jurídica, realize o pagam ento de despesas relacionadas a hospedagem e transporte de um M inistro do STF que esteve na inauguração do Centro de Estudos Jurídicos M unicipal m inistrando aula m agna que teve como tem a “A evolução do controle de constitucionalidade no STF” No julgamento das contas, o Tribunal de Contas entendeu que tais despesas estariam divorciadas do interesse público municipal, já que, apenas excepcio nalmente, ações envolvendo o m unicípio chegariam ao STF, principal m ente após a instituição da necessidade de dem onstração da “repercus são geral” para o conhecim ento do apelo extraordinário.^® Este m esm o Tribunal de Contas, agora julgando as contas de um outro ordenador de despesas, verificou que o m esm o realizou o paga m ento de um a obra que apresentava u m sobrepreço, m esm o após a ex- 66 67 68 en tc n d e q u e u m a v e i u ltrapassado o a n o n ã o há c o m o c o rrig ir a irregularidade. O STF, n o R £ 160.432SH possui a seguinte em enta: “A rejeição d e co ntas públicas, c o m fu n d a m e n to n a ausência d o percentual co m p u lsó rio m ín im o d e te rm in a d o pelo texto constitucional e m favor d o e n sin o fu n d a m e n to , n ã o c o n d uz, p o r si só, ao re c o nh ec im e n to d e u m a situação caracterizadora d e im p ro b idad e administrativa." E sta n d o o agente p ú b lico n o m e s m o exercício, b a sta ria ele pu b lic a r os atos e e m itir as n o ta s d e e m p e n h o q ue, sob o p ris m a form al, n ã o h a v eria m ais irregularidade. A n ã o p u b licação d e atos ad m in is tra tiv o s im possibilita o co n tro le d a A d m in is tra ç ão Pública, ta n to p elos ó rgãos d e co n tro le (T rib u n ais de C o n ta s, A u d ito rias (con tro le in te rn o ) e M in istério Público) q u a n to pelos cidadãos. Já a n ã o em issão d e n o ta d e e m p e n h o p re v ia m e n te à d espesa, p ossibilita a a ssu n ção d e resp o n sa b ilid a d e q u e n ã o p o d e rá ser s u p o rta d a pela A d m in istração . Está m a is d o q u e e v id e n te q ue, nessa situação, o T rib u n a l d e C o n ta s a d e n tro u n o m é rito d o ato p ara a n alisar o interesse público. K ã o cabe a q u i a d e n t r a r n e ssa (im )p o ssibilid ad e d e atuação. Pa ra o e x e m p lo exposto, p a rte -se d o ra c io c ín io q u e isso o c o rre u in d e p e n d e n te m e n te d a (im )po.ssibilidade d e tal glosa. Im p o r ta n te reg istrar q u e o co n tro le d o m é rito d o ato a d m in is tra tiv o pelos Trib u n ais d e C o n ta s se a p re se n ta aos b o rb o tõ e s na atualid ade, p o r força, inclusive, d a utilização e q u iv o c ad a d o fe n ô m e n o d e n o m in a d o d e c o n stitu cio n alização d o direito a d m in is tra tiv o e pela novel te o ria q u e d e te n d c o c o n tro le d o m é rito d o ato a d m inistra tiv o . Cf.; PE D RA , A n d e rso n Sant’Ana. A c o n stitu cio n alização d o direito e o co n tro le d o m é rito d o a to a d m in is tra tiv o p e lo judiciário. In: A G RA , W alber d e M oura; C A STR O , C elso Luiz Braga de; TAVARES, A n d ré R am o s (C o o rd .). C onstiíucionalism o: o s d esatio s no terceiro m ilênio. Belo H o rizo n te: F ó ru m . 2008, p. 41-82. 30 plícita observação do setor de engenharia do m unicípio acerca desta irregularidade. Em am bos os processos o Tribunal de Contas entendeu, p or de cisão irrecorrível, p o r rejeitar as contas p o r irregularidade insanável*^^ Indaga-se: se esses agentes públicos ressarcirem aos respectivos m un i cípios as despesas que foram pagas indevidam ente, as irregularidades tornar-se-iam saneadas? Entendem os que, na prim eira hipótese, sim, um a vez que naquela situação o pagam ento ocorreu sem qualquer eiva de desonestidade ou com a intenção de lesar o erário; todavia, na se gunda hipótese, não se pode aíirm ar o mesmo. Acrescente-se que, na segunda hipótese, perfeitam ente aplicável 0 entendim ento de que, “verificada a ocorrência de irregularidade in sanável, esta não se afasta pelo recolhim ento ao erário dos valores in devidam ente utilizados”’^, até porque, com o bem adverte Joel Cândido, “eventual ressarcim ento de parte do investigado aos cofres públicos não im pedirá sua inelegibilidade. O ressarcim ento tem natureza retributiva; a inelegibilidade tem natureza m oral”’'. Antes de continuar analisando a questão da insanabilidade é de bom tom que se traga à tona, para reflexão, os ensinam entos de fosé Nilo de Castro: N ão há garantia individual de cidadão tão forte que se co ntrapo n ha à suprem acia do interesse público e da probidade adm inistrativa. Não há, em contrapartida, tam b ém defesa do erário tão poderosa que se afaste do exercício de garantia d o cidadão."- Pode-se, então, dizer que deve ser analisado cada caso concreto para se definir se a “irregularidade insanável” será configuradora da inelegibilidade, sendo necessário que a Justiça Eleitoral verifique se essa irregularidade colocou em risco, de form a dolosa ou irresponsável, o patrim ônio público, direta ou indiretam ente, sob pena de se retirar do 69 70 71 72 Registre-se que não existe n e n h u m a n o rm a constitucional c]iie obrigue os Tribunais de Contas, em seus julgamentos, a qualificar as irregularidades c om o (in)sanaveis, A previsão n o art. 11, § 5“ d a I ei n"9.504/97 n ã o é legítima para canto, u m a vez que não se p o d e ter u m a lei federal estatuindo atribuições para todos os 'tribunais de C ontas, sob p e n a de o tend er o a au to n o m ia indissociável d o pacto federati\’o, C o n lu d o. im p o r ta registrar que seria d e b o m alvitre - e assim afastar u m a parte das discussões - que os Tribunais de Contas e/ou os Órgãos Legislativos aquilatassem a irregularidade verificada de fo rm a expressa em suas decisões. A c .T S F .n " 19.140 d e 07.12.20ÜÜ. C  N D ID O , foel ]. Direito c k ito ra l brasileiro. 11. ed. 2. tir. B auru: Edipro, 2004. p. 131. (JASTRO. losé N ilo de. lulgaincnto das contas iiniiiicipais, p.97. 31 cidadão um direito fundam ental tão caro, e ainda de form a ofensiva ao princípio da proporcionalidade. Assim, sendo as contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas ou pelo Órgão Legislativo, pelo com etim ento de “irregularidades insanáveis”, ficará o agente público responsável inelegível nos term os do art. 1°, I, g da LC 64, até que esta decisão seja revisitada pela Justiça Com um , nos term os da parte final do dispositivo m encionado, ou então que a Justiça Eleitoral não considere a declaração de insanabilidade com o motivo suficiente a ensejar a inelegibilidade. A declaração da inelegibilidade compete à Justiça Eleitoral, não po dendo utilizar as decisões dos Tribunais de Contas^^ ou do Órgão Legislati vo de forma absoluta e automática a fim de considerar o cidadão inelegível. Não se pode perder de vista que o art. 2° da LC 64 prescreve que “compete à justiça eleitoral conhecer e decidir as arguições de inelegibilidade”. A título de exemplo, cum pre trazer à colação o entendim ento do Tribunal de Contas da União no sentido de que “a inclusão de nom es de responsáveis em listas a serem enviadas ao M inistério Público Eleitoral é ato m eram ente declaratório deste Tribunal, cabendo à Justiça Eleito ral a com petência exclusiva de declarar a inelegibilidade, nos moldes da m encionada Lei C om plem entar”.^** Nesse sentido já se pronunciou o TSE ao decidir que h á “necessi dade de a Justiça Eleitoral avaliar se as irregularidades motivadoras da rejeição de contas, por decisão irrecorrível do Tribunal de Contas com petente, denotam insanabilidade. Não com provado esse fato, não há que se falar em inelegibilidade.”^^ O m esm o TSE, na Consulta n° 940DF, de 18.11.2003, assinalou que: “B) A rejeição de contas pelo TCU p ode ser causa de inelegibilidade (Lei C om plem entar n° 64/90, art. 1°, I, g); no entanto, a inclusão do nom e do adm inistrador público na lista rem etida à Justiça Eleitoral não gera inelegibilidade, pois se trata de procedim ento m eram ente informativo”. O STF tam bém já se posicionou n o MS 22.087-DF ao afirmar que ‘a justiça eleitoral com pete form ular juízo de valor a respeito das 73 74 75 Aliás, e n te n d e u o TSE, n o s Ac. 13.847 d e 19.11.1996 e Ac. 12.009 d e 04.08.1994, q u e m e s m o o T ribunal d e C o n ta s te n d o a p ro v a d o as c o n ta s c o m ressalva, é p e r m iti d o a Justiça Eleitoral a n alisa r as irre g u la ri d a d e s verificadas e, se e n te n d e r q u e as m e s m a s são insanáveis, co n clu ir pela inelegibilidade. T C 299.035:90-2, A c órd ã o 5;1997. Ac. TSE n° 22.296 d e 22.09.2004. 32 irregularidades apontadas pelo tribunal de contas, vale dizer, se as irre gularidades configuram ou não inelegibilidade”. Pode-se assim dizer que a decisão pela irregularidade é apenas um dos pressupostos da inelegibilidade, já que, quando for decidir so bre o registro da candidatura, é que a Justiça Eleitoral analisará se a irre gularidade é insanável ou não, considerando para tanto toda a decisão do Tribunal de Contas ou do Órgão Legislativo. Por fim, deve-se registrar que, caso o órgão julgador (Tribunal de Contas ou Órgão Legislativo) que rejeitou as contas não tenha adje tivado com o insanável(is) a(s) irregularidade(s) encontrada(s), deverá então a Justiça Eleitoral verificar se os vícios que conduziram à rejeição das contas são sanáveis ou não'^, sendo imprescindível para essa análise o inteiro teor da decisão que rejeitou as contas'^, a fim de perm itir tal apreciação pela Justiça Eleitoral. 5.5. PR A Z O Q ÜINQÜENAL O prazo de cinco anos de inelegibilidade previsto no art. 1°, I,g d a LC 64 inicia-se a p artir da publicação do Acórdão irrecorrível do Tribu nal de Contas, ou da publicação do Decreto Legislativo, e fica suspenso enquanto estiver tram itando a ação judicial anulatória/desconstítutiva, caso esta seja proposta. O prazo se reinicia quando a ação judicial transitar em julgado, ou seja, o prazo, quando suspenso pela propositura de ação judicial que visa a anular/desconstituir o ato que rejeitou as contas, recom eça a cor rer pelo tem po que falta, após o trânsito em julgado da sentença que não acolher o pedido.^'^ 5.6. IN EXISTÊNCIA DE AÇÃO JUD ICIAL Q U ESTIO N A N D O A REJEIÇÃO DAS CONTAS O art. 1°, I, in fine, da LC 64 traz a ressalva de que, se o ato que considerou as contas rejeitadas estiver subm etido à apreciação do Po der Judiciário, a inelegibilidade ficará suspensa. 76 77 78 a , Ac. T S E n ” 661 d e 14,09.2000. Cf, Ac. T S E n ° 659 d e 20.09.2002, A c ,T S E n " 4 7 4 d e lO ,1 0 . 2 0 0 0 . 33 É sedutora, em um a análise perfunctória, a tese"^ de que a LC 64, em seu art. 1®, J,g, seria inconstitucional no que concerne a ressalva de exclusão da inelegibilidade pela simples interposição de ação judicial. Tal tese tem como fundam ento o fato de que a lei complementar, neste particular, conferiu a ato particular e unilateral o efeito, por si só, de sustar a eficácia de ato do Órgão Legislativo ou do Tribunal de Contas, usurpando a com petência do Judiciário. Muito em bora a com petência dos órgãos independentes (Po der Judiciário, Poder Legislativo, Poder Executivo, Tribunal de Contas e M inistério Público)^” tenham previsão constitucional, a eficácia e a abrangência das suas decisões possuem outro berço - a legislação infraconstitucional. Trilhar a tese apresentada seria a m esm a coisa que concluir que um a apelação no juízo cível não poderia ter autom aticam ente efeito suspensivo (art. 520, caput, do CPC), já que um ato particular e unila teral sustaria a eficácia de um a decisão do Poder Judiciário - o que não se admite! A pura e simples interpretação literal da parte final do art. 1°, I, g, da LC 64, gerava situações esdrúxulas, com o salienta Djalma Pin to, no sentido de que era possível que um candidato com im probida de caracterizada, docum entalm ente comprovada, cujas contas haviam sido rejeitadas pelo Tribunal de Contas e/ou pelo Órgão Legislativo, tornava-se elegível simplesmente porque ingressou com ação judicial em que especificava, inclusive, seu propósito puro e simples de apenas afastar a inelegibilidade. Eleito, diplom ado e empossado, poderia voltar a praticar os mesm os saques ao erário que, no passado, m otivaram a rejeição de suas contas.^' D urante um bom tempo, restou irrelevante, para fins de inelegi bilidade, se a ação foi ajuizada até m esm o na véspera da im pugnação ou se foi proposta logo após a decisão que rejeitou as contas. Esta questão foi objeto de análise do Tribunal Superior Eleitoral, que editou a Súmula 1: Proposta a ação para desconstituir a decisão que rejeitou 79 80 81 jA R D JM , 'lorquato. D i m t o deU oralpositivo. 2. ed. Brasília; Brasilia Jurídica, 1998, p. 77. MtilRELLHS, H ely Lopes. D ireito adm in istrativo brasileiro. 26. ed, São Paulo: .Vlalheiros, 2001, p. 63. PIN T O , D jalm a. D ireito eleitoral, an o ta çõ e s e tem as polêm icos, p, 87. 34 as contas, anteriorm ente à im pugnação, fica suspensa a inelegibilidade (Lei C om plem en tar no 64/90, art. 1°, I, &)' O que se exigia era tão-som ente a objetiva comprovação da m era propositura da ação desconstitutiva. Dessa forma, proliferavam-se ações anulatórias abusivas “suspendendo a inelegibilidade e devolven do ao gestor público, com um a simples petição que sequer tinha seus pressupostos de admissibilidade analisados (muito m enos o mérito), a condição de ser livremente votado"^-. Assim, era com um o ajuizamento da ação anulatória na undécim a hora com o propósito de buscar o m anto do enunciado da Súmula n« 1 do TSE. Até pouco tem po atrás, prevalecia a interpretação literal desta sú mula, ou seja, exigia-se apenas a objetiva com provação de m era propo situra de ação desconstitutiva. Todavia, o próprio TSE superou antiga interpretação que dava à Súmula n° 1, que vigorava há mais de 14 anos, para privilegiar o inte resse coletivo de preservar a m oralidade e a probidade administrativa, como bem determ ina a Constituição brasileira de 1988 (art. 14, § 9°). A este respeito, lecionam Carlos M ário da Silva Velloso e Walber de M oura Agra: O Tribunal Superior Eleitoral, que an terio rm en te aceitava que a m e ra p ro positura de açáo anulatória da decisão de rejeição de contas suspenderia a inelegibilidade, m odificou seu p osicionam ento p ara adotar que a simples propositura da ação anulatória, sem a obtenção de provim ento lim inar ou tutela antecipada, não suspende a inelegibilidade. Dessa forma, n ão basta a intenção de co n tin uar a discussão judicial p ara im pedir essa causa de inelegibilidade, é preciso que haja o deferim ento dc lim inar ou cautelar, o que assegura que o pedido pleiteado po d e apresentar razoabilidade jurídica, ü posicionam ento anterior praticam ente inutilizava esse tipo de decisão dos Tribunais de Contas porq ue bastava a simples interposição de m e d id a judicial para postergar os efeitos da rejeição de contas. Posteriormente, protelava-se o an d am en to processual que perm itia ao 82 M O R A IS. G eorge \ c n t u r a . Inelegibilidade d e c o rre n te d a rejeição d e c o n ta s d e gestores p úblicos e a n o v a im e rp re ta ç â n d a S ú m u la n" 1 d o TSH; a m o ra lid a d e a d m in is tra tiv a c o m o desafio d o Terceiro M i lênio, In: AGRA, W alb er d e M o u ra ; CAS'i'RO. C elso Luiz Braga de; TAVARES, A n d ré R am o s (coord.). CoiistitucioiHilisino: os desafios n o te rceiro m ilênio. Belo H o rizo n te: f'ó ru m , 2008, p. 201-21)2. 35 im p etran te te rm in a r seu m a n dato sem ser alcançado por essa ineiegibilidade®’. Nesse sentido, a m era propositura d a ação anulatória, sem a o b tenção de provim ento lim inar ou tutela antecipada, não suspende a inelegibilidade®'^. Afinal, ao em prestar eficácia suspensiva autom aticam ente às ações interpostas antes da im pugnação do registro da candidatura, era esvaziado p o r com pleto o princípio da moralidade, em detrim ento do controle das contas públicas e desprezando a ponderação entre os p rin cípios constitucionais. Agora isto m udou. Se ficar caracterizado que a propositura da ação dem onstra a existência de m anobra com intenção de burlar a lei, esta não deve ser aceita para afastar a inelegibilidade.^^ Além disso, a ação a ser proposta pelo candidato deve objetivar a desconstituição da decisão que rejeitou as suas contas. Isto é, deve ser direcionada contra esta decisão, não sendo suficiente, v.g., a alegação de que 0 candidato encontra-se respondendo a um a ação penal ou a um a ação civil pública (im probidade adm inistrativa) pelas mesmas irregula ridades que ensejaram a rejeição das contas. Assim, a ação a que se refere a alínea g do art. 14 da LC 64 é aquela proposta pelo candidato para anular a decisão que rejeitou suas contas, cabendo à Justiça Eleitoral aferir se ela é apta para tanto.*^ E tal ação anulatória que busca desconstituir a decisão que rejeitou as contas deve ser proposta antes da im pugnação do registro da candidatura, a fim de evitar oportunísticas e casuísticas ações judiciais. C om efeito, a Justiça Eleitoral não deve interferir no juízo que há de ser form ulado nem antecipar qualquer julgam ento sobre o p ro n u n ciam ento da Justiça Com um . Em outras palavras, se a decisão do órgão com petente para julgar as contas for subm etida em um a ação à Justiça Com um , deve a Justiça Eleitoral abster-se de qualquer pronunciam ento sobre aquele fato tido com o irregular. 83 84 85 86 VELLOSO, C arlos M ário d a Silva; A G RA , VValberde M o u ra . E lem entos d e direito eldioral. p. 72-73. Ac.-TSE, d e 24.8.2006. n o R O n “ 912; d e 13.9.2006, n o RO n" 963; d e 29.9.2006, n o R O n" 965 e n o R E spc n ” 26.942; e d e 16.11.2006, n o AgRgRO n" 1.067, d e n tre outros. C ER Q U E IR A , 71)aJes Tácito Pontes l uz d e Pádua. D ireito eleitoral brasileiro. 2. ed. Belo H o riz o n te ; Del R ey,20ü4, p. 775. TSE, A c ó rd ã o n« 19.981, de 29.08.2002 e A c ó rd ã o 619. dc 12.09.2002 - Rcl. M in . F E R N A N D O NEVES. Cf. ainda: C E R Q U E IR A , Thales Tácito P ontes Luz d e Pádua. D ireito eleitoral brasileiro, p. 775. 36 Por fim, merece ser destacado que, a fim de utilizar a ação anulatória e ver suspensa a sua inelegibilidade, além de considerar os aspec tos abordados anteriormente, não se pode esquecer que todos os fiandam entos da decisão administrativa ou político-legislativa que ensejaram a rejeição das contas deverão ser combatidos, e não apenas algum(ns) ponto(s).^' Não obstante, obviamente é possível ter suspensa a inelegibi lidade caso a ação judicial questione, v.g., unicamente a impossibilidade do exercício da ampla defesa e do contraditório, e que esta situação tenha com prometido todo o julgamento acerca dos aspectos meritórios. 6. CO NSID ERA ÇÕES FINAIS A inelegibilidade decorrente da rejeição das contas é um tem a sempre em pauta n a prática eleitoral brasileira, m orm ente na proxim i dade do período eleitoral. Muitos candidatos, principalm ente aqueles que buscam a reeleição para cargos de chefe do Poder Executivo, têm julgadas irregulares as contas sob sua responsabilidade, podendo, em razão disto, terem im pugnadas as suas candidaturas em razão da inele gibilidade prevista no art. 1°, I, g, da LC 64. Este trabalho buscou lançar luzes aos aspectos polêmicos envol vendo a inelegibilidade decorrente da rejeição das contas. Nesse senti do, foram feitas considerações acerca da rejeição das contas bem como sobre a inelegibilidade dela decorrente. D entro de um a ponderação entre o direito fundam ental à ele gibilidade e a necessidade de zelo com a res publica, foram analisados aspectos controvertidos envolvendo os requisitos configuradores da inelegibilidade prevista no art. 1°, I, g, da LC 64, quais sejam, rejeição das contas, decisão proferida po r órgão competente, irrecorribilidade da decisão, irregularidade insanável, prazo qüinqüenal, e inexistência de ação judicial questionando a rejeição das contas. O que se almejou neste estudo foi provocar um debate para a d e finição de novas balizas quanto à análise das (ir)regularidades p o r parte dos órgãos com com petência de controle das contas da Administração Pública - Tribunais de Contas e Órgão Legislativo - e o reflexo das de cisões deste órgãos junto à Justiça Eleitoral acerca da (in)elegibilidade. 87 Ac. I sr. i r l.\2 2 3 , d e 30.09.1996. 37 Isto se faz necessário para que, de um lado, seja respeitado o d i reito fundam ental à elegibilidade, e, de outro, seja vedado que pessoas ím probas tenham a possibilidade de concorrerem a u m cargo público e novam ente usurparem o erário. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGRA, Walber de M oura; CASTRO, Celso Luiz Braga de; TAVARES, A ndré Ramos (coord.)- Constitucionalismo: os desafios no terceiro m i lênio. Belo Horizonte: Fórum, 2008. BRITTO, Carlos Ayres. O Regime constitucional dos tribunais de con tas. In: O novo tribunal de contas: órgão protetor dos direitos funda mentais. 3. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 59-75. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 1998. CASTRO, José Nilo de. Julgamento das contas municipais. 3. ed. Belo Horizonte; Del Rey, 2003. CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. Direito eleitoral bra sileiro. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. COSTA, José Rubens. Prestação de contas dos governos estaduais. Elebigilidade/inelegibilidade. Revista de direito administrativo. Rio de Ja neiro: Renovar, n. 208, p. 83-110, abr-jun 1997. COSTA, A driano Soares. Instituições de direito eleitoral 3. ed. Belo H o rizonte: Del Rey, 2000. GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel. Tribunais de contas - aspectos contro vertidos. Rio de Janeiro: Forense, 2003. GORDILLO, Augustin A. La administración paralela: el paralistema jurídico-adm inistrativo. M adrid; Civitas, 1982. JACOBY FERNANDES, Jorge Ulysses. Boletim de direito municipal. Inelegibilidade e contas públicas. São Paulo: NDJ, ano XIX, n. 12, dez., 2003. 38 JARDIM, Torquato. Direito eleitoral positivo. 2. ed. Brasília: Brasília Ju rídica, 1998. MORAIS, George Ventura. Inelegibilidade decorrente da rejeição de contas de gestores públicos e a nova interpretação da Súmula n'" 1 do TSE: a m oralidade adm inistrativa com o desafio do Terceiro Milênio. In: AGRA, Walber de M oura; CASTRO, Celso Luiz Braga de; TAVA RES, André Ramos (coord.). Constitucionalismo: os desafios no terceiro milênio. Belo Horizonte: Fórum , 2008. PEDRA, A nderson Sant’A na Pedra. A constitucionalização do direito e 0 controle do m érito do ato adm inistrativo pelo judiciário. In: AGRA, Walber de M oura; CASTRO, Celso Luiz Braga de; TAVARES, André Ramos (Coord.). Constitucionalismo: os desafios no terceiro milênio. Belo Horizonte: Fórum, 2008. _________. 0 controle da proporcionalidade dos atos legislativos: a h er m enêutica constitucional como instrum ento. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. _________. A de lei im probidade adm inistrativa e o princípio da p ro porcionalidade. Revista interesse público. Porto Alegre: Nota Dez. Ano 7, n. 34, p. 75-87, nov./dez. 2005. PEREIRA, Cláudia Fernanda de Oliveira. Revista do tribunal de contas do Distrito Federal. A inelegibilidade de agentes públicos, da ótica do controle externo: um debate crítico sobre a participação dos tribunais de contas. Brasília, v. 32, t. 1, 2006. PINTO, Djalma. Direito eleitoral: anotações e temas polêmicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. 39 40 A ARENA INCLUSIVA COMO MODELO DE DEMOCRACIA A n d r é R a m o s Tavares'"^ I. APONTAMENTOS INICIAIS O presente estudo procura apresentar a cham ada democracia deliberativa, tam bém conhecida com o dialógica, consensual, inclusiva ou discursíva^^, que se realiza p o r meio de um a arena que chamarei “inclusiva” Q ualquer das opções terminológicas, contudo, pode ocasionar confusões conceituais decorrentes de arm adilhas da linguagem. A de m ocracia assim concebida não se circunscreve ao m om ento de decisão, como seria razoável de se com preender o term o “deliberação” na língua portuguesa (nesse sentido: Souza Neto, 2006: 87); não busca apenas a inclusão de todos exclusivamente no m om ento d a escolha de repre sentantes ou na votação (concepção mais participativa); não pretende, necessariamente, o consenso universal e pleno; nem se satisfaz com a m era abertura ao diálogo (dialógica) ou com algum canal (espaço) co m unicativo (discursiva). Nas línguas latinas o term o “deliberativo” se prende fortem ente à idéia de decisão. Deliberativa, contudo, deve ser com preendida - neste contexto de deliberação dem ocrática - com o a dem ocracia que se pre ocupa com a discussão (não toda e qualquer form a de discussão, mas um específico m odelo de cunho com unicativo - inclusi vo, conform e se analisará a seguir). Assim, dem ocracia deliberativa não pode ser confundida com 88 89 Professor d o s P ro g ra m a s de D o u to r a d o e M e s tra d o e m D ireito d a PU C /S P ; Visiling Research Scholar n a C a n io zü School o f L a w - N ew York; Pro fesso r C o n v id a d o d a U niversidade de Santiago de C om poste la-. D ire lo r d o In s ü tu to B rasileiro d e E stu d o s C o n stitu cion ais; Parecerista; e-m ail: artsp ro f@ g m ail.co m . O p ta r-sc -á , aqui, e x clu sivam en te pe la p rim e ir a te rm in o lo g ia. A d e m o c ra c ia d eliberativa, con tu d o , não d escarta, c o m p le ta m e n te , a d e m o c ra c ia p articip ativa e a d e m o c ra c ia representativa. C a n o t i l h ü , c o n tudo, p re te n d e di.stltiguir a d e m o c ra c ia d iscu rsiva d a d eliberativa, p r o m o v e n d o u m a vinculat^ão e n tre esta e a Escola d o re p u b lic a n ism o liberal e e n tre a d e m o c ra c ia discu rsiv a e a te o ria d e H a b e r m a s , a p re se n ta n d o esta c o m p ro p o s ta m ais “relevante” (su b sta n c ia lm e n te engajada). O a u to r acrescenta, a in d a , u m terceiro e diverso m o d e lo : a d e m o c ra c ia c o rp o ra tís ta ( p o d e ría m o s c h a m a r d e negociai) de S c H M l T T F . R (cf. C a N O T I L H O , 2 0 0 ) : I 4 1 6 - 7 ) . 41 dem ocracia na deliberação (decisão), ainda que essa deliberação se estabeleça por votação na qual participe a totalidade dos interessados (um a dem ocracia direta). A d e m o c r a c i a é d e lib e r a tiv a , a s s i n a l a m A m m y G u t m a n n e D e n n i s T h o m p s o n , p o r q u e “o s t e r m o s d e p a r t i c i p a ç ã o r e c o m e n d a d o s s ã o co n c e b id o s c o m o ra z õ e s q u e os c id a d ã o s o u seus re p re se n ta n te s o fere c e m n u m p r o c e s s o e m c u r s o d e m ú t u a j u s tif ic a ç ã o [e r e s p e i t o ] ” ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004:126). A ênfase recai, antes, no m odo de formação e encam inham ento da discussão e conclusão, do que na decisão ou seu conteúdo. II. P O R QUE UMA NOVA PROPO STA DEM OCRÁTICA? Assim como a proposta de u m a dem ocracia participativa, a de mocracia deliberativa assume com o insuficiente os modelos calcados exclusivamente na (ainda que ampla) votação em representantes que decidem (cf. S o u z a N e t o , 2006: 10), a cham ada democracia represen tativa. A idéia de um modelo dialógico, essencial à dem ocracia delibe rativa, prende-se ao pressuposto teórico de que a dem ocracia haveria de incorporar um m om ento de amplas discussões, que fosse capaz de prom over um embate e conhecim ento profundo de idéias e pontos de vista, am pliando os horizontes da agenda política, das convicções e co nhecim entos pessoais e da harm onia entre todos que se dispusessem a incorporar um debate franco e racional. Essa proposta de um governo dem ocrático assentado em discus sões públicas pode retroagir, num a arqueologia das idéias, a A r i s t ó t e l e s . Mas tam bém é possível considerar com o bem recente um desen volvimento mais preciso dessa proposta, com J o h n D e w e y e seu prag m atism o político (cf. P o g r e b i n s c h i , 2004). O autor assegurava que, mesm o nas instituições dem ocráticas “mais rudim entares” já haveria indícios da necessidade de se prom over a consulta e discussão. Uma das obras contem porâneas que mais influenciou o debate sobre o assunto, considerada com o referencial obrigatório, é a de A m y G u t m a n n e D e n n i s T h o m p s o n , Democracy and Disagreement (1 9 9 6 ), em bora muitos reputem que as posições apresentadas são extrem a 42 m ente vagas, parciais e desvinculadas do m u n do real. Ademais, como se sabe, J ü r g e n H a b e r m a s tam bém contribuiu decisivamente para a difusão dessa discussão, na vertente dita procedimental. Para as grandes questões e divergências sociais cada concepção de dem ocracia oferece seus modelos próprios, de tom ada das decisões que fatalmente irão vincular as pessoas em geral. As resoluções alcan çadas sem a oitiva dos diversos pontos de vista envolvidos - concepção agregativa de dem ocracia ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 13) - é con siderada - pela concepção deliberativa de dem ocracia - com o injusti ficável num contexto tão complexo com o o das sociedades atuais (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004; 12). Assim, tendo em vista a existência de diversas posições sobre os mais variados assuntos, e considerando que as pessoas discordam entre si sobre as m elhores soluções e, ainda, considerando que boa parte desse desacordo é razoável, certas prefe rências estão na base das leis e do governo^", sendo a mais adequada form a de decidir seria a dialógica^'. Isso eqüivale a dizer que o conteúdo das leis em geral (m om ento decisório do Parlamento) deveria ser realizado em term os deliberati vos. Os cidadãos deveriam discutir - em term os deliberativos - acerca do mais adequado conteúdo das leis ou decisões^^ que os irão vincu lar. Nessa m edida é considerada com o incompatível com essa visão a proposta de soluções definitivas individualm ente pré-concebidas ou a aceitação/imposição de soluções externas concebidas sem o debate. Por quê? Como coloca B o h m a n , a abertura de um espaço deliberativo na formação das leis ou decisões que vincularão os participantes já oferece um a (convincente) razão para que estes sujeitos se sintam obrigados a seguir essas leis ( B o h m a n , 1996: 4; nesse m esm o sentido, tratando das políticas públicas, parece posicionar-se B o b b i o , 2004: 26). Nem m esm o a instituição de referendos públicos (m om ento áureo de uma dem ocracia participativa) seria mais im portante do que a abertura das instituições ao diálogo ( B o h m a n , 1996: 189; cf. D e w e y , 1927: 206). Considera-se, ainda, que as concepções agregativas vão apenas 90 91 92 O b se rv a S u s r t i N (1993: 164) q u e esta idéia d e q u e o (io v e rn o te m d e re a li/a r preferências é relativa m e n te nova, ap esar de e x tra o rd in a ria m e n te influente. A d v erte nesse s e n tid o B o h m a n q u e a p e n a s p r m ta fncic o p lu ra lis m o e c o m p le x id a d e das sociedades p o d e m p a re c e r o b stác u lo s à d e m o c ra c ia d eliberativa ( B o h m a n , 1996: 2. 152 e ss.). A in d a q u e p o s te r io rm e n te te n h a m d e ser c ria do s m e c a n is m o s o u u m a específica c u ltu ra p a ra in c o rp o ra r essas deliberações. 43 reforçar a distribuição de poderes já existente na sociedade (cf. G u t MANN> T h o m p s o n , 2004: 16), em bora haja acusações (por parte dos críticos) de que a dem ocracia deliberativa tam bém gere esse mesm o inconveniente, p or supostam ente realizar a eliminação das proposições inicialmente aceitáveis na discussão pública. Umas das vantagens apontadas pelos teóricos da dem ocracia deliberativa estaria num a espécie de capacidade pacificadora deste m o delo, na m edida em que as escolhas mais difíceis seriam mais aceitáveis por todos se as afirmações e reivindicações de cada um tivessem sido avaliadas adequadam ente para se chegar àquela solução (cf G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004:10). Essa m esm a capacidade pode ser encontrada na postura teórica que propugna um a constante “rediscussão e revisão” das grandes questões e decisões ( B o h m a n , 1996: 192). A dem ocracia deliberativa exige, essencialmente, que os partici pantes dialoguem entre si e estejam abertos aos argum entos contrários aos seus pontos de vista, recebendo-os p ara aceitá-los ou refutá-los de m aneira racional e convincente. Isso exige que se leve a sério os argu m entos dos adversários ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 11) e que haja um certo “policiamento” quanto aos argum entos próprios que serão apresentados. “A dem ocracia deliberativa representa, desse modo, um a aplicação da ética do discurso no cam po da política” ( S o u z a N e t o , 2006: 145). No modelo deliberativo dem ocrático os atores envolvidos não promovem qualquer arranjo de interesses, no sentido negociai com um da expressão. Os modelos dialógicos comunicativos concebidos teori camente (e praticados em alguns setores públicos e sociais) insistem na necessidade de que os diversos atores envolvidos cheguem a um ponto com um, a um a posição aceita por todos, por meio do convencimento racional, ainda que isso não signifique um consenso. Esse modelo, p o r tanto, trabalha com o pressuposto de que, num a discussão adequada, o diálogo poderá ser capaz de transform ar posições inicialmente adotadas pelos participantes desse processo, am pliando o conhecimento daqueles que deliberam, p o r meio do que se poderia cham ar diálogo responsável. Em franca contradição com um a form a dem ocrático-deliberativa de com preender o Estado, encontra-se a posição de burocratas^\ tecno93 Aliás, te rm o que, d e técnico, pa sso u a c o n sid e ra r-se a lta m e n te pejorativo. 44 cratas e ideólogos “que se consideram dispensados de buscar a decisão a ser tom ada no seio da sociedade civil” (para um a crítica: B a s t o s , T a v a r e s , 2000: 418), porque se crêem suficientemente preparados para decidir p o r ela. Em rota de colisão encontram -se tam bém as concep ções calcadas no critério majoritário ou m esm o no utilitarismo, pela oposição que representam ao livre m ercado de idéias. Com o se percebe, um modelo deliberativo de dem ocracia te n derá a resgatar o com prom isso m útuo ínsito à idéia de contrato social (cf. B o b b i o , 2000: 36), supostam ente cristalizado, adaptado e reinven tado pelo constitucionalism o na m odelagem genérica de um a C onsti tuição^^. A tensão, contudo, entre dem ocracia deliberativa e constitu cionalismo, irá aparecer justam ente pela constante e ampla abertura^^ que um modelo deliberativo propugna. Proposições (constitucionais) deveriam ser constantem ente avaliadas e subm etidas ao teste público do diálogo aberto e responsável, perm itindo-se que novas soluções fos sem apresentadas e adotadas po r todos. Essa postura conflita com a própria origem (contra-revolucionária) do constitucionalism o (norteam ericano), que pretendeu sufocar as vozes das grandes massas e as m udanças, form ada p o r “contra-revolucionários que tom aram um a revolução dem ocrática radical e transform aram -na em um a sociedade dom inada pelos ricos e poderosos” ( M e e , 1993: abertura). O enaltecim ento de um a postura dialógico-inclusiva-racional tam bém irá chocar-se com os modelos dem ocráticos que, seguindo o norte-am ericano, reconheçam amplos poderes ao Judiciário'^^. A própria teoria de G u t m a n n e T h o m p s o n se contrapõe às preo cupações e marcos liberais do constitucionalism o clássico, que se ocupa do Poder Judiciário e da preservação de certos “valores” suprem os e intangíveis, seja em relação ao legislador, seja em relação às diversas v o zes sociais. Não deixa de ser, neste ponto, um a p ostura crítica ao m ovi m ento do constitucionalism o liberal (e pseudo-dem ocrático) que teria vingado nos EUA e em diversos outros países. Há, contudo, diferenças, p or vezes profundas, entre os teóricos 94 95 96 E m sua o rig e m , d e n ítid o m a tiz a n lim ajo ritário . E m b o ra a a n u n c ia d a a b e r tu r a total seja. e m parte, c o n te sta d a p o r críticos d o m o delo , c o m o se verifi cará a seguir. A p e sa r disso, h á u m a p e rsp ec tiva d e c o o rd e n a ç ã o possível e n tre in te rv e n ç ã o Judicial e d e m o c ra cia deliberativa, in d ic a d a adiante. 45 defensores da dem ocracia deliberativa, podendo-se falar em “várias versões” de tal dem ocracia (cf. M a c e d o , 1999: 4 ). Algumas das posi ções de certos autores não são adotadas p or inúm eros outros que têm se alinhado ao modelo deliberativo de democracia. Disso decorre certa dificuldade em pretender realizar u m estudo descritivo desse modelo que não prom ova constantes referências a autores e perspectivas “sin gulares” da dem ocracia deliberativa como proposta teórica e prática. S o u z a N e t o propõe um a síntese inicial dos modelos de dem o cracia deliberativa teoricam ente sustentáveis, quais sejam, a substanti va, a procedim ental e a cooperativa, cuja fundam entalidade é reconhe cida, respectivamente, com “a) os direitos que correspondam aos princípios ou aos valores políticos fundam entais de nossa sociedade; b) os que consistam em condições procedim entais da democracia; c) ou os que capa citem os cidadãos para cooperar n a deliberação pública tendo em vista a realização do bem comum.” ( S o u z a N e t o , 2006: 12-3) Nas concepções procedimentalistas, um a vez respeitado o proce dim ento, qualquer que seja o resultado estaria ele justificado. E ly , um dos grandes representantes desta concepção, argum enta que a C onsti tuição (estadunidense) se tornou distinta da demais por ter se caracte rizado como um processo de governo, e não um a ideologia governante (axiologicamente vinculante). Citando o justice L i n d e , tem-se que a Constituição deve prescrever processos legítimos e não resultados legí tim os (cf. E ly , 1980: 101). Contudo, a crítica que se apresenta é a de que essa concepção tam bém com unga de certas posições substantivas iniciais (pressupostas), com o a liberdade e igualdade (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 25). As posições essencialmente substanciahstas, p o r seu turno, pare cem retirar do próprio espaço dem ocrático a discussão acerca de quais seriam as pautas m ínim as a serem observadas, o que de certa m anei ra poderia ser considerado com o inconsistente com certos postulados apresentados p o r alguns teóricos para a dem ocracia deliberativa. Ademais, nas teorias procedim entalistas costum a ser vislum bra da um a estratégia de “desjuridificação”, “com o form a de favorecer o racionalismo e o pluralismo jurídico, ampliando, para seus defensores, o 46 e s p a ç o d a c id a d a n i a ” (B e r c o v i c i , 2 003 : 16), j á q u e n ã o h á v in c u l a ç ã o in ic ia l a v a lo r e s p r é - c o n c e b i d o s . IH .E L E M E N T O SD O M O D E L O D E M O C R Á T IC O DELIBERATIVO A propalada falta de unanim idade dos modelos de dem ocracia deliberativa aparece com m aior ênfase nas “condições” consideradas necessárias para assegurar a realização do próprio modelo. G u t m a n e T h o m p s o n adotam , p o r exemplo, um a postura radi cal ao propugnarem que os próprios princípios da dem ocracia delibera tiva seriam m oral e politicam ente provisórios ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 97)^, não reconhecendo que algum m étodo possa ser, de ante mão, suficiente para justificar qualquer decisão que nele seja produzida ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 18,26'^^). B o b b i o (2004: 55), nessa m es m a linha, indica que nen h um a técnica dehberativa pode ser boa para todos os casos. Alguns autores parecem pretender u m a aplicação totalitária do modelo deliberativo, enquanto outros aparentem ente visam apenas às questões mais problemáticas, em bora esta identificação seja, ela pró pria, difícil. Há, ainda, autores que excluem do m odelo deliberativo a idéia de representantes eleitos com o aptos a prom overem esse modelo, enquanto outros a adm item. Estudiosos com o B o h m a n consideram que algumas das condi ções necessárias para a dem ocracia deliberativa não podem ser garan tidas po r regras institucionais, desenhos ou procedim entos. Lembra o autor que a dem ocracia deliberativa deve prover periódicas reestrutu rações das instituições quando a razão pública comece a falhar (cf. B o h m a n , 1996-. 198). Isso significa que a dinâm ica do m odelo deve não apenas se preocupar com a m udança das atitudes e crenças individuais (o que é indicado como o “coração” da dem ocracia deliberativa), mas tam bém com a m udança da própria m oldura do m odelo quando isso se faça necessário (cf. B o h m a n , 1996: 198; G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 97). 97 98 E m b o ra os criticos n ã o c o n sid e re m q u e referid a te oria seja e te tiv a m en te tã o a b erta c o m o essa assertiva nos le varia a con clu ir O s a u to res rejeitam as posições m inim alista s, calcadas e x clu siv am en te n o p ro c e d im e n to e c o m p r e e n d e n d o - o c o m o justificativa d e q u a lq u e r so lu ção ao final a d otad a. 47 Ademais, as estruturas, contexto e requisitos norm alm ente apontados pelos teóricos costum am apresentar escasso apelo prático, sendo m uito raro encontrar estudiosos com o L u i g i B o b b io ^ ^ e J a m e s B o h m a n que se dediquem a verificar com o o modelo pode desenvolver-se em “condições sociais reais” ( B o h m a n , 1996: ix)‘“ . Isso bem dem onstra que um a m aior discussão e reflexão acerca da teoria e prática da dem ocracia deliberativa é ainda necessária (essa é a linha adotada em: M a c e d o , 1999). A seguir são apresentadas algumas dessas “condicionantes”, des ses elementos gerais, levantados p o r diversos autores, p o r vezes inte grantes de teorias próprias e isoladas'^'. III.1. Publicidade das discussões Exige-se, na dem ocracia deliberativa, a publicidade das discus sões, que h á de se realizar em um fórum público (nesse sentido: B o h m a n , 1996; 5; G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 4; S o u z a N e t o , 2006: 93). Ademais, todo indivíduo deve ter igual oportunidade de “colocação” no espaço público de discussão (cf. B o h m a n , 1996:151). Mas as próprias razões utilizadas devem refletir condições da publicidade, ou seja, devem ser convincentes para todos (cf. B o h m a n , 1996: 6, 25). Esta tese está na base da idéia de u m standard m ínim o de concordância entre cidadãos livres e iguais ( B o h m a n , 1996: 25). Com um ente tam bém se fala em publicidade da deliberação, no sentido de sua universalidade ou inclusão máxima, considerada públi ca ao invés de coletiva ou com o atividade de um específico grupo (B o h m a n , 1996: 8 ) '“ . 99 B o b b io (2000; 2004) p re o c u p a -se e sp e c ia lm e n te e m a n alisar as características fu n d a m e n ta is d o f u n c io n a m e n to d a a re n a deliberativa, u m a vez in d iv id u a liz a d o s os possíveis in terlocu to res, e q u e seriam b a sic a m e n te três: e s tr u tu ra ç ã o {evitando a e te rn id a d e das discussões), in fo rm a lid a d e e tran sparência. O c u p a seus e stu d o s c o m as técnicas p a ra q u e a de lib e ra çã o seja p ro d u c e n te , c o m o o brainslormirig (2004; 74). 100 N a o b ra recen te m e n te o rg a n iz a d a p o r J o h n G a s t i l e P c t e r L eviN £ (2005) é possível e n c o n tra r u m a série d e estud o s c o m a m p lo s u p o rte e m ex em p lo s con creto s d e p ráticas deliberativas. 101 N ã ü h á n e n h u m a p re o c u paç ã o , a seguir, e m f o r m a r os e le m en to s d e u m a ú n ic a e “m e lh o r” (c o n s iste n te) teoria, m a s ap en a s levan tar d iversos e le m en to s c o m u m e n te in d ic a d o s o u iso la d am e n te sub lin h a d o s pelos teóricos, Tsse tip o cie a b o rd a g em p e rm ite v is lu m b ra r a lg u m a s d ificu ld ad es (teó ricas e práticas), ao invés b u s c a r a fo rm ataç ã o im e d ia ta d efinitiva d o m o d elo . A p o s tu ra d e a p ro x im a ç ã o c o m o te m a a d u la d a n e ste e s tu d o está b a se a d a em c erto d e sc o n h e c im e n to , n o Brasil, acerca das p o stu laçò es da d e m o c ra c ia deliberativa. 102 Esse e n fo q u e será an alisa d o abaixo, c o m o p rin c íp io d a inclusão o u universalidade. 48 A publicidade deve alcançar o desenvolvimento do próprio proces so deliberativo de apresentação e interação de razões ( B o b b i o , 2000: 31). Por íim, é preciso acentuar, com B o h m a n (1996:192), que o em prego da razão pública não pode restar isolado na esfera pública infor mal. A publicidade das discussões deve ser arrastada para as próprias instituições dem ocráticas tradicionais ou para seu entorno (abrindo canais de recepção ao diálogo deliberativo realizado nesse entorno). 111.2. Princípio da justificação das decisões e a idéia de razão pública Parece que u m dos pontos de contato entre as diversas “corren tes” da dem ocracia deliberativa encontra-se justam ente na necessida de de que as decisões sejam precedidas de razões que as justifiquem, a exigência de um a “reason-giving” (cf G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 3 ), 0 que, de resto, é recorrente em diversos teóricos (com o em R a w l s , preocupado em enfrentar o pluralismo da complexa sociedade atual e a proteção de suas liberdades básicas). Isso é compreensível na m edida em que se trata de um m ode lo comunicativo, que incorpora a livre apresentação e troca de razões com o parte essencial do processo. Mas essas razões devem ter um a qualidade especial: devem ser razões admissíveis, aceitáveis, que não possam ser rejeitadas de p ro n to (cf. B o h m a n , 1996: 5, 25; G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 3; R a w l s , 2003: 128), acessíveis a todos cidadãos (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 4). Também se exige que sejam razões não apenas toleradas, mas que produzam um respeito m útuo (cf G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 4, 22, 65 e 79-90), que possam ser com unicadas de um a form a que todos possam entendê-las, aceitá-las e livremente respondê-las. Essas exigên cias deliberativas são consideradas com o justificadoras das decisões a serem adotadas. As razões devem ser elaboradas voltadas para o problem a (forma de pensam ento aparentem ente tópico-dialética). Em outras palavras, com o assinala B o b b i o (2000: 23), é preferível que os participantes se jam confrontados com o problem a e não com um a oficial solução, para a qual sejam convocados apenas para se sentirem (artificialmente) in corporados. 49 Fazendo u m a aplicação específica deste princípio na tom ada de decisões pela A dm inistração Pública (voltada, portanto, para a esfera de execução de decisões de eficácia geral), B o b b i o lem bra que num processo deliberativo é preciso estar disposto a se surpreender. Assim, a Administração Pública, quando fizer a opção pela participação deli berativa de todos, dede estar preocupada não em legitimar a decisão (com um a convocação artificial para justificar conclusões prévias), mas em eventualm ente corrigi-la ( B o b b i o , 2004: 38). Tendo em vista a ênfase que a teoria deliberativa coloca nos ar gum entos e razões que levam a um a decisão ou conclusão, torna-se ne cessário saber com a m aior objetividade possível quais seriam razões ou argum entos aceitáveis no espaço deliberativo, para fins de justificar um a postura “final” Isso envolve um a ampla teoria acerca da linguagem^*^\ do discurso, do discurso prático geral, do discurso jurídico'^'*, bem como dos m étodos aceitáveis de exposição, articulação e contes tação das razões. Certas condições substantivas'^^ são consideradas im prescindíveis, para os teóricos que as adotam , em virtude da necessida de de só assim poder haver u m controle efetivo, pelos próprios partici pantes, das razões apresentadas na arena inclusiva, na qual se promove a discussão e se realiza a dem ocracia deliberativa. ‘A m edida de tais opiniões está no veredicto dos cidadãos livres” ( B o h m a n , 1996: 8). Há, na base de certas teorias deliberativas, um a razão prática para a apresentação dessas razões: elas produzem decisões mais convincen tes. B o h m a n , contudo, adverte que não é só esse o aspecto positivo, pois as decisões assim alcançadas seriam tam bém epistemologicamente superiores ( B o h m a n , 1996: 25-6). Indica-se, aqui, ainda, um a base m oral para essa exigência, que é justam ente a consideração da dignidade da pessoa hum ana, n o sentido de que “as pessoas devem ser tratadas não apenas com o objetos da le gislação” ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 3). 103 B o b b io (2000) defende, d e n tr o d a idéia d e in fo r m a lid a d e d a are n a d eliberativa, o uso d e lin g u ag em n ã o técnica. 104 Pa ra u m d e se n v olv im e n to d o tem a; A le x y , 1978. Envolve ta m b é m u m a c o rd o sobre o s p rin c íp io s d a a rg u m e n ta ç ã o (R a w l s , 2003) e a c o m p re e n sã o d o papel d o s críticos n a d iscu ssão pública ( c f Bo h m a n , 1996; 203-8). 105 D escritas abaixo. 50 111.2.1. Comunicação e outros processos sociológicos: o outreach B o b b i o é enfático ao ressaltar o que se poderia considerar como um a espécie de princípio implícito à idéia de publicidade, m as que aca ba p o r reforçar o uso público e genérico que se quer das razões em er gentes para o tema. Trata-se do princípio com unicação (divulgação). É preciso comunicar aos diversos agentes interessados a formação de um a arena inclusiva e dialógica. Uma com unicação prévia deve, nos term os trabalhados p o r B o b b i o , produzir o necessário interesse e alarme. Aqui deve haver um estu do mais acurado do processo em que se deve desenvolver essa “com u nicação”, de m aneira a analisar quais seus mecanism os, pressupostos e objetivos (por exemplo, ser neutra ou crítica, utilizar-se da mídia ou de processos seletivos previamente concebidos). Por meio dessa com unicação-divulgação procura-se incorporar (incluir) na arena deliberativa todos sujeitos potencialm ente interessa dos no sentido de incluir todos pontos de vista razoáveis que merecem estar presentes na discussão. Mas se esta é a íinalidade, com o bem aponta B o b b i o (2 0 0 0 : 26), outros mecanism os com plem entares deverão ser utilizados, como questionários e entrevistas. Isso porque muitas vezes os indivíduos mais interessados simplesmente não aparecerão para apresentar suas dem andas e pontos de vista e, m esm o assim, é imprescindível que as instituições oficiais, que prom ovam um a arena deliberativa (quando for esse o caso), cerquem-se de todas as razões para deliberar. É o que se cham a de outreach, ou seja, ao invés de aguardar que as demandas, declarações e pontos de vista simplesmente se apresentem à A dm inis tração ou Poder Público responsável pela deliberação, estes devem procurá-las “fora” de suas estruturas. 111.2.2. Princípio da economia do desacordo moral Q uanto às razões a serem apresentadas, A m y G u t m a n n e D e n n i s T h o m p s o n falam do princípio da econom ia do desacordo moral, que pressupõe, em realidade, a aceitação de um postulado de certa m a neira oposto à dem ocracia deliberativa, pois parece pressupor que o d e sacordo m oral deve ter limites ou sofrer limitações, m esm o no suposta 51 m ente amplo e ilimitado contexto deliberativo. Contudo, argum entam os autores que isso não significa que se devam com prom eter as razões a serem apresentadas na arena pública, no sentido de um com prom eti m ento engajado com o objetivo de se obter um acordo ao final. Sinteticamente, significa que se deve praticar um a contenção dos argum entos que levam ao desacordo, tentando encontrar justificativas ou desvios que m inim izem as diferenças e a possibilidade de rejeição da posição que se apresenta (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2 0 0 4 : 7 e 8 5), ou seja, deve-se proceder à busca de pontos de convergência entre o argum ento apresentado e aquelas outras posições que se vão rejeitar ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 2 0 0 4 : 86). Esse tipo de postura pode ser viabilizada, em parte, quando as pessoas se conscientizam de que não agem como pessoas privadas, mas sim com o “parte de um a esfera pública que é constituída por outros cidadãos” ( B o h m a n , 1996: 2 0 7 ). III.3. Princípio da inclusão ou universalidade; o stakeholder Fala-se em princípio da inclusão, no sentido de que não pode haver nenhum a conseqüência para aqueles cujos argum entos não es tiveram presentes (“representados”) na discussão. É a regra de ouro da dem ocracia deliberativa: n en hu m im pacto sem representação (cf. B o b B io , 2000: 25 e 2004: 22). B o b b i o (2000: 24) pressupõe, nessas circuns tâncias, que a abertura do processo decisório exige, via de regra, que alternativas ainda estejam disponíveis. Daí um a definição expansiva acerca de quem deve ser incluído no processo deliberativo (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 9) ou um a universalidade propriam ente dita (cf B o h m a n , 1996: 8). Há, b a s i c a m e n t e , tr ê s f o r m a s d e p r o m o v e r e s s a “ in te g r a ç ã o ” d ia ló g ic a ( c f B o b b i o ) : (i) p e l a a b e r t u r a a m p l a e p e r m a n e n t e d o “p o r t ã o d e e n t r a d a ”; (ii) p e la i n c lu s ã o “r e p r e s e n t a t i v a ” d a s d iv e r s a s o p i n i õ e s e p o n t o s d e v ista ; (iii) p e la c r ia ç ã o d e u m e s p a ç o p a r a o c i d a d ã o c o m u m a l e a t o r i a m e n t e s e le c i o n a d o i n t e g r a r a s discussões*®^. A abertura total do portão de entrada enfrenta o problema (his tórico) de que 0 espaço da decisão pública é norm alm ente fechado, in106 Esta v ariante, co n tu d o , irá sofre r as restrições d o s a rg u m e n to s razoáveis. 52 compatível com um espaço público, aberto e inclusivo. Na concepção deliberativa, espaço de decisão pública e espaço público passam a ser representados com o um m esm o e com um espaço, não com o espaços próprios e separados'^’. O Direito assim produzido terá sido, dessa forma, legítimo ( S o u z a N e t o , 2006: 155). Essa abertura signiHca que qualquer um que detenha um argum ento razoável deve poder apre sentá-lo ao espaço de deliberação ou, pelo m enos, ver seu argum ento sendo ali apresentado (v. G u t m a n n , T h o m p s o n , 1996). Ainda que os sujeitos não se integrem ao processo deliberativo, é m elhor que se tenha o portão aberto e que sejam eles a optarem pela exclusão (cf. B o b b i o , 2 0 0 4 : 48), É essencial explicitar este princípio da inclusão justam ente p or que ele tem sido descurado pelas dem ocracias na atualidade (YOUNG: 1999, 155). Pretende-se incluir no processo deliberativo todos (indivíduos, associações, grupos e instituições, além do próprio Poder Público) que tenham alguma razão aceitável, algum ponto de vista relevante. Para tanto, tem-se feito m enção à íigura do stakeholder, ou seja, todo aquele que tem (hold) u m interesse específico sobre o que foi colocado em jogo (stake) ( B o b b i o , 2 0 0 4 : 4 1 ). A abertura para todos os pontos de vista possíveis coloca a ques tão acerca das limitações (próprias do constitucionalismo) e suas compatibilidades com essa proposta (cf. M a c e d o , 1999; 4 ). Assim, em que m edida poderia o Poder Judiciário intervir para assegurar o nível de sejável de razoabilidade dos pontos de vista? Seria possível im por lim i tes prévios a esses argumentos, como, p o r exemplo, os direitos funda mentais assegurados constitucionalm ente (cf. M a c e d o , 1999: 4)? Para ficar com os exemplos anteriorm ente referidos: um debate no qual se apresente o argum ento da necessidade de estabelecer a ampla prisão por dívidas civis ou a discriminação de base exclusivamente racial poderia (ou deveria m esm o) ser descartado de pronto (e qual o fundam ento d e liberativo para tanto?), descarte a ser prom ovido p o r força de um a inter venção preventiva de um a declaração formal de direitos? O u isto cons tituiria um a restrição vexatória ao modelo de dem ocracia deliberativa? 107 Isso de co rria , e m parte, d a dissociação e n tre E stado e so cie d a d e r\o m u n d o o c id e n ta l c o n te m p o râ n e o , 0 q u e é inv o cad o p o r a lg u m a s p o s tu ra s céticas q u a n to à d e m o c ra c ia p ra tic a d a n a atualidade. 53 Mais ainda: qual o limite dessa inclusão e em que m edida algu mas pessoas, representantes de certas idéias, devem ser im pedidas de participar? A resposta remete à discussão acerca dos argum entos não aceitáveis no fórum deliberativo e às críticas dirigidas à dem ocracia de liberativa. 111.4. Princípio da aplicação seletiva Cham o de princípio da aplicação seletiva as posturas deliberativo-democráticas que adm item, em um prim eiro mom ento, que nem todas as questões devem ser submetidas à arena deliberativa (a arena é semi-inclusiva), que nem toda a atividade política deva se curvar a esse modelo (nesse sentido: G u t m a n n , T h o m p s o n , 2 004 : 3, 41 , 43 e 5 6 ), e que p o r vezes a justiça ou a privacidade deva prevalecer sobre o m odelo deliberativo-dem ocrático (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2 00 4: 3 4 -5 e 41). Além disso, admite-se que nem todas as decisões poderão ser o b tidas em pregando-se exclusivamente o m étodo deliberativo, sendo n e cessária, em alguns casos, um a “com plem entação” por outros processos decisórios (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 18-9; B o h m a n , 1996; 28), com o a votação e a representação^"^*. N a teoria apresentada p o r B o b b i o (2 0 0 0 : 2 1 ), indicam -se duas condições nas quais deve haver o alargamento da arena decisória pelo modelo deliberativo: i) quando a intervenção produzir reflexos exter nos relevantes (externalidade relevante) e, ii) quando a incerteza não puder ser simplesmente elim inada com base em análises técnicas. O u seja, quando houver bons motivos p ara entender que se pode resolver o problem a adequadamente, sem im por a arena deliberativa, então será m elhor optar pelas m odalidades tradicionais (cf. B o b b i o , 2 0 0 4 : 15). O autor chega a sustentar que o processo inclusivo deve ser a exceção ( B o b b i o , 2 0 0 4 ). Ressalte-se, ainda, que o m odelo deliberativo não pretende ex pandir-se para as relações privadas. 111.5. Princípio da reciprocidade 108 Fala-se, aqui, n u m a a p ro p ria ç ã o d a te rm in o lo g ia de A c k e r m a n ( 1 9 9 1 e 1 9 9 8 ) . cm in stituições d e m o c ráticas dualistas (cf. B o h m a n , 1996: 154, 197 e ss.). 54 Deve-se exigir, ademais, consoante alguns pensadores da de m ocracia deliberativa, a justificação (em term os morais) das ações (e decisões) adotadas, com o m edida de reciprocidade (nesse sentido: G u t m a n n , T h o m p s o n , 1996; 129). S e não é possível retornar à idéia de um m andato imperativo, o elemento dialógico vai im por um a “pres tação de contas” [accountability), que seja capaz de convencer a todos sobre a legitimidade da decisão adotada pelos representantes eleitos. Assim, em bora a decisão possa não ser desejada p o r certos grupos, es tes devem se sentir incluídos naquela decisão e p o r ela convencidos (nesse sentido: S o u z a N e t o , 2 0 0 6 : 8 9 ), de m aneira a dim inuir o “custo dem ocrático da divergência” praticando um a econom ia na extensão do desacordo m oral (cf. G u t m a n n e T h o m p s o n , 2 0 0 4 : 7). G u t m a n n e T h o m p s o n (1996: 52 e ss.) falam em reciprocida de, baseada na justificação para os demais participantes, substituindo a idéia de consenso pela de justificações m utuam ente razoáveis e aceitá veis ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 1996: 55). Isso porque os participantes, ao apresentarem suas posições, terão (no sentido impositivo) levado em conta os argum entos contrários, incorporando-os no discurso e, assim, d em onstrando o porquê de não terem sido aceitos. C om isso, a dem ocracia dialógica não tem de chegar, necessaria mente, a um consenso definitivo, o que acentua seu caráter dinâm ico e a possibilidade (politicamente relevante) de retom ar os argum entos utilizados anteriorm ente (v. G u t m a n n , T h o m p s o n : 6-7). III.6. Cláusula de reabertura das discussões Algumas teorias deliberativas, em especial a de G u t m a n n e T h o m p s o n , parecem propor um a espécie de “eternidade nas discus sões”, m esm o quando a decisão já tenha sido tomada. Um dos exemplos utilizados pelos autores é o d a guerra no Iraque e a continuidade das discussões m esm o após a invasão ( G u t m a n n e T h o m p s o n , 2004: 2 )'"l É im portante anotar que os autores não pretendem desabilitar o m om ento de decisão, nem negar que os argum entos invocados pelos 109 U m dos m o tiv u s p a ra tal o c o rrê n c ia te m ba se n a existência de razõ es q u e fo ra m oferecidas p a ra a invasão, o q u e p e rm itiria tal p e rm a n ê n c ia discursiva. 55 diversos participantes de um a arena deliberativa objetivem justam ente influenciar essa decisão. Apenas almejam anunciar que essa arena deli berativa deve perm anecer, mesm o após a decisão ter sido tom ada pelas autoridades. Desde que a decisão tenha sido justificada, as razões apre sentadas perm item essa linha de continuidade dialógica (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004; 6). Invoca-se u m a razão prática para essa postura dialógica contí nua; os cidadãos que discordassem da decisão seriam mais receptivos a estarem vinculados p o r essa decisão se soubessem da possibilidade de revertê-la (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 7), o que exige a abertura à discussão constante. Já na teoria proposta p o r B o b b i o (2000) aparece com o funda m ental a preocupação em evitar “que a discussão possa protrair-se ao infinito e degenerar em um a frustração geral”. Para tanto, B o b b i o in dica, como pressuposto, que os participantes deliberem previamente acerca das regras do jogo, que estas sejam razoáveis e que contem plem am pla possibilidade de participação e acesso. Presentes esses elem en tos, a discussão deve encerrar-se em algum mom ento. III.7. Condições substantivas de validação Em certas concepções de dem ocracia deliberativa, o Estado de Direito e alguns direitos fundam entais (aqueles considerados como de im pacto im ediato no processo deliberativo) serão tratados com o condi ções de possibilidade democrática^ e não limites à democracia. Nesse sentido, para estas vertentes, Estado de Direito e direitos fundam entais com o pautas m ínim as tam bém não serão com preendi dos com o contrários à soberania, m as a ela conform es (cf. S o u z a N e t o , 2006: 58), atuando n a sua própria preservação contra eventuais desvios que a degenerem ou eliminem. N ão só haveria u m a auto-restrição justa (em m aior ou m enor grau, mas sempre m inim alista) com o tam bém necessária à sobrevivência (preservação contra a vontade calcada em si m esm a mas arbitrária e destrutiva). Não se pretende fazer, aqui, um inventário dos diversos autores e suas respectivas filiações teóricas, nem tam pouco estabelecer um ca tálogo dos diversos direitos ou pautas considerados essenciais pelas te 56 orias substancialistas'"’. Apenas se quer prom over um a aproximação inicial com o tem a e registro do sentido dessa concepção. Q uanto aos valores substantivos que haveriam de ser incorpo rados pela dem ocracia deliberativa, encontra-se com um ente a igualda de. A rgum enta-se que a igualdade deve ser incorporada como um im portante ingrediente do m odelo deliberativo de democracia, porque a pobreza social e política bloqueiam a realização da democracia. Nesse sentido, a exclusão social operada por séculos de discri m inação racial exercerá u m elemento desagregador e desfigurador da dem ocracia dialógica, devendo ser tratada com o um a das condições prelim inares da dem ocracia a igualdade e as ações afirmativas nos con textos sociais de discrim inações históricas. Assim, a igualdade, com o afirma H a b e r m a s , será um a das con dições para que possa ocorrer um diálogo efetivo. Mas não é só. O autor, em sua concepção mais procedim entalista de dem ocracia deliberativa aponta tam bém para a liberdade. Do contrário, ter-se-á apenas a m a nipulação dos processos de discussão e formação da opinião pública. D a m esm a form a B o h m a n sustenta a necessidade tanto da igualdade como da liberdade dos cidadãos ( B o h m a n , 1996). A m y G u t m a n n e D e n n i s T h o m p s o n , em sua concepção não apenas procedimentalista, invocam a liberdade e a oportunidade como elementos substantivos necessárias para assegurar a dem ocracia delibe rativa. IV. ALGUMAS PAUTAS EM CO N EX à O CO M O M OD ELO DELIBERATIVO As preferências ou soluções alcançadas no espaço deliberativo são sustentadas “a p artir de dentro” do processo de discussão. Isso sig nifica que não há im posição de valores alheios ao próprio processo dialógico‘“ . Dessa forma, qualquer resultado poderá surgir de u m processo dem ocrático assim concebido. 110 Sobre o tem a: B e r c o v i c i , 2003. 111 Ver, sobre este p o n to , o ite m acerca das críticas à d e m o c ra c ia deliberativa. 57 A dem ocracia deliberativa aceita e preserva o pluralism o que se im põe na complexidade inafastável da sociedade contem porânea. A profunda discordância existente na sociedade acerca dos valores a se rem adotados faz com que não se possa escolher, previamente, n enh u m deles. H á um a necessidade de respeitar, aqui, a decisão dem ocratica m ente adotada, desde que as condições de existência dem ocrática te n ham sido preservadas. Parece que nem mesm o na dem ocracia deliberativa é possível im pedir que haja algum sufocamento, ainda que parcial ou reduzido, de certas minorias. O pluralismo inicial da teoria pode ser, ao final e na prática, eliminado. Apenas os valores “eleitos” com o precondições deliberativas é que podem servir com o im pedim entos (não totais) a essas ocorrências, além da suposta falta de qualquer razoabilidade em certos argumentos. Um observador “externo” poderá considerar certos resultados alcançados seguindo o m odelo dialógico, com o prejudiciais às próprias minorias. Evidentemente que a igualdade e a liberdade, com todos seus consectários, podem servir com o redutores im portantes do risco. Aliás, as próprias m inorias estão no centro das discussões delibe rativas (cf. S o u z a N e t o , 2 0 0 6 : 6 9 ). Uma interessante constatação é a de que as teses que seguem a concepção kelseniana ( K e l s e n , 1928: 56-7) de justificação de um a Jus tiça Constitucional tiveram com o horizonte o m odelo de dem ocracia não-deliberativa, de dem ocracia m ajoritária (representativa). Em bora voltado para um m odelo específico de democracia, S o u z a N e t o (2006: 161) bem observa ser fundam ental que cada in d i víduo se com preenda, nas sociedades plurais, como parte do todo, que seja assim reconhecido e tratado pela sociedade. Trata-se de um a dim ensão da dignidade, no sentido de ser asse gurado a cada um interagir no espaço público, ser respeitado, quanto às suas opiniões e pontos de vista, pelos demais, assim com o tam bém respeitar outras opiniões e pontos de vista. Exige-se, na dem ocracia de liberativa, o tratam ento do outro como sujeito, e não com o objeto, e um a certa responsabilidade dialógica. 58 V. DIFICULDADES NÃO ASSIMILADAS PELO N OVEL M ODELO: POSTURAS CRÍTICA S À PROPO STA DELIBERATIVA O q u a n t o é d e s e já v e l e n e c e s s á r io , a l é m d e o p o r t u n o , p r o m o v e r u m d e b a t e a m p l o e “p o p u l a r ” s o b r e q u e s t õ e s m o r a i s d e lic a d a s , e m d e t r i m e n t o d e u m a a p r o x i m a ç ã o té c n i c a (cf. B o b b i o , 2000: 20), d a e x p e r i ê n c i a a c u m u l a d a e a té d a e s t a b i l i d a d e p o lític a , sã o , d e n t r e o u t r o s , a s p e c t o s q u e s t i o n á v e i s d o m o d e l o d e d e m o c r a c i a d e lib e r a tiv a . Sendo o modelo de dem ocracia deliberativa aplicável não a toda e qualquer situação, em qualquer mom ento, mas especialmente às ques tões m oralm ente controvertidas e, ao m esm o tempo, sobre as quais seja viável o estabelecimento de um espaço dialógico, muitos críticos vis lum bram nessa “restrição” um problem a do modelo. Limitar e exigir a aplicação do modelo deliberativo ás grandes questões morais e para elas estabelecer, prim a fa d e , a possibilidade de um espaço com um de diálogo significa, nessa linha, excluir opiniões extrem am ente divergentes e utilizar, para tanto, um critério “circular”, só aceitando as questões que já se saiba, previamente, acerca de sua plausibilidade em gerar algum “consenso” discursivo ou im por às ques tões mais delicadas um específico senso-com um (admissível no espaço deliberativo). Temas com o discrim inação racial e intolerância religiosa podem m inar a liberdade propugnada por alguns modelos (cf. F i s h , 1999; 89). Um grande problem a aparece, assim, consoante os críticos, na teoria de A m m y G u t m a n n e D e n n i s T h o m p s o n quando estes autores distinguem entre opiniões divergentes que merecem respeito daquelas outras opiniões divergentes, que devem ser “descartadas” do processo dialógico como posições que ninguém razoavelmente aceitaria ou que ninguém deveria apresentar. M esmo B o b b i o parece aceitar um a idéia de pontos de vista relevantes com o os que devem fazer parte do contex to deliberativo ( B o b b i o , 2004: 41); o autor adverte que além de saber quem representa é preciso saber se “pode contribuir?” ( B o b b i o , 2004: 41). O u seja, adm item -se opiniões e argum entos não relevantes. Daí a crítica contundente de S t a n l e y F i s h : quem determ ina o que é e o que não é um a premissa plausível? ( F i s h , 1999: 95). Este é um dos pontos centrais da crítica à dem ocracia deliberativa, pois atinge 59 diretam ente as bases sobre as quais se constrói esse modelo, ou seja, a possibilidade do diálogo aberto. O mesm o autor pretende revelar que o pano de fundo no qual se desenvolvem propostas com o a deliberativa é o da “arbitrariedade” n a aceitação inicial do razoável, anotando que essa reserva de prem is sas discutíveis aponta, em verdade, para um “ato de p o d er” que execu ta um a exclusão perem ptória das posturas que não interessam (não só porque diferem radicalm ente das posturas dos defensores da dem ocra cia deliberativa, mas tam bém porque estes não querem assumir o risco - real - de vê-las vencedoras no espaço dialógico). Ora, se se tratasse de posições realmente insustentáveis elas, po r essa única e exclusiva razão, seriam descartadas pelos participantes de um a deliberação. Mas autores com o G u t m a n n e T h o m p s o n insistem em descartá-las teori camente, criando um a espécie de espaço válido de discussão. Com o bem lem bra F i s h , o s seguidores do m odelo deliberativo não toleram certas idéias (razões) e, p o r esse motivo, passam a excluílas ao argum ento de um a inequívoca falta de razoabiiidade das mesmas, procurando, contudo, m anter a aparência (retórica) de ampla abertura, m útuo respeito, tolerância, etc.. O u seja, com essa postura conseguem excluir deliberadamente da agenda política certos assuntos ou posições. Se não o fizessem, o m odelo deliberativo (aberto p o r definição a todos argum entos, sem qualquer discrim inação ou reprovação inicial) p o deria conduzir àqueles resultados não desejados. E essa possibilidade seria um risco^'% não apenas as convicções pessoais de certos autores, mas igualmente à própria subsistência da teoria deliberativa. A ampla abertura propugnada pelo m odelo deliberativo fica, p o r tanto, estremecida, quando se utilizam argum entos favoráveis a algu mas exclusões preliminares e perem ptórias. Retom ando a afirmação de que o “valor” da razão pública do p ro cesso deliberativo não é apenas outra opção m orai (dentre a enorm e variedade delas existente), mas um a espécie de “base m oral de excelên cia” na qual os cidadãos que discordem m oral e religiosamente podem agir coletivamente ( G u t m a n n , T h o m p s o n , 1996: 67), pode-se aqui 112 É feita a q u i u m a a p ro x im a ç ão c o m o p e n s a m e n to d o re a lism o ju ríd ico n o rte -a m e ric a n o , especifica m e n te c o m H o l m e s , c o m a id éia d e u m c erto fatalism o q u a n d o às decisões a s erem a d o ta d a s {H o l m l s falava de u m a “sovereign prero g ative o f choice”). 60 i d e n tif ic a r a c o n s t r u ç ã o d e u m a b a r r e i r a d e c o n t e n ç ã o p a r a o p ç õ e s m o ra is i n d e s e ja d a s , a o a r g u m e n t o d e q u e n ã o a t e n d e m à r a z ã o p ú b l ic a d o “o l h a r d e lib e r a tiv o ” q u e é, n e s s e s e n tid o , a m o r a l i d a d e e n ã o q u a l q u e r m o r a l i d a d e ( n e s s e s e n tid o : F i s h , 1999: 6 9 ). Parece que esses teóricos da dem ocracia deliberativa não perce bem a existência dessa dificuldade, e não fornecem soluções para com preender ou resolver m elhor o problema. Um dos exemplos apresentados para ilustrar o que se disse é o de políticas públicas que prom ovam a discrim inação racial, no sentido de que todos concordariam que tais políticas não merecem nenhum espaço na agenda política (e no espaço deliberativo-dem ocrático). Não seriam opções políticas que o Parlamento ou os cidadãos pudessem seriam ente considerar e, se o fizessem, os tribunais deveriam interce der, conform e sustentam os autores pró-deliberativos. F i s h identifica, aqui, um argum ento prático de ordem histórica, que fundam enta essa restrição. E, assim como foi estabelecido ao longo de anos, bem po d e ria, em sua análise, ser tam bém abandonado. Para o autor, G u t m a n n e T h o m p s o n pretendem excluir essa opção à base de um argum ento forte, que não perm ita um a exclusão m eram ente circunstancial (his tórica) posterior, e que im ponha um abandono definitivo dessa posi ção indesejada. A pergunta, portanto, dirige-se a saber quem fornece e com o são construídas essas razões mais fortes (não-históricas). Eis aqui o ponto falho vislum brado nessa teoria, que descortina um a verdade: 0 desejo de rem over esse e outros tipos de políticas públicas não é u n i versal, pois se fosse elas seriam excluídas sem necessidade de recorrer a esses argum entos [artificiais] mais fortes (F i s h , 1999: 9 8 -9 ). Logo, se algumas pessoas devem ser deixadas de fora da conver sação é “porque elas não acreditam no que G u t m a n n e T h o m p s o n acreditam” ( F i s h , 1 9 9 9 :1 0 0 ) . VI. ALGUMAS IMPLICAÇÕES CONCEITUAIS DO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA VI. 1. Ações afirmativas e democracia deliberativa A concepção deliberativa da dem ocracia estaria a perm itir que, p or meio de um discurso que incorpore a oposição, não a sufocando, 61 m as afastando suas pretensões de m aneira racional, possam ser im ple mentadas políticas extrem am ente polêmicas, com o as ações afirmativas (cf. Souza Neto, 2006: 90-1 e 257). Em certo sentido, no início prom ovia-se, quanto ao espaço de decisão, apenas um certo “encorajam ento” em considerar as (adm itir os argum entos da) ações afirmativas (G o m e s , 2001: 39). N um a democracia, é essencial que não se declarem apenas for m alm ente os direitos, mas que se perm ita m aterialm ente a todos alcan çarem o efetivo exercício desses direitos. As política de ações afirmativas têm em com um com a dem ocra cia dialógica a tese da inclusão e do m ulticulturalism o (para as ações afirmativas: G o m e s , 2001: 47-8; para a dem ocracia, sublinhando a im portância de sua expressa referência: Yo u n g , 1999: 155). Na primeira, a inclusão é o objetivo. Na segunda, a inclusão é um a condição inicial. Contudo, para que possa haver a efetiva inclusão de que necessita a d e m ocracia dialógica, alguns processos inclusivos prévios, que habilitem os atores do discurso que se seguirá, seriam imprescindíveis. Dentre eles estão as ações afirmativas. As ações afirmativas, ademais, têm a qualidade de potencializar as diferenças, prom ovendo a inevitável inclusão argum entativa do “di ferente”, no contexto democrático-decisório. Antes, porém , há um re conhecim ento das diferenças (pela presença de ações afirmativas). O reconhecim ento de diferenças, de m aneira que possam nortear o dis curso de um a m aioria que não se com preende como representada nes sas diferenças é um a hipótese de trabalho que tem m uito mais sentido no contexto da dem ocracia dialógica. O u seja, as ações afirmativas en contram lastro num a deliberação de m odelo dialógico, em bora possam tam bém ser alcançadas - já aqui com um cunho mais assistencial (e, p o r vezes, populista) - nas dem ocracias representativas ou majoritárias, assim com o naquelas estruturas estatais que reconheçam aqui um es paço de livre conformação do legislador (a depender, portanto, da “boa vontade” do legislador). Aqueles que adotam um a concepção material de dem ocracia d e liberativa (não-procedim entalista) adm item , num a vertente aparente m ente finalista, que este modelo tam bém deve “prom over a inclusão sob um prism a cultural” (S o u z a N e t o , 2006: 174), de m aneira que 62 todos sejam “tratados com o dignos de igual respeito” (S o u z a N e t o , 2006: 236). Contudo, a idéia de igualdade de condições iniciais para u m a discussão é sempre cara à dem ocracia dialógica, porque p o r meio dela é que se poderá observar o surgim ento dos diversos pontos de vista necessários a um a verdadeiram ente ampla discussão. É reverberado o papel essencial da cultura e da educação. Portanto, trata-se de pré-requisitos da deliberação dialógica, e não apenas de seus possíveis resul tados (lei form alm ente aprovada após um a eventual discussão aberta e racional). Por fim, ressalte-se que as políticas afirmativas procuram , dife rentem ente da dem ocracia deliberativa, alcançar o espaço privado, com o 0 de grandes corporações e empresas. VI.2. Democracia deliberativa e constitucíonalismo Séria crítica dirigida à dem ocracia deliberativa é encontrada nas formulações clássicas do constitucionalismo. Isso porque um a das alavancas do constitucionalism o e que forma, atualmente, o cerne de sua teoria, está na proteção “fechada” dos direitos fundam entais, con siderada imprescindível e definitivamente incorporada ao patrim ônio constitucional. Essas posições definitivas são incompatíveis com a arena delibe rativa aberta. E, em bora certas teorias adm itam que os direitos fu n dam entais devam estar mais protegidos que as leis comuns, nem por isso afasta esses direitos da discussão ampla e contínua (cf. G u t m a n n , T h o m p s o n , 2004: 53-4). Com o observou B o h m a n , o modelo deliberativo pode parecer mais apropriado para os m om entos constituintes, não para a política ou legislatura ordinárias. As posturas precedimentalistas da dem ocracia deliberativa não reivindicam determ inados conteúdos para as leis, ao contrário das pos turas substancialistas, que envolvem determ inados com andos n o rm a tivos como necessários e revelando u m a im posição teórica a u m a atu ação norm ativa de conteúdo livre. Aqui certam ente pode ser invocado um sério atrito com o constitucionalismo, que privilegia as decisões tom adas pelos representantes populares, especialmente baseado na 63 idéia perm anente de um a soberania popular. Este atrito da visão substancialista estará presente - e com m aior intensidade - no m om ento constituinte (inicial, fundante, incondicionado e ilimitado). De qualquer maneira, as visões substancialistas rem ontam aos direitos fundam entais, ou a parte deles, considerados como essenciais para um a bem -sucedida deliberação, com o liberdade comunicação, de expressão, de inform ação (cf. B e r c o v i c i , 1999: 17-25; B o h m a n , 1996: 23). VI.3. Democracia deliberativa e intervenção judicial A opção do Judiciário para resolver conflitos é reconhecida como um dos cam inhos clássicos, rejeitada pelo modelo de dem ocracia de liberativa, p o r não ter com o preocupação o oferecimento de um a res posta pertinente às razões do conflito, já que muitas vezes a apresenta ção destas é m eram ente formal e pessoal (cf. B obbio , 2004: 100“ '). O processo judicial não tem como preocupação a verificação das distintas razões admissíveis e um a aproximação das mesmas. Tom ando outro paradigm a, S o u z a N e t o (2006: 281) procura es tabelecer a idéia de que, no contexto de um a dem ocracia deliberativa, ao Judiciário restaria a possibilidade de aplicar, im ediatam ente, apenas “as norm as que configuram condições para um bom funcionam ento da vida democrática” Uma das conseqüências relevantes dessa postura está em reco nhecer, num a clara aplicação da dem ocracia deliberativa à teoria da Constituição, que o Judiciário pode e deve concretizar norm as classifi cadas tradicionalm ente como de eficácia limitada, além de outras, des de que sua realização seja considerada com o condição imprescindível para a democracia, operando com o ator im portante no espaço da d e mocracia deliberativa. Vl.3.1. Controle judicial de constitucionalidade dos pressupostos democráticos Um im portante papel p ode ser destinado à Justiça Constitucio113 0 a u to r refere-se à p a rtic u la rid a d e d a Justiça ad m in istra tiv a italiana. 64 nal no m odelo deliberativo de dem ocracia"^ já que as leis e o com por tam ento estatal são m onitorados a fim de garantir a não-supressão dos pressupostos necessários para a democracia. Esses pressupostos haveriam de estar previstos, contudo, na Constituição do país, o que rem ete à constatação de que apenas um m om ento constituinte"^ consciente do m odelo deliberativo de dem o cracia poderia se aproveitar dos benefícios de u m guardião constitucio nal vocacionado a tutelar seus pressupostos (constitucionais). Eviden tem ente que a atuação de um a Justiça Constitucional assim concebida seria mais circunscrita e menos interventiva"^. O espaço de decisão seria claramente transposto para as arenas deliberativas, salvo aqueles pressupostos m ínim os, sobre os quais a própria deliberação não é bem vinda. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACKERMAN, Bruce. IVe the People: Foundations. Harvard: The Belknap Press o f H arvard Univ. Press., 1991. . We the People: Transformations. Cam bridge/London: The Belknap Press of H arvard Univ. Press., 1998. ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica. [1978]. São Paulo: Landy, 2005. BASTOS, Celso, TAVARES, A ndré Ramos. A s Tendências do Direito Público: no Limiar de um Novo Milênio. São Paulo: Saraiva, 2000. BELLAVITI, P.. Rassegna Ragionata delle Procedure di Negoziazioneconcertazione e delle Normative e dei M etodi di Valutazione dei Progetti Infrastrutturali. Milano: PIM, 2000. Bibliografia: BOBBIO (20-38). BERCOVICI, Gilberto. A Constituição de 1988 e a Teoria da Constituição.V. T a v a r e s , André Ramos (org.). 114 A a p ro x im a ç ão e n tre esses dois te m a s n ã o é. co n tu d o , o objetiv o deste estu d o. A pen as p ro c u ra -s e for necer. aqui, u m a indicat;ào ge n éric a dessa conexão. 115 C o n sis te n te m e n te c o n sid e ra d o d ife re n c ia d o d o m o m e n to legislativo o rd in á rio (cf. A c k e r m a n , 1991 ), 116 N ã o é, ev id e n tem en te , a ú n ic a c o n c e p ç ã o q u e c o n d u z a essa re d u ç ão d o o b jeto d e co n tro le ju dicial da co n stitu cio n alid ad e. 65 BOBBIO, Luigi. Le Strategic dei Process! Desicionali Inclusivi. V. BELLAVITI, P.. . A Pill Voci. A m m inistrazioni pubbliche, imprese, associazioni e cittadini nei process! decisionalli inclusive. Analisi e Strum enti per rinnovazione. I Manuali. Napoli/Roma: Edizioni Scientifiche Italiane Spa, 2004. BOHM AN, James. Public Deliberation: Pluralism, Complexity and D e mocracy. Cam bridge/London: MIT, 1996. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constitui ção. 7. ed. Coimbra; Almedina, 2003. DEWEY, John. Ih e Public and Its Problems. New York; H enry H olt & Company, 1927. FISH, Stanley. “M utual Respect as a Device o f Exclusion”.V. MACEDO, Sthepen. Bibliografia: 88-102. GASTIL, John, LEVINE, Peter(org.) The Deliberative Democracy H and book: strategies for effective civic engagement in the 2P ' Century. San Francisco: Jossey-Bass, 2005. GOMES, Joaquim B. Barbosa. A Ação Afirmativa & Princípio Consti tucional da Igualdade: O Direito como Instrumento de Transformação Social A Experiência dos E.U.A. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. GUTM ANN, Amy, TH O M PSON , Dennis. Democracy and Disagree ment: why m oral conflict cannot be avoided in politics, and what should be done about it. Cam bridge/London: The Belknap Press of Harvard Univ. Press., 1996. . W hy Deliberative Democracy? Princeton: Princeton Univ. Press, 2004. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre faticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. 1. HOLMES, Oliver Wendell. “The theory of legal interpretation”. In: Har vard Law Review, 1899. v. 12. Bibliografia; 417-420. . The Common Law. Boston; Little, Brown and Co., 1881. 66 KELSEN, Hans. La Garantie Jurisdictionnelle de la C onstitution (La Justice Constitutionnelle). Revue du Droit Public et de la Science Politi que en France et à l’Étranger. 61 p. abr./ m aio/ jun. 1928. Extrato. MACEDO, Stephen (org.). Deliberative Politics: essays on dem ocracy and disagreement. New York/Oxford: Oxford Univ. press, 1999. BibUografia: M ACEDO (3-14); YOUNG (151-8). MEE, Charles L. A História da Constituição Americana-. Relato d a C ria ção do Governo durante a Convenção Constitucional. Rio de Janeiro; Expressão e Cultura, 1993. NETO, Cláudio Pereira de Souza. Teoria Constitucional e Democracia Deliberativa: um estudo sobre o papel do Direito na garantia das con dições para a cooperação na deliberação dem ocrática. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. POGREBINSCHI, Thamy. A D em ocracia do H om em Com um : res gatando a teoria política de John Dewey. Rev. Social. Polit., C uri tiba, n. 23, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext& pid=S0104-44782G0400020G005& lng-en& nr m=iso>. Acesso em: 16 Feb 2007. Pré-publicação. doi: 10.1590/S010444782004000200005. RAWLS, John. Justiça como eqüidade: um a reformulação. São Paulo: M artins Fontes, 2003. . Liberalismo Político. São Paulo: Ática, 2000. SUNSTEIN, Cass R.. The Partial Constitution. Cam bridge/London: H arvard Univ. Press, 1993. TAVARES, A ndré Ramos, FERREIRA, Olavo A. V. Alves, LENZA, Pe dro (org.). Constituição Federal: 15 anos, m utação e evolução. São Pau lo; Método, 2003. bibliografia; BERCOVICI (9-31). YOUNG, Iris M arion. Justice, inclusion and deliberative Democracy.V. MACEDO. 67 68 PRESIDENTE DA CÂM ARA DISTRITAL QUE EXERCE, TEM PO RA RIA M EN TE, EM SUBSTITUIÇÃO, O CA RGO DE G O V ERN A D O R, EM RAZÃO DE D U PLA VACÂNCIA D O S CARGOS DE G O V ERN A D O R E DE V ICE G OV ERN A D O R, P O D E D ISPU TA R A REELEIÇÃO - M ANDATO DE D EPU TA D O - PARA A CÂM ARA, AIND A QUE A SUBSTITUIÇà O TENHA O C O R R ID O N O S SEIS MESES A NTERIORES AO PLEITO. O P IN L lO LEGAL C a rlo s M á r io da Silva V e llo so I. A CONSULTA 1. Indaga o ilustre advogado Reginaldo Oscar de Castro sobre a possibi lidade de 0 Presidente da Câm ara Distrital, que exerce, em substituição tem porária, o cargo de Governador, em razão de dupla vacância dos cargos de G overnador e de Vice-Governador, disputar a reeleição para a C âm ara - m andato de deputado distrital - ainda que essa substituição ocorra nos seis meses anteriores à eleição. II. A M A TÉR L\ POSTA: A IN TERPRETAÇà O D O § 6 ° D O ART, 14 DA C O N STIT U IÇ Ã O FEDERAL. 2. A questão diz respeito à interpretação do disposto no § 6° do 14 da Constituição Federal: art. ‘Art. 14. $ 6" Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal 117 M in istro a p o se nta d o , ex -p re sid en te d o S u p rem o T rib un a l 1'ederal e d o T rib u n a l S u p e rio r Eleitoral. Professor e m é rito d a U n iv ersidad e d e Brasília, C nB, e d a Pontifícia U n iv ersid ad e C atólica d e M in as G erais. P U C /M G . e m c u ja s F a c u ld a d es d e D ire ito foi p ro fesso r titu lar d e D ire ito C o n stitu c io n a l e Teoria G eral d o D ireito Público. N a UnB, nos c u rso s d e g ra d u a ç ã o e p ó s-g ra d u a çã o . Professor e m é rito d a Escola da M ag istra tu ra Federal d a I® R egião I T R E /P Região, Brasília, DF). A dv o g ad o : OA.B/M G n° 7.725; O A B /D F n" 23.750 69 g OS Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito!' 2.1. É dizer, os chefes dos Poderes Executivos, federal, estaduais m u n i cipais e do Distrito Federal, que desejarem concorrer a outros cargos, devem renunciar aos respectivos m andatos até seis meses antes do plei to. 2.2. Esta é a regra. 2.3. Prim eiro que tudo, é relevante verificar que a Constituição, no ci tado § 6®do art. 14, refere-se a detentores de m andato de Presidente da República, G overnador de Estado e do Distrito Federal e Prefeitos. É o que deflui da parte final do citado dispositivo constitucional - se quiserem concorrer a outros cargos ''devem renunciar aos respectivos mandatos...” - Ora, quem nào tem m andato de governador, porque simplesmente está exercendo citado cargo em substituição tem porá ria, não há que renunciar ao que não tem. E, na verdade, quem apenas substitui, tem porariam ente, e o faz porque, sendo titular de m andato de deputado, é presidente da C âm ara e, em tal situação é posto, pela Constituição e pela lei, como substituto tem porário do Governador, até que se realize a eleição indireta, não tem m andato de Governador. 2.4. M atéria semelhante a esta, em que a ‘"ratio legis” é igual, foi apre ciada pelo Tribunal Superior Eleitoral e pelo Supremo Tribunal Federal. 2.5. C om efeito. 2.6. O Tribunal Superior Eleitoral decidiu que, ''havendo o vice - reeleito ou não - sucedido o titular, poderá se candidatar à reeleição, como titular, por um único m andato subsequente^ (Resolução TSE/21.026). O acór dão po rta a seguinte ementa: “RE G ISTRO D E C A N D ID ATU R A.V IC E -G O V E RN A D O R E LEITO POR DUAS VEZES CONSECUTIVAS, QUE SUCEDE 0 T IT U L A R N O SEG UNDO M AN D ATO . POSSIBILIDADE DE REELEGER-SE A O CARG O DE G O V E R N A D O R POR SER O A TU A L M A N D A T O O PRIM EIRO CO M O T IT U L A R D O E XEC U TIVO E ST A D U A L PRECEDENTES: RES./TSE n° 20.889 e 2.7. Foi interposto contra esse acórdão o recurso extraordinário, que foi adm itido, dado que se trata de m atéria constitucional: RE 366.488/SP. 70 2.8. O Supremo Tribunal Federal, julgando o citado RE 366.488/SP, caso Geraldo Alckniin - decidiu: ‘Y..J I. Vice-governador eleito duas vezes para o cargo de vicegovernador. No segundo m andato de vice, sucedeu o titular, certo que, no seu primeiro m andato de vice, teria substituído 0 governador. Possibilidade de reeleger-se ao cargo de governador, porque o exercício da titularidade do cargo dá-se mediante eleição ou p o r sucessão. Somente quando sucedeu o titular é que passou a exercer o seu primeiro m andato como titular do corço.'" U ' ’ 2.9. Decidiu o Supremo Tribunal Federal, confirm ando acórdão do Tri bunal Superior Eleitoral: (i) o vice-governador, eleito duas vezes para o cargo de vice-governador, no prim eiro m andato substituiu o titular; (ii) no segundo mandato, sucedeu ao titular, dado que este faleceu (G o vernador Covas); (iii) som ente no segundo m andato de vice é que veio a exercer o cargo de governador, na plenitude deste, em sucessão ao titular. Poderia, então, pleitear a reeleição para um segundo m andato de governador. Esclareceu o relator, no seu voto: 'Y.J Realmente, o constituinte não fo i feliz no redigir o § 5° do art. 14 da Constituição Federal, na utilização da expressão de "quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos." Isto fo i bem ressaltado no voto da eminente M inistra Ellen Gracie, Relatora do acórdão recorrido: % ■■) No mérito, esta Corte apreciou a matéria em duas oportunidades: p o r ocasião do julgam ento das Consultas n"' 689 e 710, relator de am bas o em inente Ministro Fernando Neves. As consultas deram origem às Res./TSE 20.889. (íe 9.f0.200f, e ,026, (fe 72.3.2002. Ficou assentado, então, que 'havendo o vice - reeleito ou não - sucedido o titular, poderá se candidatar à reeleição, como titular, por um único m andato subseqüente’ (Res./ TS/in" 27.026;. Conforme ressaltado pelo em inente Ministro Sepúlveda Pertence na Consulta n° 689, o preceito insculpido no art. 14, § 5°, da Constituição Federal é de redação infeliz 118 RH 366.488/SP, R elator M in. C arlos Velloso, “D l ” d e 28.10.2005; vvww.stt.ius.br 71 quando trata de quem ‘houver sucedido ou substituído, no curso do mandato' o titular do Executivo. Naquela oportunidade, ficou estabelecido que o instituto da reeleição não pode ser negado a quem só precariamente tenha substituído o titular no curso do mandato, pois o vice não exerce o governo em sua plenitude. A reeleição deve ser interpretada strictu sensu, significando eleição para o m esm o cargo. O exercício da titularidade do cargo, por sua vez, somente se dá mediante eleição ou, ainda, por sucessão, como no caso dos autos. O importante é que este seja o seu primeiro m andato como titular, como de fa to o é, no caso do Sr Geraldo Alckmin. Conforme destacado pelo M inistro Fernando Neves, b fa to de estar em seu segundo m andato de vice é irrelevante, pois sua reeleição se deu como tal, isto é, ao cargo de vice’ (Cta 689). r...) Acentua, no ponto, com propriedade, o ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Roberto Gurgel Santos, no parecer de fis. 757-761: X..) 7. O texto constitucional não proíbe a candidatura daquele que tenha substituído precariamente o titular do cargo, um a vez que o exercício pleno do m andato somente se dá p o r m eio da eleição e, no presente caso, o quadriênio 20032006 é o primeiro m andato do recorrido como governador do estado, não se revelando terceiro m andato consecutivo e não havendo, portanto, im pedimento para o seu exercício. 8. Neste sentido a jurisprudência desse Egrégio Supremo Tribunal Federal: Elegibilidade: possibilidade de o Vice-Prefeito, que substitui 0 titular, concorrer à reeleição ao cargo de Prefeito M unicipal (CF, art. 14, § 5°)- 1- £ certo que, na Constituição - como se afere particularmente do art. 79 - substituição do chefe do Executivo, nos seus impedimentos', pelo respectivo Vice, é expressão que se reserva ao exercício temporário das funções do titular, isto é, sem vacância, hipótese na qual se dá ‘sucessão’. 2. O caso, assim - exercício das funções de Prefeito pelo Vice, « vista do afastamento do titular por decisão judicial liminar e, pois, sujeita à decisão definitiva da ação -, o que se teve fo i substituição e não, sucessão, sendo irrelevante a indagação, a que se prendeu o acórdão recorrido, sobre 0 ânim o definitivo com que o Vice-Prefeito assumiu o cargo, dada a improbabilidade da volta da Prefeita ainda no curso do mandato. 3. A discussão, entretanto, é ociosa para a questionada aplicação á espécie do art. 14, § 5°, no qual, para o fi m de permitir-se a reeleição, à situação dos titulares do Executivo são equiparadas não apenas a 72 de quem bs houver sucedido’, m as tam bém a de quem os houver (...) substituído no curso do m andato’. 4. Certo, no contexto do dispositivo, o vocábulo reeleição é impróprio no tocante ao substituto, que jam ais se fez titularão cargo, m as tam bém o é com relação ao sucessor, que, embora tenha ascendido á titularidade dele, para ele tião fora anteriorm ente eleito. 5. RE conhecido, m as desprovido. fJÍE n° 318.494/SE, R ei: M in. Sepulveda Pertence, D) 3/9/2004 - sem grifos no original) 9. Não se verifica a alegada violação à Constituição Federal, um a vez que o vice-governador apenas substituiu 0 governador no prim eiro mandato, sucedendo-lhe no m andato seguinte, em razão de seu falecimento. A sucessão não retira a elegibilidade do recorrido para o cargo de governador no pleito de 2002, pois sua eleição não ocasionaria o exercício do cargo de titular do executivo estadual pela terceira vez consecutiva, sendo perm itido que o vice - reeleito ou não - que tenha sucedido 0 titular, se candidate à reeleição, como titular, por um único m andato subseqüente. (Fis. 759-761) (..r III. A LÓ G IC A D O EN TE N D IM E N T O O U A “fíA T/O LEGIS^\ 3. A lógica dos acórdãos do Supremo Tribunal e do Tribunal Superior Eleitoral, ou a ''ratio decidendi \ forte na “ra tw ' da Constituição, é isto; somente quem se investe na plenitude do cargo de governador, por eleição ou p o r sucessão, é que é titular do m andato de governador. A m era substituição não significa investir-se na plenitude do cargo. Por isso, 0 Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal deci diram, conform e vimos de ver, (i) que o vice-governador, eleito duas vezes para o cargo de vice, exerceu, no prim eiro mandato, o cargo de governador, em substituição; (ii) no segundo m andato, sucedeu ao go vernador; (iii) poderia, então, candidatar-se à reeleição. É que o fato de apenas substituir o governador, no prim eiro mandato, não o fez titu lar do m andato de governador. Isto somente ocorreu no seu segundo mandato, quando se investiu no cargo de governador, p o r sucessão, em razão do falecimento deste. 3.1. A mesm a lógica há de ser aplicada - porque a “ratio legis' é a m esm a - no caso do deputado, presidente da C âm ara que, em razão 73 de dupla vacância, investe-se, em substituição, tem porariam ente, no cargo de governador. E a m esm a lógica aplicar-se-á, na hipótese, com m aior razão, dado que o § 6° do art. 14, não m enciona ou não contém a palavra substituição, tal com o faz o § num a redação infeliz. O § 6^ do art. 14, de que aqui cuidamos, dispõe que “Ptzra concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do p leito ” Dúvida não há que a Constituição, no ponto, está se referindo aos respectivos titulares dos cargos indicados, ou aos titulares dos “respectivos m andatos”. Ora, quem está no exercí cio tem porário d o cargo de governador, com o substituto, não é titular do m andato desse cargo. É, vale repetir, m ero substituto no exercício tem porário do cargo, até que ocorra a sucessão m ediante eleição que, n o caso, é indireta. 3.2. Então, ao deputado que está exercendo o cargo de governa dor, em caráter de substituição tem porária, em razão da dupla vacância, não seria aplicável a regra do $ 6° do art. 14 da Constituição Federal. É dizer, poderá ele disputar a reeleição para a Câm ara, ainda que essa substituição tem porária tenha ocorrido nos seis meses anteriores à elei ção. IV. CONCLUSÃO. 4. Concluo dando resposta à indagação form ulada, resposta que cons titui ratificação do que exposto no item 3.2, acima: ao deputado que está exercendo o cargo de governador, em caráter de substituição tem porária, em razão da vacância dos cargos de governador e de vice-governador, não seria aplicável a regra do § 6° do art. 14 da Constituição Federal. Assim, poderá ele disputar a reeleição para a Câmara, ainda que a substituição tem porária tenha ocorrido nos seis meses anteriores ao pleito. É o m eu entendim ento, s.m.j. Brasília, DF, 30 de m arço de 2010. Carlos M ário da Silva Velloso 74 A REPÚBLICA E OS FICHAS SUJAS Djalma Pinto'"' “Todo poder em ana do povo, que o exerce p o r meio de repre sentantes eleitos ou diretamente, nos term os da Constituição”. Poucos dispositivos são tão exaltados como esse contido no parágrafo único do art. 1° do Texto constitucional. Tem ele origem na Assembléia N acio nal em que foi transform ada a velha assembléia feudal dos monarcas franceses denom inada Estados Gerais, convocada pelo rei Luís XVI na tentativa de conter a crescente determ inação de seus súditos de m enor projeção social, integrantes do Terceiro Estado, de retirá-lo do poder. A extinção do absolutismo, lem bra M irabeua, se deu quando um de sacreditado e brilhante ex-nobre disse ao rei: “Majestade, vós sois um estranho nesta Assembléia e não tendes o direito se pronunciar aqui” (A Revolução Francesa, EJ.Hobsbaw m , Paz e Terra, 2010, p.22). Aquela Assembléia, com predom inância dos Com uns, equiparou “povo” à n a ção, produzindo, em 1789, a Declaração dos Direitos do H om em e do Cidadão, cujo art. 3° afirm ou de form a enfática: “O princípio de toda a soberania reside essencialmente na Nação. N enhum a corporação, ne n h u m indivíduo pode exercer autoridade que daquela não em ane ex pressamente”. Após destacar ser o povo a fonte de toda a soberania, a C onsti tuição de 1988 assegurou-lhe o próprio exercício do poder através de plebiscito, referendo e iniciativa popular (art. 14). Nossa democracia, portanto, não é apenas representativa, mas sem idireta ou participativa. O povo manteve preservado o seu direito de afirm ar o que deseja na condição de soberano No exercício dessa prerrogativa, apresentaram os cidadãos, na Câm ara dos Deputados, o Projeto de Lei C om plem entar n® 518, exi119 F x -P ro fe sso r d e D ireito T r ib u tá rio d a U n iv e rsid ad e d e F ortaleza, ex- l^ ro cu rad or G e ra l d o R slado d o C e a rá e professo r d e D ire ito Eleitoral d a F u n d a ç ã o ts c o l a S u p e rio r d e A d v o cacia d o E stado d o C ea rá - FESAC. Autor, e n tre ou tro s, d o s seguintes livros; Meditai^ões so b re a V iolência, A C id a d e dos M en i nos, D ireito Eleitoral: Tem as Polêm icos, D isto rçõ es d o Poder, M ark etin g Política e Sociedade, D ireito Eleitoral A n o ta çõ e s e le m a s Polêm icos, D ire ito Eleitoral I m p r o b id a d e A d m in is tra tiv a e R esp o nsab ili d a d e Fiscal. 75 gíndo que fosse impossibilitado de exercer a representação popular, em seu nome, quem tivesse condenação penal transitada em julgado, esti vesse condenado em prim eira instância ou tivesse denúncia contra si recebida p o r órgão judicial colegiado. N um a situação de flagrante tensão entre dem ocracia represen tativa e participativa, referido projeto, a despeito de exprim ir o anseio de milhões e milhões de cidadãos, não apenas sofreu surpreendente protelação, com o foi m utilado no seu ponto essencial de im pedir a in vestidura no m andato de indivíduo inquestionavelmente inapto para o exercício do p od er político. Afinal, crim inoso não pode atuar em nom e do povo. Essa um a premissa básica que prevalece em qualquer sociedade em que se com preenda a finalidade do mandato. Vale dizer, é literalmente incompatível com a função de legislador, aplicador de re cursos públicos ou de fiscalizador da atuação do Executivo a condição de criminoso, com o tal considerado aquele que com ete crime, estando a autoria e a materialidade do delito devidam ente comprovada. O subs titutivo aprovado. Projeto de Lei C om plem entar n® 168/03, no art. 1°, I, letra “e”, considerou inelegíveis “os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de oito anos após o cum pri m ento da pena pelos crimes Nos term os do Projeto aprovado na C âm ara dos D eputados e no Senado, encam inhado para a sanção do Presidente, o chefe de um a m i lícia cujos crimes foram filmados, m esm o que condenado em prim eira instância, poderá se candidatar, ser diplomado, tom ar posse e exercer o m andato, atuando em nom e do povo, enquanto não houver ratifica ção dessa condenação pelo respectivo órgão judicial colegiado. O u seja, mesm o com sua ilicitude filmada, fotografada, exaustivamente d o cu m entada o autor de crim e de tráfico de entorpecentes e drogas afins, contra a vida, a dignidade sexual, racismo, tortura, terrorism o, p rati cado por organização crim inosa, quadrilha ou bando etc poderá ser candidato e investido na representação popular enquanto não transitar em julgado a decisão condenatória ou não for condenado por órgão judicial colegiado. Sob outro enfoque, não se pode falar em “alteração do processo eleitoral” (art. 16, CF), para adiar a vigência da lei que, tim idam en te, busca dar efetividade á exigência constitucional que m anda aferir a 76 vida pregressa de quem pretende ser investido na representação p op u lar. Não se trata de alteração do processo, mas de aprim oram ento dos requisitos exigidos para m aior qualificação dos que postulam mandato. A bem da verdade, as futuras gerações jam ais conseguirão com preender com o é possível u m a sociedade, que consagra expressamente a norm atividade dos princípios (art. 5°, $ 2*, CF), que exalta o prin cí pio da m oralidade (art. 37, CF), que determ ina seja considerada a vida pregressa de todo e qualquer candidato a fim de proteger a probidade adm inistrativa durante o exercício do m andato (§ 9°, art. 14, CF), em pleno século XXI, acolha crim inosos no exercício da representação p o pular sob o fundam ento de não terem sido condenados “por órgão ju dicial colegiado”. Com o se a com provação p ura e simples de um crime, através de filmagem inquestionável, não fosse suficiente para a desqualificação do infrator para o exercício de tão relevante função. Sob todos os ângulos, há excesso de tolerância da sociedade b ra sileira para com os delinqüentes de m aior projeção. Mais grave e de plorável é o excesso de ousadia daqueles que, m esm o sabendo que seus crimes se acham filmados, buscam p o r todos os meios conquistar o mandato. Obviamente, um delinqüente participando da disputa pelo p o d er político levará para o processo eleitoral todo o potencial de sua criminalidade. C om pra de voto, utilização acintosa da m áquina públi ca, coação a eleitores tudo isso é previsível n u m certam e em que se b u s ca a vitória a qualquer custo para satisfação apenas das conveniências do postulante, cuja vida é m arcada pela prática de ações delituosas sem qualquer preocupação em servir á coletividade. Com o conciliar a exi gência de m oralidade no exercício da função pública com o fato de um cidadão ter prisão decretada, ordem de detenção em diversos países e, no Brasil, agir, falar e atuar em nom e do povo, com o se a crim inalidade comprovada, em país tido como desenvolvido, nada estivesse a signifi car em outro Estado cujo Texto constitucional exalta a probidade. A verdade é que um a pessoa condenada pela prática de crime pelo juiz mais respeitado do Poder Judiciário, com seu ilícito filmado está “apto” a transform ar-se em “representante” do povo. Para eleger-se utilizará todo o seu potencial de astúcia e delinqüência. Por que o denom inado “Ficha Suja” tem a audácia de falar e agir em nom e do povo, enfim, de gastar na condição de gestor o dinheiro arrecadado dos tributos? 77 A resposta p o derá até encher páginas de tratados nas academias de Sociologia e Ciência Política. Mas p ode assim ser resumida. Poucos no Brasil com preendem as três finalidades básicas do Estado: 1) p ro duzir as leis, 2) dirim ir os conflitos e 3) realizar o bem comum. A vasta m aioria buscar capturá-lo para dele se utilizar em proveito próprio. O poder é almejado não para servir de instrum ento para que o cidadão possa atuar para m elhorar a vida dos demais integrantes da sociedade, mas para ser usado a fim de aum entar o patrim ônio, garantir emprego para parentes do titular, facilitar a vida de correligionários etc. Raim undo Faoro, que muito contribuiu para im ortalizar o con ceito da OAB perante o povo brasileiro, retratou o perfil daqueles que buscavam integrar o parlam ento no tem po do Império. Naquela época, crim inoso jamais poderia cogitar de falar em nom e do povo. A notou aquele portentoso jurista: “Os jovens retóricos, hábeis no latim, bem -falantes, argutos para o sofisma, atentos às novidades das livrarias de Paris e Londres, com frase de Pitt, G ladstone e Disraeli bem decorada, fascinados pelos argum entos de Guizot e Thiers, em dia com os financistas europeus, tímidos na im aginação criadora e vergados ao peso das lições sem crítica, fazem, educados, polidos, bem -vestidos, a matéria prima do parlamento. O lhados à distância terão o ar ridículo dos velhos retratos, com os versos Anos dedicados a m usas e dam as mal-alafabetizadas. Falta-lhe a voz áspera, o to m rude, a energia nativa dos colonos norte-am ericanos e dos políticos platinos, m enos obedientes ao estilo europeu, mais hom ens, m enos artistas e mais dotados de encanto poético”. (G randes N om es do Pensam ento Brasileiro - Os D onos do P o der -, vol. I, Publifolha, São Paulo, 2000, p.439). Se aos jovens políticos do im pério faltava voz áspera e tom rude, a um a parte expressiva dos políticos da República do início do século XXI, sobra aspereza, há excesso de rudeza na voz e nos gestos para de fender os próprios interesses. Falta com postura e inform ação para com preender que 0 exercício do poder não é instrum ento para conquista de riquezas e benesses. Tem por finalidade única servir à sociedade e não servir-se dele o agente público para aum entar seu patrim ônio ou favo recer parentes e amigos. Q uem é afinal o “Ficha suja” na sociedade contem porânea? Ape 78 nas o condenado por órgão colegiado judicial? Ficha suja, para cons tatação da inaptidão para o exercício do poder, em qualquer nível, é quem o utiliza em proveito próprio. É quem envolveu-se com a prática de ilícito, faltando-lhe, assim, decência, decoro, dignidade para o exer cício de função pública. Q uem investe contra o patrim ônio público, estando sua ilegalidade comprovada, é indigno para agir em nom e do povo em qualquer república civilizada. Muitos integrantes da sociedade não se deram conta do mal que os “Fichas sujas” lhes fazem ao serem investidos no m andato eletivo. Não exigem, p o r isso, reação à altura de sua nocividade. Não param se quer para avaliar a m onstruosidade de um a “ordem jurídica” produzida por criminosos. A situação assemelha-se àquela vivenciada no passado quando não se tinha noção sobre os malefícios do cigarro. Paulo Freire, com a sua autoridade de educador, explica m elhor esse fenômeno: “Q u an d o assum o o m al o u os m ales que o cigarro me p o d e causar, m ovo-m e no sentido de evitar os males. Decido, rom po, opto. Mas, é n a prática de não fum ar que a assunção do risco que corro p o r fu m ar se concretiza m aterialm ente. M e parece que há ainda u m elem ento fundam ental na assunção de que falo: o em ocional. A lém do conhecim ento que tenh o do m al que o fum o m e faz, te n h o agora n a assunção que dele faço, legítim a raiva do fumo. E te n h o tam b ém alegria de ter tid o a raiva que, no fundo, ajudou que eu continuasse n o m u n d o por mais tempo. Está errad a a educação que não reconhece na justa raiva, n a raiva que protesta co n tra as injustiças, co n tra a deslealdade, co ntra o desamor, co ntra a exploração e a violência um papel altam ente form ador. O que a raiva não pode, é p erdend o os limites que a confirm am , perder-se em raivosidade que corre sem pre o risco de se alongar em odiosidade”. (Pedagogia da A utonom ia. Saberes Necessários à Prática Educativa, E ditora Paz e Terra, 2009, p.40-1). O Ficha Suja, que com provadam ente desvia verba da m erenda escolar, adquire rem édio com validade vencida, que se apropria do dinheiro destinado à construção da estrada, do hospital é tão nocivo a cada pessoa residente no território do Estado onde exerce o poder, com o o fumo. O cigarro aniquila o indivíduo, o Ficha suja investido no p o d er causa dano à sociedade a partir do m au exemplo a estim ular a propagação da própria criminaUdade. 79 Argumenta-se, com freqüência, que todos os que ocupam cargos eletivos são indicados pelos cidadãos. É verdade, Mas a lei deve ser pro duzida e aplicada, tom ando como base a realidade do m undo no qual terá ela vigência. Nesse passo, como u m eleitor humilde resistirá ao assédio de “candidatos” envolvidos com facções ou no comando da criminalidade, em sua comunidade, diante da ostensiva exibição de armas potentes, exigindolhe o voto como condição para permanência naquela localidade? Com o com petirá u m cidadão de bons propósitos com alguém que, acintosam ente, desvia verba publica, distribuindo, bem próximo do pleito, um a parcela desta a eleitores carentes, estando a prática de seu crim e docum entado em processo ainda não julgado? É preciso u m a com preensão elem entar para a duração de qual quer democracia: o poder só deve ser exercido p o r pessoas decentes, insuspeitas, probas, virtuosas. Jamais p o r delinqüentes em débito com a Justiça. Uma premissa é básica em toda sociedade que almeja paz e prosperidade; lugar de quem praticou crim e contra o particular ou con tra a A dm inistração Pública é na penitenciária, ou em qualquer outro lugar, m enos no exercício do p o d er político. Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal ao julgar a ADPF n° 144 consagrou o entendim ento segundo o qual som ente após o trânsito em julgado da decisão penal condenatória alguém, que com eteu grave crime, é considerado inelegível no Brasil. A exigência de vida pregressa, em bora expressamente reclamada no art. 14, § 9®, CF, foi afastada, prevalecendo a presunção de inocência que assegura a participação, no processo eleitoral, de qualquer infrator cuja condenação penal não se tornou definitiva. Cum pre destacar que nenhum a das Declarações de Direito faz qualquer alusão á exigência de coisa julgada para que alguém perca sua condição de inocente. Aliás, a Convenção A m ericana de Direitos H u m anos (Pacto de San Jose da Costa Rica) prevê expressamente a exi gência de sentença nào mais sujeita a recurso apenas para o caso de aplicação da pena de morte. Nesse sentido, dispõe o seu art. 4°. 2: “Nos países que não houverem abolido a pena de morte, esta só p oderá ser im posta pelos delitos mais graves, em cum prim ento de sentença fin a l de tribuna] com petente e em conform idade com a lei que estabeleça tal pena, pro m ulgada antes de haver o delito sido cometido. Tampouco se estenderá a delitos aos quais nào se aplique atualm ente”. 80 Já o art. 8*2 daquela Convenção, que consagra a presunção de inocência, não faz referência alguma à exigência de decisão transitada em julgado para supressão dessa presunção, exigindo apenas a com pro vação legal da culpa: “Toda pessoa acusada de u m delito tem direito a que se presum a sua inocência, enquanto m o fo r legalmente comprovada sua culpa. A Convenção A m ericana inspirou o STF a suprim ir do direito brasileiro a prisão do depositário iníiel, expressamente prevista no Tex to constitucional vigente (art. 5°, LXVII). Poderia tam bém ser ela in vocada para mitigar a exigência de condenação transitada em julgado quando confrontada com a necessidade do exame da vida pregressa para aferição da elegibilidade. Isso evitaria a aberração bem visualizada no fato de um criminoso, com delito filmando e já condenado no juízo singular, ser investido na representação popular, estim ulando a propa gação de sua delinqüência em todos os segmentos sociais. Na verdade, a comprovação legal da culpa para fins de inelegibilidade não pode ficar condicionada à irrecorribilidade da decisão penal condenatória. Significa essa exigência, em últim a análise, desconfiança nos próprios julgadores que prolatam sentenças penais, nas instâncias inferiores, reconhecendo a culpabilidade do réu, enquanto não se tor narem estas “coisa julgada”. Depois, não há direito fundam ental absoluto. A Constituição no art. 5°, XLVII, prevê a pena de m orte no caso de guerra. A p ró pria prisão do ex-governador José A rruda sem sentença condenatória comprova a im possibilidade da prevalência sempre do princípio da não culpabilidade. Aliás, nesse particular, há um a contradição insuperável a exigir reflexão dos juristas contem porâneos: é possível u m governa d o r eleito, no exercício do mandato, ser preso sem condenação alguma, mas não é possível reconhecer sua inelegibiiidade pela prática do crime comprovado, que m otivou a supressão de sua liberdade. A Declaração Universal dos Direitos Hum anos, adotada e p ro clamada pela O N U através da Resolução n° 217/1948, tam bém não consagra a exigência de coisa julgada para extinção da presunção de inocência. Lê-se no seu art. XI. I: 81 “Toda pessoa acusada de u m ato delituoso tem o direito de ser p resu m id a inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada d e acordo com a lei, em julgam ento público no qual lhe ten h am sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”. A Declaração dos Direitos do H om em e do Cidadão, de 1789, dispõe no se art. 9°: “Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, to d o o rigor desnecessário à g uarda d a sua pessoa deverá ser severam ente rep rim id o pela lei”. As Constituições brasileiras de 1824,1891, 1934, 1946, não cogi taram da presunção de inocência na dilatação atualm ente consagrada. A Constituição de 1824, no art. 179, XIV, exigia, expressamente, “ta lentos e virtudes” para investidura nos cargos públicos civis, políticos e militares Hegel, po r sua vez, enfatizou a im portância da virtude como re quisito para o exercício do poder: "O p rincípio que M ontesquieu in dico u para a dem ocracia é a virtude; efetivamente, u m a constituição dem ocrática tem de fundar-se n a disposição das subjectividades, única form a de substancial em que a vontade que para si e em si existe, ainda se manifesta. (...) D o m esm o m odo. E um a vez que na República D em o crática a disposição para a virtude constitui a form a subs tancial, é preciso p o r de parte o contra-senso de que tal disposição seria facultativa, ou nem sequer existiria, na m onarquia, com o se entre a virtude e u m p o d er político definido n u m a organização subdividida houvesse oposi ção e incompatibilidade”. (Princípios da Filosofia do Di reito, G uim arães Editores, Lisboa, 1986, p. 231). M ontesquieu relacionou sem pre a virtude com o requisito essen cial para a fruição da democracia. Escreveu ele: “Os políticos gregos, que viviam no governo popular, não conheciam ou tra força que pudesse sustentá-los além d a virtude. O s d e hoje só nos falam d e m anufaturas, de com ércio, de finanças, de riquezas e até de luxo. Q u an d o cessa esta virtude, a am bição entra nos corações que estão p rontos para recebê-la, e a avareza en tra em 82 todos. Os desejos m u d a m d e objeto; o que se am ava não se am a mais; era-se livre com as leis, quer-se ser livre con tra elas; cada cidadão é com o u m escravo fugido da casa de seu senhor; o que era m á xim a é cham ado rigor; o que era regra cha m a m -n o incôm odo; o que era cuidado ch am am -no temor. (...) A república é u m despojo; e sua força n ão consiste em nada além do p od er de alguns cidadãos e n a licenciosidade de todos”. (O Espírito das Leis, M artins Fontes, São Paulo, 1996, p.33). Qual a qualificação de um a república, em que todo e qualquer crim inoso pode ser investido no governo, sob o fundam ento de que seu crime docum entado ainda não recebeu sanção em caráter definitivo ou julgam ento em segundo grau? Por isso mesmo, Thomas M. Cooley considera u m a loucura co locar um a pessoa no governo (traficante, peculatário, receptador etc) que represente perigo ao Estado. O M inistro Ayres de Brito resum iu seu ponto de vista que, em bora vencido, num futuro não distante, por certo, prevalecerá: "Meus colegas en tend eram q u eo po líticom ultiprocessado p o d e se candidatar. Eu não. Q u an d o u m político exibe processos que evidenciam um n am oro com a delituosidade, ele n ão p o d e representar a coletividade”. (Revista Veja, 16 de ju lho de 2008, p. 17). N orberto Bobbio invoca esta lição de John Locke, extraída do seu livro clássico O Segundo Tratado sobre o G overno Civil, para destacar a necessidade de pessoas com provadam ente idôneas para com andar o p o d er político ou integrar a própria oposição ao partido dom inante em determ inado mom ento: “O fim do governo é o bem dos hom ens: e o que é m elhor para a hum an id ade: que o povo se encontre sem pre exposto à vontade ilim itada d a tirania ou que os governantes se encontrem às vezes expostos à oposição, q u an d o se excedem no uso do p o d e r e o utilizam para a destruição e não para a conservação das propriedades do povo” (D ireito e Estado n o P ensam ento de Em anuel Kant, E ditora M andarim , São Paulo, 2000, p.64). Com o é possível ser alcançado “o bem dos hom ens”, a satisfação do interesse coletivo, entregando-se o com ando do governo a crim ino sos, cujos delitos encontram -se filmados ou gravados, com autorização 83 da Justiça, sob o argum ento de inexistência de trânsito em julgado da decisão penal que os condenou? M esmo quem não consiga definir vida pregressa, sabe que um cidadão com esse perfil não a possui, deixando assim de satisfazer esse requisito para o exercício do m andato em qual quer lugar em que haja respeito pelo patrim ônio do povo. A inda que a Constituição não m andasse considerar a vida pre gressa de quem pretende ser investido no poder político, a simples fi nalidade deste, de realização do bem com um, dem onstra, p o r si só, a impossibilidade de sua ocupação p o r marginais. Aristóteles já constata ra isso ao enfatizar: “Não existe Estado feliz p o r si m esm o senão o que se constitui sobre as bases da honestidade. (...) Aqueles, pelo contrário, que se propõem d ar aos Estados u m a boa constituição prestam atenção especialmente nas virtudes e nos vícios que interessam à sociedade civil, e não há nenhum a dúvida de que a verdadeira Cidade (a que não o é somente nome) deve estim ar acima de tudo a virtude \ (A Política, Edi tora M artins Fontes, São Paulo, p. 53-46). Não há sequer necessidade de lei para definir o que seja vida p re gressa, como é desnecessária a definição de amarelo para a com preen são de tal cor. Todo m undo capta o alcance dessa expressão e o seu real significado. Na Constituição, p or exemplo, não existe definição de re putação ilibada, um dos requisitos, ao lado do saber jurídico, para que possa alguém, com mais de 35 anos, ser nom eado M inistro do STF. Um advogado, processado por levar celular para o interior de u m presídio, haverá de ter reputação ilibada exigida para investidura naquele cargo apenas p o r não haver transitado em julgado a sua condenação ou ter sido condenado p o r um juiz singular? A certeza do conhecim ento de todos sobre o sentido da expres são “vida pregressa” é a m esm a que levou o legislador a tam bém não definir reputação ilibada exigida nos arts. 101, 104, parágrafo único, da Constituição, para nomeação, no cargo de M inistro, no âmbito do P oder Judiciário. Tem-se aqui a cham ada “zona de certeza negativa”, na feliz expressão de Afonso Rodrigues Q ueiró para resum ir a situação em que, em bora alguém não saiba precisar o que seja algo, tem certeza ab soluta do que não seja. Uma pessoa condenada p or furto e formação de quadrilha, mesm o sem o trânsito em julgado da decisão, não poderá ser integrante do Judiciário. Com o atribuir-lhe a missão de elaborar as leis? 84 Algum chefe de família, pai de duas filhas adolescentes, contra tará, na condição de síndico, para a função de vigia do prédio, no qual residem elas, um jovem indiciado pela prática de três estupros? O ar gumento, invocado pelo interessado no emprego, com um exemplar da Constituição n a mão, de que os condôm inos podem ficar tranqüilos, p or ser apenas indiciado, não tendo ainda sequer ocorrido denúncia do M inistério Público contra sua pessoa, merece ser considerado? Sua veemência, na invocação do Texto constitucional, para ter a sua inocên cia reconhecida, po r não existir contra si sentença penal condenatória transitada em julgado ou decisão de órgão judicial colegiado, deve ser levada em consideração pelo pai que busca a preservação de suas filhas? Só se ele estiver com pletam ente fora de si, hipnotizado - brada o cidadão espantado e com os olhos arregalados diante da ousadia do infrator em pretender aquele tipo de trabalho, onde acabaria p o r en contrar cam po livre para praticar novos delitos. A recusa do emprego ao indiciado pela prática de estupro decor re, na verdade, de simples análise da sua vida pregressa. Todo m undo sabe o que é “vida pregressa”, m esm o que não consiga defini-la. O m es m o absurdo, visualizado na colocação de um estuprador para ser vigia de u m prédio onde residem garotas adolescentes, pode, com mesmo grau de estarrecimento, ser detectado na perm issão para que um a pes soa, com provadam ente envolvida em desvio de dinheiro público, fique com a guarda de valores pertencentes à população, com ande licitações e prom ova a realização de concurso público. Enfim, seja investida no p o der para atuar, em nom e do Estado, cuja finalidade é realizar o m elhor para a sociedade, e não para os interesses do eventual delinqüente, que tem a petulância de se tornar autoridade m ediante ameaça a eleitores, com pra de voto e outros ilícitos compatíveis com os seus antecedentes conhecidos por todos. A vida pregressa com o requisito de elegibilidade A finalidade básica do p o der político, com o reiteradam ente e n fatizado, é a realização do bem com um. Esse objetivo é impossível de ser alcançado através de pessoas, no seu com ando, já envolvidas com a prática de delitos. Aristóteles advertia: “Q uem quiser ouvir com provei- 85 to as exposições sobre o que é nobre e justo, e em geral sobre a ciência política, é preciso ter sido educado nos bons hábitos'\ (Ética a Nicômaco, M artin Claret, 2001, p. 20). A exaltação da virtude por M ontesquieu, como requisito essencial para aqueles que se propõem a exercer o p od er político, na democracia, está, com o se pode observar, em absoluta sintonia com a exigência do exame da vida pregressa a que se reporta a norm a do § 9°, do art. 14, da Constituição brasileira. No caso de recusa em assegurar-se efetividade às exigências desse com ando normativo, constatar-se-á a possibilida de de im plantação do próprio “governo dos marginais”. Governo sob o com ando daqueles que, com provadamente, já atuaram à revelia da lei, do qual a cleptocracia é a form a mais nociva. A falta de coisa julgada da decisão condenatória dos governantes, ou de condenação p or órgão judicial colegiado, não lhes subtrai a condição de infratores, estando os seus ilícitos com provadam ente dem onstrados, passivos de consta tação, inclusive, por pessoa m enos letrada. Os fatos delituosos podem ser aferidos, seguramente, no processo de im pugnação do registro da candidatura, no âmbito da Justiça Eleitoral, em que assegurada a mais ampla defesa, podendo o im pugnado arrolar testem unhas, ju n tar d o cum entos e recorrer a todas as instâncias, no caso de decisão contrária aos seus interesses. Na verdade, a inusitada presença de crim inosos com delitos com provados, no exercício da representação popular no Brasil do início do século XXI, decorre da tansform ação em regra jurídica do p rin cípio da presunção de inocência até o trânsito em julgado da decisão penal condenatória. A natureza de m ero princípio impede, porém , a sua prevalência absoluta. Por ser apenas um princípio seus efeitos, em relação a determ inadas situações, devem ser sustados, prevalecendo o princípio da exigência de vida pregressa compatível com a m agnitude da representação popular consagrado no art. 14, § 9®, CF. Não se pode visualizar “ira cidadã”, nessa simples exigência de “calibragem”. Não se cuida de rebelião das massas. Apenas se busca o reconhecim ento da força norm ativa da Constituição, que consagra o princípio da m orali dade, para que não continue a prevalecer a “ética da criminalidade” que consiste em apropriar-se indevidam ente um a pessoa de dinheiro pú b li co, im pedir o trânsito em julgado dos processos em que literalm ente 86 com provadas tais ilicitudes, utilizar a verba desviada para aliciar elei tores e invocar, sem disfarçar o deboche, ausência de res judicata para manter-se no exercício do poder político, com etendo novos crimes. Lembra o professor Daniel Sarmento: “Ao contrário das regras, os princípios são dotados de um a dim ensão de peso. Tal característica se revela q uando dois princípios diferentes incidem sobre determ inado caso concreto, entrando em colisão. Nesta hipótese, o conflito é solucionado levando em consideração o peso relativo as sum ido po r cada princípio dentro das circunstâncias co n cretas que presidem o caso, a fim de que se possa precisar em que m edida cada u m cederá espaço ao outro. Assim, é possível que u m princípio seja válido e p e rti nente a determ in ad o caso concreto, m as que suas c o n seqüências jurídicas não sejam deflagradas naquele caso concreto, ou não o sejam inteiram ente, em razão da incidência de outros princípios tam b ém aplicáveis. Há um a “calibragem” entre os princípios, e não a opção pela aplicação de um deles, em d etrim ento de outro’’. (A P o n deração de Interesses na C onstituição Federal, Lúmen Júris, Rio de Janeiro, 2003, p. 45). Justamente essa “dim ensão de peso”, reconhecida aos princípios não pode ser afastada, na sua aplicação, para evitar a aberração supre m a de um a pessoa, condenada na prim eira instância pela prática de 5 homicídioSi 15 estupros e tráíico de entorpecentes, p o d er candidatarse ao cargo de Presidente da República, Governador, Senador ou Pre feito sob o argum ento de que nenhum a das suas condenações transitou em julgado ou foi apreciada p or órgão judicial colegiado, estando, as sim, “apta” para levar todo o seu potencial de crim inalidade para ser dissem inado no exercício do m andato político. A presunção de inocência até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória é um princípio. Não é um a regra jurídica. No âm bi to da aplicação das regras, as divergências se solucionam recorrendo-se aos critérios hierárquico, cronológico e de especialidade. Na aplicação destas, não há ponderação, a subsunção prevalece da seguinte forma, ainda quando se chegue à “loucura”, preconizada p o r Cooley, na sua aplicação: Premissa m aior - todo brasileiro é inocente enquanto inexistir contra ele condenação crim inal transitada em julgado. Premissa m enor - Paulo estuprou 5 menores, m atou dois hom ens 87 e assaltou seis senhoras, não tendo, porém , contra si, sentença penal condenatória transitada em julgado nem julgam ento p o r órgão judicial colegiado. Conclusão - Pode candidatar-se a presidente do Brasil, am para do n o princípio da não culpabilidade consagrado na Constituição da República. O absurdo, entretanto, não pode receber o aval do Direito. Tem este p o r objetivo, justam ente excluir da convivência social as pessoas que representam ameaça à paz na sociedade. Jamais assegurar-lhe p o sição de com ando nesta, diante do flagrante perigo que isso representa. Constatou e advertiu John Dewey sobre os danos que muitos hom ens acabam causando à sua geração ao recusarem adaptar velhos princípios a novos casos que reclam am sua revisão: “situações em que entram a m udança e o inesperado são um desafio para a inteligência criar novos princípios (...) A história hum ana é longa. H á um longo registro de experim entação passada, e existem verificações cumulativas que dão a muitos princípios um prestígio bem merecido. O cúm ulo da loucura é desconsiderá-los de form a leviana. Mas as situações so ciais se alteram; e tam bém é um a tolice não observar a maneira como velhos princípios operam de fa to sob novas condições, e não modificá-los de modo que sejam instrumentos mais eficientes para julgar novos casos. M uitos hom ens são agora conscientes do dano feito em questões legais ao se supor a existência antecedente de princípios fixos aos quais todo caso novo pode ser submetido. Eles reconhecem que essa suposição apenas estimula de form a artificial idéias desenvolvidas sob condições passadas, e que sua perpetuação no presente gera injustiça. No entanto, a escolha não é entre jogar fora regras anteriorm ente desenvolvidas e aferrar-se a elas de m aneira obstinada. A alternativa inteligente é rever, adaptar, expandir e alterar essas regras. O problem a é u m problem a de readaptação contínua e vital”. (Os G randes Filósofos do Direito, M ar tins Fontes, São Paulo, 2002, p. 510), Com o se percebe, na aplicação do direito, não pode o julgador deixar de considerar a realidade dos fatos n a qual tem ele vigência. É fato público e notório, em muitos municípios, que gestores desviam verba acintosam ente da m erenda escolar, m altratando crianças já des nutridas pela carência absoluta de bens. Apropriam-se de dinheiro da saúde, de estradas, da escola etc, estando seus ilícitos com provados nas instâncias adm inistrativas e judiciais. C onquistam , ainda assim, m a n dato eletivo sob o espantoso argum ento de que nen hu m a condenação pela prática de seus crimes transitou em julgado. C om o dinheiro des viado, que historicam ente não devolvem aos cofres públicos, passam a aliciar eleitores carentes que, pela excessiva dependência de tudo, se transform am em presas fáceis, trocando voto p o r bens materiais, a sa ber: tijolo, telha, cesta básica, dinheiro em espécie etc. Nesse contexto, o argum ento de que cabe ao eleitor fazer a tria gem, entre os candidatos, é desautorizado pela situação de carência, falta de escolaridade e agressividade dos “candidatos delinqüentes”. Na aplicação do Direito, não pode o julgador desconhecer essa particularidade dolorosa, mas cruel, real. A ousadia de crim inosos candidatos sepulta a própria norm alidade que se exige da disputa elei toral. Com um a agravante: ninguém tem coragem de denunciá-los. A sua inocência presum ida prevalece sobre a realidade contundente dos fatos, em que a frieza dos seus crimes, com etidos à luz do dia, sem disfarce, com o nítido propósito de intimidação, acaba servindo ainda de estímulo ao surgim ento de novos infratores que, após um a série de delitos sem condenação definitiva, tam bém se sentem credenciados à postulaçâo de um m andato eletivo. É preciso ter em m ente que o Direito C onstitucional não é ciência da realidade, com o são a sociologia e a ciência política. Ele é dotado de juridicidade. É ciência normativa, com o adverte K onrad Hesse, na sua obra clássica A Força N orm ativa da Constituição, que se caracteriza pelo dever-ser, que im põe com pulsoriam ente conduta, e não simples m ente pelo ser, que se restringe à observação da realidade, ao m undo da natureza, aos fatos regidos pela causalidade e não pela im putabilida de, com o ensinava Kelsen. O Direito Constitucional não pode tornar-se estéril a pretexto de proteger o princípio da presunção de inocência, com o se apenas este existisse no Texto constitucional. Deve im por-se sobre os fatos aberrantes, pautando a realidade com base nos demais princípios vigentes na ordem jurídica a partir da ponderação dos valores neles consagrados. Pertinente a advertência de Konrad Hesse: “Se a Ciência d a C onstitui ção adota essa tese e passa a adm itir a C onstituição real com o decisiva. 89 tem-se a sua descaracterizaçâo como ciência normativa, operando-se a sua conversão num a simples ciência do ser. Não haveria mais como diferençá-la da Sociologia ou da Ciência Política” (A Força Normativa da Constituição, Sérgio Fabris Editor, p. 11). Entre o interesse de um indivíduo candidatar-se e o interesse da sociedade de não ter o seu patrim ônio gerido p o r pessoa sem com pro vada probidade, este últim o deve prevalecer, com o já sustentava Aris tóteles: “O bem hum ano tem de ser a finalidade da ciência política, pois ainda que seja o caso de o bem ser idêntico para o indivíduo e para o Estado, o bem do Estado é visivelmente u m bem m aior e mais perfeito, tanto para ser alcançado e preservado. Assegurar o bem de u m indi víduo é apenas m elhor do que nada; porém , assegurar o bem de um a nação ou de um Estado é um a realização mais nobre e divina” (Ética a Nicômaco, Edipro, São Paulo, 2007, 2^ edição, p. 38-9). A propósito, a desapropriação de bens do patrim ônio do p articu lar por interesse público, mesm o com pagam ento de justa indenização, nada mais é do que o efetivo reconhecim ento da legitimidade da preva lência do princípio do interesse coletivo sobre o privado. Por outro lado, o exercício do poder político p o r pessoas comprovadam ente sem idoneidade, com repugnância à prática da virtude reclamada por M ontesquieu, não pode ser apenas objeto de constata ção pelos aplicadores do Direito Constitucional, sob pena de ser este transform ado em sociologia. A investidura no m andato de criminosos, cuja periculosidade é detectada, em alguns casos na própria eternização dos processos em que figuram com o réus, atesta a supressão da própria norm atividade do Direito Constitucional, a despeito da ênfase de suas norm as exigindo observância da moralidade, da probidade e do exame vida pregressa. O fato é que criminosos, com ilícitos docum entados, exercem o poder político no Brasil. Chefes de milícias arm adas buscam fortalecer suas ações delituosas, através da investidura no m andato outorgado por cidadãos, coagidos pelos fuzis que lhes são apontados. Diante desse quadro dantesco, reitere-se, o Direito C onstitucio nal não pode ser convertido em sociologia, observando passivamente tais aberrações se propagarem na sociedade na qual tem vigência. Essa imobilização, em conseqüência da subtração da efetividade da norm a 90 do art. 14, § 9^, CF, o transform a em m era ciência contemplativa da realidade. A rgum enta-se, sob outro enfoque, com m uita ênfase, ser p eri goso exigir-se análise da vida pregressa, afinal, no passado recente da ditadura, bastava um a simples denúncia do M inistério Público para tornar-se o cidadão inelegível, com base na Lei C om plem entar n° 5, então vigente. Na verdade, no período obscuro de 1964, realmente ocorreu in justiça de toda ordem. Direitos políticos foram duram ente sacrificados. O País encontrava-se subm etido ao AI n° 5, que suprim iu, inclusive, as garantias da magistratura. Entretanto, a realidade vivenciada no presente é outra completa mente diferente. A Constituição de 1988 consagrou o prim ado da ga rantia da ampla defesa, hoje vivenciado em processo de toda natureza. Até para desligamento de filiado de clube, sem expressão e de qualquer lugar, a falta de observância do contraditório e da ampla defesa provoca a nulidade da ação da diretoria, ensejando o restabelecimento do direi to do sócio prejudicado. Assim, aquele acusado pela prática de crime, que tem seu p ed i do de registro im pugnado perante o Juiz Eleitoral, pode, no curso do processo de impugnação, exercitar a am pla defesa, dem onstrando a inconsistência da acusação, a insignificância do fato que lhe é im puta do, enfim, não ser pessoa de alta periculosidade descredenciada para o exercício da representação popular. O que parece inadmissível - e as gerações futuras serão im pla cáveis na crítica am parada pela isenção que a H istória propicia - é a prevalência de um a interpretação que consagra a situação absurda, sob todas as óticas, segundo a qual, m esm o que todos sejam sabedores dos inúm eros atos delituosos, com provadam ente praticados p or deter m inado cidadão, pode este ainda assim ser registrado candidato, sob 0 argum ento de que a condenação que lhe foi im posta não se tornou res )udicata ou não foi imposta por órgão judicial colegiado. Pare ce inacreditável, mas a interposição de simples recurso de Embargos de Declaração, da decisão condenatória no STF, em pleno século XXI afastava a inelegibilidade, desacreditando toda a comprovação do cri me atestada nas próprias instâncias judiciais. 91 o poder político, na República, não pode ser transform ado em abrigo de peculatários, receptadores, homicidas, estelionatários e o u tros infratores com crimes devidam ente comprovados. Um condenado p o r peculato, registrado e eleito prefeito municipal, não deixará de co m eter novos ilícitos porque não transitou em julgado sua condenação. Terá pressa em cometê-los e buscará ocultá-los através de novos m eca nismos, afinal, não freqüentou n en h u m reform atório que lhe estim u lasse a respeitar a coisa pública. Pelo contrário, a certeza de retorno ao m andato pela dem ora do julgam ento em órgão judicial colegiado ou do trânsito em julgado de sua condenação, o estim ulará à prática de novos delitos, e, o que é mais grave, disseminará exemplos de êxito no desvio de verbas públicas que acabarão se disseminando intensamente na sociedade. O resultado da negativa de vigência do princípio constitucional da exigência de vida pregressa compatível com a m agnitude da repre sentação popular é a propagação da delinqüência em todas as camadas sociais. O contribuinte deve se preparar para custear a edificação de mais penitenciárias para abrigar o crescente núm ero de jovens infrato res, inspirados em líderes políticos que, a despeito do rosário de crimes cometidos, acabaram agraciados com a investidura no poder político, n u m portentoso exemplo de estímulo a mais devastadora crim inalida de. Impõe-se, assim, a necessidade de garantir-se efetividade à exi gência de vida pregressa com o requisito de elegibilidade para inves tidura na representação popular, tal com o exigido pela Constituição vigente no seu art. 14, § 9®. Os cidadãos que exercem função pública e aqueles que buscam p o r meios escusos aum entar seu patrim ônio devem m editar sobre esta observação de Aristóteles; 'b h o m em feliz, en q u an to h om em , necessita tam b ém de bens exteriores, pois nossa natureza não basta a si m esm a, p ara ser saudável, de ser alim entado e cuidado. E ntretanto, não se deve p en sar que o h om em , para ser fehz, necessite de m uitas o u de grandes coisas, só porque não p o d e ser sum am ente feliz sem bens exteriores. D e fato, a auto-suficiência e a ação não im plicam excesso, e p o d em o s praticar ações nobres sem p ara isso necessitarm os ser donos d a terra e do mar. M esm o com 92 recursos m oderados, po d e-se proceder virtuosam ente (aliás, isso é evidente, pois se pen sa que u m cidadão p od e praticar atos não m enos dignos que os dos que detêm o po der; e m uitas vezes até mais), basta que tenh am o s o necessário p ara isso, pois a vida das pessoas que agem em co nform idade com a virtude será feliz”. (Ética a N icôm aco, E ditora M artin Claret, p. 233). Todo hom em tem o livre arbítrio para agir conform e lhe con vém. Se optar p o r praticar ação tipificadora de delito, deve saber de antem ão que se to rn a inapto para o exercício do mandato. A investi dura de delinqüente na representação popular é incompatível com a ordem constitucional vigente que, de form a enfática, m anda que seja considerada a vida pregressa de quem pretende ser candidato com o fim específico de “proteger a probidade adm inistrativa” e a m oralidade durante o exercício do m andato (art. 14, § 9°, CF). É preciso apenas com preender que um infrator da lei ou espertalhão não pode exercer o poder. N ão pode atuar em nom e do povo, sob pena da crim inalidade ser mais prestigiada do que a virtude, cujo cultivo é essencial para que a República Federativa do Brasil não seja reduzida a m era República dos Fichas sujas. 93 94 INCLUSÃO ELEITORAL DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA F á b ia L im a d e B r ito D a m ia '-" L u iz A l b e r to D a v id A r a u jo '- ' SUMÁRIO: L Considerações sobre a dignidade da pessoa hum ana; 2. Da dignidade à igualdade de direitos; 2.L O que significa acessibilidade? 3. O acesso das pessoas com deficiência ao processo eleitoral; 3.1 A norm ativa eleitoral existente e as barreiras de acesso; 3.2 A questão dos intérpretes de LIBRAS e dos debates televisivos; 4. Conclusões; 5. Bibliografia. 1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA O ponto de partida para o estudo de qualquer direito deve ser o de que a pessoa hum ana é o bem mais valioso para a hum anidade e, portanto, está sempre acima de qualquer valor'^\ Para que possa existir e desenvolver-se de form a plena, deve-se assegurar à pessoa hu m ana um m ínim o de condições necessárias para a sua participação ativa na sociedade ou para que possa usufruir dos benefícios de se viver em sociedade. Essas condições m ínim as são os direitos fundam entais da pessoa hum ana, imprescindíveis para a sua existência digna. Sim, pois, o direito fundam ental à vida deve ser enten dido como direito à vida digna e esta não prescinde da coexistência de outros direitos igualmente fundam entais, com o a alimentação, a saúde, a m oradia, a educação, a participação na vida política etc. A dignidade da pessoa hum ana é, portanto, intrínseca ao ser h u mano. 120 A ssessora Jurídica n o M in ístériu P ú b lico Federal, Especialista e m D ireito Processual Civil, Especialista em D ireitos H u m a n o s pela Faculdade d e D ireito d a U n iversid ade d e São Paulo. 121 Professor T itular d e D ireito C o n stitu c io n a l d a F a culd ad e d e D ireito d a PL’C-SP, Pro fesso r e C o o r d e n a d o r d o C u rs o d c P ó s -G ra d u a çã o (M e strad o e D o u to ra d o ) d a In stitu ição T oledo d e B au ru -IT E , Mestre, D o u to r e L iv re -D oce n te e m D ireito C on stitu cio n al. 122 DALLARI, D a lm o d e Abreu, Direitos h u m a n o s c cidadiinia. 2^ cd, reform , São Paulo: M o d e rn a , 2004 (C oleção Polêmica), p, 9, 95 A localização topográfica da dignidade da pessoa hum ana, no texto constitucional, com o um dos fundam entos da República (art. 1°, inciso ÍII), ao lado da soberania, da cidadania, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e do pluralismo político, bem denota a sua excepcional im portância em nosso ordenam ento jurídico. De acordo com José Afonso da Silva, “a dignidade da pessoa h u m ana é um valor suprem o que atrai o conteúdo de todos os direitos fundam entais do hom em , desde o direito à vida"^^\ Nesse ponto, dis cordando de parte da doutrina, afirma que a dignidade da pessoa h u m ana não constitui um princípio constitucional fundam ental, pois “a Constituição lhe dá mais do que isso, quando a põe com o fundam ento da República Federativa do Brasil constituída em Estado Democrático de Direito”. De outra parte, m esm o quando tom ada, pela doutrina, como princípio constitucional, a dignidade da pessoa h u m ana é entendida como vetor que norteia a própria unidade da Constituição. Nesse sen tido, Paulo Bonavides, no prefácio da obra de Ingo Wolfgang Sarlet, Dignidade da pessoa hum ana e direitos fundam entais na Constituição Federal de 1988, afirmou que: [...] n en h u m princípio é mais valioso para co m pen diar a unidade m aterial da C onstituição que o princípio da dignidade da pessoa hum ana. Q u an d o hoje, a p ar dos progressos herm enêuticos do direito e de sua ciência argum entativa, estam os a falar, em sede de positividade acerca d a u nidade da Constituição, o princípio que urge referir n a ord em espiritual e material dos valores é o principio da dignidade da pessoa humana'-*. 123 SILVA, José A fonso da. A d ig n id a d e d a p e sso a h u m a n a c o m o v alor s u p re m o d a d e m o c ra cia , fiev/i-fa de Direito Adm inistrativo. Rio d e laneiro, v. 212, pp. 89-94, abr./jun . 1998, pp. 91-92, grifo d o autor. 124 A in d a p re fa c ia n d o a m e n c io n a d a o b ra , P a u lo B onavides aduziu: “A u n id a d e d a C o n stitu iç ão , na m e lh o r d o u trin a d o c o n stitu cio n alism o c o n te m p o râ n e o , só se tr a d u z c o m p re e n siv e lm e n te q u a n d o t o m a d a em sua im prescritível b id im e n sio n a lid a d e, q u e ab ran g e o fo rm al e o axiológico, a saber, form a e m atéria, ra z ão e valor. A m b o s os te rm o s c o n ju g a d o s assin alam , c o m a rev o lu ção h e rm e n ê u tic a , o m o m e n to definitivo d a s u p re m ac ia p rin c ip io ló g ica d o s c o n te iíd o s co n stitu cio n ais sobre os c o n te ú d o s legislativos o rd in á rio s d a velha d o g m á tic a e a o m e s m o te m p o e x p rim e m a a scen são d a leg itim idad e m aterial q u e p õ e e m g ra u d e m e n o r im p o rtâ n c ia , p o r carência d e p ré s tim o s u p e r io r nas soluções in te rpreta tiv a s da C on stitu ição, o fo rm a lism o positivista e legalista d o p assad o , p e cu liar à d o g m á tic a ju ríd ica d o sécu lo XIX. F o rm a lism o q u e in te rp reta v a regras, e n ã o princíp io s. P o r isso m e sm o , mais a ten to a o texto d a s leis q u e ao D ireito p ro p r ia m e n te dito” (S A R L tT , ín g o Wolfgang. D ignidade da pessoa h u m a n o e direitos fu n d a m e n ta is na Constituição Federai de 1988. 4 “ ed. P o rto Alegre; Livraria d o A dvogado, 2006, Prefácio). 96 Seja entendida com o princípio fundam ental, seja como fu n da mento do Estado, não pairam dúvidas acerca da im portância da digni dade da pessoa hum ana, a qual deve sempre nortear a interpretação de qualquer norm a existente no arcabouço jurídico pátrio. Em havendo colisão entre direitos fundam entais e, na im possibilidade de coexisti rem, o princípio que deve prevalecer é aquele que mais se aproximar da dignidade da pessoa humana'-% na m edida em que o hom em deve ser sempre visto e tratado com um fim em si mesmo, nunca com o um meio.'-'’ O marco histórico m oderno desse entendim ento é de 1948, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a Decla ração Universal dos Direitos do H om em e proclamou os direitos fun damentais. A im portância do term o “proclam ar”, segundo D alm o de Abreu Dallari'-% reside na evidência de que “não há concessão ou re conhecim ento de direitos, m as proclam ação deles, significando que sua existência independe de qualquer vontade ou form alidade”. Assim, por serem direitos fundam entais inerentes à natureza hum ana, “nenhum indivíduo ou entidade, nem os governos, os Estados ou a própria O r ganização das Nações Unidas, tem legitimidade para retirá-los de qual quer indivíduo”. 2. DA D IG N ID A D E À IGUALDADE DE D IREITO S Firm ado o entendim ento de que a dignidade é condição inerente a toda pessoa hum ana, decorre a assertiva de que todas as pessoas são iguais. Uma pessoa não vale mais ou m enos do que outra. Essa igualdade de que se cuida não significa que cada pessoa não 125 COMPARA'1'O, Fábio Kondcr. A ajirninção histórica dos direitos h u m anos, p. 61 ef 126 N esse s e n tid o são as p o n d e ra ç õ e s d e D aniel S a rm e n to : " O ser h u m a n o p re c ed e o D ire ito e o Estado, q u e ap en a s se justificam e m r a / ã o dele. N esse sentido, a p essoa h u m a n a deve ser c o n ceb id a e tra ta d a c o m o valo r-to n te d o o rd e n a m e n to ju rídico , c o m o assevera M iguel Reaie, s e n d o a defesa e p ro m o ç ã o d a d ig n id a d e , em to d a s as suas d im e n sõ es, a tarefa p rim o rd ia l d o E stado D e m o c rá tic o d e D ireito, f...] N esta linha, o p rin c ip io d a d ig n id a d e d a pessoa h u m a n a re p re s en ta o ep ic en tro axiológico d a o rd e m co n stitucio n al, irr a d ia n d o efeitos so b re to d o o o rd e n a m e n to ju ríd ico c b a liz a n d o n ã o a p e n a s os atos estatais, m a s ta m b é m to d a a m iria d e d e relações p riv a d a s q u e se d e senv o lv em n o seio d a socied ad e civil e d o m e rc a d o [...] A ssim, é ap en a s o resp eito à d ig n id a d e d a p e sso a h u m a n a q u e legitim a a o rd e m estatal c c o m u n itá ria , c o n stitu in d o , a u m só te m p o , p re s su p o s to e objetivo d a d e m o c ra cia . (S A R M E N TO, Daniel. .4 ponderação de interesses na C onstituição Federal. Rio dc Janeiro: L ú m en Juris, 2000, pp. 59 - 60 ). 127 DALLARl. D a lm o de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado, 14'' ed. São Paulo: Saraiva. 1989, p. 178. 97 tenh a a sua própria individualidade e personalidade. Também os varia dos grupos sociais, distinguem -se p o r sua própria cultura, costum es e relações sociais. Em tal sentido, as pessoas, assim como os grupos so ciais são diferentes, “mas continuam todas iguais com o seres hum anos, tendo as m esm as necessidades e faculdades essenciais. Disso decorre a existência de direitos fundam entais, que são iguais para todos’V^® Em que pese a dicotom ia existente entre o universalismo e o relativismo dos Direitos Humanos^^^, há que se ter em m ente que há direitos m ínim os que são com uns a todos os seres hum anos, porque derivam justam ente dessa condição hum ana, da qual a dignidade e o respeito não se dissociam, independentem ente de sua origem étnica, sexo, idade, credo, nacionalidade, convicção política, ter ou não defici ência e demais diferenças. Nesse sentido, vale lem brar que o Supremo Tribunal Federal, em julgam ento histórico no qual lançou m ão da interpretação teleológica e sistemática da Constituição, dialogando com circunstâncias históricas, políticas, sociológicas e antropológicas, firm ou o entendim ento de que 128 D AI.l.A RI, D a lm o d c A breu. Direitos h unuinos e ciiladania. pp. 13-14. 129 Critica-.se a un iv ersa lid ad e d o s d ireitos h u m a n o s, a o a r g u m e n to d e q u e esta seria u m a fo rm a de c o lo n ia lism o e a p ro te ç ã o d o s d ire ito s h u m a n o s , u m a fo rm a de in gerên cia estran g eira o c id e n tal nos a ss u n to s d o m é stico s dos paises orientais, c o m a im p o s iç ão d e valores c c o n se q ü e n te sacrifício d a d i versid ade cultural- C ritica-se, ain d a , a le g itim id ad e d a D eclaração U niversal d o s D ireitos d o H o m e m , em ra z ão das oito a b stençõ es q u e teve, b e m c o m o p elo fato d e q u e m u ito s países d c hoje e ra m colônias eu ro p e ia s à é p o ca d e sua form u lação . E n tretan to , o b serv a A n d ré <Je C a rv a lh o R am o s q u e "a origem eu ro p é ia e a n tro p o c e n tric a das p rim e ira s c artas d e direitos h u m a n o s n ã o p o d e ser c o n sid e ra d a p ara além d e m e ro d a d o histórico. [...) A p ro te ç ã o d o s direitos h u m a n o s , q u e r nas p rim e ira s revoluções liberais, q u e r n o s dias atuais, c o n tin u a se n d o u m a co n q u ista, n ã o p e rte n c e n d o a d e te rm in a d a tra d iç ã o cultural, m a s sim o b jeto d e p e rm a n e n te d is p u ta política, d u ra n te a qual tradiçõ es c u ltu ra is e religiosas p o d e m se a lterar e n ov as leituras dessas m e sm a s tra d iç õ e s p o d e m aflorar. [...| N ã o se tra ta d e buscar, assim, u m a d e n o m in a ç ã o c o m u m m ín im a d o s d iversos valores culturais, q u e aceita diversas c o n d u ta s h u m a n a s ap en a s p o r serem in teg rantes d c tra d iç õ e s culturais, e m sacrifício d a d ig n id a d e d a pessoa h u m a n a , m a s d e se a firm a r q u e a p lu ra lid a d e d e c u ltu ra s e orie u fa ç õ e s religiosas !o u d e c osm ovisões) de v em ser resp eitad as c o m o re c o n h e c im e n to d a lib erd ad e e p a rtic ip a ç ão c o m d ireito s iguais p ara to d o s” C o m isso, p o n tu a R am os, "o a r g u m e n to c u ltu ra l d e relativízação à u n iv e rsalid ad e d o s direitos h u m a n o s so m e n te p o d e ser aceito c o m o cláusula de s alv ag u ard a àqueles q u e assim d e sejarem exercer seus direitos de escolha, m a s n u n c a p a ra coag ir o u tro s a se s u b m e te re m a d e te rm in a d o s c o m p o r ta m e n to s ap en a s p o r se tra ta r d e p rá tic a tradicional'", (R A M O S, A n d ré d e C arv alh o . Teoria gera! dos direitos hu m a n o s na ordem internacional. Rio d e Janeiro: R enovar, 2005. pp. 182 e 192-194). Dc to d o m o d o , a D eclaração de V iena, q u e c o n to u c o m m ais d e cen to e o ite n ta países, p revê q u e a na tu re z a universal d o s d ireito s h u m a n o s n ã o a d m iíe d ú v id a s (art. 1), b e m c o m o q u e "iod o s os direitos h u m a n o s são universais, indivisíveis in te rd e p e n d e n te s e in te r-relacionados. A c o m u n id a d e in te rn a c io n a l deve tra ta r os direitos h u m a n o s de fo rm a global, ju s ta e eqiiitativa, em p é d e ig u a ld a d e e c o m a m e sm a ê n fase. E m b o ra p a rtic u la rid a d e s n acio n ais e regionais d e v am ser levadas e m co nsideração, assim c o m o diversos con tex to s h istóricos, c u ltu ra is e religiosos, é d e v er d o s E stad o s p ro m o v e r e p ro te g e r to d o s os d ireito s h u m a n o s e liberdades fu n d a m e n ta is, sejam quais fo rem seus sistem as políticos, e co n ô m ic o s e culturais.” (art. 5) 98 inexiste subdivisão n a raça hum ana, pois “não há diferenças biológicas entre os seres hum anos. Na essência são todos iguais” '^^ A Constituição Federal brasileira estabelece no caput do art. 5® que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (igualdade formal). Entretanto, “não só perante a n o rm a posta se nive lam os indivíduos, mas, a própria edição dela assujeita-se ao dever de dispensar tratam ento equânim e às pessoas” (igualdade m aterial).'” Por outro lado, outra coisa não faz a lei a não ser desigualar situ ações: o jovem do idoso, o nacional do estrangeiro, a criança do adulto, a pessoa com deficiência da pessoa sem deficiência etc. Todavia, outro não é o seu objetivo a não ser igualá-las nos seus direitos, já que to dos os seres hum anos são iguais. As variadas características externas de cada pessoa, contingenciais (sexo, idade, profissão, nacionalidade etc.), não podem e não devem ser capazes de diferenciá-las naquilo que, es sencialmente, tem em com um ; a sua condição hu m ana e a dignidade que dela decorre. Do princípio da igualdade, tom ado na sua acepção isonômica, e dos objetivos fundam entais da República previstos no art. 3°, incisos I, III e IV (a construção de um a sociedade livre, justa e solidária; a erra dicação da pobreza e da marginalização e redução das desigualdades sociais e regionais; assim com o a prom oção do bem de todos, sem p re conceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discrim inação), afere-se o dever de todos, e do próprio Estado, no sentido de prom over as ações necessárias (ações afirmativas) à garantia da não exclusão de pessoas ou grupos marginalizados. Isto porque, a construção de um a sociedade livre, justa e solidária; a redução das desi gualdades sociais e a promoção do bem de todos sem preconceitos (CF, art. 3°) implicam um fazer, um a atuação positiva do Estado em direção à inclusão social. Portanto, a efetividade do princípio da igualdade, nos dias atuais, leva ao entendim ento de que, não basta u m a atuação negativa do Esta do no sentido de im pedir violações às liberdades individuais; a tran s formação pela qual passou a sociedade, que resultou no surgim ento dos 130 S1'F, T ribunal Pleno, H C - Q O 82424/R S, Rei. M in. M o re ira Alves, Rei. p / A c ó rd ã o M in. M au rício C o r rêa, j. 17/9/2003, v.m., D \ 19/3/2004, p. 17). T a m b é m disponível n a p u b lic a çã o Racism o e anli-sem itistno: u m julgam ento histórico do ST F (H abeas Corpus n" 82.424/RS). Brasília; Brasilia Jurídica. 2004. 131 M ELLO, C elso A n to n io B an d eira de. C.ontei'uh jurídico do p rincipio d a igualdade, p. 9. 99 direitos sociais, reclama u m a atuação positiva, um a prestação positiva do Estado, que objetiva nada m enos do que a igualaçâo de direitos^’^. É nesse contexto que se insere a proteção jurídica das pessoas com deficiência, a qual, fundada nos princípios da dignidade da pes soa hum ana, da igualdade e da isonomia, busca a plena inclusão social dessas pessoas, bem com o a garantia do pleno acesso a todos os seus direitos. Não há mais espaço, nos dias atuais, para que a exclusão das pes soas com deficiência da vida social seja vista com naturalidade'^^. Nesse sentido é expressa a afirmação contida na Convenção Interam ericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discrim inação contra as Pes soas Portadoras de Deficiência (Convenção de Guatemala), da qual o Brasil é s i g n a t á r i o , e segundo a qual as pessoas com deficiência “têm os m esm os direitos hum anos e liberdades fundam entais que outras pessoas e que estes direitos, inclusive o direito de não ser submetidas a discrim inação com base na deficiência, em anam da dignidade e da igualdade que são inerentes a todo ser hum ano”. A m elhor e mais recente definição do que seja deficiência, ali ás, é dada pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência'^^, da ONU, em seu preâm bulo, alínea “e”: “Deficiência é um conceito em evolução. A deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras atitudinais e ambientais que im pedem sua plena e efetiva participação na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas”. 132 A esse respeito p ro n u n c io u -s e o S u p e rio r T rib u n a l d e Justiça, c m a có rd ão re la ta d o p e lo M in istro Luiz Fux: “C o m o d e sabença, as açõ e s afirm ativas, fu n d a d a s e m p rin c íp io s le g itim a d o re s d o s interesses h u m a n o s re a b re m o d iálog o pó s-p o sitiv ista e n tre o d ire ito e a ética, t o r n a n d o efetivos os p rin c íp io s c o n s titucionais d a is o n o m ia e d a p ro te ç ã o d a d ig n id a d e d a p e sso a h u m a n a , c ân o n e s q u e re m o n ta m às mais antigas d e ciaraç õ e s U niversais d o s D ire ito s d o H o m e m . Eiífim. é a p ro te ç ã o d a p r ó p r ia h u m a n id a d e , c e n tro q u e h oje ilu m in a o u n iv e rs o ju ríd ico , ap ó s a tã o d e c a n ta d a e a p la u d id a m u d a n ç a d e p a ra d ig m a s d o sistem a juríd ico , q u e a b a n d o n a n d o a igualizaçáo d o s d ire ito s o p to u, axiolo g icam ente, pela b u sca da ju stiça e p e l a p essoalização das situ açõ es co n sa g ra d a s n a o r d e m ju ríd ic a ”. (ST), P rim e ira T u rm a . RESP 5 67873-M G , Processo 200301510401, Rei. M in. Luiz Fux, j. 10-2-2004, v,u„ Dl 25-2-2004, p. 120). 133 E xem plos dessa visão p re té rita são c ita d o s p o r Flávia Piovesan, B eatriz Pereira d a Silva e H eloísa B or ges P e d ro sa C am po li: n a E s p a rta d o s s écu lo s IX a V II a .C - u m a deficiência física im p licav a a c o n d e n a ç ã o d e u m a cria n ç a à m o rte. T a m b é m n o Brasil d o sécu lo XVI, q ua se to d o s os hospitais d e m is e ri có rd ia m a n tin h a m as c h a m a d a s R o d as d o s Expostos, o n d e re c é m -n a sc id o s c o m d e fo rm id a d e s p o d ia m ser c o lo c ad o s p a ra , à m a rg e m d a socied ad e, serem c riado s e m o rfan a to s o u c o n v en to s (PIO V ESA N , Flávia, Temas de direitos h u m a n o s, 2 \ ed., São Paulo: M ax L im o n ad , 2003, p. 305). 134 D e creto p residen cial 3.956/2001. 135 Esta C o n ven ç ã o, a p ro v a d a e m m arço /2 00 7 , e m N ov a York, e n tr o u em v ig o r n o Brasil, p e lo D ecreto Legislativo n. i 86 d e 9 d e ju lh o d e 2008. H ouve, p o s te rio rm e n te , o D ecreto 6.949/2009. 100 Além disso, ser pessoa com deficiência não deveria gerar reflexos negativos. Nas palavras de Eugênia Augusta Gonzaga Fávero: [...] deficiência não é o contrário de eficiência. O con trário de eficiência é ineficiência. Especialmente qu an d o se refere a seres h u m an os, a deficiência não deve ser tradu zid a com o “im perfeição ou defeito”, já que não existe perfeição ou ausência total de defeitos em qualquer ser h um ano, ou se)a, n ão se p o d e dizer que pessoas sem deficiência são pessoas... perfeitas. A deficiência, neste caso, indica falta, limitação. Indica que alguém não tem certos atributos físicos, sensoriais ou m entais com u m en te en co ntrado s nas dem ais pessoas, o que é absolutam ente natural. Por isso, n ão é preciso receio no uso da palavra deficiência e a substituição dela p o r outros term os. A lém de não con tribu ir em nada para o reco nhecim ento do direito à cidadania, acaba p or prejudicar a comunicação.'-’^’ Sem embargo do em penho e da participação de cada um , a atua ção positiva do Estado é de grande im portância, pois “som ente a partir da participação efetiva do Estado, é que o direito poderá se concretizar. Não se trata, portanto, de exigir um a abstenção do Estado, para que o direito não sofra interferência, tal com o a prim itiva idéia de liberdade, mas exatamente o contrário, estamos diante de um a típica necessidade de intervenção do Estado para a composição da igualdade"'^\ 2.1 O QUE SIG N IFICA ACESSIBILIDADE? A perspectiva d a inclusão social, que decorre da aplicação efetiva do princípio da igualdade, traz ínsita a idéia da acessibilidade, a qual não se restringe à m era eliminação de barreiras arquitetônicas nas edi ficações e logradouros públicos. Acessibilidade é conceito mais amplo, pois significa ter acesso aos mais variados direitos, ainda que para isso seja necessária a tom ada de algum a m edida afirmativa p o r parte d a sociedade ou do Poder Públi co. Isto porque, não basta a declaração constitucional de igualdade de 136 FÁVERO. Eug ên ia A u gu sta G onzaga. Direitos das pessoas com deficiência: gara ntia de igualdade na diversidade. R io d e janeiro: W V A , 2004. pp. 23-24. 137 A RAU fO, Luiz A lb e rto D avid, A proteção constitucional das pessoas p o rtad ora s de deficiência. Brasília: C O R D E , 1994, p. 64, 101 direitos de todos perante a lei, se esses direitos não puderem ser efeti vamente exercidos. A idéia da acessibilidade, portanto, está ligada à idéia da igual dade material e à atuação positiva do Estado, p o r m eio das chamadas “discriminações positivas”, que buscam com pensar as discriminações de fato ou a inacessibilidade a determ inado direito, na situação que se fizer necessária. Sim, pois, o uso de tais medidas só se justifica nas h i póteses em que a pessoa com deficiência estiver im pedida de exercer determ inado direito. É de se ponderar, todavia, que tais m edidas afirmativas, que bus cam perm itir o exercício de determ inado direito só se justificam q u an do a pessoa com deficiência não conseguir superar as barreiras de ex clusão, em razão de sua deficiência, pois há determ inadas situações em que a pessoa com deficiência não precisa desse apoio do Estado'^^. Apesar das diversas norm as que decorrem do dever constitucio nal de incluir a pessoa com deficiência, ainda encontram os determ i nadas áreas em que a proteção deve ser im plem entada, sob pena de não com pletude do processo de inclusão social. A proteção se justifica, portanto, já que o sistema normativo, por si só, atualm ente existente, não perm ite a efetividade do processo inclusivo. 3. O ACESSO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA AO PROCESSO ELEITORAL Considerando-se que todo p od er em ana do povo, que o exercício desse poder pode ser direto ou p o r meio de representantes, que a dig nidade da pessoa hum ana é um dos fundam entos de nossa República Federativa, que busca construir um a sociedade livre, justa e solidária, desprovida de quaisquer formas de preconceito ou discriminação, te n do em vista que todos são iguais em direitos e obrigações, alcança-se a assertiva de que o exercício da soberania popular, que é viabilizado pelo processo eleitoral, deve ser acessível a todos os cidadãos, em igualdade de condições, ainda que se enquadrem no conceito de m inoria, como as pessoas com deficiência. 138 ARAU JO , Luiz A lb erto D avid. B u sc a n d o significados a p a r tir d e critério s d e in te rp re ta ç ã o c o n stitu cional e, m u ita s vezes, e n c o n tra n d o u m d e sc o n c e rta n te precon ceito. Defesa dos direitos dos pessoas portadoras de deficiência, São Paulo; Revista d o s T rib u n ais, 2006, p. 215. 102 o conceito de m inoria, nesse passo, não se refere a um critério necessariamente quantitativo. Entende-se m inoria p o r u m grupo com interesses específicos e multifacetados, que podem não se alinhar com os interesses da m aioria'’*^. É o caso do grupo das pessoas com deficiên cia, contigente populacional expressivo, que representa o percentual de 14,5% da população brasileira'^". Talvez pudéssemos adotar a expressão de grupo vulnerável, que m elhor se encaixaria na questão. Cuida-se de grupo com interesses multifacetados e não unifor mes, já que cada tipo de deficiência (física, auditiva, visual, mental) reclama um tratam ento próprio. Assim, as necessidades específicas de um a pessoa com deficiência visual, por exemplo, são diversas das ne cessidades de um a pessoa com deficiência auditiva, que p or sua vez, são diferentes das necessidades de um a pessoa com deficiência de loco moção. Seja como for, “todos necessitam de um a proteção especial do Estado, tal fato é inegável. Mas a especificação de tal proteção leva para cam inhos específicos e nem sempre uniformes.”''” N o cenário eleitoral, a inclusão das pessoas com deficiência, co m preende a idéia de que não são apenas os seus esforços pessoais que devem ser envidados para o exercício de u m direito - de soberania p o lítica, de sufrágio, de cidadania - que lhe pertence e que é igual ao de todo cidadão. Sob a perspectiva da inclusão eleitoral, que difere do conceito de integração'''^ tam bém a sociedade e o Estado têm o dever de disponibilizar os meios necessários para acolher essas pessoas, na m edida de suas desigualdades, isto é, na conform idade de cada tipo de 139 AKAL’10, Luiz A lb e rto David. A q u e stã o das m in o r ia s n o sistem a con stitu cio n al brasileiro: an álise de u m casu. Democracia, hoje. Um tnadelo politico paru o Brasil. M aria (ia rc ia (C o o rd .). São Paulo: Celso Bastos / in s titu to B rasileiro d c D ire ito C o n stitu cio nal, 1997, p. 198. 140 D e a c o rd o c o m os d a d o s d o C en s o D e m o g rá lic o d e 200(1, o b tid o s n o e n d ereç o e letrônico d o IB GE In stitu to Brasileiro d c tie o g ra fia e Estatística (hüp: ihge.gov,br), d o s 170 m ilh õ e s de brasileiros, 24,6 m ilh õ e s são pessoas c o m deficiência (14,5% d a p o p u la ç ã o to tal), da.s q u a is 19,8 m ilh õ e s estão nas zonas u rb a n a s e 4,8 m ilh õ e s nas z o n as rurais. 141 ARAL'JO, Luiz A lb e rto David. A q u e stã o das m in o rias n o sistem a con stitu cio n al brasileiro: análise de u m caso. Deritücracia, hoje. Um nnnielo politico para o Brasil. M aria G arcia (C o o rd .). São Paulo: Celso B astos I In s titu to B rasileiro d c D ire ito C o n stitu cio n al, 1997, p. 200 142 A expressão “in clu são social” c o nstitu i evolução d a ex p ressão “ in teg ração social", as quais são co m um e n te m e n c io n a d a s e m cen á rio s d e de sig u a ld a d e social. A ex p ressão “ in clu são social", representa persp ectiva n ova na luta c o n tra a exclusão social, ao passo q u e " in tegração social" explica I.auro Luiz G o m e s Ribeiro (As n o rm a s co n stitu cio n ais d e tutela d a s pessoas p o r ta d o ra s d e deticiència. Revista de D ireito C onstitucional c Internacional, v. 47. pp. 164-165, abr./iun. 2004), re lacion a-se a u m esforço u n ilateral e exclusivo d a pessoa excluída (p o r exem plo, d a p e sso a c o m deficiência); se ela co n seg u ir a d ap tar-se p o r si o u p o r seus fam iliares, a so cie d a d e a “aceita". N a “ in c lu são social", o p ro c e ss o é b ila te ral, a so cie d a d e e a p e sso a excluída, c o n ju n ta m e n te, b u s c a m m eio s d c interação, de inclusão. 103 deficiência, para que o seu acesso ao processo eleitoral seja efetivo. Não é outra, com efeito, a postura que se espera de u m regime democrático. Se não for assim, “pessoas com deficiência terão dificuldade em acom panhar a propaganda eleitoral, pois podem ser cegas ou surdas. A inscrição como eleitor poderá ser dificultada, se se tratar de pessoa com algum grau de deficiência mental. Os que tiverem dificuldade de loco moção precisarão dem onstrar um civismo quase exagerado, enfrentan do escadarias para “tirar o título”, para dirigir-se ao local das votações e para alcançar sua seção eleitoral. E m esm o para um surdo capaz de ler lábios, os lábios dos políticos serão m uito velozes.. Assim, a acessibilidade ao processo eleitoral não se restringe ao acesso físico às zonas eleitorais no dia da votação. O processo eleitoral é mais amplo e o acesso a ele deve alcançar toda essa amplitude, de forma a abranger, além da acessibilidade física aos locais de votação, tam bém o acesso á com unicação eleitoral, isto é, às propagandas institucionais, partidárias e eleitorais. Com preende, ainda, o atendim ento prioritário e diferenciado"^^, bem com o o acesso às discussões e debates entre os candidatos durante a cam panha eleitoral e, até mesmo, o acesso aos partidos políticos (filiação partidária). 3.1 A NORMATIVA ELEITORAL EXISTENTE E AS BARREIRAS DE ACESSO No âmbito infraconstitucional eleitoral, algumas norm as ofe recem um início de proteção aos direitos das pessoas com deficiência. A prim eira delas é o Código Eleitoral (Lei 4.737/65). Dos 383 artigos que o com põem , dois são os dispositivos que se referem às pessoas com deficiência: o art. 150 e o § 6'^ A, do art. 135, § 6^-A. O art. 150, estabelece que o eleitor cego poderá: assinar a folha indi vidual de votação em letras do alfabeto com um ou do sistema Braille (inci so I); assinalar a cédula oficial, utilizando também qualquer sistema (inciso II); usar qualquer elemento mecânico que trouxer consigo, ou lhe for for necido pela mesa, e que lhe possibilite exercer o direito de voto (inciso III). 143 D A M IA , Fábia Lima d e Brito; G O N ÇA L V E S, Luiz C arlo s d o s Santos. A inclusão eleitoral das pessoas com deficiência. D isponível em ; < http;//www.prcsp.mpr.gov.br>, D o u trin a , Acesso e m 02-07-2008. 144 A Lei 10.048/2000 d isp õ e sobre o a te n d im e n to p rio ritá rio q u e deve ser d is p e n s a d o às pessoas co m deficiência. 104 O corre que, deficiência visual, de acordo com os Decretos fede rais 3.298/99, art. 4", III e 5.296/2004, art. 5", § V\ “c” abrange a cegueira e a baixa visão. C om isso, medidas afirmativas em prol de pessoas com baixa visão podem deixar de ser tomadas, porque não existem neste ce nário de proteção e, portanto, são desconhecidas as suas necessidades e peculiaridades. Esse conceito fixado pelo Decreto regulamentar, enten demos, é apenas útil quando inclui. Não para excluir. Expliquemo-nos. O Decreto regulamentar, na verdade, cria direitos e obrigações, matéria reservada, pela Constituição Federal, à lei, norm ativa de ordem p rim á ria, distinta da do decreto regulamentar, de caráter secundário. Além disso, com o advento da Convenção Internacional já mencionada, o conceito de pessoa com deficiência passou a ser mais amplo, deixando o decreto regulam entar sem sua base prim ária (que, aliás, nunca exis tiu). Portanto, deve prevalecer o conceito genérico, am plo e inclusivo da Convenção, com o já visto acima. Se a hipótese concreta se enqua d rar no decreto, ele deve ser aplicado, porque facilita a Adm inistração no seu quotidiano. No entanto, se o Decreto não contem plar o caso concreto, ele não poderá ser aplicado para barrar, para excluir. Nesse caso, 0 conceito deve ser retirado da própria Convenção, desprezandose, p o r restritivo, o decreto, que ferirá o conceito amplo d a Convenção, que tem estatura equivalente de em enda constitucional. Vale m encionar que, em bora nenhum a norm a de proteção elei toral trate do tema, a pessoa com deficiência visual - cega ou com baixa visão - tem o direito de ingressar e perm anecer com o seu cãoguia nas seções e zonas eleitorais (Lei federal 11.126/2005 e Decreto 5.904/2006)'^\ Portanto, tal direito deve ser inserido tam bém no âm bi to da proteção eleitoral das pessoas com deficiência. O fato de inexistir tratam ento específico para o tem a eleitoral não im pede a aplicação da regra geral para o caso das pessoas cegas ou com baixa visão. Já 0 art. 135, § 6“-A do Código Eleitoral (Lei 4.737/65), inserido 145 O art. 1" d a Lei 11.126/2006 Icin o seguinte teor: "Art. 1" Ê a ss e g u ra d o à p e sso a p o r ta d o ra de defici ência visual u s u á ria d e c ão -g u ia o d ire ito d e in gressar e p e rm a n e c e r corn o a n im a l n o s veículos e nos e sta b e le cim ento s p úblicos e p riv a d o s de usu coletivo, d e sd e tjue o b s erv ad a s as c o n d iç õ es im p o sta s p o r esta Lei. § V' A deficiência visual referida n o c a p u t deste a rtig o re strin ge -se à cegueira e à baixa visão. §■ 2" O d isp o sto n o c ap u t deste a rtig o aplica-se a to d a s as m o d a lid a d e s d e tra n s p o rte in te re stad u a l e in te rn a c io n a l c o m o rig e m n o te rritó rio brasileiro". o art, 3 " d a referid a lei p re c o n iz a que: “Art. 3" C o n stitu i ato d e d is crim in a ç ão , a ser a p e n a d o co m in te rd iç ã o e m ulta , q u a lq u e r te n ta tiv a v o ltad a a im p e d ir o u dificultar o g ozo d o direito prev isto n o art. 1- desta Lei”. ]á 105 pela Lei 10.226/2001, diz respeito à acessibilidade física aos locais de votação. Diz o dispositivo: Ari. 135 [...] § 6 ° - A Os Tribunais Regionais Eleitorais d e verão, a cada eleição, expedir instruções aos juizes eleito rais, para orientá-los n a escolha dos locais de votação de mais fácil acesso para o eleitor deficiente físico. Tal dispositivo está em consonância com o teor do parágrafo ú n i co, do art. 21, do Decreto federal 5.296/2004^“^^, o qual determ ina que as urnas das seções eleitorais devem ser adequadas ao uso com autonom ia pelas pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, além esta rem instaladas em local de votação plenam ente acessível e com estacio nam ento próximo. Portanto, em bora se reíira apenas ao eleitor deficiente físico, a lei tu ra atualizada do § 6'^-A do art. 135, do Código Eleitoral, deve contem plar os demais tipos de deficiência, quando for necessário, bem assim as pessoas com dificuldades de locomoção, com o idosos, gestantes e recém-operados. Essa interpretação é recolhida dos dizeres da C onsti tuição Federal e da Convenção. A Resolução TSE 21.008/2002 dispõe sobre o voto dos eleitores com deficiência e estabelece que os juizes eleitorais, sob a coordenação dos tribunais regionais eleitorais, deverão criar seções eleitorais espe ciais destinadas a eleitores com deficiência (art. 1°, caput). Nos m unicí pios onde não for possível, um a das seções existentes poderá ser desig nada para funcionar, tam bém , com o seção especial para esses eleitores (art. 1°, § 1°). Essas seções especiais deverão ser instaladas em local de fácil acesso, com estacionam ento próxim o e instalações, inclusive sani tárias, que atendam às norm as técnicas de acessibilidade (art. 1°, § 2*). Além de fixar o prazo para que os eleitores com deficiência solici tem transferência para as seções especiais (até 151 dias antes do pleito) e com uniquem as suas restrições e necessidades (até 90 dias antes da eleição), conform e arts. 2° e 3°, referida Resolução determ ina que as urnas eletrônicas instaladas nas seções especiais para eleitores com de ficiência visual, conterão dispositivo que lhes perm ita conferir o voto assinalado, sem prejuízo do sigilo do sufrágio (art. 3®, parágrafo único). 146 O D e creto 5.296/2004 re g u la m e n ta a Lei 10.048/2000, q u e d isp õ e sobre o a te n d im e n to p rio ritá rio das p esso as c o m deficiência, b e m c o m o a Lei 10.098/2000, q u e estabelece n o rm a s gerais e critério s básicos p a ra a p ro m o ç ã o d a acessibilidade das p esso as c o m deficiência o u c o m m o b ilid ad e reduzida. 106 Esse dispositivo que perm ite a conferência do voto consiste na função áudio das urnas eletrônicas instaladas nas seções especiais, onde é possível acoplar fone de ouvido. De acordo com inform ações do TRE/ SP, a única diferença entre a u rna eletrônica instalada nas seções elei torais com uns e nas seções especiais é que, nestas, a função áudio está ativada. Por íim, preceitua que seja dada am pla divulgação das regras que estabelece, pelos tribunais regionais eleitorais (art. 4^). A criação das seções eleitorais especiais destinadas aos eleitores com deficiência, todavia, foi repudiada, pelo Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (CONADE), o qual, em 16/12/2002, solicitou a alteração dos term os da Resolução 21.008/2002, ao argum ento de que tal procedim ento “cristaliza a exclusão da pessoa portadora de deficiência que tem o direito de utilizar sua sessão [sic] eleitoral desde que acessível na form a dos princípios constitucionais e da Lei 10.098/00?'" O Tribunal Superior Eleitoral, p or m eio da Resolução 21.342, da relatoria do M inistro Fernando Neves, indeferiu o pedido veiculado pelo CONADE, sob o fundam ento de que a transferência para as se ções especiais não é obrigatória, bem com o que a solução adotada pela Resolução 21.008 era a viável para aquele mom ento, pois a Justiça Elei toral não tinha condições de adaptar todas as seções eleitorais do País às necessidades dos eleitores com deficiência. Por fim, asseverou que “nunca houve intenção de excluir as pessoas deficientes, com o afirma o Conade, mas, ao contrário, possibilitar a elas que exerçam seu direito da m aneira mais côm oda e facir'^^ Trata-se de solução provisória, que deverá sofrer transform ação com o decorrer do processo inclusivo. Não deve haver, em tese, seções eleitorais especiais. No estágio em que esta mos, elas são aceitáveis, mas não definitivas. Q ualquer seção deve ser acessível, nos term os da legislação de acessibilidade. Portanto, a criação 147 TSH, Processo A d m in is tra tiv o 18,764, Classe 19’, D istrito Federal (Brasília), Rei. M m . F e rn a n d o N e ves. 148 A d ecisão p ro ferid a pelo T rib u na l S u p e rio r Eleitoral está assim e m e n ta d a : “R e s ./I SE ii'^ 21,008. Solici tação. C o n se lh o N acional d a Pessoa P o r ta d o r a d e Deficiência - C O N A D E , Seções eleitorais especiais d e stin ad a s a eleitores p o rta d o re s d e deficiência. Extinção, Im p o ssib ilid ad e. I, A tra n sfe rê n cia d e elei tores p o rta d o re s d e deficiência p a ra as seções eleitorais n ã o é o b rigató ria. 2. Inviab ilid ad e d e a Justiça Eleitoral a daptar, n o p re s e n te m o m e n to , to d a s as seções eleitorais d o país às ne ce ssid a d e s especiais d o s eleitores nela in scritos" (P ro cesso A d m in is tra tiv o 18.764, Classe 19“, D istrito Federal/B rasília, Rei. Min. F e rn a n d o Neves. R esolução 'l'SE 21,342, d e 13/2/2003, v,u., D | 2 8 /3 /2 0 0 3 . p. 158). 107 de urnas acessíveis é algo transitório e que, com o tem po, deve ser su prim ido, pois todas devem ser acessíveis. Por ocasião das eleições m unicipais de 2004, o Tribunal Superior Eleitoral proferiu a Resolução 21.633^^^, a qual dispõe sobre algumas regras em prol das pessoas com deficiência, N o art. 52, § 2° asseguroulhes a preferência para votar, nas zonas eleitorais em que estejam inseritas^^". Nos arts. 57 a 59 estabeleceu que: Art. 57. Os eleitores com necessidades especiais que votarem em seções eleitorais apropriadas poderão utilizar os m eios e recursos postos à sua disposição pela Justiça Eleitoral para facilitar o ex ercid o do voto. Parágrafo único. Os eleitores com necessidades especiais poderão contar com ajuda de pessoa de sua confiança para o exercício do voto’^'. Art. 58. As urnas eletrônicas, instaladas em seções especiais para eleitores com deficiência visual, conterão dispositivo que lhes p erm ita conferir o voto assinalado, sem prejuízo do sigilo do sufrágio. Art. 5 9 .0 eleitor cego p o d erá (C ódigo Eleitoral, art. 150, I a III}; I - assinar o caderno de votação, utilizando-se de letras do alfabeto co m u m ou do sistem a Braille; II - usar qualquer instru m en to m ecânico que trouxer consigo, ou lhe for fornecido pela mesa, e que lhe possibilite exercer o direito de voto; III - utilizar-se do sistem a de áudio, q u an d o disponível; 149 A R esolução TSE 21.633, de 19/2/2004, foi p u b lic a d a n o D iá rio d a Justiça d e 9 /3 /20 0 4 , p. 118. Re ferida n o r m a foi an te ce d id a pela R eso lu çã o T S E 2 1 .3 9 5 /2 0 0 3 a q u a l d e te r m in o u q u e as sugestões a p re se n ta d a s p e lo C o rre g e d o r R egional Eleitoral d e M in as G erais, n o s e n tid o d e facultar às pessoas c o m deficiência física serem a c o m p a n h a d a s p o r p e sso a de s u a confiança, n a cabine d e votação, p a ra auxiliá-las n o a to d e votar, b e m c o m o n o d e re g u la m e n ta r a pre sen ç a d e in térp retes e a inscrição de legendas n o s p ro g r a m a s eleitorais televisivos, d e v eria m ser o bjeto d e análise p o r ocasião d e e labo ração das in stru ç õ e s p a ra as eleições d e 2004. A lé m das sugestões m e n c io n a d a s , o T R E /M G sugeriu; (a) que se d e te rm in a ss e q u e os serv en tu á rio s d o s c artó rio s se o rg a n iz e m d e m o d o que. se necessário, se d e slo q u e m até as p o rta s das serventias p a ra a te n d im e n to às pessoas c o m deficiência física e (b) q u e se d e sti n e v e rb a o rç a m e n tá r ia p a ra q u e os p ré d io s d e p ro p r ie d a d e d a U nião, q u e ab rig a m c artó rio s eleitorais, sejam a d ap tad o s a fim d e p e rm itir o acesso d o s c id a d ão s c o m deficiência fisica aos serviços eleitorais (TSE, Processo A d m in istra tiv o 18.764, Classe i 9 “, D istrito Federal, Brasília. Rei. M in . f c r n a n à o Neves, R esolução 21-395, d e 8/5/2003, v.u., DJ 23/5/20 0 3 , p. 125). 150 O § 2" d o art. 52, d a R esolução TSE 21.63^/2004, te m o seg u in te teor; "O b se rv a d a a p rio rid a d e a sse g u ra d a aos can d id ato s, tê m preferên cia p ara votar, n a s z o n as eleitorais e m q u e estão inscritos, o juiz eleitoral d a zona, os juizes d o s trib u n ais eleitorais, seus auxiJiares d e serviço, os p ro m o to re s p úblicos q u a n d o a serviço d a justiça Eleitoral, os policiais m ilitares e m efetivo exercício de p o lic ia m e n to, os fiscais e d e le g ad o s d e p a r tid o p o litico o u d e coligação m u n id o s d a re spec tiv a c re d en c ia l e. ain d a , os eleitores de m a is d e 65 an os d e idade, os e n fe rm o s, os p o rta d o re s d e necessid ad es especiais e as m u lh e res g rá v ida s e Jactantes (C ó d ig o Eleitoral, art. 143, § 2")" 151 G rifo nosso. 108 IV - utilizar-se d o princípio d a m arca d e idenüftcaçào da tecla n ú m ero 5; V - assinalar as cédulas, utilizando o alfabeto co m u m ou o sistem a Braille, no caso de votação p o r cédulas. Em virtude do confronto aparente entre o preceito contido no supra transcrito parágrafo único, do art. 57 d a Resolução TSE 21.633, que autoriza as pessoas com deficiência a contar com o auxílio de pes soa de sua confiança no exercício do voto e o art. 14 da Constituição Federal que preconiza o sigilo do voto, o qual, se violado, atrai a nulidade da votaçào'^^ e, ainda, considerando a necessidade de se viabilizar o efetivo exercício da cidadania por parte das pessoas com deficiência, a Corregedoria-G eral Eleitoral questionou o Tribunal Superior Eleitoral acerca do alcance do m encionado parágrafo único do art. 57, da Reso lução em referência. Assim, sobreveio a R esolução TSE 21.819/2004‘^-\ da relatoria do M inistro Fernando Neves, em cujo voto assevera que a garantia do sigilo não pode ser elevada a extremos que im peçam o exercício do voto, já que am bos são princípios constitucionais e o sigilo não pode existir sem o direito ao voto. Deste m odo, na com provada im possibili dade de se observar ambos os princípios, o direito ao voto é que deve prevalecer, p or ser expressão m aior da cidadania. C om essas conside rações, propôs os critérios adiante transcritos, que foram aprovados, à unanim idade, pelos M inistros do Tribunal Superior Eleitoral: • o eleitor com necessidades especiais poderá, para votar, contar com o auxílio necessário, ainda que não o tenha requerido antecipadam ente ao juiz eleitoral e/ou ainda que não esteja inscrito em seção eleitoral especial; • o presidente de m esa de seção eleitoral, verificando ser imprescindível que eleitor com necessidades especiais conte com o auxílio de pessoa de sua confiança para exercer o direito de voto, estará autorizado a perm itir o ingresso dessa segunda 152 D e a c o rd o c o m o in ciso IV, d o art. 220, d o C ó d ig o Eleitoral, é n u la a v o ta ç ão “q u a n d o p re te rid a fo r m a lid a d e essencial d o sigilo d o s sufrágios”. 153 A R esolução TSE 21.819, d e 13/6/2004, foi p u b lic a d a n o D iá rio d a iustiça d e 28/6/2 0 0 4 , p. 100. V., adiante, A n e x o B. 109 pessoa, junto com o eleitor, na cabine eleitoral, sendo que ela poderá, inclusive, digitar os núm eros na u rn a eletrônica; • a pessoa que ajudará o eleitor com necessidades especiais não poderá estar a serviço da Justiça Eleitoral, de partido político ou de candidato. Por outro lado, ao dispor sobre o alistam ento eleitoral e o voto dos cidadãos com deficiência, cuja natureza e situação impossibilitem ou tornem extrem am ente oneroso o exercício de suas obrigações elei torais, a Resolução TSE 21.920, de 19/9/2004, em bora ressalte que “o alistam ento eleitoral e o voto são obrigatórios para todas as pessoas portadoras de deficiência” (art. 1°, caput), estabelece que não estará su jeita á sanção'^^ a pessoa cuja deficiência torne impossível ou excessi vam ente oneroso o cum prim ento das obrigações eleitorais, relativas ao alistamento e ao exercício do voto (art. 1“, parágrafo único). Deste modo, m ediante requerim ento do cidadão, ou de seu p ro curador, e comprovadas as condições acima descritas, consideradas, ademais, a situação sócio-econômica do interessado e as condições de acesso ao local da votação ou de alistam ento desde a sua residência, es tará o juiz eleitoral autorizado a expedir certidão de quitação eleitoral, com prazo de validade indeterm inado (art. 2^, caput e § 1°). Entretanto, dispõe ainda a aludida Resolução que seus dispositi vos não têm o condão de alterar a aptidão da inscrição eleitoral para o exercício do voto (art. 2°, $ 5°). Além disso, a expedição da certidão de quitação eleitoral não impede, a qualquer tem po, o alistam ento eleitoral de seu beneficiário, que não se sujeitará à sanção do art. 8® do Código Eleitoral. Todavia, ao argum ento de que o voto, mais do que um direito, é um a obrigação e, p o r entender que o Tribunal Superior Eleitoral estava tornando facultativo o voto das pessoas com deficiência grave, o que levaria a considerá-las cidadãs de segunda categoria, a Associação dos Policiais Militares Deficientes Físicos do Estado de São Paulo im petrou 154 D e aco rd o c o m o art. 7". caput, d o C ó d ig o Eleitoral, “o eleitor q u e d eix ar d c v o ta r c n ã o se justificar p e ra n te a luiz Eleitoral até trin ta d ia s a p ó s a realização d a eleição in c o rre rá n a m u lta d e três a d e z p o r c e n to s o b re o salá rio noínim o P o r sua vez, o caput d o art. 8". d o referido C ó d ig o e statu i q u e “o brasileiro n a to q u e n ã o se alistar até os d e ze n o v e an o s o u o n a tu ra liz a d o q u e n ã o se alistar até u m a n o d e p o is d e a d q u irid a a n a c io n alid ad e b rasileira in c o rre rá n a m u lta d e três a de z p o r cen to so b re o valor d o salário m ín im o li O M andado de Segurança C oletivo'” perante aquela Corte, a fim de afas ta r 0 assim entendido cerceam ento do direito de votar das pessoas com deficiência. Na linha desse entendim ento, em seu parecer, o M inistério Público opinou no sentido de que a perspectiva em que é colocada a questão deve ser reconsiderada pois, em bora a norm a pareça um a libe ralidade, pode estar exim indo a obrigação do Poder Público de cum prir o seu papel, no que concerne à acessibilidade dos locais de votação. Em seu voto, o Relator, M inistro H um berto Gomes de Barros, denegou a segurança, observando que tal norm a “não im pede o exercício da obrigação, apenas faculta ao requerente a possibilidade de requerer, m otivadam ente, que não seja compelido à sua prática” e, a título de esclarecimento, acrescentou “que o Estado deve propiciar ao máxim o o exercício do voto, mas há situações que estão além do limite”. Na colo cação feita pelo M inistro G ilm ar Mendes: Im aginar que a questão d a acessibilidade pudesse ser resolvida com um ‘A bre-te, Sésamo’ é acreditar tam bém n a ‘V elhinha de Taubate. Há grandes dificuldades neste processo. A Justiça Eleitoral está aberta a isso, m as são questões que aparentem ente só guardam conexão espiritual. A resolução trata daquele que de fato está praticam ente im possibilitado e tinha u m ônus desm esurado ou para ir votar, ou im p u n h a à família esse ônus. O M inistro M arco Aurélio, po r sua vez, ao tem po em que p o n derou que a norm a em com ento apenas cogita o reconhecim ento da justa causa ao não com parecim ento para votar, sustentou a possibilida de de se repensar a redação da referida norm a, até para inserir algo que estimule a adaptação dos locais de votação Dessa forma, com base nos argum entos expostos, o Tribunal Supe rior Eleitoral, à unanimidade, denegou a segurança pleiteada pela Asso ciação dos Policiais Militares Deficientes Físicos do Estado de São Paulo. 155 O in teiro te o r d o a c ó rd ã o p ro ferid o pelo T ribunal S u p e rio r Eleitoral p o d e ser o b tid o n o e n d ereç o ele trônico-. \ \ ww.ise.gov.br. A e m e n ta d o re fe rid o ju lg a d o é a seguinte: “M A N D A D O DH S E G U R A N Ç A C 0 1 , E T I \ '0 PR EV E N TIV O - A to d o TSE. P o r ta d o r de deficiência física. D ire ito de votar. C e r c e a m e n to. N à o -o c o rré n c ia. S eg u ran ça deneg ad a. A Resoiução-TSE n “ 2 1 .920/2004 n ã o im p e d e o p o r ta d o r de deficiência d e e xercer o d ireito d e votar, antes, faculta-lhe o de requerer, m o tiv a d a m e n te , a d isp en sa d a obrigação, da d as as p e cu liarid a d es d e sua situação" (TSE. M S C O I, - M a n d a d o d e S eg u ran ça C o letivo n° 3,203, (Hasse 35 ', São Paulo, SP, Re!- M in. H u m b e rto G o m e s de B arros, j. 3/11/2005, v.u,, DJ 9 /12/2005, p. 142), 156 N ã o h á no tícia, até os d ia s atuais, d e q u e a re d a ç ã o d a R eso lu ção 21,920 te n h a s id o a lte ra d a n e ste s e n tido. 111 N a linha desse entendim ento, ainda, a R esolução TSE 21.991/2005^-'^', que dispõe sobre o cancelamento de inscrições e a re gularização da situação dos eleitores que deixaram de votar nas três últimas eleições consecutivas, estabelece, em seu art. 1°, § 2°, que “não estarão sujeitas ao cancelamento as inscrições atribuídas a pessoas p o r tadoras de deficiência que torne impossível ou extrem am ente oneroso 0 cum prim ento das obrigações eleitorais Convém mencionar, tam bém nessa esteira, a decisão m onocrática proferida pelo M inistro Francisco César Asfor Rocha, em 4/4/2006, a qual, endossando o posicionam ento firm ado pelo Tribunal Superior Eleitoral, concluiu que: {...] para o alistam ento eleitora] do cidadão p o rtad o r de deficiência, privado dos m em bro s superiores, o cartório eleitoral deverá providenciar, nos espaços próprios d o form ulário RAE, d o título eleitoral e do seu protocolo de entrega, a consignação da expressão “im possibilitado de assinar”, devendo o m esário exigirlhe, no m o m en to do com parecim ento para o exercício do voto, a apresentação de d o cu m en to oficial com foto que com prove sua identidade, sen do facultado ao eleitor fazer-se acom p an har de pessoa de sua confiança, nos term os das instruções p ertinentes desta C orte Superior. O presidente d a m esa providenciará, ainda, o registro da expressão “im possibilitado de assinar” no local apropriado da folha de votação e da ocorrência n a ata da eleição. C om un iqu e-se às corregedorias regionais eleitorais. 3.2 A QUESTÃO D O S INTÉRPRETES DE LIBRAS E D O S DEBATES TELEVISIVOS Destacam-se, ademais, as norm as que dispõem sobre os intérpre tes da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), nas propagandas eleitorais televisivas. A Resolução TSE 14.550/1994’^^, decorrente de Represen tação oferecida pelo M inistério Público Eleitoral de Sào Paulo'^'^, auto- 157 A R esolução TSE 21.991, d e 15/2/2005. foi p u b lic a d a n o D iá rio d a Justiça d e 2 5 /2 /2 0 0 5 , p. 103. 158 TSE, Processo A d m in istra tiv o 19538, Belcm-PA, Rcl. M in . Francisco C ésa r Asfor R ocha, d ecisão m o n o c rá tic a,). 4/4/2006, D l 10/4/2006, p. 8 6 . 159 A R esolução TSE 14.550. d e 01/9/1 9 94 , foi p u b lic a d a n o D iá rio d a justiça d e 11/10/1994, p. 279. 160 O ofe re c im e n to d a referida R ep rese n ta çã o p e lo M in istério P ú blico Eleitoral d e c o r re u d e solicitação feita pela c o m u n id a d e d e deficientes auditivos. 112 rizou os partidos políticos a utilizarem intérpretes de sinais, no horário da propaganda eleitoral gratuita veiculada pela televisão, com a ressalva de que a função do intérprete, necessariamente técnico especializado, deve ser discreta, vedado o seu exercício p or outro candidato ou pessoa famosa, que p o r si só, implique prom oção do partido ou candidaturas. Em março/2006, a R esolução TSE 22.158'^\ dispôs sobre a p ro paganda eleitoral e as condutas vedadas aos agentes públicos em cam p an h a eleitoral nas eleições de 2006 e, no seu art. 60, previu que: “A propaganda eleitoral gratuita na televisão deverá utilizar Linguagem Brasileira de Sinais (LIBRAS) e os recursos de legenda”. Todavia, a Re solução TSE 22.261/2006^ , revogou a m encionada Resolução 22.158 e dispôs, em seu art. 58 que: “A propaganda eleitoral gratuita na tele visão deverá utilizar a Linguagem Brasileira de Sinais (Libras) ou os recursos de legenda” Desde então, as Resoluções do Tribunal Superior Eleitoral que lhe sucederam - R esolução TSE 22,718/2008 (art. 25, § P - eleições2008) e R e s o lu ç ã o 23.191/2009 (art. 33, § 1 * - eleições2010) - repetem o m esm o teor, ao regulam entar as eleições de que cuidam. De acordo com tal normativa, portanto, na propaganda eleito ral gratuita veiculada pela televisão, não é mais obrigatória a utilização concom itante da Língua Brasileira de Sinais e da legenda, pois perm itese a opção entre um ou outro recurso. Essa possibilidade de alternância, contudo, não abrange a plenitude das pessoas com deficiência. Isto porque, há surdos (em regra, de nascença, não oralizados) que não podem ser destinatários do recurso da legenda oculta, já que, p o r não conhecerem a Língua Portuguesa, não conseguem com preen der textos escritos e, assim, necessitam da janela de LIBRAS para com preenderem 0 conteúdo da propaganda. A determ inação para que o uso da janela de LIBRAS e da le genda seja alternativo, e não concom itante, dem onstra o absoluto des conhecim ento das peculiaridades inerentes às pessoas com deficiência auditiva, afastando parcela desse grupo do acesso à propaganda eleito ral. Aliás, a sigla LIBRAS significa Língua e não Linguagem Brasileira de Sinais. 16] A R esolução TSE 22.158, d e 2/3/2ÜÜ6, foi p u b lic a d a n o D iário d a Justiça d e 14/3/2006. p. 106. 162 A R esolução TSE 22.261, d e 29/6/2 0 0 6 , q u e revo g o u a R esolução 22.158, foi p u b lic a d a n o D iário da ]ustiça d e 17/7/2006, p. 124. 113 Pode-se apontar, como justificativa para essa norm ativa atual do Tribunal Superior Eleitoral, “questões com o a dificuldade e o custo na obtenção de intérpretes, a interferência da interpretação no campo visual da propaganda etc. Razões com o essas, contudo, se invocadas fossem, ainda assim não nos pareceriam válidas para dim inuir a pos sibilidade de que os surdos tivessem plena participação no processo eleitoral.”^^^ Mesmo nas hipóteses em que a Justiça Eleitoral faz uso de ambos os recursos, ainda assim, há que se atentar para a qualidade da legenda e da janela para intérprete de LIBRAS, isto porque, têm chegado ao conhecim ento do M inistério Público Eleitoral reclamações como: (i) legendas com letras pequenas, de cor fraca e que não contrastam com o fundo, dificultam a leitura; (ii) legendas que \o r r e m ” m uito rapida m ente no vídeo, tam bém dificultam a leitura; (iii) janela para intérprete de LIBRAS m uito pequena, com pouca nitidez e sobreposta à imagem da propaganda, dificulta sua visualização e compreensão. A inclusão eleitoral das pessoas com deficiência auditiva reclama, ainda, o uso dos recursos de legenda e janela de LIBRAS tam bém nos debates televisivos entre os candidatos aos cargos majoritários. Nesse sentido, a Procuradoria Regional Eleitoral de São Paulo vem atuando desde 2006, p o r meio da expedição de recom endações às emissoras de televisão do Estado, a fim de que ‘a transmissão pela televisão de debates entre candidatos dos mais diversos níveis, seja acompanhada de legendagem, ainda que no sistema do closed caption e de tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais’\ Em 2006 não obteve êxito; em 2008, o êxito foi parcial, pois as emissoras com prom eteram -se a fazer uso da legenda. Nesse ponto, é im portante ressaltar que a inclusão eleitoral das pessoas com deficiência, que vem acontecendo, tem com o grande alia do o M inistério Público Eleitoral. No Estado de São Paulo, p o r exem plo, o marco dessa atuação foi a audiência pública de julho/2006, que convidou a com unidade em geral e as pessoas com deficiência a indi car os problemas, dificuldades, necessidades e sugestões. O utra atua ção im portante foi a Representação apresentada ao Tribunal Regional 163 D A M IA , Fábia Lim a d e Brito; G O N ÇA L V E S. Luiz C arlos d o s Santos. A inclusão eleitoral da$ pessoas com deficiência. D isponível em: < iittp://w/ww.prcsp.mpf.gciv.br>. D o u trin a , A cesso e m 02-07-2008. 114 Eleitoral de São Paulo (TRE/SP), em fevereiro/2009, com pedido para que a acessibilidade das pessoas com deficiência e com dificuldades de locomoção fosse m apeado e tom adas as providências cabíveis. Um dos argum entos utilizados foi o de que as eleições acontecem a cada dois anos e, portanto, nada justifica a não tom ada das medidas necessárias. A boa notícia é que tal atuação, que tam bém contou com o em penho do Tribunal, já para as eleições 2010, trouxe dados de relevo. O objetivo é o de que haja pelo m enos um a seção especial, com acessibi lidade universal, em cada local de votação. De acordo com dados do TRE/SP, em m arço de 2009, na Capital, havia 473 seções especiais; em fevereiro/2010, esse núm ero passou para 1.674 seções especiais, o que representa u m aum ento de 254%. No interior, das 1.905 seções espe ciais que existiam em março/2009, num aum ento de 185%, alcançou-se o núm ero de 5.749 seções especiais instaladas. Em breve, com a tarefa da acessibilidade cum prida (os prazos do decreto regulam entar já estão esgotados, em sua m aioria), não haverá mais seções especiais, m as ape nas seções (todas acessíveis, é claro). Para tanto, o M inistério Público deve ficar atento para exigir o cum prim ento da regra d a acessibilidade em TODOS os imóveis públicos e, certamente, naqueles destinados ao processo eleitoral. A perspectiva é otimista; o cam inho é longo... 4. CONCLUSÕES A inclusão eleitoral das pessoas com deficiência, a par do aces so efetivo ao processo eleitoral, reclama tam bém p o r legitimidade na feitura das norm as que a regulamenta. Dadas as peculiaridades que as qualificam, é im portante que as pessoas com deficiência participem, prévia e dem ocraticam ente, da elaboração das norm as que buscam tu telar seus direitos. Destarte, e n a esteira do lem a “N ada sobre nós, sem nós"'^\ as pessoas com deficiência devem ser consultadas acerca de suas necessi dades, para que o acesso aos seus direitos seja efetivo. Isto porque, sem 164 O lem a “N a d a so b re nó s, sem n ó s ”, foi a d o ta d o p a ra o d ia 3 d e d e z e m b ro d e 2004, institu íd o pela O N U - O rg a n iz aç ã o das N a çõ e s U n id a s (O N U ), o D ia In te rn a c io n a l das Pessoas c o m Deficiência. 115 conhecer as suas reais dificuldades e interesses, com que legitimidade serão fixadas norm as que as regularão, a pretexto de protegê-las? Para que essa “ilegitimidade” não ocorra, a participação das pessoas com d e ficiência no processo de inclusão social é fundam ental, o que implica conferir-lhes o papel de agentes no desenvolvimento dos sistemas de apoio e serviços de que necessitam, bem com o o reconhecim ento do direito de exercerem pressão em prol dos seus próprios interesses'^\ Em consonância com esse entendim ento, M aria de Lourdes Canziani assinala que; O novo parad ig m a [com que se pensa a deficiência nos dias de hoje] d á ênfase aos apoios, aos am bientes naturais e considera o nível de funcionam ento d a pessoa em seu am biente - tendo em conta sua opinião, escolhas, decisões, participação, e conseguindo, assim, reduzir os indicadores das desigualdades sociais. [...] a nova form a de pensar a deficiência afasta-a d a ótica d a patologia, d a etiologia, intro du zind o a dim ensão da abordagem de que a incapacidade causada por uma deficiência é agravada ou m inimizada conforme sua relação com a sociedade. Esta, p o r sua vez, deve oferecer os apoios facilitadores para que o indivíduo com deficiência possa ter as m esm as o p ortu nidades que qualquer o u tra pessoa, para satisfazer suas necessidades gerais e específicas'*’^. Uma sugestão de m edida inclusiva seria a realização de audiência pública pelo Tribunal Superior Eleitoral, com a participação de pes soas e entidades representantes de cada tipo de deficiência, antes da expedição de Resoluções que se destinem ao am paro de seus direitos, a exemplo do que estabelece o art. 105 da Lei 9.504/97, segundo o qual até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal, antes da expedição das instruções necessárias à realização do pleito, ouvirá os delegados dos partidos políticos participantes. O utro exemplo nesse sentido é o da audiência pública prom ovida pelo Tribunal Superior Eleitoral, desti nada a discutir diretrizes para os Tribunais Regionais Eleitorais assegu rarem o exercício do direito de voto pelos presos provisórios e adoles centes em m edida sócio-educativa de internação, apresentando m inuta 165 C A N Z IA N I, M aria d e Lourdes. D ireitos h u m a n o s e os no v os p a ra d ig m a s das p esso as c o m deficiência. Defesa dos direitos das pessoas p ortadoras de deficiência. Luiz A lb e rto D av id A ra u jo (C oo rd.). São P a u lo; Revista d o s Tribunais, 2006, pp. 258-259. 166 Ibidem , pp. 259-260, grifo nosso. 116 da Resolução, que veio a ser posteriorm ente expedida (Resolução TSE 23.219/2010). C am panhas informativas são providências igualmente essenciais que, necessariamente devem ser tomadas, ou reforçadas, para a ampla divulgação desses direitos, pois não são poucos os casos de reclamações que chegam ao M inistério Público, decorrentes da falta de informação. Vale destacar, ainda, que as medidas em prol da acessibilidade para as pessoas com deficiência, no que concerne ao processo eleito ral, não deveriam ser tom adas apenas às vésperas das eleições, pois a proxim idade do pleito e as m edidas necessárias para o seu bom an dam ento são, muitas vezes, impeditivas de soluções eficazes. Ademais, considerando-se que as eleições acontecem a cada dois anos, medidas de inclusão eleitoral não deveriam ser tom adas de form a tão episódica e casuística. H á que se assumir, portanto, o com prom isso de viabilizar o acesso das pessoas com deficiência, não apenas ao dia da votação, mas ao processo eleitoral como um todo. Seja como for, “nenhum a situação que afete, em m aior ou m e n o r grau, quase 15% da população brasileira pode ser desconsiderada, m uito m enos quando do exercício de função basilar do Estado D em o crático de Direito, que é a de plena participação eleitoral, em todas as suas posições. A igualdade construída pela sociedade é condição para o respeito à dignidade da pessoa hum ana. Nisso consiste o 'ser cidadão sob pena de se configurar m odalidade indesejável de cidadania restrita, a qual acarretará lam entoso retrocesso na História”^^^ Na projeção para o futuro, im portante citar o caráter vinculativo para o Estado Brasileiro, do artigo 29 da Convenção sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, aprovada com estatura equivalente à em enda constitucional (Decreto Legislativo n. 186 de 09 de julho de 2008): “A rtig o 29 Participação na vida política e pública Os Estados Partes garantirão às pessoas com deficiência direitos polí ticos e oportunidade de exercê-los em condições de igualdade com as demais pessoas, e deverão: 167 D A M IA, Fábia Lim a d e Brito; G O N ÇA L V E S, Luiz C arlo s d o s Santos. A inclusão eleitoral das pessoas com deficiência. D isponível em; < h t t p ; / / w w w . p r e s p . m p f . g o v . b r > , D o u trin a , A cesso e m 02-07- 200& 117 a) Assegurar que as pessoas com deficiência possam participar efetiva e plenam ente na vida política e pública, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, diretam ente ou p o r meio de representantes li vrem ente escolhidos, incluindo o direito e a oportunidade de votarem e serem votadas, mediante, entre outros: I) G arantia de que os procedim entos, instalações e materiais e equipa m entos para votação serão apropriados, acessíveis e de fácil com pre ensão e uso; II) Proteção do direito das pessoas com deficiência ao voto secreto em eleições e plebiscitos, sem intimidação, e a candidatar-se nas eleições, efetivamente ocupar cargos eletivos e desem penhar quaisquer funções públicas em todos os níveis de governo, usando novas tecnologias assistivas, quando apropriado; III) G arantia da livre expressão de vontade das pessoas com deficiên cia como eleitores e, para tanto, sempre que necessário e a seu pedido, perm issão para que elas sejam auxiliadas na votação p o r um a pessoa de sua escolha; b)Prom over ativamente um am biente em que as pessoas com deficiên cia possam participar efetiva e plenam ente na condução das questões públicas, sem discrim inação e em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, e encorajar sua participação nas questões públicas, m e diante: I) Participação em organizações não-governam entais relacionadas com a vida pública e política do país, bem com o em atividades e adm inistra ção de partidos políticos; II) Formação de organizações para representar pessoas com deficiência em níveis internacional, regional, nacional e local, bem com o a filiação de pessoas com deficiência a tais organizações” 5. BIBLIOGRAFIA ARAUJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional das pessoas portadoras de deficiência. Brasília: CORDE, 1994. . (Coord.). Buscando significados a partir de critérios de inter pretação constitucional e, muitas vezes, encontrando um desconcer tante preconceito. Defesa dos direitos das pessoas portadoras de deficiên cia, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. 118 . A questão das m inorias no sistema constitucional brasileiro: análise de um caso. Democracia, hoje. Um modelo político para o Brasil M aria Garcia (Coord.). São Paulo: Celso Bastos / Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 1997. CANZIANI, M aria de Lourdes. Direitos hum anos e os novos paradig mas das pessoas com deficiência. Defesa dos direitos das pessoas porta doras de deficiência. Luiz Alberto David Araujo (Coord.). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos h um a nos. São Paulo: Saraiva, 1999. DALLARI, D alm o de Abreu. Direitos humanos e cidadania. 2" ed. re form. São Paulo: M oderna, 2004 (Coleção polêmica). . Elementos de teoria geral do Estado. 14^ ed. São Paulo: Saraiva, 1989. DAMIA, Fábia Lima de Brito; GONÇALVES, Luiz Carlos dos Santos. A inclusão eleitoral das pessoas com deficiência. Disponível em: < http: /www. presp.m pf.govbr>, D outriua, Accsso em 02-07-2008. FÁVERO, Eugênia Augusta Gonzaga. Direitos das pessoas com deficiên cia: garantia de igualdade na diversidade. Rio de Janeiro; WVA, 2004. MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3" ed., 9^ tiragem. São Paulo: Malheiros, 2001. PIOVESAN, Flávia . Temas de direitos humanos. 2“ ed. São Paulo: Max Limonad, 2003. RAMOS, A ndré de Carvalho. Teoria geral dos direitos humanos na or dem internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes. As norm as constitucionais de tutela das pessoas portadoras de deficiência, Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 47, pp. 164-165, abr./jun. 2004. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa hum ana e direitos f u n damentais na Constituição Federal de 1988. 4*^. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. 119 SARMENTO, Daniel. A ponderação de interesses na Constituição Fede ral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. SILVA, José Afonso da. A dignidade da pessoa h u m ana com o valor su prem o da democracia. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, V. 212, pp. 89-94, abr./jun. 1998. . Curso de direito constitucional positivo. 21* ed. rev. e atual, nos term os da Reforma Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2002. 120 BREVES ANOTAÇÕES SOBRE O EXCESSO DE DOAÇÕES DE RECURSOS PARA CAMPANHAS ELEITORAIS 1'Vriiaiido N e \ e s cia S ilv a '"' Ponto nevrálgico das cam panhas eleitorais, seu financiamento sempre foi -- e certam ente sempre será -- objeto de debates; seja para definir novas formas, seja para aperfeiçoar os mecanism os de controle dos recursos para ela arrecadados e nela utilizados. Comissão instituída no final do ano de 2004, pelo então Presi dente do Tribunal Superior Eleitoral, o notável M inistro Carlos Mário Velloso, se deteve sobre o assunto e apresentou diversas sugestões. Uma das idéias então debatidas foi adotada pela Secretaria de Re ceita Federal, que introduziu nos formulários de inform ações àquele órgão, um cam po específico para os contribuintes indicarem valores doados a partidos políticos e a seus candidatos. Buscou-se, com isso, fornecer meios à própria Receita para aferir se os limites estabelecidos nos artigos 23, § 1"^, e 81, § 1“, da Lei 9.504, de 1997, estavam efetiva m ente sendo respeitados. Em paralelo, o Tribunal Superior Eleitoral firm ou com a Secre taria da Receita Federal um convênio para o controle desses mesmos limites. Em razão do acordado, após consolidar todas as doações decla radas à Justiça Eleitoral, os totais, p o r contribuinte, são com unicados à Receita, que, em seguida, efetua as conferências devidas, relacionando quais os doadores que possam ter extrapolado os limites legais, o que é feito com base nas inform ações relativas aos exercícios fiscais anterio res ao do ano da eleição. Recebendo a relação dos contribuintes que, nas eleições de 2006, teriam doado acima dos limites previstos, deu-se que o M inistério P ú blico Eleitoral, ao invés de requerer judicialm ente acesso aos núm eros pertinentes aos rendim entos brutos das pessoas físicas que destinaram recursos para cam panhas eleitorais ou, no caso de pessoas jurídicas, ao 168 A dvogado, P resid en te d o In stitu to B rasileiro d e D ire ito Eleitoral, M in istro d o T rib u n a l S u p e rio r Elei to ral de 1997 a 2004. 121 faturam ento bruto das mesmas, optou po r requisitar tais informações diretam ente à Receita Federal e, com base nelas, iniciar procedim entos contra os referidos doadores, buscando im por-lhes elevadas multas e, em alguns casos, a proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o Poder Público pelo período de cinco anos, sanção de questionável constitucionalidade, na m edida em que parece não ser razoável, nem respeitar o princípio da proporcionalidade. Evidentemente tais pessoas, logo que citadas, argüiram a ilicitude da prova, na m edida em que o M inistério Público Eleitoral utilizou-se de informações protegidas pelo sigilo fiscal sem a necessária autoriza ção judicial. Após inúm eros julgados de Tribunais Regionais reconhecendo a ilicitude do procedim ento do M inistério Público, a questão chegou ao Tribunal Superior Eleitoral, merecendo, de imediato, decisões m onocráticas (entre outras, cabe destacar a do em inente M inistro Ricardo Lewandowski, atual Presidente da Corte, n o Recurso Especial Eleitoral n^ 28.362, publicada no Diário da Justiça eletrônico em 5.8.2009), rea firm ando a inviabilidade de o parquet Eleitoral obter, direta e indepen dentem ente de autorização judicial, inform ações protegidas pelo sigilo fiscal e, com base nelas, iniciar ações buscando a imposição de elevadas e graves sanções. Depois de intensos debates, o Tribunal, ao julgar o Recurso Espe cial Eleitoral n° 28.756, de Goiás, reconheceu que o M inistério Público Eleitoral não pode requisitar diretam ente à Secretaria da Receita Fede ral inform ação sobre o valor do faturam ento de empresa para dem ons trar que ela não respeitou o limite previsto na Lei das Eleições. Conform e im ediatam ente divulgado pela assessoria de im prensa do TSE, para a douta maioria form ada p o r ocasião do julgam ento e na linha da proposta apresentada pela em inente M inistra C árm en Lúcia, o M inistério Público Eleitoral pode apenas indagar à Receita Federal se determ inada pessoa física ou empresa, em razão das doações que fez, ultrapassou o limite fixado na legislação eleitoral, E, se a resposta for positiva, deve pedir autorização judicial para obter junto à mesm a Receita, informações sobre rendim entos ou faturam ento bruto. Entretanto, considerando o convênio firmado entre o Tribunal Superior Eleitoral, essa etapa preparatória pode ser desnecessária, na 122 m edida em que tal informação, ou seja, a de que determ inado contri buinte não respeitou o limite estabelecido pela legislação em vigor, é fornecida autom aticam ente pela Secretaria da Receita Federal ao Tri bunal Superior Eleitoral, que a com partilha com o M inistério Público especializado. De qualquer forma, o que vale destacar é que se o M inistério P ú blico resolver tom ar a iniciativa de pleitear, em juízo, a imposição de sanções por excesso de doação, deve ter o cuidado de p edir autorização judicial para afastar o sigilo que protege as inform ações encam inhadas à Receita Federal pelos contribuintes. Com o m uito bem registrado na decisão m onocrática referida li nhas acima “em bora o sigilo fiscal e bancário não sejam direito abso luto, exige-se, m esm o em defesa do interesse público, a requisição ao juízo com petente”. Essa garantia assume m aior vulto e im portância quando diz res peito a doador pessoa física, que não pode ter sua intim idade invadida e violada pelo simples fato de haver resolvido contribuir para o finan ciamento de um a cam panha eleitoral. Com o devido respeito a quem pensa diferente, entendo não ser correta a afirmação de que quem resolve doar para u m candidato adm i te, tam bém , abrir mão de seu sigilo. A m eu ver são coisas diferentes, que m erecem tratam entos dife rentes. Participar, com o financiador, de cam panhas eleitorais, é direito de todo 0 cidadão e tam bém das empresas, observadas as condições e os limites legais. O utra coisa é a garantia à m anutenção do sigilo de d a dos fiscais protegidos, que, ainda que relativa, só pode ser afastada por autorização judicial. Além disso, a prevalência de tal posição poderia acabar p o r de sestim ular doações para as cam panhas eleitorais, atitude que, desde que adotada de acordo com a lei e com com pleta transparência, contribui sobrem aneira para o aperfeiçoam ento do processo dem ocrático e para a divisão das responsabilidades, pela desconcentração da origem dos recursos. Consequentem ente, por mais nobres que possam ser as intenções dos ilustres m em bros do M inistério Público, eles não têm o direito de requisitar diretam ente à A dm inistração Pública inform ações prote- 123 gidas, cujo conhecim ento p o r terceiros é condicionado à obtenção de autorização judicial. Ter Poder, não é tudo poder. Constatada a ilicitude da prova que deu início ao procedim en to judicial intentado pelo parquet, aquele se encontra ferido de morte, pouco im portando que o acusado tenha, no exercício de seu sagrado direito de defesa, trazido aos autos inform ações sobre seus rendim entos ou faturamento. Isso porque há de se aplicar, sem dúvida, a teoria dos frutos da árvore envenenada, segundo a qual a ilicitude da prova original conta m ina as demais, produzidas em seqüência e p o r conseqüência daquela primeira. Desse modo, irrelevante que algum acusado, em sua defesa, tenha aceitado ou reconhecido os núm eros indicados pelo M inistério Públi co, pois é direito seu apresentar a defesa mais am pla possível, exploran do todas as vertentes admissíveis. Sobre a aferição dos limites de doações de pessoas jurídicas, in teressante abordagem do tem a foi realizada pelo Eg. Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas, p o r ocasião do julgam ento da Representação 57 de 2009 (Acórdão 137/2010). Para o Juiz Federal Márcio Luiz C oe lho de Souza, cujo voto prevaleceu, faturam ento bruto não se confunde com receita bruta, que é o resultado com um ente solicitado e fornecido pela Receita. Assim, o ilustre M agistrado teve p or insuficiente, naquele caso, as informações relativas aos rendim entos da representada, tendo em vista a posição firm ada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julga m ento dos recursos extraordinários 357.950/RS, 358.273/RS, 390.840/ M G e 346.084/PR, no sentido da inconstitucionalidade da ampliação d a base de cálculo das contribuições destinadas ao PIS e à COFINS, um a vez que faturam ento é receita que decorre apenas da venda de m ercadorias e serviços, não incluídas as receitas de natureza diversa. Portanto, caso venha a prevalecer a distinção proposta, não será suficiente apenas apontar o resultado final dos balanços, mas se terá que adentrar no exame dos núm eros e das rubricas, a fim de apurar, com exatidão, o resultado das vendas e dos serviços, ou de ambos, de m odo a identificar o faturamento. Entretanto, sem deixar de reconhecer a excelência da distinção 124 sob a ótica do direito tributário, considero que para fins de aferição de limites de doações p o r pessoa jurídica, toda e qualquer receita deve ser considerada, pois sem dúvida essa é a interpretação que m elhor atende a finalidade da lei eleitoral. O utra im portante decisão do Eg. Tribunal Superior Eleitoral re lacionada com a questão da apuração e punição de excesso de doações para cam panha eleitoral foi tom ada p or ocasião do julgam ento do Re curso Especial Eleitoral n° 36.552, de São Paulo, quando foi definido o prazo para ajuizamento da representação do M inistério Público. Ante a constatação de que a legislação de regência não estipulava prazo certo para tal ação, a Corte, a exemplo d o que definiu tam bém em relação a situações assemelhadas e realçando a necessidade de se dar eficácia aos princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, acatou a proposta do em inente e atento M inistro Marcelo Ribeiro e decidiu privilegiar, p or analogia, o term o final para os candidatos e os partidos conservarem a docum entação concernente a suas contas: cento e oi tenta dias após a diplomação*^^. Com isso, deu-se tratam ento isonômico para doador e benefici ário, pois desde que o beneficiário da doação só está obrigado a con servar a docum entação pertinente a suas contas de cam panha até cento e oitenta dias após a diplomação, o m esm o prazo foi considerado para eventual questionam ento da doação, inclusive quando se suspeita ou se alega que ela possa ter sido feita em quantia superior ao limite estabele cido pela Lei das Eleições. E não se im agine que a fixação desse prazo pode prejudicar o controle da observância dos limites das doações, nem im pedir a co brança de m ultas ou imposição de sanções, se justas e pertinentes. Observe-se, de início, que o prazo de cento e oitenta dias a par tir da diplomação (que é o ato que encerra o cham ado m icro período eleitoral), na verdade é bastante dilatado quando se tem em conta que a questão diz respeito a procedim ento pertinente ao Direito Eleitoral, seara em que os prazos norm alm ente são fixados em três dias e a ação rescisória tem que ser ajuizada no prazo máxim o de cento e vinte dias. Além disso, é de se ter presente que a Justiça Eleitoral recebe, antes da diplomação, todas as inform ações dos candidatos acerca das 169 A rtig o 32 da Lei 9.504, d e 1997 125 doações por eles recebidas e tem plenas condições de automaticam ente agrupar as doações pelo núm ero do CPF e ou do CNPJ do doador. Obtidos esses totais, eles ficam disponíveis para os interessados, inclusive para o M inistério Público Eleitoral, que poderá, então, aguar dar a conferência a ser feita pela Receita Federal em razão do convênio já mencionado, pedir informações sobre eventual extrapolação do lim i te legal à própria Receita, ou, desde logo, requerer, ao Poder Judiciário, autorização para ter acesso aos dados protegidos, pertinentes a rendi m entos ou faturam ento no ano anterior ao da eleição. A informatização dos sistemas utilizados pela Justiça Eleitoral bem como dos sistemas utilizados pela Receita Federal perm ite, sem dificuldade, que todas essas etapas sejam vencidas em curto espaço de tempo. Portanto, plenam ente satisfatório o prazo estabelecido, que assu m e relevante significado ante a necessidade de se concluir o processo eleitoral e assegurar que os m andatos obtidos sejam exercidos de forma definitiva e segura, o que só ocorre quando restam firm emente consoli dadas as relações jurídicas que envolvem os diversos atores, principais ou secundários, do evento eleitoral. A segurança jurídica, assim com o a total transparência das cir cunstâncias e etapas percorridas para a obtenção do m andato popular, constitui elemento fundam ental de qualquer Nação que pretenda ser respeitada com o legítima, desenvolvida e democrática. 126 A ORIGEM DO SISTEMA ELEITORAL PROPORCIONAL NO BRASIL G i l b e r t o B e r c o v ic i'’" INTRODUÇÃO Os sistemas de representação proporcional são reconhecidos como os mais representativos, reproduzindo m elhor a vontade do elei torado ao perm itir a representação das m inorias’^'. Apesar disso, a su perioridade dos sistemas m ajoritários é apregoada no tocante à estabili dade política. De acordo com várias análises, os sistemas proporcionais conduzem ao m ultipartidarism o, o m ultipartidarism o à fracionalização eleitoral e partidária e estas à instabilidade p olítica''^ Os sistemas p ro porcionais são “fórmulas de traduzir votos em cadeiras parlam entares de m odo tal que, ultrapassado certo limite m ínim o de peso eleitoral, todas as nuances de preferência do eleitorado se convertam em poder parlam entar na proporção aproxim ada de suas respectivas densida des eleitorais, Intuitivamente, supõe-se que quanto m aior o eleitorado, m aior a dispersão das preferências e quanto m enos exigentes os requi sitos legais para a constituição jurídica de partidos, m aior a tendência a que a dispersão das preferências se traduza em rótulos partidários” Um sistema proporcional perfeito é aquele em que os partidos obtêm um percentual em cadeiras igual ao percentual de votos. Na prática, é impossível um sistema proporcional perfeito. Os sistemas de represen tação existentes têm se afastado, em m aior ou m enor grau, desse ide- 170 Professor A ssociado d a F a cu ld ad e de D ireito d a U n ive rsid ad e de São Paulo. D o u to r em D ireito do listad o e l.iv re-D o cen te e m D ireito H conôm ico pela USP. 171 CA CiG lA N O , M o n ica H e r m a n n Salem, Sistemas Eleitorais X Representação. Brasília, C e n tro G rafico d o S enad o Federal, 1987, pp. 200-202. 172 SA N TO S, W an d e rley G u ilh e rm e dos, C m t ’ e Castigo - Partidos e Generais na Política Brasileira, São Pau lo /R io d e Janeiro, Vértice/Ed. R171UFHRI, 1987, p. 55. Para u m a análise a p ro fu n d a d a sobre o te m a, vide RAE, D ouglas W., l h e Political C.oiisequences o f Electoral Laws, N ew H a v e n /l.o n d o n , Yale U n iv e r sity Press, 1971, pp. 148-176. 173 SA N TO S, W an d e rley G u ilh e rm e d os, O i s e t’ Castigo cit., p. 62. 127 al, gerando as desproporcionaiidades^^**. A representação proporcional possui o grave problema de muitas vezes gerar a distorção do próprio princípio representativo. A representação proporcional, na realidade, é proporcional até certo ponto; daí em diante é um a distribuição políti- ca'^\ No Brasil, a tradição política no tocante à representação gira em torno de três idéias fundam entais. A prim eira é a do m andato livre e independente, isto é, de que os representantes, ao serem eleitos, não têm nenhum a obrigação, necessariamente, para com as reivindicações e os interesses de seus eleitores. O representante deve exercer seu papel com base no exercício autônom o de sua atividade, na m edida em que é ele quem possui a capacidade de discernim ento para deliberar sobre os verdadeiros interesses dos seus constituintes. A segunda idéia é a de que os representantes devem exprim ir interesses gerais, e não inte resses locais ou regionais. Os interesses nacionais seriam os únicos e legítimos a serem representados. Em terceiro, o princípio de que o sis tem a dem ocrático representativo deve se basear no governo da maioria. Praticam ente todas as leis eleitorais que vigoraram no Brasil buscaram a formação de maiorias compactas que pudessem governar. Por causa dessas duas grandes idéias, abandonou-se no Brasil a tradição do sis tem a majoritário (que vinha desde o Império) para a instituição, em 1932, do sistema proporcional'"^. ASSIS BRASIL E O CÓDIGO ELEITORAL DE 1932 C um prindo um a das promessas da Revolução de 1930, o Gover no Provisório de Getúlio Vargas prom ulgou o Código Eleitoral (Decre to 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, alterado pela Lei n*^ 48, de 4 de m aio de 1 9 3 5 ) Garantia-se o voto secreto, além de se introduzir o voto fem inino e o dos maiores de 18 anos. O alistam ento eleitoral em 174 N IC O LA U , Jairo C é s a r M arciini. “O Sistem a Eleitoral Brasileiro: A Q u e s tã o d a P n ip n rc io n a lid a d e da R ep resen tação Política e seus D e te rm in a n te s ” in LIM A Jr., O lavo Brasil d e (org.), Siííem ü Eleitoral Brasileiro: Teoria e Prática, Rio d e laneiro. R ia F u n d o /IU P E R J, 1991. p. 99. 175 FR A N C O , A fo n so A rin o s d e Níeki (org.), M odelos Alternativos de Representação Política no Brasil (Se m in á rio realizado n a U nB e m s e te m b ro d e 1980), Brasília, EdU nB, 1981, pp. 18-19. 176 F R A N C O , A fonso A rin o s d e M elo (org.). M odelos A lternativos de Representação Política no Brasil cit., pp. 85-86 e K IN Z O , M aria D'Alva Gil, Representação Política e Sistem a Eleitoral no B rasii São Paulo, Sím bolo, 1980, pp. 112-117. 177 Pa ra a c rítica d o C ó d ig o Eleitoral d e 1932 pela p e rsp ec tiva d o te n e n tism o , vide SA N TA ROSA, Virgínio, O Sentido do Tenentismo. 3" ed, São Paulo, A lfa-O m ega, 1976 (e d ição o rigin al d e 1932), pp. 83-90. 128 todas as instâncias, a apuração dos votos, o reconhecim ento e a procla mação dos eleitos passariam a ser de com petência exclusiva da recémcriada Justiça Eleitoral. Foi introduzido, no lugar do voto distrital (que vigorou durante o Im pério e a República Velha), o voto proporcional, através dos quocientes eleitoral e partidário. C om essas novas regras seriam realizadas as eleições para a Assembléia Constituinte, m arca das, desde maio de 1932, para 15 de maio do ano seguinte’'^ Além da representação eleita pelas novas regras eleitorais, haveria tam bém a re presentação classista, regulada pelos Decretos 22.653, de 20 de abril de 1933, e n® 22.696, de 11 de maio de 1933. O Código Eleitoral foi inspirado n a obra Democracia Representa tiva: Do Voto e do Modo de Votar, do político gaúcho Joaquim Francisco de Assis Brasil, chefe do Partido Libertador. O seu livro teve 4 edições, as três prim eiras no final do século passado e a últim a em 1931, após a Revolução, pela Im prensa Nacional. A diferença entre as prim eiras edições e a últim a se dá no tocante ao voto secreto. Assis Brasil conde nava o voto secreto p o r ser, então, o voto fechado, passível de fraude. Não passava d o gesto de colocar o voto na u rn a dentro de u m envelope opaco. Já em 1931, passou a defender a instituição do voto secreto, que na sua opinião não era “propriamente dado em segredo, mas em recafo”. Assis Brasil defendia o sufrágio universal, mas com restrições. Para ele, a universalidade era do direito, não do exercício: “O que distingue as limitações do sujfragio universal das do restrictivo é o caracter de privilegio que encerram as d ’e ste ultimo. A questão não é de extensão; é de intensidade. Isto tudo não quer dizer que as limitações do suffragio universal não possam também ser injustas. Serão apenas mais ou menos justificáveis, segundo a situação do povo a que disserem respeito” (grifos do a u t o r ) E s s a s restrições não atingiam mais as mulheres, devendolhes ser perm itido votar. Entretanto, os militares da ativa não deveriam 178 M es m o c o m as eleições p a ra a C o n stitu in te m arcad as, a olig a rq u ia d e São Paulo, sob o p re te x to d e ex i g ir a im e d ia ta reconstitucionali7.ação d o pais, se le v a n tou e m a r m a s n a a u to - d e n o m in a d a “Revolu<;ão Constitucionaiista". e m 9 d e ju lh o d e 1932. A d e rira m a o m o v im e n to a Torça Pública, a lg u n s b atalh õ es d o Exército s ed ia d os em São Paulo e p o u c o s m ilitares s ed ia d o s e m M a to G rosso, sob o c o m a n d o d o G e n eral B erto ld o Klinger, além d o s v o lu n tá rio s civis. O G o v e rn o P rov isó rio m o b ilizo u to d o s os ou tro s E stad o s e c o m b a te u o s re v o lto sa s p e lo sul e pe la d iv isa m in e ira . A pós 3 m e se s d e lutas, o s rebeldes fo ram d e rro ta d o s , re n d e n d o -s e em 1" d e o u tu b ro d e 1932. Foi a ú ltim a vez q u e u m E sta d o se levantou em a rm a s c o n tra a U nião. 179 ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. D em ocracia Representativa: D o Voto e do M o do de Votar, 3“ ed, P aris/L isboa, G uUlard, AUlaud & C\a, 189S. p. 62. 129 votar, nem ser votados e os analfabetos tam bém não deveriam votar: “Não ha remedio; portanto, senão colher a todos os analphabetos na regra geral de que elles são incapazes de escolher conscientemente bons repre sentantes. E, se algum houver que se sinta prejudicado com a exclusão, o remedio é conhecido: aprenda a l e r e a escrever” A eleição direta era defendida por Assis Brasil {"o voto não deve ser 0 echo, mas a voz"), mas não para a Presidência da República. A eleição presidencial direta era encarada com o um a espécie de plebis cito, que só gerava crises e comoções internas. A eleição deveria ser feita com o na França, através das Câmaras, pois “o suffragio popular, arrebatando-se mais por emoções do que deixando-se levar por conside rações de bem entendida utilidade” causava a única crise verdadeira das democracias. O u tra inovação do Código Eleitoral que havia sido p ro posta por Assis Brasil foi o do sistema proporcional, a seu ver, o único capaz de representar as minorias^*^'. N a últim a edição de seu livro, Assis Brasil trata da questão da proporcionalidade de representantes p o r Estado. Para ele, existiriam dois critérios de divisão proporcional: pela população ou pelo eleitora do. O critério do eleitorado seria o mais racional. Com o crescimento da população, a proporção deveria ser de u m deputado por 150 mil habitantes. Cada Estado, inclusive o Território do Acre, deveria ter o m ínim o de 3 deputados. Dessa forma, para Assis Brasil, as cadeiras de veriam ser distribuídas, além dos 3 deputados que cada Estado teria direito, da seguinte maneira; Alagoas, 8; Amazonas, 4; Bahia, 26; Ceará, 11; D istrito Federal, 10; Espírito Santo, 4; Goiás, 4; M aranhão, 7; Mato Grosso, 4; M inas Gerais, 37; Pará, 9; Paraíba, 9; Paraná, 6; Pernambuco, 19; Piauí, 5; Rio de Janeiro, 13; Rio G rande do Norte, 5; Rio G rande do Sul, 20; Santa Catarina, 6; São Paulo, 34 e Sergipe, 4. Além de fixar o m ínim o, Assis Brasil era favorável a im por um limite m áxim o para a representação: “Objectivando a hypothese, não seria abusar da propor cionalidade attribuir a São Paulo mais de 40 representantes e mais de 50 a Minas, enquanto Amazonas, Espírito Santo, Goyaz, M atto Grosso, Ser180 ASSIS BRASIL, Jo aq u im Francisco de. D emocracia Representativa cit., ed, pp. 68-69. Sobre a re s tri ção d e v o to aos a nalfa b eto s e m ilitares d a ativa, v id e op. cit., 3° ed, pp. 63-69 e 77-85; so b re a defesa d o v o to fem in ino , vide op. cit.. 3" ed, pp. 71-76 e so b re o v o to secreto, v id e ASSIS BRASIL, Jo aq u im Francisco de. Democracia Representativa cit., 4 “ ed, Rio d e Janeiro, Im p re n s a N acional, 1931, pp. 75-85. 181 ASSIS BRASIL, Jo aq u im Fran cisco de. D em ocracia Representativa cit., 3* ed, pp. 101-115 e 262-271 (eleições diretas) e 165-173 (sistem a p ro p o rc io n a l p a r a re p re s e n ta r as m in o rias). 130 gipe apanhassem, apenas 4 cada um, e algum, ainda, po r muito favor?" (grifo do autor) Essas propostas ainda causariam m uita polêmica nos debates da Constituinte. A obra de Assis Brasil contém , para M aria D’Alva Gil Kinzo, toda um a visão sobre a representação política que se desenvolveu no Brasil e deu suporte à m aneira com que foi im plantado o sistema proporcional no país‘^-\ Assis Brasil defendia um sistema representativo mais ver dadeiro, sem quaisquer falseamentos, assegurando-se a representação das minorias. Para tal, o sistema proporcional seria o mais adequado'*\ Entretanto, sua concepção sobre representatividade estava distante da idéia de representação com o am ostra ou “espelho” da população"^^ O m étodo proporcional era o m elhor porque garantiria alguma represen tação às m inorias, estabilizando, assim, o regime, pois a oposição passa ria a ser feita de form a legal e aberta, no Parlamento. Além disso, o Par lam ento deveria ter, prim ordialm ente, um a m aioria capaz de conduzir as deliberações e dar estabilidade ao governo. O aspecto fundam ental da representação não era trazer, proporcionalm ente, representantes de todas as tendências, mas assegurar maiorias estáveis para o governo. Assim, a proporcionalidade deveria ser controlada para garantir essa maioria, não havendo necessidade do sistema eleitoral ser exatamente proporcional'^^. Ao defender o sistema proporcional, Assis Brasil considerava com o um de seus elementos básicos a ampliação da circunscrição elei toral para o território dos Estados. Com essa m edida, segundo acredita va, a eleição por Estado contribuiria para que os deputados se ativessem a temas de im portância nacional, não local. Para isso, o representante não poderia estar atrelado a interesses específicos de seus eleitores, mas deveria exercer livremente o seu mandato, tendo em vista os grandes problemas nacionais'^^ 182 ASSIS BRASIL, lo a q u im Fran c isco de, D em ocnjcju Representativa cil., 4 “ ed, p. 279. S o b re as dem ais p ro p o s ta s d e Assis Brasil n o to c a n te à p ro p o rc io n a lid a d e d a representação, v id e op. cit., 4 “ ed, pp. 268 ( 273-283 183 K IN Z O , M aria D A Iva Gil, Represeritiição Políuca e Eleitoral no Brasil cit.. p. 118. 184 ASSIS BRASIL, Jo aq u im t-rancisco de, Democracia Representativa cit.. 3* ed, pp. 165-173. 185 Vide P IT K IK , H a n n a Fenichel, lh e Concept o f Representation, B erkcley/Los A n g e les/L o n d o n , U niver sity o f C alifornia, sd, pp. 60-62. 186 K IN Z O , M aria D ’Alva Git, Represt;ii(ação Politico e Sisit’m a E kito ral tio Brasil cii., pp. 123-126 e 131. 187 K IN ZO , M aria D ’Alva Gil, Representação Política e Sistem a Eleitoral no Braíil cit., pp. 126-130. 131 o DEBATE NA ASSEMBLÉIA CONSTITUINTE DE 1933-1934 O Governo Provisório controlou todo o processo jurídico de for mação e instalação do poder constituinte. Foi nom eada u m a subcom is são para elaborar um anteprojeto de Constituição, sediada n o Itamaraty. Também foi sob a orientação do governo que se estabeleceram as inelegibilidades e se elaborou o regim ento interno da Assembléia C ons tituinte. A Assembléia Constituinte foi instalada em 15 de novembro de 1933. Sua principal tarefa seria tentar harm onizar o confronto entre centralização e descentralização. A grande m aioria dos constituintes estava disposta a um meio-term o: os federalistas reconheciam a neces sidade de intervenção do Estado e os centralistas aceitavam determ ina dos níveis de autonom ia regional. O que estava em questão era o m o d e lo de Estado liberal, arrasado pela crise de 1929. O utro debate im por tante seria o da representação política. Neste se oporiam os defensores da dem ocracia liberal e os tenentes, que defenderiam a representação classista como novo modelo de organização política a ser instaurado. O anteprojeto da C onstituição eliminava o Senado. Em seu lugar era criado o Conselho Supremo, com atribuições político-adm inistrativas e de caráter técnico-consultivo e deliberativo. O Conselho Supre mo coordenaria os poderes constitucionais. Sua composição múltipla (seriam 35 membros: 21 dos Estados, 6 nom eados pelo Presidente da República, 3 representantes das universidades e 5 representantes dos “interesses sociais”)'®® restringia a im portância da participação dos Es tados. O Poder Legislativo seria exercido pela Assembléia Nacional, form ada p o r representantes políticos distribuídos proporcionalm ente à população. Os porta-vozes do tenentism o defendiam o Conselho Su prem o para assegurar limites ao Executivo através de um órgão onde a representatividade dos pequenos Estados (que dificilmente chegariam à Presidência da República) fosse maior. O substitutivo restaurou o Senado e criou o Conselho Nacional, com posto p or 10 m em bros escolhidos pelo Presidente da República, com 10 anos de m andato. Caberia ao Conselho Nacional elaborar pro188 A lb erto Torres ta m b é m p ro p ô s n o livro A Organização Nacional, d e 1914, u m C o n se lh o N a cio n al q u e c o o rd e n a ria os o u tro s p o d e re s (exerceria o c h a m a d o “ P o d e r C o o rd e n a d o r " ) e m od ificav a fu n ç õ e s e a c o m p o siç ã o d o Senado. Pa ra a n alisar a p ro x im id a d e e n tre as p ro p o s ta s de A lb erto Torres e d a S u b c o m issã o d o Ita m a ra ty v id e TO RRES, A lberto, A O rganização N acional, y ed, São Paulo, N acional, 1978, pp. 249-263, 132 jetos de lei para a boa aplicação e execução da Constituição e demais leis. O Senado, agora denom inado C âm ara dos Estados, teria 2 m em bros p o r Estado. A C âm ara dos Representantes seria com posta p o r re presentantes políticos distribuídos proporcionalm ente à população e p o r representantes classistas. D urante as discussões sobre a instituição ou não do Senado, parte da bancada gaúcha propôs a criação de um Conselho Federal, com as atribuições do Senado e as funções coorde nadoras do Conselho Nacional. Os Estados seriam representados igual m ente e o Executivo nom earia 6 m em bros do Conselho, cujo direito de voto seria restrito. A decisão final da Assembléia foi a de suprim ir os Conselhos e restabelecer o Senado. Entretanto, o Senado da C onsti tuição de 1934 era diferente do da de 1891. Pela nova distribuição dos poderes o Senado não se restringia ao Poder Legislativo, passando a colaborar na coordenação dos poderes. Sua com posição era de 2 sena dores p o r Estado (artigos 88 e 89)'^\ A principal prom essa da Revolução de 1930 havia sido a de sa nar os vícios na representação política. A disputa entre as oligarquias dissidentes e o tenentism o tam bém se deu nesse campo. Para as oli garquias, os problemas de alistam ento e fraudes eleitorais só seriam resolvidos através de procedim entos que restaurassem as instituições políticas liberais como saneadoras do sistema, com o o sufrágio univer sal (com a constante exceção dos analfabetos), o voto secreto e a Justiça Eleitoral. Assim, a verdade das urnas seria efetivamente respeitada. O tenentism o questionava o sistema liberal de representação política. A restauração da verdade eleitoral só ocorreria através de reformas que ultrapassassem os formalismos liberais. Através de Juarez Távora, os tenentes defenderam o voto direto na esfera municipal e indireto nas esferas estadual e federal, além da eleição indireta para a Presidência da República. O tenentism o buscava um novo modelo de representação política e, dentro desse modelo, um a das medidas propostas era a da representação classista, como veremos adiante. O anteprojeto instituiu a distribuição das cadeiras na C âm ara dos D eputados (denom inada Assembléia Nacional) de form a proporcional 189 SO U Z A , M a n a d o ( ia rm o C a m p e llo de, Lshuio e Partitlos Políticos no Brasil (1930 n 1964), 3" ed, São Paulo, A lfa-O m eg a, 1990, pp. 72-73 e G O M F S , A ngela M aria d e C a s tro (c o ord.), Regionalism o e Cent r a l i Z í i ( ã o Política: Parliilas c C,onstituiiite nos Aiios 30. Rio d e laneiro, Nova Fronteira. 1980, pp. 117, 316-318 0 397-402. 133 à população dos Estados, além de fixar a representação em no máximo 20 e no m ínim o 4 deputados p o r Estado, independentem ente do n ú m e ro de eleitores do Estado. A bancada gaúcha defendeu que o critério de divisão das cadeiras na C âm ara dos D eputados fosse proporcional ao eleitorado inscrito e não à população residente em cada Estado, confor me ocorria durante a República Velha. Esse critério vincularia o tam a nho das bancadas à população alfabetizada, ficando o Rio G rande do Sul em m elhor posição para com petir com M inas Gerais, Bahia e Per nam buco. Os demais Estados, populosos ou não, seriam prejudicados pelo elevado nível de analfabetismo de suas populações. M inas Gerais e São Paulo se pronunciaram pela m anutenção da proporcionalidade referente à população, sugerindo que o desequilí brio na representação entre os grandes Estados e os outros seria m i nim izado com a restauração do Senado. Os dois Estados tam bém se opuseram ao estabelecimento de núm ero m áxim o e m ínim o de depu tados. Pernam buco e os demais Estados do Norte-N ordeste tam bém defenderam o núm ero de deputados proporcional à população e não ao eleitorado. O fato desses Estados possuírem grande parcela de anal fabetos os prejudicaria na distribuição de cadeiras se esta fosse propor cional ao eleitorado. Entretanto, as bancadas nordestinas defenderam a instituição do núm ero m ínim o e máxim o de deputados p o r Estado. O acordo a que se chegou criou um a nova desproporcionalidade, ao determ inar que o núm ero de deputados p o r Estado fosse fixado por lei, na proporção de um para 150 mil habitantes até 20 deputados; e, a partir daí, n a proporção de um para 250 mil habitantes’'^". Foi fixado o núm ero m ínim o de deputados p o r Estado, mas não o núm ero máximo, atendendo, nesse ponto, às bancadas m ineira e paulista'^'. 190 O artigo 23 d a C o n stitu iç ão d e 1934 prescrevia: "A C a m ara dos D eputados com põe-se de representantes do povo, eleitos m edian te system a proporcional e suffragio universal, igual e directo, e de representantes eleitos pelas organizações projissionaes, n a fó r m a q u e a lei indicar § ■ O n u m e ro de D eputados será fix a d o p o r lei; os d o povo, proporcionalm ente á população de cada Estado e do D istricto Federal, não p o d e n d o exceder d e u m p o r 150 m il habitantes, até o m á x im o d e vinte, c, deste lim ite para cima. de um p o r 2 5 0 m il habitantes; 05 das profissões, em total equivalente a u m q uin to da representação p o p u la r Os Territories elegerão dois D eputados. § 2° - O Tribunal Superior de Justiça Eleitoral determ inará, com a necessaria antecedencia, e de acórdo com os últim os com putos offtciaes da população, o nu m ero de D e p u tados do povu q u e devem ser eleitos em cada u m dos Estados e no D istricto Federal." 191 SA N T O S , W an d erley G u ilh e rm e d os. O rdem Burguesa e Liberalismo Político, São Paulo, D u a s C idades. 1978, pp. 91-96 e G O M E S,  ngela M aria d e C a s tro (c o ord.). R egionalism o e Centralizaçíio Política cit., pp. 1 1 0 -113,203, 2 0 7 -2 1 3 ,4 0 3 -4 0 6 e 429. 134 A REPRESENTAÇÃO CLASSISTA E A CRISE DO MODELO REPRESENTATIVO LIBERAL A representação classista fez parte de u m processo de estímulo das forças sociais organizadas a se transform arem em elementos de colaboração do G overno Provisório. Dessa forma, articulou-se com a criação do M inistério do Trabalho, Indústria e C om ércio e a Lei de Sindicalização (Decreto n° 19.770, de 19 de março de 1931), pois para que os representantes classistas pudessem ser escolhidos, tornou-se neces sário o estímulo à organização das associações e sindicatos profissio nais. O Código Eleitoral de 1932, em seu artigo 142, previa a represen tação classista. A Subcomissão do Itamaraty rejeitou esse tipo de repre sentação no anteprojeto da Constituição. O próprio Superior Tribunal Eleitoral opôs-se p o r unanim idade à representação classista. Apesar disso, o G overno Provisório resolveu, em abril de 1933, instituí-la, in clusive prevendo os representantes classistas no regim ento interno da Constituinte. Através do Decreto n “ 22.653, de 20 de abril de 1933, de term inou-se que seriam eleitos p o r delegados (eleitores escolhidos pe los sindicatos devidam ente reconhecidos pelo M inistério do Trabalho) 40 deputados classistas, distribuídos da seguinte forma: 17 em pregado res, 18 empregados, 3 profissionais liberais e 2 funcionários públicos. O Decreto n° 22.696, de 11 de m aio de 1933, regulamentava a eleição dos deputados classistas representantes dos empregados, ocor rida em 20 de julho daquele ano. Houve grande m ovim entação para sindicalizar trabalhadores. Sob instrução do Governo Provisório, os Interventores e os tenentes organizaram sindicatos e prepararam delegados-eleitores no Norte-Nordeste. O objetivo era alcançar o maior núm ero possível de deputados classistas para a região, com o meio de enfrentar a dom inação do Centro-Sul. Dos 18 deputados empregados, 12 estavam dispersos p o r vários Estados (3 do Distrito Federal, 1 do Rio de Janeiro, 2 de M inas Gerais, 2 de São Paulo, 2 do Rio G rande do Sul, 1 do Paraná e 1 de Santa Catarina) e 6 eram vinculados às regiões ligadas ao tenentism o (2 do Espírito Santo, 1 do Pará, 1 da Paraíba, 1 de Pernam buco e 1 da Bahia). A eleição dos em pregadores ocorreu em 25 de julho de 1933, no M inistério do Trabalho. Havia grande defasagem 135 entre os delegados de São Paulo e Rio de Janeiro e os delegados dos outros Estados; dos 74 delegados, 47 pertenciam àqueles dois Estados. Dos deputados empregadores escolhidos, 6 eram do Rio de Janeiro, 4 de São Paulo, 3 de Minas Gerais, 3 do Rio G rande do Sul e 1 de Per nambuco. A vinculação das bancadas classistas com os Interventores pôde ser determ inada em algumas situações. Em determ inado aspec to, a representação classista dos em pregadores propiciava o reforço das bancadas dos grandes Estados. Os Interventores do Norte-Nordeste tiveram pouca participação na escolha dos representantes dos em pre gadores, ao contrário dos Interventores do Centro-Sul, particularm ente A rm ando de Salles Oliveira e Olegário Maciel. Já a m aior influência na escolha dos representantes dos empregados foi do tenentism o e não dos grandes Estados. As bancadas m ineira e paulista se opuseram à representação classista, assim como, em m enor escala, os deputados gaúchos. Já os deputados ligados ao tenentism o e as bancadas do N orte-N ordeste de fenderam o princípio da representação classista, vista com o contrapeso às grandes bancadas estaduais na C âm ara dos Deputados. A represen tação classista só vigorou em 1933 p o r determ inação do Código Eleito ral. Como não constava do anteprojeto, a proposta de incluí-la ou não no sistema político brasileiro foi das mais polêmicas das debatidas na Constituinte. A grande oposição à representação classista acabou sendo a da bancada paulista, pois tanto os deputados mineiros como os gaú chos se dispuseram a transigir nesse ponto com o Governo Provisório. As razões que justiíicavam a existência da representação classista eram aceitas p o r todos. A necessidade de se reform ular o m odelo de partici pação política, levando-se em conta os interesses de classe era consen sual a nível técnico, não a nível político. Houve a proposta de instituição d a representação exclusiva das classes, através de um parlam ento cor porativo, logo excluída. As classes seriam representadas politicamente através de alguma fórmula que as acrescesse ao sistema de representa ção já existente. Existiam duas propostas. A participação das classes se daria através de Conselhos Econômicos ou Técnicos. Dessa forma, a re presentação se daria a nível consultivo, com a decisão final pertencendo à C âm ara dos Deputados. Essa proposta foi defendida pela bancada paulista. A outra proposta, defendida pelo Governo Provisório, era a de um a C âm ara única de formação mista. Parte dos deputados eleita por 136 sufrágio popular e parte eleita pelas classes. A representação classista seria deliberativa, com assento ao lado da representação política. Essa últim a proposta foi a aprovada pela Constituinte. A C âm ara dos D e putados teria um quinto de suas cadeiras ocupados p o r representantes classistas, eleitos da m esm a forma instituída pelos Decretos n° 22.653 e n" 22.696, de acordo com o artigo 23, §s 3" a 9® da Constituição'^^ O debate e as disputas políticas se desenrolaram nos anos trinta entre os liberais, tenentes e adeptos do autoritarismo. O ideário liberal de defesa da autonom ia estadual e de independência dos agrupam entos políticos de “notáveis” foi utilizado com o proteção contra a centrali zação e tinha origem no tem or da crescente participação popular. A tim idez cada vez m aior do liberalismo da década de 1930 fez com que cedesse espaço ao pensam ento autoritário. Isso ocorria em um contexto de passagem da política de notáveis à de massas, dos partidos repre sentativos das oligarquias estaduais ou parcelas das classes dom inantes para partidos fundados em interesses sócio-econômicos. O m om ento era de perplexidade dos liberais diante da radicalização ideológica e do ingresso das camadas populares urbanas no sistema político. Com a inexistência de um partido nacional, com exceção da fascista Ação Integralista Brasileira'^^ e do Partido C om unista do Brasil (na clandes tinidade, sendo representado pela Aliança Nacional Libertadora)'^^*, as 192 SO U Z A , M aria d o C a r m o C a m p e lio de, Estado c Partidos Políticos no Brasil cit., pp. 77-78 e G O M ES, Ângela M aria d e C a s tro (c oord.), Regionalism o c Centralização Política d f., pp. 431, 43 3 -4 3 9 ,4 4 4 -4 4 5 , 4448-449, 469-471, 474, 483 e 486. Sobre a rep re sen ta ç ã o classista, vide, a in d a , n e stu d o TAVARES, A n a L ucia d e Lyra, A C onstituinte dc 1 934 c a Representação Profissional (E studo de Direito C om p a ra do), Rio d e Janeiro, Forense, 1988. 193 Sobre a A ção Integralista Brasileira (AIB), vide T R IN D A D E , Hélgio, Integralismo (O Fascismo Brasi leiro n a D écada de 30), 2" ed, São Paulo, Ditcl, 1979; A R A Ü ÍO , R icardo B eiizaquen de. Totalitarismo e Revolução: O Integralismo de Plíuio Salgado. Rio d e Janeiro, Jorge Z a h a r Editor, 1988; M A IO , M a r cos C hor, S e m Rotschild N en i Trotsky: O Pensam ento A n ti-S e m ita de G ustavo Barroso, R io d e Janeiro, Im ago, 1992 e CAVAI.ARI, R osa M aria Eeiteiro, Integralismo: Ideologia e Integração de u m Partitio de M assa no Brasil (1932-1937), B auru , ED U SC , 1999. Para a análise d o p e n s a m e n to ju ríd ic o v in c u la d o à cú p u la d o m o v im e n to integralista, vide os textos de M iguel Reale, p a rtic u la rm e n te REALE, M iguel, A B C do Integralismo (edição o rig in al d e 1935) ín Obras Políticas (Prim eira Fase - I 9 3 I /I9 3 7 ), Brasília, E dU nB . 1983, vol. 3, pp. 151-222. 194 Sobre a a tu ação d a A liança N a cion al L ib ertad o ra e suas v iiiculações c o m o PCB, vide P IN H E IR O , Paulo Sérgio, Estratégias d a Ilusão: A Revolução M u n d ia l e o Brasil, I9 2 2 -I9 3 5 , 2 ' ed, São Paulo. C o m p a n h ia das Letras, 1992, pp. 269-326; V IA N N A , M arly d e A lm e id a (i., “0 PCB, a ANT. e a s Insurreições d e N o v e m b ro d c 1935" in EERREIRA, Jorge & D E L G A D O , Lucilia d e A lm e id a Neves (orgs.), O Brasil Republicano, Rio d e laneiro. Civilização Brasileira, 2003, vol. 2 (O Tem po d o N acionaTF.statismo - Do Início da Dccada de 1930 ao Apogeu do Estado S o v o ), pp. 6 5-103 e C A S C A R D O , Francisco Carlos Pereira, "A A liança N acio n al L ibertadora: N ovas A b o rd ag ens" in FERREIRA, Jorge & REIS, Daniel A a rã o (orgs.), Esquerdas no Brasil, Rio d e laneiro. Civilização Brasileira, 2007, vol. 1 (A Formação das Tradições, 18S9-I9-I5), pp. 455-491. 137 forças revolucionárias se desestruturaram após a Assembléia C onsti tuinte. Os conflitos ocorridos entre 1934 e 1937 foram causados pela tentativa de institucionalizar u m p o d er pós-revolucionário sobre a es tru tu ra política baseada novam ente na política dos Estados. O cerne das discussões continuou a ser centralização versus autonom ia estadu al. A radicalização da luta entre os integralistas e os com unistas acabou por facilitar a reunião dos setores dom inantes e dos setores revolucio nários, que se aliariam no apoio ao Estado Novo. 138 PO LÍTIC A , SONEGAÇÃO E FIN A N CIA M EN TO DE CAMPANHAS H é li o S ilvio O u r e m C a m p o s '" ' G u s t a v o P o n tes'-"’ RESUMO: a fragilidade das estruturas políticas brasileiras e as conseqüências que daí resultam em im portante m edida decorrem da deficiência na transparência da origem dos recursos destinados ao financiam ento das cam panhas eleitorais. O interesse público pela identidade dos doadores asseguraria u m a certa lisura no certam e eleitoral, perm itindo um a m aior paridade. O débito de favores entre os eleitos e a iniciativa privada exige instrum entos que dificultem o pagam ento depois das eleições. Evitar-se a m anipulação das licitações, dos contratos públicos, dos alvarás de construção e de licenciamentos talvez seja u m a tarefa quase impossível. O recebimento em m oeda estrangeira e em dinheiro vivo, as remessas ilegais para o exterior trariam a necessidade de u m a atuação integrada do Estado (fiscalização bancária, auditorias das receitas públicas, m inistério público, Tribunais de Contas etc.). A questão é saber se é isto o que realmente se quer. PALAVRAS-CHAVE: política, interesse público, financiam ento das campanhas. SUMMARY: the fragility of Brazils political structures and the consequences resulting from deriving im portant m easure of disability in the transparency o f the source of funds for the financing o f election campaigns. The public interest in the identity of donors w ould ensure a certain fairness in the electoral contest, allowing for greater parity in the campaign. The flow of goods am ong the elect and the private sector requires tools that make it difficult to pay after the elections. To avoid m anipulation of tenders, procurem ent, building perm its and licensing may be an alm ost impossible task. The receipt in foreign currency and in 195 D o u to r e M estre pela UFPE. |u iz Federal. Professor T itu la r e m D ireito Processual e T rib u tá rio d a U n i v ersidad e C atólica d e P e rn a m b u c o . E x -P ro c u ra d o r Judiciai d o M u n ic íp io d o Recife. F x - P ro c u ra d o r d o E sta d o de P e rn a m b u c o . E x -P ro c u ra d o r Federal, wuw.oiireiti.cjb.net 1 % )ui 2 Federal n a Seção Ixidiciária d o E sta d o d e P e rn a m b u c o . 139 cash, illegal rem ittances abroad would bring the need for an integrated action of the (banking supervision, auditing o f public revenues, public ministry, audit etc.).. The question is w hether this is really w hat you want. KEYWORDS; politics, public interest, cam paign financing. C om o líder de um G rupo de Pesquisa junto ao CN PQ - C onse lho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, desenvolvi, com alguns profissionais da área jurídica, um a tentativa de aproxim a ção entre a teoria e a prática, sobretudo na área tributária. É sob este enfoque que surgiu “Política, sonegação e financia m ento de cam panhas”, produto de palestra pronunciada, em 2007, pelo Juiz Federal Gustavo Pontes, com assento em Vara Especializada em crim inalidade organizada. O tem a pareceu-m e palpitante. É o que se verá em seguida, sob a ótica do jovem magistrado. Sobreleva ponderar, logo de início, que a ciência do Direito, di vorciada da exatidão de proposições algorítmicas, calca-se em vicissi tudes e valores dos que a ela se dedicam. Sendo assim, não se pode ter p o r autêntica a propalada im parcialidade do jurista, razão pela qual o trabalho desenvolvido neste Ciclo não se revela ideologicamente n eu tro, m arcado que é p o r abordagens a fenôm enos sociais decorrentes do degradado cenário político-social que nos é exibido diuturnam ente. É dentro deste panoram a e dúplice perspectiva que se pretende, nesta sucessão de encontros que se iniciou no longínquo mês de maio, abordar, sob o enfoque de cada órgão estatal conclam ado a com ele co laborar, a realidade complexa de um país derruído em suas estruturas políticas, frágil em suas instituições e, principalm ente, incipiente em noções de m oralidade pública. A análise da ordem positiva eleitoral encartada na Constituição e na legislação esparsa, bem com o dos m ecanism os a ela inerentes, m o s tra concom itantem ente síntese de valores supremos e instrum ento de direitos dominantes. C onquanto a Constituição Federal de 1988 revelese intolerante para com atos atentatórios à m oralidade e isonom ia no processo eleitoral, dois conceitos intim am ente ligados à probidade ad m inistrativa e indiscutivelmente perniciosos à legitimidade do pleito e, conseqüentemente, ao processo dem ocrático, a legislação vigente em 140 m atéria eleitoral tem -se m ostrado hipossuíiciente na tarefa de assegu rar êxito ao m andam ento constitucional. O intrincado sistema eleitoral brasileiro é com posto p or arcabou ço norm ativo em que, em plano piram idal, ocupa o vértice a própria Constituição. Em escalonam ento decrescente, em bora sem hierarquia distintiva, seguem as Leis 4.737/65, que instituiu o Código Eleitoral, e 9.504/97, que im pôs diretrizes gerais ao processo eleitoral. Destacamse, ainda, a Lei 9.096/95, que dispôs sobre os partidos políticos, e a Lei C om plem entar n.° 64/90, que estabeleceu casos de inelegibilidade e prazos de sua cessação. A últim a ganha especial interesse em face de tu telar e coibir o abuso do p o d er econôm ico ou político, regulam entando a form a e processam ento das representações eleitorais e apreciação das contas públicas, em respeito à paridade na disputa eleitoral. Mais recen temente, ganhou enfoque a Lei 11.300/06, que versa sobre a propagan da, financiam ento e prestação de contas das despesas com cam panhas eleitorais, e que alterou a Lei 9.504/97. C om plem entam esses diplomas diversas Resoluções em anadas do Tribunal Superior Eleitoral, autori zado pelo art. l.°, parágrafo único, do Código Eleitoral, dentre as quais mais nos interessa a 22.250, de 29 de ju n h o de 2006. D entro da problem ática proposta no presente Ciclo, realça, notadam ente, a abordagem à sempre crescente necessidade de transpa rência da origem dos recursos destinados ao financiam ento das cam panhas eleitorais e recentes mecanism os criados na tentativa de elidir a sonegação e a fraude, dois dos mais triviais artifícios na prática do abuso do p o d er econômico. Perm eando essa questão, a Resolução TSE 22.250, de 29 de junho de 2006, editada sob a égide da Lei 11.300/06, regulam entou a arre cadação e a aplicação de recursos nas cam panhas eleitorais, dispondo tam bém sobre a prestação de contas. Ao tratar da origem dos recursos, tanto a referida lei quanto a Resolução im puseram restrições a determ inadas categorias de pessoas, às quais é vedada a prática da doação, fixando valores m áxim os para contribuições (art. 14 da Resolução 22.250), que serão sempre proce didas m ediante “recibo eleitoral”. Aquelas que ultrapassarem os limites fixados sujeitam o infrator ao pagam ento de m ulta no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso, sem prejuízo de responder o candidato 141 p o r abuso do p o der econômico, nos term os do art. 22 da Lei Com ple m entar 64/90. O ineditism o da Resolução, entretanto, reside no disposto no § 4.° do art. 14, que autoriza a Justiça Eleitoral a, na a verificação dos limites estabelecidos, após a consolidação dos valores doados, solici tar inform ações de todos os órgãos que, em razão de sua competência, possam colaborar na apuração. Esse dispositivo atende à necessidade de ser levado a conheci m ento público, m ediante inequívoca individualização, a identidade dos doadores, a fim de que se perm ita fazer saber ao eleitor quem está doando o que a quem. A exposição constante visada pelo legislador e pelo Tribunal Superior Eleitoral é necessária para m anter a sociedade alerta e bem inform ada, em evidente aperfeiçoam ento do processo d e m ocrático e em atenção ao postulado constitucional da publicidade, sem deslembrar que o processo eleitoral, p o r ser em inentem ente estatal e relacionar-se diretam ente à m áquina pública, não pode ser desvincu lado dos preceitos esculpidos no art. 37 da C arta Política. Com o cediço é, no plano concreto, decorrência de um a série de fatores de ordem legal e temporal, são raros os exemplos de punição para aqueles que desdenham das norm as eleitorais, pelo que cabe ao próprio eleitor, por ocasião do pleito, aplicá-las pela via transversa do voto, motivo pelo qual avulta a im portância da informação. Buscando mecanism os que perm itissem essa identificação, m es m o antes da edição da Resolução 22.250/06, o TSE já havia editado, em janeiro de 2006, em conjunto com a Secretaria da Receita Federal, a Portaria C onjunta n.® 74, que dispõe sobre o “intercâmbio de informa ções entre o Tribunal Superior Eleitoral e a SRF\ Ela determ ina que o TSE encam inhe à SRF informações relativas à prestação de contas dos candidatos e dos comitês financeiros dos partidos. Im pende gizar o seu art. 3.°, parágrafo 2°: “Art. 3.°... $ 2" Nas declarações de ajuste anual do imposto de renda da pessoa fisica e nas declarações de informações econômico-fiscais da pessoa jurídica serão estabelecidos campos específicos para identificar doações a candidatos, comitês financeiros e partidos políticos, bem como gastos 142 realizados por eleitores na fo rm a áo art. 27 da Lei r f 9.504, de 30 de setembro de 1997, sem prejuízo da instituição pela SRE no âmbito de sua competência, de declarações especificas dos fornecedores de mercadorias ou prestadores de serviço para campanhas eleitorais!' Diante do novel instrum ento, tem -se a imposição de que os doadores se identifiquem e apontem em suas declarações o quanto doaram , sob pena de multa. Até então, era exigido apenas do candidato ou partido que declarasse o quanto recebeu. Não havia idêntica obriga toriedade ao doador. Dessa forma, se José da Silva recebe dinheiro para deixar pintar o m uro de casa com o nom e do candidato ou para distribuir “santinho” pelas ruas, deverá registrar na declaração de Im posto de Renda. Além de declarar o valor gasto, o candidato ou o partido só poderá pagar com cheque nom inal ou transferência eletrônica. Saques em dinheiro foram proibidos. A m edida revela-se boa e realmente facilita o rastream ento dos valores implicados no processo eleitoral. Mas, evidente, não se presta a solucionar o problem a alusivo às doações dos corruptos, dos devedo res, e nem a evitar aquelas processadas à margem da legislação. Estabelece a Lei 11.300/06, no art. 22, § 3.°, que ‘"será cancelado 0 registro da candidatura ou cassado o diploma, se já houver sido outor gado'] para aqueles que se valerem de recursos que não provenham da conta específica de que ela trata, mas ressalva que apenas se “'comprova do 0 abuso do poder econômico". Não obstante louvável o propósito de assegurar a lisura do certa m e e a paridade de arm as no transcorrer da cam panha, peca o referido dispositivo por exigir a comprovação do abuso do poder econômico p ara que ocorram os dois efeitos atrás referidos. M elhor seria que o cancelamento do registro ou a cassação do diplom a fosse condicionado tão-som ente ao emprego de recursos não provenientes da conta espe cífica, independentem ente de resultar caracterizado ou não o abuso do poder econômico. Muito em bora o § 4.^ do referido dispositivo determ ine que, re jeitadas as contas, a Justiça Eleitoral rem eta cópia de todo o proces so ao M inistério Público Eleitoral para os fins previstos no art. 22 da Lei C om plem entar n.® 64/90, sabe-se que as sanções ali com inadas 143 aplicam-se apenas às hipóteses de “uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de Partido político”. Abriu-se, assim, margem a interpretações subjeti vas a respeito de doações espúrias que, em bora nem sempre tonalizem abuso de poder econômico, afetam sempre a tão almejada isonomia entre os concorrentes. M elhor seria trilhado se a própria rejeição ou a não apresentação de contas já fosse causa de cancelam ento de registro de candidatura ou cassação de diploma, independentem ente da instau ração de processo de apuração de que trata a Lei C om plem entar 64/90. Isso porque o descaso que se tem verificado no alusivo à prestação m e rece p ronta resposta, m orm ente quando, conform e am plam ente divul gado, até 0 dia l.°-ll-2 0 0 6 , apenas 61,09% das prestações de contas dos 19.959 candidatos que disputaram o prim eiro turno das eleições de 2006 haviam sido entregues aos Tribunais Regionais Eleitorais e ao próprio TSE. O prazo final era 31 de outubro. Questão que tam bém merece especial atenção é aquela condizen te aos ''recursos não identificados". È que dispõe o art. 23 da Resolução em tela que “os recursos de origem não identificada não poderão ser uti lizados pelos candidatos ou comitês financeiros”. O que é vedado, p o r tanto, é o emprego desses valores. Em princípio, não há sanção para o tão-só recebimento. O conceito de recurso não identificado nos é dado pelo art. 23, § l.*^, da Resolução 22.250; “Art. 23... § 1.° A falta de identificação do doador e/ou da informação de n ú meros de identificação inválidos no CPF ou no CNF} caracteriza o recur so como de origem não identificada.” Esses valores, consoante preceitua o § 2.° do m esm o dispositivo, ‘"comporão sobras de campanha \ cuja destinaçào é dada pelo art. 27, parágrafo único, da Resolução, e art. 31, parágrafo único, da Lei 9.507: serão utilizadas pelos próprios partidos, de form a integral e exclusi va, na criação e m anutenção de instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política. O ainda insuficiente controle sobre a destinação dada às sobras de cam panha acaba por perm itir que os partidos possam se beneficiar daquelas doações tidas p o r ilegítimas, afrontando, novamente, a tão 144 perseguida isonomia. Bem p o r isso, parece-nos mais legítimo que os valores que se enquadrarem nessa conceituação sejam revertidos para finalidades públicas, não sujeitos à adm inistração partidária. Essa posição, é verdade, é antagônica à idéia de financiamento público das cam panhas. Em tese, a tão em voga proposta do financia m ento estatal evitaria que os candidatos buscassem doações na ini ciativa privada, principalm ente entre empresários, para quem ficam devendo favores que serão pagos depois da eleição, através das mais diversificadas formas, onde sobressai a fraude em licitações, visando a beneficiar esse ou aquele empresário. Lastimavelmente, a Lei 8.666/93, que trata do processo licitatório e dos contratos públicos, é facilmente manipulável e incapaz de evitar as contratações irregulares, os paga m entos superfaturados com o form a de reembolso ao doador, o paga m ento de parte do valor a empresas subcontratadas, que em item notas fiscais frias e que depositam os pagam entos em nom e de laranjas ou fantasmas, dentre outros artifícios fraudulentos. É em almejo à consecução desses favores que as doações acabam p o r ser pulverizadas a diversos candidatos, com propostas e ideologias diam etralm ente opostas. A análise das declarações perm ite transpare cer que grandes grupos econômicos e pequenos doadores contribuem para todos os partidos, graduando o valor dos benefícios na percenta gem respectiva às possibilidades de vitória na eleição. O financiam ento público eliminaria do cenário político - em tese - o caixa-dois, m ontado com recursos ilegais. Também facilitaria a fiscalização, porque todos prom overiam cam panhas de acordo com o m ontante recebido, sem dem onstrar, portanto, sinais excessivos de riqueza. Essa idéia, entretanto, m ostra-se se elevada ingenuidade. Com ou sem doação financeira, os interesses econôm icos não serão apar tados da política e não se vai neutralizá-los. E mesm o que as cam pa nhas passem a ser controladas pelo que ostentarem , a m edida não se m ostra propícia a im pedir que seja doado dinheiro a partido algum, Até porque, bem se sabe, verte a im prensa inform ações de que valores recebidos p o r partidos têm sido aplicados em ações bem m enos nobres do que a divulgação de filosofias e idéias partidárias. A revés, tem-se visto em pregado tanto na fraude ao próprio processo quanto na com 145 p ra de votos parlamentares. Em síntese, Estado financiando cam panha é m edida tendente a elevar a dívida pública e penalizar o contribuinte, m ostrando-se inapta no combate à corrupção e na extinção das doa ções privadas, m orm ente ante o com balido e opróbrio sistema íiscalizatório estatal. Ê interessante observar, tam bém , que boa parte desses recursos escusos arrecadados com o doação de cam panha - obviamente não os depositados na conta específica, mas sim aqueles recebidos em m oeda estrangeira e em dinheiro vivo, prática que vem se vulgarizando, tem sido rem etido de form a ilegal para o exterior. Sinteticamente, a nova regulamentação do TSE na luta contra o “Caixa 2” consiste em: Cabos eleitorais: Q uem recebe dinheiro para deixar o nom e do candidato estam pado no m uro de casa ou para distribuir folhetos pela cidade tam bém vai precisar declarar o valor na declaração de Im posto de Renda. 2. Saques bancários: Ficaram proibidos os saques em dinheiro, feitos na boca do cai xa. Saques apenas via transferência eletrônica (internet) ou m ediante emissão de cheques nominais. Cada comitê é obrigado ainda a m anter Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) próprio e um a conta cor rente exclusiva para a m ovim entação do dinheiro de cam panha. 3. Arrecadação e gastos: Os com itês de cam panha devem de informar, de 15 em 15 dias ao TSE, receitas e despesas. As inform ações são divulgadas na página do tribunal na "Internet", e é im portante que se efetue constante acom pa nham ento dessa prestação de contas, em bora não seja da nossa tradição efetuar esse tipo de controle. Q uem descum prir a no rm a poderá ter a conta bloqueada. 4. Formulário na Receita: Foi prevista a criação de novo form ulário da Receita Federal ex clusivo a todos fornecedores de materiais de cam panha ou prestadores de serviço aos candidatos. Na declaração de Im posto de Renda, é n e 146 cessários especificar datas, características do m aterial e do serviço, bem com o valores e núm eros de notas fiscais. 5. Fisco: Para suprir as deficiências da Justiça Eleitoral, no final da eleição a Receita vai avaliar a prestação de contas em busca de empresas doadoras inativas, pessoas físicas cujo CPF não mais exista, doações acima do limite etc. Detectado algum indício de irregularidade, a fiscalização se estenderá à sede dos com itês de cam panha e das empresas que com eles se relacionarem. Sem dúvida, esses três instrum entos - Lei 11.300/06, Resolução TSE 22.250 e Portaria C onjunta n.° 74 - são o prim eiro passo, m edi da preambular, no combate à sonegação e à fraude na política. Mas o essencial ainda não foi focalizado. O fundam ental é que todas as ações apresentadas durante o processo eleitoral sejam julgadas antes da diplom açáo dos eleitos. Depois dela, eventual punição torna-se hipótese remota. Não se pode gerar a falsa expectativa de que se está criando um a fórm ula para im pedir a contabilidade paralela. Mais do que de leis, é preciso eficiência adm inistrativa e gerencial da Justiça Eleitoral, em to dos os níveis. Aspecto positivo nisso tudo é que o Tribunal Superior Eleito ral tem se m ostrado preocupado com o processo de financiam ento de cam panha, o que é bom , porém não suficiente. Todo o rigor possível na legislação é bem vindo, mas tam bém é preciso instrum entalizar a Justiça para que as ações sejam julga das em tempo. Bibliografia: vide em www.ourem.cjb.net 147 148 PARLAMENTARISMO E PRESIDENCIALISMO Ives G a n d r a d a S ilv a M a r t i n s ' ' " Em 1987, objetivando colaborar com a Constituinte e tendo p arti cipado, a convite dos parlamentares maiores, de duas audiências públicas, escrevi artigo, em form a de perguntas e respostas, sobre o Parlamentaris m o e o Presidencialismo. Como não alterei m eu pensam ento anterior, para a coletânea sobre modelo político coordenada pelo bom amigo e brilhante jurista Walber de M oura Agra, reedito o trabalho de 1987. QUESTÕES: l) Q ual a diferença nuclear entre o sistema presi dencialista e o parlam entar de governo? 2) Quais os tipos fundam entais de parlam entarism o e presidencialismo? 3) Q ual o tipo de sistema de governo ideal para o Brasil? 1® Pergunta; Q ual a diferença nuclear entre o sistema presiden cialista e o parlam entar de Governo? Em bora divirjam os autores na conform ação conceituai das duas formas de governo referidas, entendendo uns que correspondem a au tênticos sistemas e outros a regimes jurídicos de exercício do poder, preferimos fugir ao debate semântico utilizando-nos de um ou de outro vocábulo, mas trazendo à reflexão aqueles aspectos que os diferenciam e que lhes dão a tônica dom inante O parlam entarism o é, p or excelência, o sistem a de governo repre sentativo, posto que toda a sua conform ação foi plasm ada a partir das conquistas populares de co-participaçào, no excelente laboratório em que a Inglaterra se transform ou, p o r muitos séculos, para a experiência democrática. O sistema parlam entar de governo propicia a plenitude de tal exercício, visto que todas as correntes de pensam ento nacional podem 197 Professor E m é rito das U n iv e rsid ad e s M a c k e n z ie /U N IF M U /U N IF IE O /U N IP , d o C IE H /O ESTA D O D E SÀO PAULO e d a s Escolas d o C o m a n d o e E sta d o M aio r d o E xército -E C E M E e S u p e rio r d e G u e rra-ESG , P residen te d o C o n se lh o S u p e rio r d e D ireito d a F e com ércio - SP 198 José A lfred o d e O liveira B arach o ensina; “V im os, nas ex p o sições a q u i efetuadas, q u e as discussões sofre re g im e p a rla m e n ta rista, re g im e p residencialista, ou, c o m o alg u n s p referem , sistem a p re siden c ia lista d e gov ern o , d e n o m in a ç ã o c itad a n o fa m o s o livro d e H a ro ld o Laski, q u a n d o ele analisa o sistem a p residen cialista n o rte -a m e ric a n o , s u scitam a lg u m a s co lo caçõ es” (S im p ósio M in as G erais e a C o n s ti tuinte. Fase I, Ed. A ssem bléia Legislativa d o E sta d o d e M in as G erais, abril d e 1986, p. 211). 149 ser representadas nas Casas Legislativas, perm itindo, p o r outro lado, que, nas composições que se fazem necessárias para a formação de G a binetes, os parlamentares, escolhidos pelo povo, exerçam sua força de representação, na indicação, participando e controlando o Gabinete en carregado de governar o país Os governos de um hom em só, assim com o aqueles originários das absolutas e despóticas m onarquias ou ditaduras, não po d em con viver com o sistema parlamentar, visto que neste a representatividade popular é essencial e não naqueles. O presidencialismo, ao contrário, surge —nos modelos conheci dos, exceção feita à solução americana, que se constitui em um parla m entarism o presidencial — como versão atual das m onarquias absolu tas do passado 199 Lockc escreveu: ‘E m s e g u n d o lugar, a a u to rid a d e legislativa o u su p re m a n ã o saberá a s s u m ir p o r si m e s m a o p o d e r d e g o v e rn a r p o r decretos arbitrários, im p ro v isad o s, a n te s deverá d is p e n s a r ju stiça e d e cid ir os d ireito s d o s s ú d ito s m e d ia n te leis fixas e pro m u lg a d a s e juizes a u to riz a d o s e c o n hec id o s. Pois p o r ser n ã o escrita a lei n a tu ra l, e assim im possível d e a c h a r e m p a rte a lg u m a, salvo n o s espíritos dos h o m e n s , aqueles que, p o r p aixão o u m á fé, a c o n c e d e re m o u ap licarem , n ã o p o d e r ã o ser c o m facilidade p e rs u a d id o s d e seu e rro a o n d e n ã o havia juiz estabelecido,- e a ssim n ã o n o s serv e d e v id a m e n te p ara d e te r m in a r os d ire ito s e d e m a rc a r as p ro p rie d a d e s d e q u e m vive nela, e sp e c ia lm e n te q u a n d o c a d a qual é d e la juiz, in té rp re te e executor, e isso e m caso p ró p rio ; e ele assistido p e lo direito, n ã o d is p o n d o sen ã o d e seu p ró p r io vigor, carece d e força necessária p ara d e fe n d er-se d e in jú rias o u castigar os malfeitores. Para evitar in co n v e n ien tes tais, q u e p e r tu r b e m as p ro p rie d a d e s d o s h o m e n s em seu e stu d o natural, u n e m -s e estes e m so cied ad es p ara q u e p o s sa m d is p o r d e u m a força u n id a d a c o m p a n h ia in teira p ara defesa e s eg u ran ç a d e suas p ro p ried a d e s, e te r regras Hxas p a ra d e m a rc á-las a fim d e q u e to d o s saibam q u a is s ã o o s seu s p ertences. A este ob)eto c e d e m os h o m e n s seu p o d e r n a tu ra l ã so cie d a d e e m que in g ressam , e a R epública co lo ca o p o d e r Legislativo e m m ã o s d e q u e m se te m p o r idôneas, c o n fia n do nelas o g o v e rn o p o r leis declaradas, pois d e o u tr a m a n e ira a paz, tra n q ü ilid a d e e p ro p r ie d a d e d e to d o s se e n c o n tra ria m n a m e sm a in c erteza q u e n o e sta d o n a tu ra l” (E nsaio sobre o g o v e rn o civil em O P o d e r Legislativo, ite m 2 — "Separação d e P o d e re s” p. 79, M in istério d a Ju stiç a /F u n d a ç ão P e tró n io Portella e F u n d a ç ã o M ilton C a m p o s, co le tân e a o rg a n iz a d a p o r N e lso n S ald an h a, Brasília, 1981). 200 N ã o sem razão Rui B arb o sa se la m e n ta v a, ap ó s te r in tr o d u z id o o p re sid en c ia lism o n o Brasil, que; “se h á u m a coisa a e s tra n h a r n a nossa h is tó ria política, p e lo m e n o s, é esta im p res sã o cau sad a n o m eu espírito, é q u e se h á u m p o d e r forte, u m p o d e r o n ip o te n te , c u jo p e d id o d e faculd ad e n ã o se possa to m a r a sério, u m p o d e r q u e só carece d e ser lim itad o , c o n tra o q u al os d ireito s co n stitu cio n ais tê m n e cessid ade d e se ro d e a r d e novas garantias, é o P o d e r Executivo” ‘n in g u é m se acautela, se defende, se bate c o n tra as d ita d u ra s d o P o d e r Executivo. E m b o ra o P o d e r Executivo, n o re g im e presidencial, já seja, d e s u a natureza, u m a s e m i-d ita d u ra ” ... “o n d e o go v e rn o se realiza pelo sistem a p a rla m e n ta r, o jo g o das m u d a n ç a s m in isteriais, d o s votos d e confiança, d o s apelos à nação, m e d ia n te a dissolução das C âm aras , c o nstitu i u m a g arantia, já c o n tra os excessos d o P o d e r E xecutivo já c o n tra as d e m a sia s das m a io ria s p a rla m e n ta re s. Mas, neste regim e, o n d e p a ra o chefe d o E sta d o n ã o existe responsabilidade, p o r q u e a resp o n sa b ilid a d e c ria d a s o b a fo rm a d o im p e a c h m e n t é a b so lu ta m e n te fictícia, irrealizável. m e n tiro s a , e o n d e as m a io ria s p a rla m e n ta re s são m a n e ja d a s p o r u m sistem a d e eleição q u e as converte n u m m e io d e p e rp e tu a r u p o d e r às oligarquias estabelecidas, o re g im e presidencial c rio u o m a is chinês, 0 m ais tu rco , o m ais russo, o m ais asiático, o m ais a fric a n o d e to d o s os reg im es” ... a o g o v e rn o pessoa! d o im p e ra d o r, c o n tra o q ua l ta n to n o s b a te m o s, su ce d e u h o je o go v e rn o pessoal d o P resid en te da R epública, re q u in ta d o n u m c aráter in c o m p a ra v e lm e n te m ais grave: g o v e rn o p esso al d e m a n d õ e s, de chefes d e p a rtid o , g o v e rn o absoluto, sem resp o n sab ilid ad e, arb itrário e m t o d a a e x te n sã o d a palavra, neg ação c o m p le ta d e to d a s as idéias q u e p re g a m o s, os q u e v im o s en v o lv id os n a o rg an ização desse re g im e e q u e tra b a lh a m o s co m ta n ta s in ce rid ad e p a r a org an izá-lo ” (e m D o P a rla m e n ta rism o , n a Fatura C o n stitu iç ão , d e A lirR a fa c h esk i, C u ritib a, J985, ps. J6/17). 150 o Presidente, um a vez eleito, é titular absoluto e irresponsável po r seu m andato, nom eando m inistros e auxiliares, sem qualquer n e cessidade de controle e à revelia da vontade popular, eis que o eleitor que o escolhe tem os seus direitos políticos restritos ao voto periódico e nada mais. C om pertinência, Raul Pula entendia ser o presidencialism o sis tem a de governo de “irresponsabilidade a prazo certo” Uma vez eleito o Presidente da República, o povo deveria suportá-lo, bom o u mau, até o fim do mandato. Se m uito ruim , apenas a ru ptura institucional poderia viabilizar sua substituição, posto que a figura do im peachm ent é aplicá vel som ente à inidoneidade adm inistrativa e não à incompetência. Contrariam ente, o parlam entarism o é o sistema de governo da “responsabilidade a prazo incerto”. O governo apenas se m antém e n quanto m erecer a confiança do eleitor. Se não, será substituído, com a crise política encontrando rem édio institucional para sua solução D urante a guerra das Malvinas, a prim eira-m inistra da Inglater ra era obrigada a com parecer diariam ente ao Parlam ento para prestar contas de sua ação. Se perdesse a guerra, seria derrubada e substituída p o r u m outro ministro, visto que a responsabilidade é a nota principal do parlam entarism o, O presidente da Argentina, p o r seu lado, ofertava as inform ações que desejava ao povo, sem a responsabilidade de dizer a verdade, visto que se sentia livre para “fabricá-la”. A derrota argentina provocou seu afastamento, através de ru ptura institucional, à falta de m ecanism os capazes de equacionarem tais crises no sistema presiden cial 201 V icto r Faccioni explica; “F c o n sa b id o qu e os p a rla m e n ta re s, p o r m ais o u m e n o s ativos q u e sejam , s e m pre p r o c u ra m a m a lg a m a r os interesses coletivos e d a r o rie n ta rã o às aspiraçõ es p o p u la re s, visto que, de q u a tro em q u a tro anos, te rã o q u e se s u b m e te r às u rn a s livres c dem oc rá tic as. É p e ra n te este P arla m e n to q u e o go v e rn o te m q u e re s p o n d e r n o â m b ito d o p a rla m e n ta ris m o . A re c íp ro c a ta m b é m existe, p o rq u e o P residen te R epública p o d e dissolver a C â m a ra , a fim d e qu e o p o v o se m a n ife ste so b re o fato efetiv am ente fu n d a m e n ta l d e q u a l d o s d o is está v e rd a d e ira m e n te re p re s e n ta n d o os Interesses da c oletividade’ ( “P a rla m e n ta ris m o e P residen cialism o ”, lo rn a l Z e ro H ora, 31 .8.86, p. 4). 202 Luís A lexand re C a rta W in te r relem bra: "Ê necessário h a v er u m a p re staç ã o d e c o n ta s d o m in isté rio aos p a rla m e n ta re s, q u e são, afmal d e c on tas, os repre sen ta n te s d o p o v o c, é através deles q u e o povo deve governar. N ã o se p o d e im p u n e m e n te fa lh a r e c o n tin u a r go v e rn a n d o . C o m o d i / Pilla: "o p o v o nã o é, c o m o n o s istem a p a rla m e n ta r, o s o b e ra n o d e u m dia — o d ia d a eleição — ' m as, v e rd a d eira m en te 0 s e n h o r d o s seus d estino s, p o rq u e , p o r in te rm é d io d o s re p re sen ta n te s, a sua in flu ên c ia se está c o n tin u a m e n te e x erce n d o n o governo. E, c o m o os re p re sen ta n te s se p o d e m transviar, e os m a n d a tário s p o d e m tra ir o m a n d a to , o in stitu to d a dissolução d o P a rla m e n to restabelece as relações n o rm a is entre 0 pov o e os seus representantes. N ã o há, n e m até h o je foi s e q u e r con ceb id o, m ais perfeito m e c an ism o p o litico qu e o d o siste m a p a rla m e n ta r. É re a lm e n te a o b ra -p r im a d a arte p o litic á ’ (O P a rla m e n ta ris m o e a E x p eriên cia Brasileira”, 1983, p. 32). 151 o sistema parlam entar é, p o r outro lado, sistem a conquistado pelo povo. Nasce de suas aspirações e reivindicações. Assim foi na In glaterra e em todos os países em que se instalou O presidencialismo, pelos seus resquícios m onárquicos, posto que o Presidente da República é um m onarca não vitalício, constitui-se em sistema outorgado pelas elites dom inantes, que sobre escolherem entre elas aqueles nom es que serão ofertados à disputa eleitoral, neces sitam do eleitor apenas para sua indicação. Em outras palavras, no sistema parlam entar o eleitor controla o Parlamento e este controla o governo, durante o m andato legislativo. No sistema presidencial, sobre não ter o eleitor o p od er de escolha de um a gama variada de candidatos, m as som ente entre os poucos elencados pela elite, sua participação política resume-se, exclusivamente, no depósito de um voto na u rn a e nada mais À evidência, o sistema parlamentar, para permitir esta corrente de mútuos controles, deve se alicerçar no voto distrital, de um lado, e no di reito de dissolução do Congresso por parte do Poder Moderador, de outro. N a prim eira estaca do sistema, o voto distrital perm ite que o elei tor conheça, conviva e controle o seu representante, que, p or seu lado, depende para reeleição, no distrito em que vive e por que concorre, de representar condignam ente aqueles que nele depositaram o voto e a coníiança Graças ao voto distrital, o Parlam ento se transform a, efetiva mente, na Casa de representação de todos os segmentos e correntes do pensam ento político, econôm ico e social de um a nação. A própria escolha, pelo parlamentar, do G abinete que deve governar o país será sempre exercitada com a preocupação de intuir a vontade de seu eleitor. Sua participação na escolha do governo e no seu controle, em verdade, transform a-o em “longa m anus” da vontade popular. 203 M o n te s q u ie u escreveu sua clássica o b ra D o Espírito d a s Leis, a p a r tir d a s lições d e Locke e d a e x p e r i ê n cia p a rla m e n ta r inglesa, q u e ta n to o in fluenciou. A in flu ên cia p a rla m e n ta r inglesa foi d e tal o rd e m q u e até ho je o p re sid en c ia lism o a m e ric a n o tem , n o P a rla m e n to órg ã o m ais fo rte q u e o Executivo. 204 M ax W eber, e m seu D u a s V ocações; Política e C ientifica (Ed. U nB ), a o c o m p a ra r o s istem a p olítico a m e ric a n o co m o alem ão, m o s tra c o m o a d e m o c ra c ia n o pre sid en c ia lism o inexiste. n a m e d id a e m que a escolha d o c an d id a to oficial d o p a rtid o passa, necessariam en te, p o r u m a seleção eleitoral "in te rn a c o rp o ris”, p re v a le ce n d o a fo rça da d ire ç ã o sobre a a m p la lib e rd a d e de escolha d o povo, co n d ic io n ad o , m e s m o n a s eleições p rim árias, a d e c id ir p o r n o m e s p re v ia m e n te in dicado s, sem sua p articipação. 205 Em m e u liv ro A Separação d e P o d eres (Ed. P r N D e lASP) às ps. 4 5/51, disco rri m ais lo n g a m e n te sobre o s do is m e c a n is m o s viabilizadores d o s istem a parla m e nta r. 152 Por outro lado, o direito do Chefe de Estado de dissolver o C o n gresso, se este derru bar Gabinetes constituídos, com m uita freqüência, traz elemento de estabilização às relações entre Parlam ento e Gabinete, posto que se “irresponsável” o Parlamento, poderá o Chefe de Estado consultar novam ente o eleitor para saber se aquele Parlam ento conti nua a m erecer confiança de seu eleitorado. E a própria separação da figura de Chefe de Estado da do Chefe de G overno não perm ite que o Chefe de Estado seja envolvido nas cri ses políticas, fator de equilíbrio que o presidencialism o não pode ofer tar pela confusão n a m esm a pessoa das duas representações Não é sem razão que nas 21 únicas democracias estáveis que o m u n do conheceu, sem solução de continuidade, de 1945 até 1984, 20 eram parlamentares e naquela única presidencial (a americana), o Parlamento é de tal form a vigoroso que derruba presidentes, ao contrário dos demais países presidencialistas em que os presidentes fecham os Congressos Por outro lado, a experiência latino-am ericana, com o m odelo presidencialista, é penosa, na m edida em que a falta de mecanism os para solução de crises políticas tem levado todos os países, que o ad o taram , a regimes pendulares, os quais vão da ditadura à dem ocracia precária e desta à ditadura. O presidencialismo é, portanto, um sistema tendente à democracia, mas inibido pela sua origem e pela pouca confiabilidade do hom em no poder, razão pela qual não poucas vezes trabalha contra a democracia 206 A lir R atachebki ensina: "A apatia, a in d iferen ç a p elo q u e o g ov e rn o faz, o u vai fazer, n o re g im e p resi dencialista, im p rim e n a alm a n a cio n al sensação d e in d iferen ç a e o rfan d a d e .A m a io ria das criatu ras n ã o sen te a pre senç a d o Estado, a n ã o ser n o m o m e n to de p a g ar trib u to s. M as essa pre senç a faz-se m a d ra sta. Aos p o u c o s o c id a d ã o vai m a lq u e re n d o o veread or, o prefeito, o d e p u ta d o e, assim , até o M i n istro d o Planejam en to. Político, p a ra a m a io ria das pessoas, n o re g im e presidencialista, é o e m b u s teiro, 0 en g an ado r, o falso profeta. O u tr o asp ecto qu e fa / do p re s id en c ia lism o u m re g im e ra n ç o so é sua in c a p ac id a d e de ajustar-se e s u p e r a r as crises. B asta u m ep isó d io “Juru n a" p a ra q u e o p â n ic o se instale n a alm a nacio nal, co m re p e rc u ssã o até nas bo lsas de valores. Ao c o ntrá rio , o p a rla m e n ta ris m o , p o r sua e x tre m a flexibilidade, ab sorv e as m ais im p rev ista s situações. Se o go v e rn o n ã o estiver c m con d iç õ es de e n fren tá-las, p o d e ele ser fácil e su av e m e n te su bstituído. Para c a d a n o v a c o n ju n tu ra , a in d a c o m o afirm a o s a u d o s o e stadista R aul Pilla, ‘terá a Nação, o g o v e rn o a d e q u a d o : isto p o r ser o Parla m e n to c o m o u m se n s ó rio da n a c io n alid ad e e nele se refletirem to d o s os s e n tim en to s, to d a s as necessid ades e to d o s os desejos dela” (D o P a rla m e n ta ris m o , n a F u tu ra C o nstitu ição , C uritib a, 1985, p. 28). 207 I.ijphart, e m seu livro “D e m o crac ie s” {Hd. Yale U niversity Press, 1984), d e m o n s tr a que. c o m regim es m istos o u p u ro s, são p a rla m e n ta ris tas C a n a d á . A ustrália, Itália, França, Israel, A le m a n h a , Suécia, Su íça, N o ru e g a , lap ào, H o la n d a, Bélgica, F in lân dia, Á ustria, L ux em bu rg o, D in a m a rc a , N o v a Zelândia, R eino U n id o e Islândia e p resid encialista os E stad os U nidos. 208 N o rb e rto B obbio, e m Teoria das F o rm as d e G o v e rn o (Ed. U nB), re le m b ra q u e M o ntesq uie u , p o r não a cre d ita r n a n a tu re z a h u m a n a , fo rm u lo u a te o ria trip a r tid a p a ra q u e o p o d e r p u d e ss e "co ntro lar o poder". Seu d e se n c an to c o m a ex p eriê n cia h u m a n a n o go v e rn o levo u-o a in tu ir a refe rida divisão. 153 o parlam entarism o, pela sua própria formulação de conquista popular, é sistema plenam ente dem ocrático, m otivo por que, nas m u i tas crises por que passa, encontra sempre formas renovadas de preser vação da dem ocracia e da vontade popular. 2* Pergunta: Quais os tipos fundam entais de parlam entarism o e presidencialismo? O presidencialismo clássico não é o americano. Este foi apenas o prim eiro sistema criado. À tradição inglesa de Parlam ento forte fez da experiência am ericana um a experiência ímpar, visto que o Parlamento nunca perdeu sua dignidade, desde a preparação da C arta M agna da quele país, com mais de 200 anos. O presidencialismo clássico foi aquele desenvolvido por todos os países que procuraram copiar a solução am ericana, sem a m esm a tra dição parlamentar. Hegel, que contestou M ontesquieu, de quem foi adm irador inconteste, pretendia criar um p o der ideal, ao contrário do Mestre, que não se iludia sobre a natureza hum ana. O presidencialismo clássico, em que na figura de um hom em só se concentra a essência do poder, torna-o mais vulnerável às tentações próprias de quem detém a força e, com o tempo, com ele se identifica, transform ando aqueles que governa, não em seus superiores a quem deveria servir, mas em seus inferiores que lhe devem obedecer O parlam entarism o clássico é o inglês ou o belga, posto que neles 0 chefe de governo é realmente aquele que governa Não é 0 francês, nem o português. É bem verdade que o parlam entarism o clássico pressupõe o bipartidarism o ou o pluripartidarism o. Nos países em que o bipartidarism o dom ina, com o na Inglaterra, tal parlam entarism o reveste a forma de governo majoritário, ou seja, o partido que ganha as eleições gover na sem necessidade de apoio e participação do partido derrotado. Nos países em que o pluripartidarism o prevalece, o m odelo é consensual. O partido ou a coligação vencedora governa com participação de muitos 209 H a rt, e m “ l h e C o n c e p t o f Law” (Ed. C la re n d o n . O xford ), m o s tro u q u e se o s reg im es n ã o são p le n a m e n te d em o crático s, as leis feitas p a ra sere m c u m p rid a s p o r g o vern antes e g o v e rn a d o s te rm in a m in c id in d o p rin c ip a lm e n te so b re os gov ernad os. 210 Lijphart, in “D em ocracies” (Ed. Yale U n iversity Press, 1984), divid e as d e m o c ra c ia s e m m a jo ritárias ou co nsen su ais, tais co m o a inglesa o u a belga. Em am b as, te n h a m m a io r o u m e n o r d u ra ç ã o o s G abinetes, a rep re sen ta tiv id ad e d e m o c rá tic a faz-se p o r inteiro. 154 partidos, inclusive de partidos m inoritários. O governo decorre, pois, de um consenso político, reflete-o e se orienta em tal linha. Entre o parlam entarism o puro e o presidencialism o puro colocam-se os sistemas mistos, com o o francês ou o am ericano M ister se faz, todavia, rápida observação. Nos sistemas parlam en tares puros, os partidos políticos se fortalecem e passam a representar as aspirações populares. No presidencialism o puro, as estruturas partidárias são fracas, m eros instrum entos institucionais para que as personalidades, nem sempre com elas identificadas, possam alçar-se ao poder. Os partidos políticos são, portanto, instrum ento do povo no p ar lam entarism o e das elites políticas dom inantes no presidencialismo Os sistemas mistos parlam entaristas de que falávamos são aque les em que se procura solução interm ediária, ofertando m enos p arti cipação governam ental ao Chefe de Governo, que o dirige ao lado do Chefe de Estado. Assim é que o Presidente da República na França e em Portugal, indica determ inados m inistros que divergem e discutem com o chefe de governo a política que deva ser adotada p ara o país A solução não m e parece ideal, na m edida em que, p o r ser o Pre sidente da República não demissível e sê-lo o prim eiro-m inistro, nos impasses criados, se pertencentes a coligações partidárias ou partidos diversos, nem sempre encontram m ecanism os de solução fácil, no ar senal jurídico-institucional. A França, em 1987, enfrentou problem as de convivência sérios, m orm ente porque o presidente socialista divergia da linha econôm ica do prim eiro-m inistro liberal, gerando choques que desestabilizaram, m uitas vezes, os projetos nacionais, sobre perm itirem que os grupos de pressão se formassem para tirar vantagens das divergências e choques entre um prim eiro-m inistro mais fraco do que deveria ser, em regime 211 A n a lisa m o s a m até ria , e m m a io r p ro fu tidid a de, n o livro R o teiro p a ra u m a C o n stitu in te (Ed. Forense, 1987). 212 José C arlo s G raça W agner, e m seu livro O s P a rtid o s Políticos (Ed, P r N D e lASR 1986), retra ta tal realidade. 213 A C o m issã o A fonso A rin o s p re te n d e u a d o ta r sistem a m isto c o m o pais s e n d o d irigido, n o estilo es p a rta n o , p o r dois chefes e c om dois co n selho s, o u seja, o (ia b in e te d o s M in istro s Parla m e n ta re s e o C o n se lh o dc E stado d o P resid ente d a República. A so lu ção p a re c e u -m e perig o sa p e la possível desresp o n sabilização d o go vern o, a p a r tir d e cho qu es, q u a n d o div erg entes as políticas su geridas p o r u m e outro. 155 parlamentar, e um presidente mais fraco do que deveria ser, em regime presidencial Pode-se, entretanto, resum ir a questão form ulada na colocação de existência de três tipos clássicos, a saber: o parlam entar, o presiden cial e 0 misto. Em m inha opinião, o m elhor dos três é inequivocam ente o parla m entar puro, na m edida em que fortalece as estruturas políticas, gera a responsabilidade do eleitor e do eleito e obriga o perm anente exercício democrático, com a depuração natural de elementos aproveitadores e oportunistas, que se encontram em núm ero consideravelmente m enor que nos sistemas presidenciais conhecidos 3®Pergunta; Qual o tipo de sistema de governo ideal para o Brasil? O período político mais estável que o Brasil conheceu foi à época do 2° império, em que o país possuía o sistema parlam entar de governo. Por aproxim adam ente 50 anos, m esm o enfrentando um a guerra externa, a que o país foi levado sem preparação, os Gabinetes se suce deram , mas a estabilidade perm aneceu Rui Barbosa, introdutor do presidencialismo no país, declarava, desconsolado 10 anos após, que preferiria a instabilidade do parlam en tarismo à irresponsabilidade do presidencialismo, em “desabafo” que de veria fazer pensar todos os constituintes brasileiros de todas as épocas 214 E m m e u livro O P o d e r (Ed. Saraiva, capítulo ' 0 p o d e r rep resen tativo ” 1984), m ais la rg a m e n te defendi 0 s istem a p a rla m e n ta r puro. 215 D e c erta fo rm a, n o painel so b re p a rla m e n ta ris m o e p re sid en c ia lism o d a A ssem bléia Legislativa de M in as G erais, foi esta a te n d ê n c ia alb erg ada pe la m a io ria d o s p a rtic ip a n te s d e m in h a conferência ( “Sim p ósio M in a s G erais e a C o n stitu in te ”, Fase 1, A ssem bléia Legislativa d o E sta d o d e M in as G erais, ab ril/86, ps. 179/221). 216 A iir R atacheski em D o P a rla m e n ta rism o , n a F u tu ra C o n stitu iç ã o (Ed. C u ritib a , 1985, p. 20), ensina: “A os pou c o s, pela p rá tic a d o regim e, as im p erfeições foram s e n d o ex p u n g id a s e, q u a n d o adveio o p r e sidencialism o, em 189], n o sso re g im e p o lític o e r a u m d o s m a is invejáveis d o c o n tin e n te a m ericano, ü P o d e r Executivo era e xercido p o r u m M inistério. Em 1847, foi c riad a a pre sid ên c ia d o C o n se lh o de M inistros. H graças à llcxibilidade d o regim e, q u e se a d ap ta a to d a s as tra n sfo rm a ç õ e s, sem golpes d e E sta d o ou revoluções, foi possível, sob seus auspícios, c o n su m a re m -se re fo rm as p ro fu n d a s n a vida nacio nal. N ão se p o d e ignorar, ta m b é m , ter sido essa fase d o exercício d o p a rla m e n ta ris m o n o país, q u e p re p a ro u os m a io re s e stad istas d e to d a n o ssa história, p ro je ta n d o -o c o m o u m a das g ra n d e s na çõ e s da época. Foi u m a escola d e estadistas qu e o p re s id en c ia lism o fechou, c o m a im p la n ta ç ã o d a C a rta d e 1891. M e s m o aqueles q u e lo g ra ra m destaq ue, n o início d a R epública, tiv e ra m sua fo rm a ç ã o po lítica c o n so lid ad a sob o influxo daq uele p e río d o histórico." 217 É a in d a Rui B arb osa q u e m leciona: “discu te-se h oje c o m m u ito calor, n a tr ib u n a e n a im p ren sa , a q u estão de saber se, n o to c a n te a essas in stitu içõ es fu n e stas q u e to rn a m irresponsáveis os governos, e e stab elecem o p re d o m ín io d a incap acidad e, o re m é d io n ã o seria s u b stitu ir a rep úb lica presidencial p e la re p ú b h c a parla m e n ta r. Q u a n to a m im , a p es a r de tu do . hesito ainda. M as c o m e ç o a s en tir q u e não h a v erá talvez n e n h u m o u tro m eio de chegar, e n tre nós a u m go v e rn o re a lm e n te d e m o c rá tic o fu n d a n d o a resp o n sa b ilid a d e n o p o d e r p e ra n te o povo. e c h a m a n d o o m é rito e a cap a c id a d e ã p a rtilh a d o poder, à gestão d a s finanças, à a d m in is tra ç ã o do s u eg ócios estran g e iro s e à e la b o ra çã o da lei. N ão se p o d e rã o 156 o presidencialismo no Brasil, por outro lado, apenas trouxe inse gurança política e sistema gangorra! entre períodos de ditadura real e ou tros de débil democracia, De 1889, quando um a quartelada derrubou a m onarquia do Brasil, ao ponto de Marechal D eodoro pensar ter derruba do o Gabinete e não a monarquia, b Brasil conheceu revoluções periódi cas (1918, 1924,1930,1937,1954,1957), sucumbiu à ditadura de 1930/45 e ao regime de exceção (1964 a 1984), precisando de seis constituições para conformá-lo (1891,1934, 1937,1946,1967 e 1988) Em term os históricos, portanto, a experiência presidencialista não foi positiva e a parlam entar foi consideravelm ente m enos negativa. Em term os de desenvolvimento atual, em que o país se transfor m ou no 10° m ercado do m undo e que, não obstante os desacertos da política econôm ica governam ental, graças a em presários e empregados, ganha novos patam ares de confiabilidade externa, não h á por que não se adotar o sistema parlam entar que, sobre ser o mais estável no concer to das nações, representa tam bém form a mais dem ocrática e civilizada de governo. Nem se diga que, p or ser um Estado Federativo, o Brasil, em face do bicameralismo, dificultaria o exercício dessa form a mais civilizada, posto que a Alem anha, Canadá, Austrália tam bém o são e o parlam en tarism o tem perm itido a segurança das instituições, mesm o nas crises políticas, sociais e econômicas mais graves que viveram a d ia r p o r m u ito te m p o re fo rm as tã o essenciais sob p e n a de la n ç a r o pais n a d e so rd e m , e c o m p ro m e te r os interesses m ais caros d e seu c ré d ito e da existência m e sm a ” (e m D o P a rla m e n ta rism o , n a futura C onstituii;ão, A lir R atacheski, C u ritib a , 1985, p. 18). 218 R a y m u n d o Farias d e O liveira escreve: “N o Brasil, o p re s id en c ia lism o foi g e ra d o n o v entre d o golpe m o rta l d e sferid o c o n tra a n io n a rq u ia . P o rtan to , n a sc e u d e c im a p a r a baixo, foi im p o s to à con sciência cívica d a N ação a rb itra ria m e n te pelos a rtic u la d o re s d o golpe. N ã o se p o d e n e g a r a b em d a verd ad e h istórica, que a R epública sim, esta v in h a s e n d o p re c o n iz ad a pelos re pu blic a n os já org a n iz a d o s em P a rtido, C lubes e lornais. O ra , a R cpública n ã o precisava ser n e ce ssa ria m e n te p residencialista pa ra sobreviver. h m verdade, a eu fo ria e u d elírio d o s inim igo s da m o n a rq u ia d ia n te d o êxito d o g olpe lid e ra d o pelo M arechal M anu el D e o d o ro d a Fonseca c o n tra o Im pério , não se d e sp re z a n d o os efeitos d in a m ita d o res dos artig os e d iscu rso s d e Ru B arbosa, a ca b a ra m p o r d e s p e rta r v e rd a d eira s in d ro m e d e im itação c o nstitucion al à g ra n d e R epública d o N o rte , o n d e , c o m o já se viu, as razões histó ricas e políticas foram b em o u tra s a in flu en c ia re m o invejável d o c u m e n to c o nstitu cio nal.A ssim , u m d o s m ales co ng ênitos d e n o sso p re s id en c ia lism o é o d e n ã o te r p a ssa d o p e lo "processo" vivido pelos a m e ric a n o s d o norte. A n o ite c em o s "p a rla m e n ta ristas"— situação q u e v in h a desd e 1847 ~ e a m a n h e c e m o s “pre sid enc ia lis tas” co m a in s ta u ra çã o d a R epública” (‘M ales C o n g ê n ito s d o N o sso Presidencialismo", jo rn a l O Estado de S. Paulo. 11.1.87, p. 44). 219 Em m e u artig o O D ireito em Fran galh o s" ( H R, S u p le m e n to T rib u tá rio n’ 69/86), an aliso os m ales que o plano de estabilização tro u x e ã nação, o q u e só foi possível g raças ao presidencialism o . Tal insensatez seria m ipossível n o regim e p a rla m e n ta r, o n d e em n o m e de 130 m ilh õ e s de brasileiros. 10 cid a d ão s não p o d e ria m d e c id ir o seu de stino, sem te r que p re star contas. Entendo que o m om ento é de am adurecim ento das instituições e o Brasil necessita, de um a vez p o r todas, abandonar aquelas que trazem resquícios das m onarquias absolutas, visto que, no presidencialismo, o Poder Executivo é hipertrofia- do e os Poderes Legislativo e Judiciário enfraquecidos. Só terem os plenitude dem ocrática e u m a carta suprem a mais estável se abandonarm os, definitivamente, o sistema presidencial de governo, principal causa de todas as crises políticas que vivemos no século XX A2009-031 PARLA X PRES 220 V icto r Faccioni, em discu rso n a C â m a r a d o s D e p u ta d o s , sug ere p ara e n fre n ta r-s e a crise po litics b r a sileira a a do çã o d o p a rla m e n ta ris m o , a o dizer; “E m n o s so país, n o m o m e n to e m q u e foi feita a o p ção p e la d em o c ra cia , to rn a -s e necessário ta m b é m fazer a o p ç ã o p elo p a rla m e n ta ris m o , p o rq u e so m en te n este s istem a represen tativ o p o d e m su rg ir p a rtid o s p olíticos c o m clareza ideológica, d a n d o o p o r t u n id a d e , d e sta form a, ao s u rg im e n to d a v e rd a d eira O p osição . N o te m p o e m q u e os E stad os U n id os a d o ta ra m o presid en cialism o , d e m o d o fu n d a m e n ta l n ã o existiam p a rtid o s ideológicos, n ã o h aven d o o po sição nesse sentido, n in g u é m q u e se o p u n h a ao governo, via d e c o n seq üên cia, se o p u n h a ao E sta do. N o m o m e n to e m que surge a O p o siçã o , c o m o s u rg im e n to d o s p a rtid o s ideológicos, aqueles que se o p õ e m ao g o v e rn o são ao m e sm o te m p o c o n tra o C hefe d e Estado, o p õ e m -s c à Nação, são c o n tra as Forças A rm a d a s, c o n tra os valores n a cionais, to rn a n d o a d e m o c ra c ia im praticável e im possivcl de a p erfeiçoam ento.E n o c o nte xto d o p a rla m e n ta ris m o q u e se p o d e r á a firm a r u m a o p osição estável e c o nstru tiva, c o m ch an ces de viabilizar-se p o liticam ente, e m q u e o go v e rn o te m u m a espécie d e p re p o n d e râ n c ia lim itad a no acesso aos m eio s d e coerção, isto é o n d e o g ru p o n o p o d e r te m fortes chan ces cJe insucesso ao te n ta r r e p rim ir a ação d e seu s o p o sito re s — q u e n ã o se o p õ e m à N ação — m a s ao C hefe d o G o vern o, ao p rim e iro -m in is tro , exp ressão de u m a ideologia, de u m a facção. D e fin itiv a m e n te, 0 g ru p o n o p o d e r p e rm itirá e m e sm o e n co rajará o d e se n v o lv im e n to d e in stituições d e m o c rá tic a s ” (D iá rio d o C o n g re sso N acional. 1 1.9.86). 158 LEI COMPLEMENTAR N. 135. E SUA ADEQUAÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL PRESUNÇÃO DE INOCÊNCU Janine Accioly^^' O crescente núm ero de escândalos políticos que evidenciam a prática de diversas ilicitudes no exercício de m andatos eletivos sejam elas de natureza cível, criminal, eleitoral, adm inistrativa ou ética, fez aum entar o clam or público pela adoção de m edidas mais enérgicas no sentido de im pedir que pessoas com vida pregressa incompatível com o exercício de cargo eletivo possam pleiteá-lo. O clam or da sociedade foi suAciente para desencadear, às véspe ras do pleito M unicipal de 2008, discussão acerca da possibilidade de, à luz do direito atual e com respaldo no art. 14, § 9®, da Constituição Federal, considerar inelegível o candidato que tivesse vida pregressa in compatível com o exercício de m andato eletivo, considerando, assim, autoaplicável o dispositivo constitucional supra. À época, a Associação Brasileira de M agistrados ajuizou Ação de D escum prim ento de Preceito Fundam ental perante o Supremo Tribu nal Federal (ADPF 144)^^^ requerendo o reconhecim ento da autoaplicabilidade do $9° do art. 14 da Constituição Federal, bem com o que fos sem revogadas as condições estabelecidas em dispositivos da LC 64/90 no tocante à ressalva “fl questão houver sido ou estiver sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário”, prevista na alínea “g” do art. 1“, inciso I, além da revogação da exigência de trânsito e julgado das decisões que: julgarem procedente representação eleitoral em processo de apuração de abuso do poder econôm ico ou político (art.l®, I, d ) ^ ; 221 A dvogada; Especialista em D ireito Eleitoral; C o n se lh e ira d a OAB Seccional C eará; Secretária d a C o m issã o N acion al d e Exa m e d e O rd e m 222 A D PF 144, R e l a t o r : M i n i s t r o C e l s o d e M e l l o , p u b l i c a d a n o D ) E n " 15 3 , d i v u l g a d o em 15/08/2008 223 Art- 1“ São inelegíveis: I - p a ra q u a lq u e r cargo: (...) d ) o s q u e te n h a m c o n tr a su a pe sso a re p re s en ta ç ã o ju lg a d a pro c e d en te pe la )ustiça Eleitoral, tra n sita d a em julgado, e m proc e sso d e a p u ra ç ã o de ab u so d o p o d e r e c o n ô m ic o ou político, p a ra a eleição n a qual c o n c o rre m o u te n h a m sid o dip lo m a d o s , b e m c o m o p a ra as q u e se realizarem 3 (três) a n o s seguintes; 159 - condenarem , crim inalm ente, o autor de crim e contra a econo m ia popular, a fé pública, a adm inistração pública, o patrim ônio p ú blico, 0 m ercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais (a rt.l“, I, e)^^^ - julgarem procedente ação contra os detentores de cargo na adm i nistração pública direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econômico ou político (art.l° I, h ) ^ ; - declarar a inelegibilidade do candidato (art.l5)^^\ Após um a acalorada discussão jurídica, a nossa Corte Suprema, po r maioria, vencidos os M inistros Carlos Britto e Joaquim Barbosa, m anifestou-se pela im procedência da dem anda, p o r considerar que o § 9° do art. 14 da CF, com redação dada pela Em enda de Revisão 4/94, não é autoaplicável, exigindo-se, portanto, a edição de Lei C om plem en tar definindo novos casos previstos nas alíneas “d”, V ’ e “h” do inciso I do art. 1° da LC 64/90 não transgride, tam pouco descum pre os precei tos fundam entais concernentes à probidade adm inistrativa e à m orali dade para o exercício do m andato eletivo. No caso, a im procedência da referida ADPF sustentou-se, princi palmente, na ausência de Lei C om plem entar disciplinando especifica mente novos casos de inelegibilidade, manifestando-se, ainda, de form a expressa, que sentença penal condenatória, não transitada em julgada, além de, p o r si só, não acarretar a inelegibilidade, não im pede o registro de candidatura.-^’ 224 A rt.l": (...) I(...) e) os q u e forem c o n d e n a d o s crim in a lm e n te , co m sen te n ç a tra n s ita d a em julgado, pela p rá tic a d e crim c c o n tra a e c o n o m ia p opular, a fé pública, a a d m in is tra ç ã o pública, o p a trim ô n io p ública, o m e rc a d o financeiro, pe lo tráfico d e e n to rp e c e n te s e p o r c rim e s eleitorais, p e lo p ra z o d e 3 (três) a n os, apó s o c u m p rim e n to d a pena; 225 A rt.l": (...) 1(...) h) os d e te n to re s d e cargo n a a d m in is tra ç ã o p úb lic a d ireta, ind ireta o u fun da c io na l, q u e beneficiarem a si o u a terceiros, pe lo a b u so d o p o d e r e c o n ô m ic o o u p olítico a p u ra d o e m processo, c o m sentença tra n s ita d a em julgado, p a ra as eleições q u e se realizarem n o s 3 (três) a n u s seg uintes ao té rm in o d o seu m a n d a to o u d o p e río d o de su a p e rm a n ê n c ia n o cargo; 226 A rt. 15. T ran sita d a e m ju lg a d o a de cisão q u e d e clarar a inelegibilidade d o can d id ato , ser-lh e -á n e gad o registro, o u cancelado, se já tiver s id o feito, o u d e c la ra d o n u lo o d ip lo m a , se já expedido. 227 CA STRO , E d so n de Resende. Teoria e Prática do D ireito Eleitoral. 5 ed., Belo H orizon te: D el Rey, 2010. P, 267. 160 Apesar de ter sido julgada im procedente, o simples ajuizamento da ADPF gerou um a valiosa discussão sobre o assunto, com o jamais se tinha visto, fato este que acabou p o r fortalecer o m ovim ento que almeja m udanças no sentido de im pedir que indivíduos que não possuam vida pregressa compatível com o exercício de m andato eletivo, venham a concorrer nos pleitos eleitorais. D iante da decisão que selou o entendim ento da não autoaplicabilidade do § 9° do art. 14 da CF, o Supremo transferiu p ara o legislativo a responsabilidade de aprovar Lei Com plem entar prevendo novos casos de inelegibilidade, considerando a vida pregressa do candidato^^*. Assim, as atenções se voltaram ao esquecido Projeto de Lei C o m plem entar 168/93, que, apesar de proposto em 1993, p o r nítida falta de interesse dos parlam entares, perm aneceu inerte p o r mais de um a déca da e meia sem que fosse subm etido à análise e votação. Entretanto, em 2008, aproveitando o propício m om ento em que as discussões sobre a m atéria foram intensificadas, inclusive perante o Poder Judiciário, surgiu u m organizado M ovim ento de Com bate a C orrupção Eleitoral - MCCE, que lançou um a Cam panha nacional d e nom inada “Ficha Limpa”. Para isso foi elaborado um Projeto de Lei de iniciativa popular que torna mais rígidos os critérios de avaliação do candidato, levando-se em consideração a sua vida pregressa. Após a obtenção de mais de um m ilhão e m eio de assinaturas, o projeto chegou ao Congresso com um apelo popular m uito forte, con tando, inclusive, com o apoio de vários entes, dentre eles a OAB, As sociações de M agistrados e do M inistério Público e CNBB, sendo tal Projeto apresentado com o substitutivo ao PLP 168/93. Após um a tram itação em caráter de urgência, foi aprovada pe las duas Casas Legislativas, com sanção do Presidente da República, a Subem enda Substitutiva G lobal,apresentada pelo relator do projeto perante a Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania da Câm a ra dos Deputados, Dep. José Eduardo Cardozo, contendo em seu bojo inúm eras previsões de inelegibilidade, que visam a excluir da disputa eleitoral cidadãos que não possuem um perfil m oral e ético compatível com o exercício de um m andato eletivo, ou que contém em seu passado 228 C O Ê L H O , M arcu s V inícius F u rtad o . D ireilo Eleitoral e Processo E leitoral R io d e Janeiro: Renovar, 2010. P.166. 161 máculas que depõem pela falta de probidade ou pela prática de condu tas que, em virtude de sua gravidade e relevância no seio da sociedade, apresentam -se com o incompativeis com o exercicio de m andato eleti vo. D entre os aspectos mais polêmicos desta Lei, cujos dispositivos Já serão aplicados nas eleições de 2010 conform e manifestação recente do egrégio Tribunal Superior E l e i t o r a l , e s t á a querela envolvendo a possibilidade ou não de atribuir a pecha de inelegíbilidade àqueles com decisão condenatória penal, ainda sem trânsito em julgado. Para um a abordagem mais objetiva do tem a, inicialmente, cu m pre fazer as seguintes reflexões: o postulado da não-culpabilidade ou da presunção de inocência restringe-se ao dom ínio penal ou, ao contrário, irradia os seus efeitos para além dos limites em que se apresenta a sen tença penal de natureza condenatória? E, ainda, o principio processual penal da presunção de inocência é absoluto, independentem ente de ser analisado dentro de um procedim ento penal ou m esm o em processos de natureza não-crim inal e cotejado com outros princípios constitucio nais, como, no caso, o da probidade e moralidade? C onform e aludido anteriorm ente, o tema, no tocante à constitucionalidade de tal iniciativa, é polêm ico e vem ensejando profundas discussões, não apenas no meio jurídico, com o tam bém no legislativo e no seio da sociedade civil. De fato, o entendim ento que prevaleceu nos últim os tem pos foi o de que tal proposição legislativa colidiria com o princípio da presunção da inocência firm ado no art. 5°, LVII, da Constituição Federal, na m e dida em que este afirma que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” Entretanto, com a evolução natural do direito e a m aior valoração de novos princípios constitucionais, dentre eles o princípio da p ro porcionalidade, da m oralidade e da probidade administrativa^^\ esse entendim ento, que até pouco tem po atrás se apresentava como inultrapassável, inclusive quando analisado em m atérias de natureza não criminal, passou a ser questionado, e a tese de sua relativizaçào ganhou 229 A G RA , W alber de M o u ra & VELLOSO, C arlos M ário d a Silva. Elem entos d o Direiio Eleitoral. 2ed., São PauloT Saraiva, 20 J0 . P. 76. 230 Brasilia, T rib u n a l Su p e rio r Eleitoral- C ta 114709, Rei. M in. A rn a ld o Versiani. Julgado e m 17.06.2010 231 BONAVIDHS, Paulo. Curso de D ireito C onstitucional. 12 ed., São Paulo; M alh e ircs, 2002. P 356. 162 força, principalm ente quando confrontado com outros princípios cons titucionais. Assim, nota-se que já não são poucas as manifestações no senti do de que ao m encionado princípio da presunção de inocência não se pode dar interpretação ampliativa capaz de abranger to d a e qualquer situação restritiva de direitos decorrente de ato jurisdicional, principal m ente quando tal princípio for sopesado com outros preceitos tam bém de natureza constitucional. Especificamente n o tocante a sua am plitude com relação ao direi to eleitoral, principalm ente com relação a sua interferência nas causas de inelegibilidades, essa interpretação ampliativa da presunção de in o cência encontra alguns obstáculos, um a vez que, além da confrontação necessária com os princípios da m oralidade e da probidade, im prescin díveis ao exercício de m andato eletivo, a prática eleitoral tem dem ons trado que alguns conceitos afetos a determ inada área do direito, quan do transplantados para a seara eleitoral, ganham configuração própria, face à especificidade desse ram o do direito, inclusive no tocante à temporariedade dos m andatos eletivos. Assim, é necessário que a avaliação acerca da am plitude do p rin cípio da presunção de inocência seja feita levando-se em consideração esse contexto bem particular afeto ao direito eleitoral, ram o este, inclu sive, que, além de outras peculiaridades, consagra, com o regra, a apli cação im ediata de suas decisões, conform e previsto n o art. 257^^ do Código Eleitoral. Além disso, a possibilidade de se prever com o causa de inelegibilidade a existência de sentença crim inal condenatória, proferida por colegiado, mas ainda sem trânsito em julgado, privilegia de m aneira mais contundente outros princípios constitucionais tam bém muito im portantes e que, p o r m uitos anos, foram relegados, com o é o caso dos princípios da probidade e da m oralidade adm inistrativa, devendo ser considerado que os desm andos praticados p o r u m m andatário ímprobo afetam to d a u m a coletividade, acarretando danos gravíssimos à população que deixou de usu fru ir de m elhorias em prol de interesses particulares do m au gestor. 232 Art. 257. Os recursos eleitorais n ã o terão efeito suspensive. Parágrafo único. A execução de q u a lq u e r acó rd ão será feita im ediatam en te, através d e c o m u n ic aç ã o po r o tk io , telegram a, ou, em casos especiais, a critério d o presidente d o Tribunal, através d e cópia d o acórdão. 163 É im portante ressaltar, ainda, que, nessa proposição, não se está im putando ao acusado qualquer pena, u m a vez que a previsão de inelegibilidade não possui, neste caso, caráter sancionatório com o o pleitea do pela seara penaP^\ Na verdade, o que a norm a almeja é apenas utilizar o fato “conde nação crim inal p or orgão colegiado” com o parâm entro de aferição do perfil necessário para que um cidadão possa pleitear um cargo eletivo. O u seja, o legislador entendeu que a existência de u m a condenação cri m inal p or um dos delitos listado pela própria lei apresenta-se com o um requisito objetivo que indica que o candidato possui um a vida pregressa incompatível com o exercicio de u m m andato eletivo. Prova disso é que o legislador não usou como parâm entro a conde nação criminal p o r qualquer tipo de crime, utilizando-se, apenas, para a aferição da vida pregressa, alguns delitos que se relacionam diretamente com a adm inistração pública, dentre eles, os crimes contra o sistema fi nanceiro, eleitoral, de abuso de autoridade, contra os patrimônios públi co e privado, de lavagem de dinheiro ou que, em virtude de sua gravida de e relevância no seio da sociedade, apresentam-se como incompatíveis com o exercicio de m andato eletivo, como é o caso do tráfico de trocas, racismo, terrorismo, formação de quadrilha e terrorismo. Destarte, verifica-se que o projeto em alusão, visando a dar efe tividade aos princípios da m oralidade e da probidade administrativa, apontou, de form a objetiva, algumas condutas que não se coadunam com o perfil necessário a um agente politico, adotando, ainda, um cri tério objetivo de aferição desse perfil, que seria, justam ente, atráves de um a decisão judicial proferida p o r orgão colegiado. Observa-se, assim, que a norm a não está utilizando um a conde nação ainda sem trânsito em julgado para penalizar o indivíduo, mas apenas para abalizar o aplicador do direito n o m om ento da aferição da vida pregressa do pretenso candidato. Não há de se confundir, ainda, a previsão de inelegibilidade con tida no projeto em referência com a suspensão de direitos políticos p re vista no art. 15 da Constituição Federal, o qual dispõe, em seu inciso III, que ocorrerá suspensão dos direitos políticos em caso de "conde nação crim inal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos” 233 D E C O M A IN , P e d ro R o berto . Elegibilidade e Inelegibilidade. São Paulo; D ialéctica, 2004. R 53. 164 Nesse caso, a suspensão dos direitos políticos é conseqüência n a tural da condenação crim inal transitada em julgado, pela prática indis tinta de qualquer delito. Além disso, a elegibilidade (direito de ser votado) constitui-se apenas das prerrogativas inerentes aos direitos políticos e com este, portanto, não pode ser confundido. C um pre ressaltar, ainda, que, no caso em apreço, não está sendo atribuída a pecha de inelegibilidade de form a aleatória ou arbitrária, pelo contrário, estão sendo estabelecidos critérios objetivos, através de um a Lei Complementar, eleita pela Constituição com o meio adequado para a previsão de inelegibilidade, em que se utiliza o fato “condenação crim inal” com o fator em baçador de um a inelegibilidade, com fins de proteger a probidade adm inistrativa e a m oralidade para o exercício do m andato (art. 14, CF)^^' No caso, busca-se o equilíbrio entre os valiosos princípios da p re sunção de inocência e da m oralidade e da probidade adm inistrativa, que precisam conviver de form a harm ônica. O u seja, se, p o r um lado, tem -se que disponibilizar ao cidadão pleno direito à defesa e a um d e vido processo legal, que são a alma, p o r assim dizer, de um estado de m ocrático de direito, p or outro, tem os que garantir que a sociedade seja com andada por pessoas probas e com perfil m oral e ético condizentes com suas funções. A situação é delicada, um a vez que estamos diante de princípios que, num prim eiro m om ento, parecem chocar-se, cabendo ao operador do direito buscar um a adequação destes à própria estrutura eleitoral, que clama p o r providências rápidas e eficazes, não com portando, as sim, a m orosidade inerente ao nosso sistema judiciário, além de um a compatibilização de acordo com o ordenam ento jurídico pátrio como um todo. Essa avaliação interpretativa da constitucionalidade de tais dispo sitivos deverá ser aferida com auxilio de alguns princípios, dentre eles o da concordância prática o u da harm onização e o da proporcionalidade. Para Ingo Wolfgang Sarlet, o principio da concordância prática 234 § 9" I.ei c o m p le m e n ta r estabelecerá o u tro s casos d e inelegibilidade c os p razo s d e sua cessação, a fim d e p roteger a p ro b id a d e a d m in is tra tiv a , a m o ra lid a d e p a ra exercício d e m a n d a to c o n sid e ra d a vida pregressa d o can d id ato , e a n o rm a lid a d e e le g itim id ad e das eleições c o n tra a in flu ên cia d o p o d e r ec o n ô m ic o o u o ab u so d o exercício de fu n ção, cargo o u e m p re g o n a a d m in is tra ç ã o d ire ta o u indireta. 165 ou d a harm onização refere-se a u m procedim ento de ponderação no qual não se atribui valor absoluto de u m valor a outro, tentando-se a aplicação sim ultânea e com patibilizada de norm as, ainda que haja um a atenuação de um a delas. Já com relação ao princípio d a proporcionalidade, José Joaquim Gomes Canotilho m enciona que tal princípio veta restrições desneces sárias, inúteis ou excessivas de direitos fundam entais. Segundo o m en cionado autor os direitos fundam entais apenas podem ser restringidos quando tal se torne indispensável, e no m ínim o necessário, para sal vaguardar outros direitos ou interesses constitucionalm ente protegi- dos.^^^ Destarte, a avaliação da constitucionalidade da norm a, à luz do principio da proporcionalidade, deve ser aferida com base nas seguin tes premissas: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito do ato legislativo. Para Willis Santiago G uerra Filho os subprincípios da adequa ção e da exigibilidade ou indispensabilidade determ inam que, dentro do faticam ente possível, o meio escolhido se preste p ara atingir o fim estabelecido, m ostrando-se, assim, “adequado” A inda mais, esse meio deve-se m ostrar “exigível”, o que significa não haver outro, igualmente eficaz, e m enos danoso a direitos fundamentais.^^' No que tange à terceira premissa, o autor afirma que o princípio da proporcionalidade em sentido estrito’ determ ina que se estabeleça um a correspondência entre o fim a ser alcançado p or um a disposição normativa e o meio empregado, que sejâ juridicamente a m elhor possível.” ^ N o caso, a previsão norm ativa apresenta-se adequada, um a vez que torna inelegível aquele cidadão cuja vida pregressa não se com pati biliza com o exercício de um cargo eletivo. Por outro lado, o disciplinam ento norm ativo que torna inelegí vel o condenado crim inalm ente p o r órgão colegiado, mas ainda sem 235 SARLET, In g o Wolfgang. Valor de A lçada e L im itação d o Acesso ao D u p lo G ra u d e lurisdição. Revista d a Ajuris 6 6 ,1 9 9 6 236 C A N O T IL H O , 1) G om es; M O R E IR A , Vital. F u n d a m en to s d a Cotjsütuição. C o im b ra ; C o im b ra , 1991, p, 134. 237 G U ER R A FILH O , W illis S. “O P rin cíp io d a P ro p o rc io n alid ad e e m D ireito C o n stitu c io n a l e e m D ire i to P riv ad o n o Brasil”, M u n d o Juridico, JO.05.2003,w w w . m u n d o j u n d i c o . a d v . b r / c g i - b i n / u p l o a d / t e x t o 3 4 7 . r t f - acesso em-.ló.maio.ZOlO 238 G U E R R A FILH O , W illis S. op.cit 166 trânsito em julgado, foi o meio encontrado pelo legislador de evitar que cidadãos com m áculas graves em seu passado venham a se to rn ar os representantes do povo e os adm inistradores de recursos públicos. Em virtude das características de nosso sistema judiciário, a espera pelo trânsito em julgado viabiliza que pessoas, m uitas vezes com inúm eras condenações por desvio de verbas ou até m esm o crimes graves como o trafico de drogas, venham a exercer m andatos eletivos, sendo suas cam panhas, inclusive, financiadas com dinheiro proveniente de tais práticas criminosas. Assim, a restrição à elegibilidade im posta pela n orm a apresentase necessária, com vistas a dar efetividade ao com ando constitucional descrito no §9® do art. 14 que transfere para a Lei C om plem entar a incum bência de estabelecer outros casos de inelegibilidade em que se considere a vida pregressa do candidato, visando preservar a m oralida de e probidade no exercício do mandato. A proposição apresenta-se proporcional a p artir do m om ento que os fins nela pretendidos justificam a utilização, com o parâm etro de aferição d a vida pregressa capaz de acarretar a inelegibilidade, da exis tência de condenação crim inal pela prática de determ inados crimes, que, em virtude de sua natureza, são incompatíveis com o exercício do m andato eletivo. A fim de robustecer os argum etos favoráveis à possibilidade de utilização da condenação crim inal com o ensejador da inelegibilidade de um cidadão, convém registrar que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência pacífica no sentido de que é legítimo o levantam ento da vida pregressa de candidato a cargo em concurso público, com o fator determ inante para a exclusão do cer tame. C om o exemplo, cito o Recurso Extraordinário n “ 233.303/CE^^'^, cuja relatoria foi do M inistro Menezes Direito, em que o Tribunal, u ti lizando precedentes da Corte, afastou a aplicação do art. 5®, LV da 239 Brasília, S u p rem o T rib u n a l Federal. RE 233.303, Rei. M in. M enezes D ireito, ju lg a m e n to , D /E de l°-0808. 240 A rt. 5° To do s são iguais p e ra n te a lei, .sem d istin ç ão de q u a lq u e r n a tu re z a, g a ra n tin d o -s e aos b rasilei ros e aos e stran geiro s residen tes n o País a inviolabilid ad e d o d ire ito à vida, à liberdade, à igualdade, à s eg uran ç a e à p ro p ried a d e , n o s te rm o s seguintes: (. ..) LV - aos litigantes, e m p ro c e ss o ju d ic ia i o u a d m in istra tiv o , e aos ac u s a d o s em geral são a sse g u ra d o s o c o n tra d itó rio e a m p la defesa, c o m o s m e io s e rec u rso s a ela in erentes; 167 Constituição Federal quando se trate de investigação sum ária sobre a vida pregressa para efeito de inscrição em concurso público, entendose não haver necessidade, sequer, de contraditório nessa sindicância. No mesm o sentido, o Superior Tribunal de Justiça, quando do julgam ento do AgRg no RMS 23819 RO 2007/0061793-4, considerou, explicitamente, que: “É constitucional e legal a elim inação de candidato a concurso público para ingresso n a carreira policial pela caracterização d e m á co nd uta n a investigação sum ária d a vida pregressa, sendo irrelevante posterior absolvição no juízo crim inal, ten do em vista o princípio d a incom unicabilidade das instâncias”^'^' Assim, verifica-se que os Tribunais Superiores pátrios adm item com o constitucionais os atos que excluem candidato em concurso p ú blico, em virtude de sua vida pregressa, m esm o quando inexistente qualquer condenação transitada em julgado, chancelando, inclusive, investigações sum árias com o form a de investigação social. Destarte, se a vida pregressa aferida em simples investigação su m ária pode ser m otivo im peditivo para o ingresso no serviço público, não há com o se dar tratam ento interpretativo diverso quando da ava liação dos requisitos necessários à investidura em cargo eletivo, que, igualmente, exige um a idoneidade m oral compatível com o exercício dessa atividade. Constata-se, inclusive, que, no caso das inelegibilidades, esses critérios de aferição da vida pregressa estão sendo estabelecidos o b jetivam ente através de Lei Complementar, assim com o determ ina a Constituição, garantido ao indivíduo conhecim ento prévio acerca dos requisitos. Não parece razoável adm itir tratam ento interpretativo diferen ciado para essas duas situações, sob o risco de chancelar a absurda h i pótese em que determ inado cidadão que responda a processos crim i nais é im pedido de concorrer em concurso público, podendo, contudo, se candidatar e ser eleito a qualquer cargo eletivo, inclusive ao cargo mais im portante de nossa estrutura política que é o de Presidente da República. 241 Brasília, S u p e rio r T rib u n a l d e Justiça. A g R g n o RMS 2 3 8 )9 R O 2007/0061793-4, R d . M in. A rn a ld o Esteves Lim a. DJe 15/06/2009 168 Assim, o conteúdo norm ativo proposto através da Lei Com ple m entar n° 135/2010, oriunda de projeto de iniciativa popular denom i nado “Ficha Limpa”, que se apresenta com o um instrum ento que expri me o clam or da sociedade para que sejam adotadas m edidas eficazes, capazes de excluir do cenário político indivíduos não com prom etidos com os princípios m orais e éticos, necessários ao exercício da função pública, apresenta-se compatível com a nossa estrutura constitucional, no tocante à conjuntura harm oniosa dos princípios da presunção de inocência, da m oralidade e da probidade adm inistrativa. 169 I 1i 170 REFLEXÕES D O U TRIN Á RIA S E JU R IS P R U D E N C U IS SOBRE O ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. J o sé A u g u s to D elg a d o ^ 1. IN TR O D U Ç Ã O A aplicação do princípio da m oralidade nos últim os anos, tem sido alvo de intensa preocupação do Poder Judiciário, a fim de fazer cum prir os propósitos inseridos expressamente, a seu respeito, na Constituição Federal, torn an do efetivo os anseios da cidadania no al cance desse valor. A inserção do princípio da m oralidade, de m odo explícito, na CF, com o revelam os arts. 37, caput^^\ $ 4**^'*'', LXXIIF'^^ 14, § rea242 M in istro d o STJ. D o u to r H o n o ris C au s a pe la U ER N . T itu la r d a C ad e ira n. I d a A cadem ia Brasileira d e D ire ito T rib u tá rio , se d ia d a em São Paulo. T itu la r da C a d e ira n. 19 d a A c ad e m ia Brasileira de Letras Juridicas, sed ia d a n o Rio d e Janeiro. P rofessor d e D ireito Público (A dm inistrativ o, T r ib u tá rio e P ro cessual Civil). Professor U F R N (a p o se n ta d o ). E x -p ro fesso r d a U n iv e rsid ad e C atólica d e Pern am bu co . Professor C o n v id a d o d o C u r s o d e E specialização e m D ire ito P rocessual Civil d o CEÜB-DF. Sócio H o n o rá rio d a A c ad e m ia Brasileira d e D ire ito T rib utário . Sócio B en e m é rito d o In s titu to N acio nal de D ire ito Público. C o n se lh e iro C o n su ltiv o d o C o n se lh o N acio nal das In stitu içõ es d e M ed ia ç ã o e A rb i tra g e m . In te g ra n te d o G r u p o B rasileiro d a S o ciedad e In te rn a c io n a l d o D ire ito P e n a l M ilitar e D ireito H u m a n itá rio . Sócio H o n o rá rio d o In s titu to B rasileiro d e E stud os Jurídicos. Sócio d a A sso ciação B ra sileira de D ireito Tribu tário. 243 A rt. 37. A ad m in istra ç ão pública d ire ta e ind ireta de q u a lq u e r d o s Poderes d a União, d o s Estados, do D istrito Federal e d o s M unicípios o be d ec e rá aos prin cíp io s d e legalidade, im pessoalidade, m oralidade, pub licid ade e eficiência e, ta m b é m , ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 19, de 1998) 244 A rt. 37. A a d m in is tra ç ã o pú blic a d ire ta e in d ire ta d e q u a lq u e r d o s Po deres d a U nião, d o s Estados, d o D istrito Federal e do s M u nicípios o b e d ec e rá aos prin c íp io s d e legalidade, im p e sso a lid a d e , m o ra lid a d e , p u b lic id a d e e eficiência e, ta m b é m , ao seguinte: (R edação dada pela Em enda Constitucional n° 19, de 1998) § 4" - O s atos de im p r o b id a d e a d m in is tra tiv a im p o r ta r ã o a su sp e n sã o do s d ireitos políticos, a p e rd a da fu n ç ã o pública, a in d isp o n ib ilid a d e d o s b e n s e o re ssa rc im e n to ao erário , na fo rm a e g ra d a ç ã o previstas e m lei, sem preju ízo d a a ção pe n al cabível. 245 A rt. 5'= Todos são iguais p e ra n te a lei, sem d istin ç ão d e q u a lq u e r na tu re z a, g a ra n tin d o -s e aos b rasilei ros e aos e strang eiros residen tes n o País a inviolabilid ad e d o d ire ito à vid a , à lib e rd a d e , à igu ald ade, à s e g u ran ç a e à p ro p rie d a d e , n o s te rm o s seguintes: LXXIU - q u a lq u e r c id a d ã o é p a rte le g itim a p a ra p r o p o r a ção p o p u la r q u e vise a a n u la r ato lesivo ao p a trim ô n io p ú b lic o o u d e e n tid a d e d e q u e o E sta d o particip e, à m o ra lid a d e a d m in istra tiv a , a o m eio a m b ie n te e a o p a trim ô n io h istó ric o e cu ltu ra l, ficando o autor, salvo c o m p ro v a d a m á-fé, isento de c ustas jud iciais e d o ô n u s d a sucu m b ê n c ia ; 246 A rt. 14. A so b e ra n ia p o p u la r será exercida pelo sufrágio universal e pelo v oto d ire to e secreto, c o m va lo r igual p a ra to d o s , e. no s te rm o s d a lei, mediante-, § 9° Lei c o m p le m e n ta r estabelecerá o u tro s casos de inelegjbilidade e os p razos de su a cessação, a fim de pro te g e r a p ro b id a d e ad m in istra tiv a , a m o ra lid a d e p a ra exercício d e m a n d a to c o n s id e ra d a v id a p regressa d o c an d id ato , e a n o rm a lid a d e e legitim idade das eleições c o n tra a in ílu é n c ia d o p o d e r e c o n ô m ic o o u o ab u so d o exercício de fun ção, cargo o u em - 171 briu os debates referentes à repercussão da ética e da m oral na prática das relações jurídicas, com destaque para as de natureza eleitoral. Em face desse novo panoram a principiológico, a eficácia e a efe tividade da m oralidade estão sendo exigidas com o m áxim o de inten sidade n o âm bito dos fenôm enos eleitorais^ a com eçar com a postura a ser adotada pelos candidatos a cargos eletivos. A busca de ser im posto respeito absoluto ao princípio da m o ra lidade pelos atores do processo eleitoral não tem ficado circunscrita a simples debate de natureza filosófica, circulando p o r aspectos m etafí sicos. O contrário tem acontecido. H á um a m ovim entação crescente no sentido de ser cristalizada um a conscientização de ser de grande valia para o aperfeiçoam ento do regime dem ocrático a exigência de um com portam ento rigorosam ente lícito p or parte dos que fazem a opção de se subm eterem ao julgam ento dos eleitores para representá-los nas atividades estatais executivas e legislativas. A história do direito está a dem onstrar que a adoção da moralida de como regra de conduta a ser exercida pelos agentes públicos surgiu na França, em decorrência da ampliação da teoria do desvio do poder, nos meados do século XIX. A aceitação imediata da idéia de ser combatido o desvio de poder pela autoridade pública, conduziu Maurice Hauriou, juris ta francês, no início do século XX, a defender a moralidade como princípio fundamental a nortear qualquer tipo de relação entre o ser humano e o Estado.A previsibilidade do princípio da moralidade, de forma expressa e autônoma, na Constituição Federal, reforçou o entendimento de que, qualquer atividade voltada para realizar fins estatais só alcança aperfeiçoa mento se for prestigiada pelo cumprimento das regras morais que lhe são impostas e vinculação à disciplina legislativa que lhe diz respeito. Esse panoram a im põe obrigatoriedade ao Poder Judiciário de examinar, do m odo m ais am plo possível, a conduta do agente que se candidate a qualquer cargo eletivo, a fim de verificar se a sua eleição p ara integrar o Poder Executivo ou Legislativo ocorreu de conform ida de com os postulados dem ocráticos, especialmente, os que consagrem o respeito à dignidade hum ana, ao valor da liberdade do voto, à legali dade e igualdade. pre g o n a a d m in is tra ç ã o d ire ta o u ind ireta. (R ed ação d a d a pe la E m e n d a C o n stitu c io n a l d e R evisão n “ 4, d e ] 994) 172 No círculo dessas idéias a serem seguidas pelo Poder Judiciário, deve ser firm ado o entendim ento de que a carga valorativa a ser presti giada nas relações jurídicas eleitorais, p o r influência das circunstâncias que estão presentes na situação em análise, deve ser a m oral legitimada pelo próprio Direito, isto é, a que esteja contida na coerçâo de um a norm a reconhecida com o existência, válida, eficaz, efetiva e harm ônica com os desígnios da Constituição Federal. O conceito de m oralidade adm inistrativa pregado p o r Hely Lo pes Meirelles, serve, sem qualquer alteração, p ara se com preender esse im portante valor a ser seguido nos fenôm enos jurídicos eleitorais. Hely Lopes Meirelles, sintetizando o afirm ado p o r M aurice Hauriou, considerado o principal sistem atizador da teoria da m oralidade adm inistrativa, apregoa que “a m oralidade adm inistrativa constitui hoje em dia, pressuposto da validade de to d o ato d a A dm inistração Pública (art. 37, caput, da CP). N ão se trata, diz H auriou, o sistem atizador de tal conceito - d a m oral com um , mas sim de um a m oral jurídica, entendida com o o conjunto de regas de co nd uta tiradas da disciplina interior da adm inistração’. D esenvolvendo a sua d outrina, explica o m esm o autor que o agente adm inistrativo, com o ser h u m a n o d o ta d o d a capacidade de atuar, deve, necessariam ente, distinguir o Bem d o Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não p o d erá desprezar o elem ento ético de sua conduta. Assim, não te rá que decidir som ente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o o p o rtu n o e o in op ortu no , mas tam bém entre o h onesto e o desonesto. Por considerações de direito e de m oral, o ato adm inistrativo não terá que obedecer som ente à lei jurídica, m as ta m b ém a lei ética da pró pria instituição, po rqu e nem tu d o que é legal é honesto, conform e já proclam avam os rom anos - non om inae quod licet ho n estu m est. A m oral com um , rem o ta H auriou, é im posta ao h o m em para a sua con du ta externa, a m oral adm inistrativa é im posta ao agente público para a sua co n d u ta interna, segundo as exigências da instituição a que serve, e a finalidade de sua ação: o b em com um ”. Conclui Hely Lopes: “O C erto é que a m oralidade do ato adm inistrativo, ju n tam e n te com a sua legalidade e finalidade, constituem pressupostos de validade, sem os quais to da atividade 173 pública será ilegítima. (Direito A dm inistrativo Brasileiro, 15® ed., São Paulo, RT, 1990, p. 79/80) Registramos, encerrando essa fase introdutória de conceituaçào do princípio da m oralidade, as precisas observações feitas p o r Juarez Freitas, sobre a autonom ia, em nosso ordenam ento jurídico, do prin cí pio da m oralidade. Assevera o autor citado: “N o tangente ao princípio da m oralidade, p o r mais que tentem assímíIá-Io a outras diretrizes e conquanto exp erim entando p ro nu nciad a afinidade com todos os dem ais princípios, certo é que o constituinte brasileiro, com todas as im ensas e profundíssim as conseqüências técnicas e herm enêuticas que deles advêm, pretendem conferir autono m ia jurídica ao principio d a m oralidade, ao qual veda condutas eticam ente inaceitáveis e transgressoras ao senso m oral da sociedade, a p o n to de não co m portarem condescendência. De certo m odo, tal princípio p o d erá ser identificado com o d a justiça d eterm in a r que se trate a outrem do m esm o m o d o que se apreciaria ser tratado. O outro, aqui, é a sociedade inteira, m otivo pelo qual o princípio da m oralidade exige que, fu n d am en tad a e racionalm ente, os atos, contratos e p rocedim en to s adm inistrativos v en h am a ser contem plados à luz da orientação decisiva e substancial, que prescreve o dever de a A dm inistração Pública observar, com pro nu nciado rigor e a m aior objetividade possível, as referências v ahrativas basilares vigentes, cu m prin do , de m aneira precípua até, proteger e vivificar, exem plarm ente, a lealdade, e a boa-fé para com a sociedade, b em com o travar o com bate co ntra toda e qualquer lesão m o ral provocada p o r ações públicas destituídas de probidade e h o n rad ez”. (O C ontrole dos Atos A dm inistrativos e os P rincípios Fundam entais, SR, M alheiros, 1997, pp. 67/68). A obediência ao princípio da m oralidade, em qualquer tipo de relação jurídica, torna-se essencial a “concreção e persistência do Estado de D ireito ou do Estado Social e D em ocrático de Direito, en ten dido este com o aprim o ram en to daquele e n ão com o categoria distinta” (W eida Zancaner, Prof. Dir. A dm inistrativo d a PU C / SP, Assessora Jurídica do T ribunal de C ontas do Estado de São Paulo) em “Razoabilidade e m oralidade: Princípios C oncretizadores do Perfil Constitucional do Estado Social e D em ocrático de Direito”, pub. hupi/zw-ww, d irc ito p u b iico -c o m .b r, acessado em 2 1 . 0 8 . 0 7 ) . 174 2 - ASPECTOS HISTÓRICOS DO ART. 41-A DA LEI N. 9.504, DE 1997. A crescente conscientização da sociedade em ser obedecido o princípio da m oralidade nas relações jurídicas de qualquer natureza, motivou, em face do grave explícito com portam ento do voto para a eleição de candidatos aos cargos do Executivo e do Legislativo, em m ui tas oportunidades, ser trocado p or dinheiro, cestas-básicas, m edica m entos, prestação de serviços médicos e outras vantagens, o surgim en to de u m a cam panha nacional para com bater esse tipo de concepção eleitoral. Esse m ovim ento coordenado pela OAB, AMB, HABI, CUT, C o n federação dos Bispos e outras entidades associativas, após ter identi ficado a inexistência de legislação específica p u nind o esse atentado à dem ocracia e à m oralidade eleitoral, form ulou um projeto de iniciativa popular, apoiado no art. 61, § 2°,da CF, com mais de 1 m ilhão de assi naturas, que, ao ser apresentado no Congresso Nacional, e seguindo os seus trâm ites legais, resultou na Lei Federal de n. 9.840, de 28.09.1999, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 9.504, de 30.09.1997, com a seguin te redação: Art. 41-A - Ressalvado o disposto no art, 26 e sem incisos, constitui captação de sufrágio, vedado p o r esta lei, o candidato doar, oferecer, prom eter, ou entregar, ao eleitor, com fim de obter-lhe voto, bem ou vantagem pessoal d e q ualquer natureza, inclusive em prego ou função pública, desde o registro da can did atura até o dia da eleição, inclusive, sob p en a de m ulta de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diplom a, observado o pro ced im en to previsto no art. 22 da Lei C om p lem entar n. 64, de 18 de m aio de 1990. O referido dispositivo legal passou, conseqüentem ente, a vigo rar, em toda a sua plenitude, sem determ inar conflito, com o art. 299 do Código Eleitoral. Este regram ento considera crim e eleitoral a ação de doar, oferecer e prom eter vantagem de qualquer natureza ao eleitor, para conseguir o seu voto. Temos, portanto, o ato de doar, oferecer ou prom eter qualquer vantagem para o fim de ser beneficiado pelo voto, com o determ inante da possibilidade do candidato ser punido tanto na esfera eleitoral pe- 175 nal, com o na esfera eleitoral cível. Nesta, são severas as punições: m ulta e cassação do registro da candidatura ou do diplom a concedido. O art. 41-A, introduzido na Lei n. 9.504, de 1997, em 1999, pela Lei n, 9.840, de 28.09.99, veio ao encontro da vontade da sociedade de testem unhar, de m odo rígido, a punição dos candidatos autores de ilí citos eleitorais, especialmente, o de com pra de voto ou votos, regra que cabe à Justiça Eleitoral zelar pelo seu integral cum prim ento. O art. 41-A introduzido pela Lei n° 9.840, de 22.09.90, na Lei n. 9.504, de 30.09.97,encerrou um ciclo de mais de 500 anos onde se con viveu com precário sistema eleitoral, com características identificados p o r M órton Jacinto Reis, Juiz de Direito, em excelente artigo intitulado “M ercadores de Votos, cerca-igrejas e cacetistas ( http://jus 2 .uoi.c om.br/c ioutrina/texio.asp^id=5324), que, pclas boas idéias nele contido, transcrevem os de m odo integral: “P or m ais d e 500 anos, u m precário D ireito Eleitoral vem teim ando em ten tar provar aos brasileiros que dem ocracia é assunto sério dem ais para que dele possam cuidar as pessoas do povo. E ntre a C olônia e a P rim eira República o país conviveu com o den o m in ad o “sistem a de veriAcação de poderes”, p o r m eio do qual o processo eleitoral era presidido pelos m em bros d o Parlam ento. Os m étodos de seleção dos m andatários, até então, com binavam leis injustas (com o a Lei do Terço, de 1875, que fixava a antecipadam ente a proporção das vagas a serem ocupadas pela oposição, e a Lei Rosa e Silva, de 1904, que autorizava o ‘Voto a descoberto”) com falsificações, abusos e violência. São daquela época as “eleições a bico d e pena” on de q u em de fato escolhia os novos m andatários n ão eram os eleitores, m as os m esários que, sozinhos o u com o concurso d e falsários profissionais, elaboravam as atas reveladoras do “resultado” d a eleição. Era com um o voto dos m ortos e daqueles que não mais residiam na vila. Por séculos não votaram as mulheres, os negros, os m endigos e os analfabetos. Em certa época, os eleitores de oposição eram esperados à boca das urnas por agressores mercenários, conhecidos, conform e a região, com o “capoeiras”, “capangas” ou “cacetistas”. A violência que p ro m o 176 viam não raro evoluía para as punhaladas e tiros de bacamarte. Costa Porto nos lem bra que o ano de 1840, no Rio de Janeiro, entrou para a história como aquele em que se deram as “eleições do cacete”. Ainda no Império, a certa altura, definiu-se que as votações pas sariam a ocorrer dentro dos tem plos católicos, para sensibilizar ou inti m idar a capangagem. No Ceará, ficaram conhecidos com o “cerca-igrejas” as hordas que, sob paga dos coronéis, invadiam os templos e faziam uso das próprias imagens e castiçais para arrebentar a cabeça dos que tentassem exercer o direito de voto. Se m esm o após a utilização de alguns ou de todos esses m eca nism os o resultado eleitoral não fosse o esperado, restavam outras al ternativas: aos da situação, cuja eleição tão esperada não sobreviera, aplicava-se o “esguicho” (ou com plem entação fraudulenta da votação faltante); aos oposicionistas mais indesejáveis restava a “degola” (ou a p u ra e simples retirada de seus nom es da lista dos eleitos). Não sem m uitas baixas (o com bate à fraude eleitoral era um a das principais bandeiras de m uitos dos m ovim entos contestatórios da dé cada de 20 e da própria Revolução de 30), surgiu o Código Eleitoral de 1932 e, com ele, a Justiça Eleitoral. Desde então conseguimos, entre ditaduras e leis eleitorais casuísticas excludentes, trilhar alguns passos ru m o ao m om ento atual, em que sobrepaira a possibilidade de um a m elhor definição dos rum os de nossa democracia. Bem recentem ente surgiram algumas novidades. Juntas, a nova Lei dos Partidos Políticos (1995), a Lei das Eleições editada em 1997 (que dotou as norm as eleitorais de m aior estabilidade) e a universali zação d a coleta eletrônica do voto superaram , apesar de suas im perfei ções, as mais graves m áculas do passado do nosso Direito Eleitoral. Descrentes da possibilidade de burlar o resultado m atem ático da votação, os candidatos voltaram todas as suas energias à prática da mercancia eleitoral. Os “cerca-igrejas” e “cacetistas” m odernos não mais distribuem porretadas e punhaladas, mas dentaduras, chinelos, filtros, promessas de empregos e funções públicas, lotes, telhas, tijolos, areia e dinheiro. Tudo em porciúnculas cuidadosam ente definidas, de m odo que em nada se possa alterar a sorte daqueles que, na próxim a eleição, terão 177 que novam ente bater à porta dos seus “benfeitores”. A motivação e a violência são as mesmas, as armas, todavia, m udaram . Um grande passo foi dado, em 1999, contra esta forma de agressão eleitoral, por meio da aprovação do prim eiro projeto de lei de iniciativa popular da história do Brasil: a Lei n° 9.840, de 28 de setembro de 1999. Nos quatro primeiros anos de sua aplicação cento e vinte de candidatos a vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal e senador viram contra si proferidas sentenças em que se reconhecia a prática da captação ilícita de sufrágio (denominação legal da “com pra de votos”). Desse total aproximadamente 80% foram já foram afastados dos cargos. Curiosam ente, às vésperas de novas Eleições Municipais, surgem agora no Senado Federal projetos voltados a to rnar ineficaz a lei prove niente da mobilização de mais de um m ilhão de brasileiros. A principal finalidade dos projetos é evitar a pronta execução das decisões judiciais que aplicam a m edida de cassação do registro ou do diploma. A rgum entam os seus defensores que a eficácia im ediata das sen tenças e acórdãos, hoje expressamente adm itida pelo TSE, afronta os princípios constitucionais da “segurança jurídica” e da “presunção de inocência”. Tais afrontas, no entanto, inexistem. A lei afronta a coisa ju l gada, o direito adquirido ou o ato jurídico perfeito. Também não coíbe o exercício do direito de defesa ou o m anejo de qualquer recurso. Tam pouco cuida de m atéria penal, a cujos específicos lindes a Constituição voltou o prim ado da inocência presum ida. Em lugar de buscar as lições dos grandes constitucionalistas b ra sileiros que estudaram tais princípios, os apressados defensores dessa alteração passaram a repeti-los e a levantá-los com o bandeiras de sua batalha injusta. Esquecem da necessidade de proteção ao princípio da igualdade e de que vivemos nu m Estado que se proclam a dem ocrático e de Direito, o que significa, dentre tantas outras coisas, que os candi datos devem agir conform e as leis n a busca dos m andatos almejados. Todos sabem os que a exigência do trânsito em julgado nas de cisões da Justiça Eleitoral sempre ensejou a interposição sucessiva e protelatória de recursos, perm itindo que os m andatos se cum prissem em sua inteireza antes da superveniência do esgotamento das vias impugnativas. 178 Os projetos que visam à m utilação da lei de iniciativa popular bem lem bram o “esguicho” da República Velha, naquilo em que p e r m item o exercício do m andato p o r quem não logrou legitimam ente alcançá-lo. Aos honestos e aos despossuídos, restará a nova Megola”, decorrente da preponderância daqueles que, não fosse o am or ao ilícito, jamais seriam eleitos para ocupar cargo algum”. A evolução dos entendim entos para a aprovação do art. 41-A e, conseqüentem ente, a sua introdução na Lei n. 9.504, de 30.09.1997, foi detectada p o r M arlusse Pestana Daher, Prom otora de Justiça no Estado do Espírito Santo, conform e descreve n o artigo “Lei 9.840/99 - eleições m unicipais e corrupção eleitoral” (http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1531). Destacamos, do referido artigo, o trecho seguinte; “D epois de m uitas articulações, coligações e outras iniciativas necessárias, foi deflagrado o processo sucessório, p o d e ser reeleição, dos atuais detentores do p o d er nos m unicípios d a terra d o Brasil. Neste ano, com particu lar característica, já que, agora, d ispo m os de u m a lei capaz de coibir os abusos e absurdos que invariavelmente, v in ham acontecendo em tem po de eleição, favorecidos pela falta de um m eio eficaz e inibidor de tais desatinos. Para que a lei valha, faz-se necessário qu e o m ilhão de signatários do projeto que a fez surgir, continue mobilizado, sentindo-se enriquecido pelas adesões posteriores e pela efetiva vontade que a todos nos possui de p o r u m basta àqueles desm andos, facilitados pelo dinheiro, nem sem pre limpo, de qu em tem , o que possibilita o assalto ou a chegada ao poder, p o r parte d e pessoas desqualificadas, despreparadas e que nunca deveriam conquistá-lo, porqu e no seu exercício, jamais se lem bram que exercer u m m an d ato político não é sobrepor-se aos concidadãos, m as estar a serviço deles. N ão p ode ser ensejo de auto prom oção. Pela C onstituição cidadã, é reconhecido aos cidadãos brasileiros, o direito de apresentarem tanto em âm bito nacional, com o m unicipal, projeto de iniciativa popular, um direito político, ao lado do plebiscito e do referendo, É exercido na form a da lei, m ediante apresentação à C âm ara dos D ep utado s com subscrição m ínim a, de um p o r cento d o eleitorado nacional, distribuído pelo m enos p o r cinco Estados, com n ão m en os d e três décim os po r cento dos eleitores de cada u m deles. Passaram -se quase 179 onze anos da prom ulgação constitucional para surgir a Lei 9.840 de 28 de setem bro de 1999, com o resultado do prim eiro projeto de iniciativa po p u lar em nosso país, apresentado ao Congresso N acional em 10 de agosto do m esm o ano. Modifica alguns dispositivos d a Lei 9.504, de 30 de setem bro de 1997 que disciplina sobre as eleições para os diferentes m andatos políticos d e V ereador a d e P residente da República e fixa o prim eiro d om ingo de o utubro do ano respectivo para sua realização. Altera dispositivos do Código Eleitoral, a lei 4.737 de 15 de ju lh o de 1965. C om algum as em endas im pressas pelos congressistas, as quais co ntudo não chegaram a desn ortear os objetivos iniciais propostos, foi v otado em tem po recorde. A presentar em endas é faculdade que lhes assiste. O Estado do Espírito Santo p articipo u com 53.144 assinaturas, ficou atrás apenas de M inas Gerais, do Paraná e d e São Paulo, o que nos autoriza a dizer que proporcionalm ente ao n ú m e ro de eleitores, ficamos em prim eiro lugar. Foi a C om issão Brasileira de Justiça e Paz que considerando que dois terços d a nossa população vive em absoluta carência, qu an to m ais d e consciência política; que nesta faixa, p o r tais razões a com pra de votos é facilitada, chegando a ser decisiva n u m a eleição, o que é nefasto e prejudicial à dem ocracia; que depois de pesquisa a nível nacional, de audiências públicas e outras mobilizações, sentiu ainda mais, a gravidade do fato. Por isto em fevereiro de 1997, fez lançam ento de um projeto: “C o m baten do a corrupção eleitoral” e de certa form a, dava continuidade a C a m p a n h a d a Fraternidade de 1996, cujo tem a foi “F raternidade e Política". E co m o form a concreta d e alcançar u m m eio do qual se valer em tal com bate, pela expressividade e pela força de que se revestiria, p en so u no projeto de iniciativa popular. N ão ta rd o u para que a idéia atraísse m uitas atenções. C om preendia-se que algo de m uita im portância estava p o r acontecer. N em é que a corrupção eleitoral já não fosse tipificada com o crim e no seu Código. Mas é q u e a famosa lentidão d a justiça, decorrente até das m anhas a que está sujeita u m a tram itação processual, facilitava a im punidade. Im p u n h a-se p o r conseguinte o surgim ento de u m a nova lei que agisse de imediato. Para a redação do respectivo projeto foi form ado um G rup o de T rabalho que veio a ser presidido pelo D r Aristides Junqueira Alvarenga, ex-P rocu rado r G eral da República, qu e foi q u em o apresentou na Assembléia G eral dos Bispos Brasileiros. Era form ado ainda pelo Dr. D yrceu A guiar Dias C intra Jr., ex-juiz Eleitoral em 180 São Paulo e pelo D r. José G erim Cavalcanti, P rocurador Regional Eleitoral do Estado do Ceará. C om a conquista da Lei, em pen ha-se a Com issão Brasileira de Justiça e Paz apoiada pela Conferência N acional dos Bispos d o Brasil em fazer valer o que nela está previsto. Neste sentido, nos dias que correm , h á um a grand e m obilização nacional, envolvendo as Com issões de Justiça e Paz em cada Estado, nas A rquidioceses e Dioceses. C om o in stru m en to de divulgação, foi editado u m livreto - publicado pelas Edições Paulinas, cujo título é VAMOS ACABAR COM A CORRUPÇÃO ELEITORAL, m ediante u m lema; VOTO NÃO TEM PREÇO, TEM CONSEQÜÊNCIAS. Redigido com clareza e precisão con tém inclusive m odelos das iniciativas que p o d em ser tom adas p o r quem a lei faculta. Além disto, disponibilizou m uitas outras inform ações na sua página na in tern et (www.cbpj.org.br). Pela nova Lei oco rreram duas inovações, a p rim eira é n o sentido de que o candidato que de qualquer forma ou usando de qualquer artifício estiver comprando votos, além de receber a p en a já prevista no código, com a tram itação do processo penal tradicional, terá mediante um procedimento sumário, seu registro cassado e ainda pagará uma multa. A outra, inibe o uso da máquina administrativa em favor da própria candid atura o que vai suceder com prefeitos candidatos à reeleição principalm ente, pelo fato de pod erem concorrer, sem ter que deixar o cargo. Temos dito que m ais do que de D em ocracia, im porta falar em Cidadãos. Se existirem estes, aquela virá com o conseqüência. Q ualquer cidadão brasileiro, qualificando-se, m encion an do o nú m ero do seu título de eleitor, poderá proceder à representação da conduta do candidato ao P rom o to r Eleitoral da respectiva zona. Ao Prom otor, com pete representar o infrator ju n to ã Justiça Eleitoral, mais precisam ente ao Juiz Eleitoral, cujas funções na respectiva circunscriçâo correspondem as do C orregedor-G eral ou Regional m en cio nado n a lei. Assim que to m ar conhecim ento das reclam ações que lhe forem feitas verbalm ente ou por escrito, o Juiz deve reduzi-las a term o e determ in a r as providências que cada caso exigir. A lém do P ro m o to r p o d em exercer a m esm a faculdade, os p artid o s políticos, as coligações e m esm o quem for candidato. Caso o Juiz retarde a decisão p o d erá haver representação direta ao Tribunal Regional Eleitoral que resolverá em 24 (vinte e quatro) horas. 181 Se quiserm os, po dem o s m u d a r o curso d a história que vem sendo escrita n o p erío d o que antecede as eleições no Brasil, suas conseqüências se estendem além dos quatro anos dos m and ato s dos que os conquistam desonestam ente. Q u e decidam os extirpar do cenário político os que galgam tais m andatos, valendo-se d a carência dos m ilhares de eleitores sem condição de bem discernir, até pela fome, m ed ian te com pra do seu voto. Tom ara que não retardem os por mais qu atro anos os resultados e as conquistas que o advento dessa lei nos traz, que nin gu ém ven d a seu voto, que n in gu ém se cale a vista do uso d a m á q u in a adm inistrativa e não só denuncie, m as acom panhe a efetiva punição do transgressor. E starem os e n c u rtan d o o tem po que nos separa d a aurora de um dia com m eno s exclusão, com m enos excluídos” 3 - INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DO ART. 41-A DA LEI 9.504, DE 30.09.1997, PELO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. O Tribunal Superior Eleitoral, no exercício de sua com petência constitucional, quando provocado, vem interpretando e aplicando o art. 41-A inserido na Lei n. 95.04, de 30.09.1997, de m odo que os seus propósitos produzam os mais intensos efeitos de eficácia e efetividade. C om o objetivo de ser apresentada u m a visualização mais ampla possível do posicionam ento do TSE sobre o tema, passamos a registrar, em form a de enunciados, dezenas de precedentes jurisprudenciais. Eilos: E nunciado 1. Inexiste conexão entre a ação de im pugnação de m and ato eletivo com base no art. 41-A d a Lei n® 9.504/97 e ação penal p o r infração ao art. 299 do Código Eleitoral (corrupção eleitoral), m esm o que os fatos sejam idênticos (AC n. 3.949, de 15.04.2003 e AC n. 21.137, de 08.04.2003). Enunciado 2. A doação de cestas básicas com prom essa de voto constitui captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97) A córdão no RO n. 907, de 17.08.2006). E nunciado 3. Dar, oferecer, prom eter, solicitar ou receber, para si ou para outrem , dinheiro, dádiva ou qualquer 182 ou tra vantagem , para si ou para outrem , par ao fim de conseguir ou p ro m eter abstenção configura a infração prevista no art. 41-A, p o r interpretação analógica (AgRg M C n . 1.850, de 3.8.2006). E nunciado 4. O oferecim ento de carteira de habilitação em tro ca de votos configura o delito do art. 41-A da Lei n. 9.504/97 (RO n. 777, de 6.4.2006). E nunciado 5. Verificado u m dos núcleos do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, doar, oferecer, pro m eter ou entregar ao eleitor b em ou vantagem pessoal de qualquer natureza no p erío d o com p reend id o do registro da can didatura até o dia da eleição, inclusive, presum e-se o objetivo de obter voto, sen do desnecessária a prova visando a d em on strar tal resultado. P resum e-se o que no rm alm en te ocorre, sendo excepcional a solidariedade no cam po econômico, a filantropia. (Resp n. 25146, de 7.3.2006, rei. Min. Marco Aurélio). E nunciado 6. As prom essas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e provados, não são capazes de atrair a incidência do art. 41-A da Lei n. 9.504/97 (Prom essa de pavim entação de via pública sem pagam ento de contribuição pelos m oradores) (AC n° 5.498, de 11.9.2005), rei. M in. G ilm ar Mendes). E nunciado 7. Para a caracterização d a infração ao art. 41-A d a Lei das Eleições, é desnecessária que o ato de com p ra de votos ten h a sido praticado diretam ente pelo candidato, m o stran do-se suficiente que, evidenciado o benefício, haja participado de q ualquer form a ou com ele consentido. (A córdão n. 21.264, A córdão n. 21.792, de 15.9.2005, Rei. M in. C aputo Bastos) (Caso: D istribuição de p on to s de luz). E nunciado 8. C onfigura a captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97) a m anutenção, período eleitoral, de cu rsinh o pré-vestibular gratuito e outras benesses, às vésperas d a eleição, p o r revelar o intuito do candidato em obter votos, pois, para a caracterização da con du ta ilícita é desnecessário o pedido explícito de votos, b astan do a anuência do candidato e a evidência do especial fim de agir. (Ac. N. 773, de 24.8.2004, rei. Min. Carlos Velloso). E nunciado 9. A configuração do ilícito inscrito no art. 41-A d a Lei n. 9.504/97, conform e a Lei n. 9.840/99, não exige a aferição da potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral (AC n. 21.264, de 27.4.2004). 183 E nunciado 10. A alegação de dem issão de servidores que não apoiassem determ in ad o candidato e nom eação de outros que fossem sim patizantes d a candidatura, sem prova de que o candidato p o r si ora p o r terceiro tenha praticada essa ação com p edido de voto, não configura a infração do art. 41-A da Lei n. 9.504/97 (AC n. 704, de 8.4.2003). E nunciado 11 - “(...) II - C aptação ilícita de sufrágios (Lei no 9.504/97, art. 41-A): não- caracterização. N ão configura a captação ilícita de sufrágios, objeto do art.41-A da Lei n o 9.504/97, o fato, d o cu m en tad o no ‘protocolo de intençõesquestionado no caso, firm ado entre os representantes de diversas igrejas d e d eterm in ado m unicípio - travestidos de m em b ro s do conselho ético de um p artid o político - e certos candidatos a prefeito e vice-prefeito, que form alm ente se com prom etem , se eleitos, ao atend im en to de reivindicações im putadas à com un id ade evangélica’ e explicitadas no instrum ento, entre elas, a doação de u m imóvel do patrim ô nio m unicipal, se não voltadas as prom essas a satisfazer interesses patrim oniais privados.” (Ac. no 19.176, de 16.10.2001, rei. M in. Sepúlveda Pertence.) Enunciado. 12 - N ão configura co nd uta vedada pelo art. 41-A da Lei n o 9.504/97 prom essa de cam p an ha no sentido de m a n ter p ro gram a m unicipal de benefícios. Recurso conhecido e provido." (Ac. no 2.790, de 8.5.2001, rei. M in. Fernando Neves. E nunciado 13 - N a linha d a ju rispru dên cia desta Corte, estando com provado que houve captação vedada de sufrágio, não é necessário estejam identificados no m in alm ente os eleitores que receberam a benesse em troca de voto, bastando para a caracterização do ilícito a solicitação do voto e a prom essa o u entrega d e b em ou vantagem pessoal de qualquer natureza. (...)” (Ac. de 16.2.2006 no REspe no 25.256, rei M in. Cesar Asfor Rocha.) E nunciado 14 - A caracterização d a captação ilícita de sufrágio requer qu e a oferta ou prom essa de entrega de benefício o co rra desde o registro da cand idatu ra até o dia da eleição. (...)” (Ac. de 29.6.2006 no AgRgREspe no 25.795, rei. Min. Caputo Bastos.) 184 E nunciado 1 5 - 0 term o inicial do p erío d o de incidência da regra do art. 4 1- A d a Lei no 9.504, de 1997, é a data em que o registro da can didatura é requerido, e não a do seu deferim ento. 2. Para a caracterização de con du ta descrita no art. 41-A da Lei no 9.504, de 1997, é im prescindível a d em onstração de que ela foi praticada com o fim de obter o voto do eleitor.” NE: D oação pelo prefeito, précandidato à reeleição, de 4 tíquetes-refeição a um eleitor e solicitação à co m p an h ia de água e esgoto para não suspender o fornecim ento ao m esm o eleitor. Ausência de com provação d a finalidade de obtenção de voto. (Ac. no 19.229, de 15.2.2001, rei. M in. Fernando Neves.) E nunciado 16 - Configura captação ilícita de votos, glosada no art. 41-A da Lei no 9.504/97, a m anutenção de curso gratuito com entrega de m aterial contendo propaganda eleitoral.” Ac. no 882, de 24.5.2005, rei. M in. Marco Aurélio.) E nunciado 17 - Para a configuração do ilícito previsto no referido art. 41-A, não é necessária a aferição d a potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral, p orq u an to a proibição de captação de sufrágio visa resguardar a livre vontade do eleitor e não a n o rm alid ad e e equilíbrio do pleito, nos term os da pacífica jurisp rud ência desta C o rte (A córdão no 3.510).” (Ac. no 21.248, de 3.6.2003, rei. M in. Fernando Neves.) E nunciado 18 - A decisão que julgar procedente representação p o r captação de sufrágio ved ada por lei, com base no art. 41-A d a Lei no 9.504/97, deve ter cu m prim ento im ediato, cassando o registro ou o diplom a, se já expedido, sem que haja necessidade da interposição de recurso contra a expedição de diplom a ou de ação de im pugnação de m an d ato eletivo.” NE: “(--) no caso de captação de votos vedada p o r lei, não há que se indagar sobre a potencialidade de o fato influir no resultado da eleição (...).” (Ac. no 19.739, de 13.8.2002 , rei. M in. Fernando Neves.) E nunciado 19 - N o art. 41-A da Lei no 9.504/97, o bem protegido não é o resultado d a eleição, e sim a vontade do eleitor, n ão havendo que falar-se em potencialidade para influir no resultado da eleição. (Ac. no 19.553, de 21.3.2002, rei. M in. Sepülveda Pertence.) E nunciado 20 - A caracterização d a captação ilícita de sufrágio h á de ser d em o n strad a m ed ian te prova robusta de que o beneficiário praticou ou anu iu com prática das 185 condutas descritas n o art. 41-A da Lei no 9.504/97. (...)” (Ac. de 31.10.2006 no AgRgAg no 7.051, rei. M in. Caputo Bastos.) E nunciado 2 1 - 0 art. 41-A d a Lei no 9.504/97 só tipifica a captação ilícita de votos entre candidato e eleitor, não a configurando a vantagem dada ou p ro m etida p o r u m candidato a outro, visando a obter-lhe a desistência. 2. Recurso não conhecido.” (Ac. no 19.399, de 23.10.2001, rei. M in. Sepúlveda Pertence.) Enunciado. 22 - Não há falar em inconstitucionalidade do art. 41-A d a Lei no 9.504/97, tese, inclusive, rejeitada pelo Suprem o T ribunal Federal n o recente julgam ento d a Adin no 3.592, relator M inistro G ilm ar Mendes. (Ac. de 21.11.2006 no AgRgREspe no 25.258, rei. Min. Caputo Bastos.) E nunciado 23 - Art. 41-A d a Lei no 9.504/97. C onstitucionalidade. (...) A cassação do registro ou do diplom a em decorrência d a captação ilícita de sufrágio não gera declaração de inelegibilidade. (Ac. de 22.9.2005 no AgRgREspe no 25.241, rei. M in. H um berto Gomes de Barros; no mesm o sentido o Ac. de 9.3.2006 no REspe no 25.579, do m esm o relator; o Ac. de 8.11.2005 no EDclRO no 882, rei. M in. Marco Aurélio; o Ac. de 10.5.2006 no AgRgREspe no 25.787; e o Ac. de 8.8.2006 no AgRgREspe no 25.790, rei. M in. Caputo Bastos.) E nunciado 24 - “Representação. Captação ilegal de sufrágio. Oferta. Pagam ento. Form aturas. Art. 41 - A d a Lei no 9.504/97. Art. 22 d a LC n o 64/90. Prefeito candidato ã reeleição. Vereador. Extinção sem julgam ento de m érito. Falta de citação do vice-prefeito. Litisconsórcio necessário. Inexistência. Decadência. N ão-ocorrência. 1. Em representação em que se im p uta a prática de ato ilegal apenas ao prefeito, não é necessária a citação do vice-prefeito. Inexistência de litisconsórcio necessário. 2. Por se tratar de u m a relação jurídica subordinada, o m andato d o vice-prefeito é alcançado pela cassação do diplom a do prefeito de sua chapa.” (Ac. no 19.782, de 27.6.2002, rei. M in. Fernando Neves.) E nunciado 25 - A nulados m enos de 50% dos votos válidos, im põe-se a posse do candidato segundo colocado, e não a aplicação do co m and o posto n o art. 224 do C ódigo Eleitoral. 6. Recurso especial eleitoral parcialm ente conhecido e não provido.” (Ac. de 17.8.2006 no REspe no 25.937, rei. M in. José Delgado.) 186 E nunciado 26 - “Eleição m ajoritária m unicipal. Renovação. Art. 224 do C ódigo Eleitoral. Prefeito e viceprefeito que tiveram seus diplom as cassados p or ofensa ao art. 41 -A da Lei no 9.504/97. Registros. Indeferimento. Prevendo o art. 222 do Código Eleitoral a captação de sufrágio com o fator de nulidade d a votação, aplica-se o art. 224 do m esm o diplom a nos casos em que houver a incidência d o art. 41 -A d a Lei n o 9.504/97, se a nulidade atingir mais de m etade dos votos. H avendo renovação da eleição, p o r força do art. 224 do C ódigo Eleitoral, os candidatos não co ncorrem a u m novo m andato, mas, sim, disputam com pletar o perío do restante de m andato cujo pleito foi anulado (iniciado em lo.l.2 00 1, findando em 31.12.2004). Aquele que tiver con tra si decisão com base no art. 41-A não p o d erá participar d a renovação do pleito, p o r haver dad o causa a sua anulação. O bservância ao principio da razoabilidade. Recursos especiais conhecidos pela divergência, a que se negam provim ento, con firm and o a decisão que indeferiu os registros dos recorrentes.” (Ac. no 19.878, de 10.9.2002, rei. M in. Luiz Carlos Madeira.) E nunciado 27 - Tratando-se de decisão fu n d ad a no art. 41- A da Lei no 9.504/97, a ju risp ru dência deste Tribunal Superior é pacífica q uanto à possibilidade de execução im ediata do julgado. Precedentes. 2. A regra do art. 257 do C ódigo Eleitoral estabelece que os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo, o que, excepcionalm ente, pode ser concedido, desde que presentes circunstâncias que o justifiquem . Precedentes. 3. Esta C o rte Superior tem reiteradam ente assentado a conveniência de se evitarem sucessivas alterações no com and o d a adm inistração. Precedentes. M edida cautelar indeferida.” (Ac. no 1.385, de 26.8.2004, rei. M in. Caputo Bastos; no mesm o sentido do item 1 da em enta o Ac. de 9.3.2006 no AgRgM S no 3.427, rei. M in. H um berto Gomes de Barros.) Obs. “M edida cautelar. (...) C ondenação. Candidato. Vereador. C aptação ilícita de sufrágio. Art. 41-A d a Lei no 9.504/97. Cassação. Decisão. Indeferim ento. Pedido de execução im ediata de acórdão regional. Recurso. N ão-interposição. Preclusão. Fum us boni iuris. Ausência. Cautelar Indeferida". (Ac. no 1.315, de 11.3.2004, rei. M in. Fernando Neves.) E nunciado 28 - As decisões fundadas no art. 41-A têm aplicação im ediata, m esm o se forem proferidas após a proclam ação dos eleitos.” (Ac. no 19.587, de 21.3.2002, rei. M in. Fernando Neves.) 187 E nunciado 29 - “C aptação ilícita de sufrágio (Lei no 9504/97, art. 41-A). Representação julgada procedente após a eleição. Validade da cassação im ediata do diploma; inaplicável o art. 22, XV, da LC n o 64/90, po r não im plicar declaração de inelegibilidade.” (Ac. no 3.042, de 19.3.2002, rei. M in. Sepulveda Pertence; no mesm o sentido o Ac. no 25.300, de 15.12.2005, rei. Min. Marco Aurélio; e o Ac. de 21.3.2006 no AgRgREspe no 25.596, rei. M in. Caputo Bastos.) E nunciado 30 - “(.■•) Votos. C aptação ilícita. Verificada a captação ilícita de votos - art. 41- A da Lei no 9.504/97, incide a m ulta e a cassação do registro ou do diplom a do candidato.” NE: C ontratação de pessoas para cadastrarem eleitores, com anotação de nom e, n úm ero do título eleitoral, zona e seção eleitoral. (Ac. no 791, de 12.4.2005, rei M in. Marco Aurélio.) 4 - CONCLUSÃO A natureza jurídica do artigo 41-A da Lei 9.504, de 1997, está voltada, portanto, para garantir a liberdade do voto, afastando qualquer ato ilícito que contam ine esse valor, em hom enagem à cidadania. A postura da Justiça Eleitoral é de, p o r via de suas decisões, ex trair das mensagens axiológicas presentes no art. 41-A toda a sua p o tencialidade, dando-lhe aplicação do m odo mais extensivo possível. A dem ocracia tem na liberdade do voto a coluna m aior de sua grandiosidade, por essa atitude cívica representar a vontade do eleitor na escolha dos que vão dirigir os seus destinos administrativos. 188 SUSPENSÃO E PERDA DOS DIREITOS POLÍTICOS L u iz V iana Q u e ir o z ’^’ l. Conceito e definição de direitos políticos no ordenam en to jurídico interno e no direito internacional dos direitos hum anos. 2. Direitos políticos com o direitos fundam entais. 3. Distinção entre gozo e exercício dos direitos políticos. 4. Suspensão e perda dos direitos políticos. 5. Conclusão. I. Conceito e definição de direitos políticos no ordenamento jurídico interno e no direito internacional dos direitos humanos. D enom inou a Constituição da República do Brasil, de 1988^''^ seu Capítulo IV, do Título II, “Dos Direitos Políticos"; aponta 15CF^^^ hipóteses de perda ou suspensão dos direitos politicos; a regra do II,§3®,14CF indicou dentre cinco condições de elegibilidade a exigên cia de: “pleno exercício dos direitos políticos'"; o III,85CF tipificou com o crim e de responsabilidade do Presidente da República os atos que atentem contra “o exercício dos direitos políticos, individuais e so ciais”; e 0 III,87CF estabeleceu com o requisito para ocupar cargo de M inistro de Estado que o brasileiro m aior de 21 anos esteja “no exercí cio dos direitos políticos”. O levantam ento das regras acima apontadas dem onstra que a expressão “direitos políticos” é conceito jurídico de direito positivo, segundo a Constituição Federal. Pode-se, inclusive, afirmar que todos os direitos previstos no Capítulo IV, do Título II, que engloba os artigos 14, 15 e 16, são direitos políticos, no mínimo por topologia constitucional. Fora daquele Capítulo da Constituição Federal, tam bém é possí247 Luiz V iana Q u e iro z é a d v o g ad o e p rofessor d e d ireito eleitoral d a UCSa) - U n iv ersid ad e C atólica do Salvador. 248 D o ra v a n te será u sad o C F p ara C o n stitu iç ã o F ederal brasileira de 1988. 249 Utilizo a ab re v ia tu ra d a d esig n a ç ã o d o texto legal p re c ed id a d o n ú m e r o d o artigo, c o m o, neste caso, 15CI- q u e significa artig o 15 d a C o n stitu iç ão Federal. 189 vel encontrar outros direitos políticos, como, p o r exemplo, a ação p o pular, prevista entre o rol das garantias individuais {LXXIII,5°CF), ou a liberdade para criar partidos políticos (17CF), m esm o sem que este jam diretam ente ligados à expressão direitos políticos. Na esfera norm ativa infraconstitucional, igualmente, nosso orde nam ento jurídico prevê direitos políticos em norm as complementares, com o é o caso das inelegibilidades^^^ ou da ação de investigação judicial eleitoral, previstas n a Lei C om plem entar n°64, de 1990^^% ou em leis ordinárias, com o é o caso da propaganda eleitoral, disciplinada tanto no Código EleitoraP^^ com o na Lei das Eleições^^\ O problem a é que nem a C onstituição Federal, nem as leis brasi leiras definiram os direitos políticos de m odo completo. A Lei n*» 818, de 18 de setembro de 1949, que dispõe sobre a aqui sição, a perda e a reaquisição da nacionalidade, e a perda dos direitos políticoSy e ainda está em vigor na parte relativa à perda dos direitos políticos, usa a expressão com o seguinte sentido: “Art.38 - Sâo direitos políticos aqueles que a Constituição e as Leis atribuem a Drasileiros, precipuamente os de votar e ser votado”. Exatamente na m esm a linha, o Código Eleitoral estabelece em seu artigo 1°: “Art.l® - Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos, precipuamente os de votar e ser votado”. As norm as legais, como se vê, utilizam o conceito direitos políti cos como gênero, ao qual pertencem os direitos eleitorais de votar e ser votado, mas não facilitam a identificação de outros tipos porque se res tringem a fazer aquela inclusão parcial de duas espécies. Disso resulta certa imprecisão no uso daquele conceito, como, po r exemplo, quando se inclui entre os direitos políticos o de participar de eleições sindicais e o de dirigir ou ser redator-chefe de jornal ou periódico^^^. 250 A d o to a classificação d e JOSF. A F O N S O DA SILVA p a ra as inelegibilidades c o m o d ire itos políticos negativos. Curso de direita constitucional positivo. 27“ ed., Sáo Paulo; M alheiros, p. 346. 251 A Lei C o m p le m e n ta r n"64, de 18 d e m a io de 1990, será grafad a c o m o L C 64/90. 252 O C ó d ig o Eleitoral será, sim p le sm e n te , CE. 253 A Lei das Eleições é a Lei n "9.504. d e 30 d e se te m b ro d e 1997, o u , sim p le sm e n te , LE. 254 FERREIRA. W olgran Junqueira. C omentários à Constituição de 1988. São Paulo: Julex, 1989, v. I, p. 349. 190 A falha de definição, no entanto, é m eram ente aparente, porque é possível encontrá-la na norm ativa internacional, internalizada no d i reito positivo brasileiro através da abertura propiciada ao direito inter nacional dos direitos hum anos pela regra de Vou, aqui, apenas elencar as regras de direito internacional de di reitos hum anos mais importantes do sistema global e do sistema am eri cano, já que estudo mais aprofundado, com análise de cada um a delas, bem assim das demais regras do sistema global e dos sistemas europeu e africano, pode ser encontrado em m eu texto ''Direitos políticos à luz do direito internacional dos direitos humanos” (QUEIROZ, Luiz Viana. C a dernos de Soluções Constitucionais, Vol. 3. Malheiros: São Paulo, 2008). N a Declaração Universal de Direitos H um anos se pode ler no ar tigo XXI: “Art.XXI 1 - Toda a pessoa tem o direito de tomar parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2 - Toda a pessoa tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país. 3 - A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto^^^”. No Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que possui alguma variação significativa em relação à previsão da Declaração U ni versal de Direitos H um anos, dispõem a regra do artigo 25: “Artigo 25 Todo cidadão terá o direito e a possibilidade, sem qualquer das formas de discriminação mencionadas no artigo 2» e sem restrições infundadas: 255 E s tu d o a p ro fu n d a d o d a s c o m p a tib ilid a d e s e in c o m p a tib ilid a d e s e n tre a n o rm a tiv a in te rn a c io n a l d e c o rre n te d o art.23 d o Pacto de São José da C o sta Rica e o d ire ito in te rn o brasileiro em : Q U E IR O Z . Luiz Viana. Direitos políticos com o direitos hum anos: im pacto da Convenção A m e rica n a de Direitos H u m anos no direito eleitoral brasileiro. U FPE . Recife. 2002 (d issertaç ã o d e m e stra d o ). 256 M azzuoli, Valério d e Oliveira. C oletânea de direito internacional. 4 “ ed„ São Paulo: RT, 2006. pp.556-7. 191 a) de p articipar da condução dos assuntos públicos, diretam ente o u p o r m eio de representantes livremente escolhidos; b) de votar e ser eleito em eleições periódicas, autênticas, rea lizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a manifestação da vontade dos eleitores; c) de ter acesso, em condições gerais de igualdade, às funções públicas do seu país-^'”. São, igualmente, interessantes os artigos XX e XXXII, da Declara ção A m ericana dos Direitos e Deveres do Homem: “Artigo XX. Toda pessoa, legalmente capacitada, tem o direito de tomar parte no governo do seu país, quer diretamente, quer através de seus representantes, e de participar das eleições, que se processarão por voto secreto, de uma maneira genuína, periódica e livre \ “Artigo XXXIII. Toda pessoa tem o dever de votar nas eleições populares do país de que for nacional, quando estiver legalmente habilitada para isso"-^^ Por último, o artigo 23 da Convenção A m ericana de Direitos H u m anos (Pacto de São José da Costa Rica) trata do tema: “Artigo 23 - Direitos políticos 1. Todos os cidadãos devem gozar dos seguintes direitos e oportunidades: a) de participar da condução dos assuntos públicos, diretamente ou por meio de representantes livremente eleitos; b) de votar e ser eleitos em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a livre expressão da vontade dos eleitores; e c) de ter acesso, em condições gerais de igualdade, às funções públicas de seu país. 2. A lei pode regular o exercício dos direitos e oportunidades, a que se refere o inciso anterior, exclusivamente por motivo de idade, nacionalidade, residência, idioma, instrução, capacidade civil ou mental, ou condenação, por juiz competente, em processo penal^^". 257 M azzuoli, Valério de Oliveira. C oletânea de direito internacional. 4 ‘ ed „ São Paulo; RT, 2006, p.6I9. 258 C A N Ç A D O T R IN D A D E , A n tô n io A ugusto. A proteção internacional dos direitos hum a nos: fu n d a m e n tos jurídicos e instrum ento s básicos, p.330. 259 Id., Ibid., p . m . 260 M azzuoli, Valério d e Oliveira. C oletânea de direito internacional. 4 ‘ ed., São Paulo: RT, 2006, p.743. 192 C om o se pode constatar da leitura das norm as acima descritas, são os direitos políticos espécies de direitos hum anos, reconhecidos pela norm ativa internacional, seja no sistema global seja nos sistemas regionais de proteção, entre os quais o sistema americano. Alguns aspectos da qualificação desses direitos são universais, ao m enos no M undo Ocidental, pois todos os docum entos jurídicos, com status de tratados internacionais ou não, reconhecem três grupos de direitos políticos: a) direito de participar do governo de seu país, que envolve to m ar parte em todos os assuntos públicos e da form ulação de políticas governam entais, diretam ente ou po r m eio de representantes livrem ente eleitos; b) direito de ter acesso, em condições gerais de igualdade, às funções públicas de seu país; c) direito de sufrágio e direito de ser votado. Assim, penso que é possível definir os direitos políticos como sendo direitos públicos subjetivos, que integram os cham ados direitos fundam entais, cujo conteúdo se desdobra no direito de participação política, no direito de votar e ser votado, e no direito de ter acesso a cargos e funções públicas. 2. Direitos políticos como direitos fundamentais. Direitos políticos são direitos hum anos. A norm ativa interna cional apontada to rn a desnecessário dem onstração mais dem orada. É preciso, então, diferenciar ''direitos hum anos” e “direitos fundam entais” Utilizo a proposta daqueles que usam a prim eira expressão para os d i reitos internacionais e a segunda para os direitos internos-^', na tentati va de evitar equívocos conceituais que podem com prom eter a adequa da interpretação e aplicação de categorias distintas, ainda mais quando os direitos pessoais que passaram a ser protegidos pela norm ativa inter nacional, sobretudo depois da Declaração Universal de 1948, da ONU, tam bém se estenderam a quase todas as Constituições nacionais, sendo tam bém invocados no âm bito do direito interno^^l 261 N O G U E IR A , Alberto. A nco n síru ç ã o dos liireilos hum ano s da tributação, p.33; R A M O S, A n d ré de C a r valho. Direitos hum a n o s em juízo: com entários aos casos contenciosos e consultivos da Corte Interamericana de Direitos H um anos, p.29; SILVA, José Afonso da. C urio de direito constitucional positivo. p.76-I78. 262 C A N Ç A D O T R IN D A D E , A n tô n io A ugusto. Tratado de direito internacional dos direitos h um ano s, vol. I. p.I9, 193 Afirma JOSE AFONSO DA SILVA que “direitos humanos é ex pressão preferida nos documentos internacionais’] e sugere identificar os “direitos fundam entais do hom em " com o aqueles que, no nível do direi to positivo, resum em a concepção do m undo e inform am a ideologia política de cada ordenam ento jurídico, reservado para designar aque las prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de um a convivência digna, livre e igual de todas as pessoas^®'. Estritam ente sob essa opção conceituai, pareceria inadequada a opinião de DALLARI, segundo a qual, “direitos hum anos” é um a form a abreviada de m encionar os “direitos fundam entais da pessoa humana'] sem os quais a pessoa h u m ana não consegue existir ou não é capaz de se desenvolver e de participar plenam ente da vida^^^, mas, em verdade, es ses usos decorrem de genealogias específicas, em cada um a das línguas. “Direitos humanos" é conceito que vem de “H um an rights” do direito inglês e norte-am ericano, “direitos do hom em" tem origem francesa, enquanto “direitosfundamentais"' ficaria mais circunscrita à preferência alemã, onde h á um a Lei Fundamental. A distinção pelo nível de sua positivação - internacional: “direi tos humanos'] nacional: “direitos fundam entais" -, tem a desvantagem de não perm itir, no cam po do Direito Internacional dos Direitos H u manos, elaborar um outro conceito, distinto de ''direitos humanos" des tinado aos direitos não-derrogáveis, que CANÇADO TRINDADE de nom ina “direitos fundam entais inderrogáveis", núcleo com um de certos direitos fundamentais que não adm item qualquer derrogação, porque isso im portaria adm itir “direito humanos" que não fossem “fu nd am en tais", quando, na verdade, todos o são; apenas, alguns são e outros não são derrogáveis, em razão de expressas disposições convencionais, mas como chega ele a falar no processo de "infiltração'' dos direitos fundamentais (incorporados nos tratados sobre direitos humanos), sua doutrina indica um a distinção entre uns e outros, nos term os aqui adotados^^l O uso indiscrim inado e intercam biante das expressões “direitos humanos" e “direitos fundam entais" gera novas conceituações que po- 263 SILVA, |o s é A fon so da. Op. cii., p. 178. 264 DALLARI, D a lm o de Abreu. Direitos h u m a n o s e cidadania, p.7. 265 C A N Ç A D O T R IN D A D E . A n tô n io Augusto, A proteção internacional dos direitos hum ano s: fu n d a m e n tos juridicos e instrum entos básicos, p.42; Idem . C A N Ç A D O T R IN D A D E . A n tô n io Augusto. 0 legado da Declaração Universal de 1948 e o fu tu r o da proteção internacional dos direitos hu m a n o s [1997], p.640. 194 dem, em lugar de iluminar, encobrir o que se quer expor. Assim, usar expressões como ''direitos humanos fundam entais'\ com o o fazem os ilustres professores MORAES^^^ e FERREIRA FILHO^^S para tratar dos “direitos fundam entais'' e não dos “direitos hum anos” pode gerar certa instabilidade conceituai, na m edida em que estão estudando e com en tando direitos e garantias positivadas na Constituição Brasileira e não nos tratados internacionais. Por outro lado, corre-se o risco de se considerar que os “direitos fundam entais'' estariam no plano da norm atividade, enquanto os “di reitos humanos" no plano dos valores, vinculando-os ao direito natu ral, pois seriam estes u m a categoria prévia, legitim adora e inform adora daqueles, que p o r sua vez seriam um a classe descritiva dos “direitos humanos”^^^. Na verdade, ambas as categorias estão no plano da norm ativida de. Os “direitos humanos" na norm atividade internacional, os “direitos fundam entais" na norm atividade nacional, quase sempre nas C onsti tuições, com influência m útua. Q uantos mais “direitos humanos" são declarados e protegidos, mais são incorporados nos sistemas nacionais com o “direitos fundamentais"; quanto mais “direitos fundam entals’' vão sendo garantidos, mais vão sendo incorporados à norm ativa interna cional com o “direitos hum anos\ Chega m esm o PIOVESAN a destacar a força expansiva dos valores da dignidade hum ana e dos direitos fu n dam entais com o parâm etros axiológicos que orienta a com preensão do fenôm eno constitucionaP^^. O problem a consiste na natureza 'fu n d a m e n ta r tanto dos ''direi tos fundam entais”, quanto dos “direitos hum anos”, mas creio que não é incompatível adm itir que os ''direitos hum anos” são “fundam entais” no sentido de que têm po r conteúdo os valores supremos do ser hum ano e da prevalência da dignidade humana^’^, da m esm a m aneira que os direitos fundam entais”^^'. Mas isso não justifica que se diga que uns e 266 M OR A ES, A lexan dre de. Direitos h u m a n o s fu n d a m e n ta is : com entários aos arts.1° a 5" da Constituição da República Federativa do Brasil: do utrin a e jurisprudência. 267 FERREIRA FILH O , M ano el G onçalves. Direitos h u m a n o s fu n d a m e n ta is. 268 M OR A ES, G u ilh e rm e Pena de. Direitos fu n d a m e n ta is : conflitos & soluções, p. 16-17. 269 PIO V E SA N , Flávia. Direilos h u m a n o s e o direito constitucional internacional, p.74. 270 M A Z Z U O l.I, Valerio d e O liveira. Direitos h um a nos. C onstituição e os Tratados Internacionais: estudo analítico da situação e aplicação do Tratado na ordem ju ríd ica brasileira, p.228. 271 C U N H A FILH O , Francisco H u m b e rto . Direitos culturais com o direitos fu n d a m e n ta is no ordenam en to ju rídico brasileiro, p,39. 195 outros sejam sinônimos, nem que os “direitos humanos'' tenham sua fundam entação no direito natural. Parece mais coerente com o espírito de nossa época^'^ a doutrina de HENKIN, para quem; “A idéia de direitos hum anos, que tem recebido curso e aceitação universal (se nom inal) deve m uito a esses antecedentes, m as é distinta e diferente deles. A versão contemporânea não se enraíza nem se justifica no direito natural, no contrato social, ou em qualquer outra teoria política. Em instrum entos internacionais, representantes de Estados declaram e reconhecem direitos humanos, definem seu conteúdo e regulam suas conseqüências em sociedades políticas e no sistema dos Estados-nação. A justificativa dos direitos hum anos é retórica, não filosófica. Direitos hum anos são auto-evidentes, implicados com outras idéias que são com um ente intuídas e aceitas. Direitos H um anos derivam de princípios aceitos, ou são requeridos para finalidades aceitas - finalidades sociais como p a z e justiça; finalidades individuais como dignidade hum ana, felicidade e plena realização"^'\ Ademais, tratar “direitos humanos” e ''direitos fundamentais"' como expressões sinônim as esvazia a particularidade do II,4®CF, que, antecedendo o Título II, “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, im põe ao Brasil, em suas relações internacional, que se guie, entre outros, pela prevalência dos “direitos hum anos\ Partindo-se do pressuposto de que a Constituição da Repúbli ca não possui conceitos inúteis e que os princípios jurídicos alcançam mais e mais caráter norm ativo e cogente^^**, e no caso específico dos princípios constitucionais, são pressupostos da interpretação constitucionaP^\ os ''direitos humanos” do I,4°CF, não são os mesm os “direitos fundam entais” do Título II acima m encionado, apesar de uns e outros serem “fundam entais” Confirm a essa opção de uso term inológico a Em enda nM 8, de 8.12.2004, que acrescentou entre as com petências dos juizes federais, 2 72 C A N Ç A D O T R IN D A D E , A n tô n io A ugusto. Tratado de direito internacional dos direitos h um a nos, vol. I , p . 185. 273 H E N K IN , Luuis. The age o f rights, p.2. Livre tr a d u ç ã o d o a u to r de ste texto. 2 74 PEREIRA . Jane Reis Gonçalves. SILVA, F e rn a n d a D u a rte Lo pes Lucas. A estrutura n o rm ativa das nor m as constitucionais: notas sobre a distinção entre princípios e regras, p .3-24. 275 D A N TA S, Ivo. Princípios constitucionais e interpretação constitucional, p.79-82; Idem . Instituições de direito constitucional brasileiro, p.367. 196 as causa relativas aos direitos hum anos a que se refere o §5° do art. 108, da Constituição (V-A,108CF), que atribuiu ao Procurador-G eral da República a legitimidade para requerer ao STJ incidente de desloca m ento de com petência para a Justiça Federal de inquérito o u processo que envolvam grave violação de “direitos humanos'' com a finalidade de assegurar o cum prim ento de obrigações decorrentes de tratados inter nacionais de direitos hum anos dos quais o Brasil seja parte. Aquela norm a constitucional (§5°,108CF) só pode ser interpre tada como se destinando a assegurar a proteção de “direitos humanos” internacionais, e não “direitos fundam entais” nacionais. Afinal, se ali se pretender adm itir deslocam ento de com petência para Justiça Fede ral de todo processo que envolva violação de “direitos fundam entais”, a regra se tornará inexeqüíveU já que quase todo crim e ou ilícito viola, direta ou indiretam ente, um direito fundam ental. Os '"direitos hum anos” e os “direitos fundam entais” se diferenciam apenas pela órbita internacional ou nacional de sua gênese normativa, sem que haja, necessariamente, diferenças de conteúdo. Mas essa ori gem distinta exige m odos de interpretação e aplicação igualmente dife rentes, m esm o quando se adm ite que o direito internacional e o direito interno destinam -se a garantir e am pliar a proteção à pessoa hum ana. Nas palavras de PIOVESAN, ao retratar o relacionam ento entre os sis temas global e regionais de proteção com os sistemas nacionais: “A dotando o valor da prim azia da pessoa hum ana, esses sistemas se com plem entam , interagindo com o sistema nacional de proteção, a fi m de proporcionar a maior efetividade possível na tutela e promoção de direitos fundam entais-'^’’. É essa, igualmente, a direção apontada po r CANÇADO TR IN DADE, quando fala do todo harm ônico form ado pelo direito interno e pelo direito internacional: “A s norm as jurídicas, de origem tanto internacional como interna, vêm socorrer os seres hum anos que têm seus direitos violados ou ameaçados, fo rm a n d o um ordenamento de proteção. O direito internacional e o direito interno aqui se mostram, desse modo, em constante interação, em benefício dos seres hum anos protegidos^''". 276 PIO V E SA N , Flavia. D ireitos h u m a n o s e o direito constitucional internacional, p.286. 277 C A N Ç A D O T R IN D A D F , A n tô n io Augusto. Tratado de direito internacional dos direitos h um ano s, vol. 197 A diferenciação entre ‘'direitos fundamentais'^ e ‘"direitos hum a nos” a p artir da sua fonte nacional ou internacional po d e servir, tam bém , para auxiliar a com preensão de sua com plem entariedade, e não de sua igualdade (jurídicas), o que perm ite flexibilizar sua interpretação e aplicação, à luz das garantias internacionais para os “direitos humanos'] mesm o quando não existam para a tutela dos ‘‘direitos fundam entais" Além disso, o consenso da com unidade internacional acerca das características dos direitos hum anos - universalidade, indivisibilidade, interdependência e o tratam ento global dos mesmos^^^ - exige que se afaste a tentação de continuarm os a falar em gerações de direitos, como o faz parte da doutrina^”^ e o STF: a prim eira geração (direitos civis e políticos) com preenderiam as liberdades clássicas, negativas ou for mais, os de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) identificar-se-iam com as liberdades positivas, e os de terceira m ate rializariam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagrando o princípio da solidariedade e constituindo um m om ento im portante no processo de desenvolvi mento, expansão e reconhecim ento dos direitos humanos^®**. Já aponta BONAVIDES para direitos de quarta geração, que tratam do futuro da cidadania e do porvir da liberdade de todos os povos^*'. A idéia das gerações de direitos hum anos decorre da sua categorização, resultante da falta de condições históricas para que, em 1969, quando a O NU proclam ou seus Pactos Internacionais, se fizesse apenas u m tratado, no lugar dos dois que regulam, o prim eiro, direitos civis e políticos, e o segundo, direitos econômicos, sociais e culturais, sob o argum ento jurídico (que encobre a verdadeira natureza ideológica das divergências) de que seriam distintos, possuindo os prim eiros autoaplicabilidade, e os outros não, porque seriam programáticos, exigindo im plem entação progressiva^*^ Superada a circunstância histórica da G uerra Fria que dividiu 0 m undo em capitalista e com unista, verificou-se que já não há mais 1, p.408. 278 Op. c it.,p . 186; Op. d t., p .l5 6 . 279 Op. c)f-, p.77. 280 STF, M S n"22164/SP. voto d o R elator M in istro C elso de Mello, pu b lic a d o n o D iário da fustiça, Seção I, à e 17/11/1995, p.39.206. 281 BO NA V ID ES, Paulo. Curso de direito constitucional, p.525. 282 C A N Ç A D O T R IN D A D E , A n tô n io A ugusto. A proteção dos direitos h u m a n o s e o Brasil, p.30. 198 sentido m anter-se aquela dicotom ia dem arcada nos dois Pactos Inter nacionais de Direitos Civis e Políticos e de Direitos Econômicos, So ciais e Culturais, com o foi expressamente consignado na Conferência de Direitos H um anos de Viena, de 1993, na qual a delegação brasileira observou que os direitos hum anos têm im pacto, uns no exercício de outros, e recordou a sim ultaneidade da adesão do país aos dois Pactos Internacionais de Direitos H um anos das Nações Unidas^^^ Correta, portanto, a crítica que se tem feito àquela classificação tradicional dos direitos hum anos a p artir de suas gerações, seja pela não correspondência entre tais gerações e o desenvolvimento históri co de sua efetivação e solidificação, seja pela falsa noção de sucessão entre as gerações, quando, em verdade, surgem e são im plem entados concom itantem ente, seja, sobretudo, pelo enfraquecim ento que pode produzir sobre as suas características mais marcantes: universalidade, indivisibilidade e interdependência^'^^. Os direitos políticos, portanto, tipos que integram os direitos hu manos, na norm atividade internacional, são tom ados, no direito inter no, como direitos fundamentais.-^^ 3. Distinção entre gozo e exercício dos direitos políticos. A distinção entre gozo e exercício dos direitos políticos é questão relevante. O problem a está em que, apesar de não haver dúvida sobre a n a tureza de direitos fundam entais dos direitos políticos, não se lhes pode aplicar todas as regras pertinentes àqueles, entre as quais, aquela que nega diferença entre gozo e exercício na sua titularidade. Classifica MORAES os direitos políticos com o direitos fu n d a mentais de prim eira geração^^\ afirm ando que: “a distinção entre ca pacidade de direito ou de gozo e capacidade de fato ou de exercício, segundo a qual aquela seria a aptidão para ser titular de direitos e o bri gações, ao passo que esta seria a aptidão para o exercício desses direitos 283 Idem . Tratado de direito internacional dos direitos h u m a n o s, vol. I, 226. 2 84 M A Z Z U O I.I, V alerio d e O liveira. Direitos h um a nos, C onstituição e os Tratados Internacionais: estudo analítico da situação e aplicação do Tratado n a ordem ju ridica brasileira, p.211. 285 A d o u trin a está a d e v e r e s tu d o q u e extraia c o nclusões teóricas e práticas d o re c o n h e c im e n to d a n a tu re z a d o s direitos p oliticos c o m o d e dire ito s fu n d a m e n ta is. 286 M OR.A ES, G u ilh e rm e Pena de. D ireitos fu n d a m e n ta is : con/lilos e so lu çõ e s, p.28. 199 e obrigações, carece de relevância no cam po dos direitos fundam entais, porquanto não seria admissível a disjunção entre titularidade e o exer cício dos direitos fundam entais”^*^^ O direito positivo brasileiro não acolheu esse argum ento, e dife renciou gozo de exercício dos direitos políticos. A Constituição, v.g., no II,§3®,14CF, indicou entre outras quatro condições de elegibilidade: “o pleno exercício dos direitos políticos”; no II,85CF, tipificou com o cri m e de responsabilidade do Presidente da República os atos que atentem contra “o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais”; no Cflpuí,87CF, im põe-se com o requisito para ocupar cargo de M inistro de Estado que o brasileiro m aior de 21 anos esteja no exercício dos direitos políticos”. Em todas aquelas regras constitucionais, se usa a expressão “exer cício dos direitos políticos”. A Lei dos Partidos Políticos - LPP (Lei n “9.096/95), p o r seu turno, exige que para se filiar o eleito esteja em “pleno gozo de seus direitos políticos” (artigo 16). Isso tem levado a algumas confusões. SOBRINHO, p o r exem plo, parece confundir gozo e exercício, quando afirm a que “pleno gozo dos direitos políticos, tem-no o cidadão eleitor com capacidade ativa de votar e passiva de ser votado. Entretanto, pode ocorrer que o cidadão goze da capacidade ativa de votar, mas, temporariamente, não goze da capa cidade passiva de ser votado. Não se trata de penalidade voltada a res tringir os direitos políticos, mas apenas de impedimentos circunstanciais, devido a determinados fatores como idade, exercício de função pública, parentesco até o segundo grau com titulares de m andato executivo, entre outros, que o impossibilitam a candidatura a cargos eletivos. Porém, esse tipo de inelegibilidade não retira a capacidade do uso e gozo dos direitos políticos, que credencia o cidadão afiliar-se a partido político”^^^. No campo normativo, igualmente, a confusão persiste. O Tratado da Amizade, entre Brasil e Portugal, aprovado pelo Decreto Legislativo 165, de 30.05.2001, e prom ulgado pelo Decreto 3.927, de 19.09.2001, dispõe que o “gozo” dos direitos políticos no Estado de re sidência im porta na suspensão do “exercício” dos m esm os direitos no 2S7 288 Id., Ibid., p .U . S O B R IN H O , José Bispo. C om entários à Lei Orgânica das Partidos Políticos, p .53. 200 Estado da nacionalidade (art. 17, 3), tornando as expressões sinônimas. Gozar e exercer direitos não são a m esm a coisa. Por todos, pela profundidade e extensão do estudo, tom a-se a lição de RUY BARBOSA, n o fam oso caso da im pugnação à candidatura de H erm es da Fonseca, p o r inelegibilidade decorrente de falta de exercício de direito políticos, em página que m erece ser apreciada, mas que, aqui, basta a síntese m a gistral do mestre: “Eis aí extremadas com a maior lucidez as raias entre o gozo e 0 exercício nos direitos políticos: o gozo, mera “capacidade potencial da faculdade jurídica; o exercício, “capacidade atua!" dessa faculdade. N o alistável, que se pode alistar, em lhe aprazendo, o direito politico de voto está em capacidade potencial. É o gozo. No alistado, que se habilitou a votar atualmente, esse direito está em capacidade atual. É o exercício!”’^'^ Sempre que a norm a exigir com o requisito o gozo dos direitos políticos, estará m encionando alistabilidade^^°, enquanto o exercício daqueles direitos pressupõe alistamento. O alistável goza, o alistado exerce direitos políticos. Ademais, é de se observar, que a doutrina de COSTA chega m es m o a am pliar a definição tradicional, tendo em vista que, a seu juízo, a alistabilidade é um direito pré-eleitoral, integrante daquela catego ria ‘‘que são inerentes à pessoa por sua condição de integrante do Poder Constituinte e, neste sentido, prévios a qualquer decisão constitucionar. E, logo adiante, que “a característica de pré-constitucionalidade desse direito é proclam ada na Declaração Universal dos Direitos H umanos”, na qual se diz que: “Todo H om em tem o direito de tom ar parte no governo de seu país, diretam ente ou p o r interm édio de representantes livremente escolhidos”^^'. É aquela um a proposição inovadora, e dem onstra que houve um a redução conceituai da Declaração Universal da O N U em comparação com o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e os Tratados Internacionais, com o a Convenção A m ericana de Direitos Humanos, 289 BARBOSA, Ruy. Merfiâria sobre a eleição preiideiicinL vol. X X X VIII, t. II, p.47. 290 (x>nsidera C Ü ST A a alistabilid ade direito pré-eleitoral, p o r q u e in e re n te à p e sso a p o r sua c o n d iç ão de in le g ra iu e d o P o d e r C o n stitu in te e, n este sentido, prévios a q u a lq u e r d e cisão constitucion al. COSTA, Elcias Ferreira da. D ireito eleitoral: legislação, doutrin a e ju risprud ência, p .53. 291 Idem . 201 tendo em vista que, naquela, afirma-se a natureza pré-eleitoral da ti tularidade dos direitos políticos, quando se usa a expressão “todo h o mem”, e, nestes, não, um a vez que preferiram “todo cidadão” ou “todos os cidadãos” o que já exige um a qualificação constitucional ou legal de quem são esses “hom ens”, que adquiriram o estatuto de “cidadãos”. A solução doutrinária apresentada p o r COSTA, no entanto, não encontra respaldo nem no sistema global nem no sistema americano de proteção dos direitos hum anos, já que aquela am plitude conceituai (“todo hom em ”) foi reduzida pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e pela Convenção A m ericana de Direitos Humanos. O im portante é destacar que o direito brasileiro ora usa a expres são “exercício dos direitos políticos”, ora “gozo de direitos políticos”, exigindo do intérprete que aponte a diferença e busque as diferenças propriam ente jurídicas, como é o caso da distinção entre suspensão e perda daqueles direitos. 4. Suspensão e perda dos direitos políticos. Os direitos políticos estão subm etidos a regime jurídico próprio na Constituição e nas leis infraconstitucionais. Já foi dito acima que o Capítulo IV, do Título II, da Constituição de 1988 denom ina-se “Dos Direitos Políticos”. Ali se encontra regula mentação diversa que envolve: a) soberania popular exercida através do sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com igual valor para todos, e m ediante plebiscito, referendo e iniciativa popular; b) obriga toriedade do alistam ento e do voto; c) condições de elegibilidade; d) inelegibilidades; e) ação de im pugnação de m andato eletivo; f) vacatio legis de lei que altere o processo eleitoral; e g) causa de suspensão e per da dos direitos político. O 15CF tem especial relevância no estudo dos direitos políticos, porque aquelas hipóteses são fatos suspensivos o u extintivos desses di reitos. Traz ele cinco hipóteses de perda ou suspensão desses direitos, com a seguinte redação: “Art. 15 - É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; 202 II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art.5°, VIII; V - improbidade administrativa, nos termos do art.37, §4“”. A Constituição não definiu qual ou quais são os casos de perda ou de suspensão, mas parece evidente que sào conseqüências distintas. A perda consiste na privação definitiva, a suspensão na privação temporária'^-. O cancelam ento da naturalização gera a perda dos direitos políticos^^ porque a nacionalidade é pressuposto para o gozo daqueles, salvo os portugueses com residência perm anente no Brasil, aos quais, nos term os do §1“,12CF, serão atribuídos os direitos inerentes aos brasilei ros, se houver reciprocidade. Aqui vale a pen a observar que, apesar do 1,15CF m encionar apenas o cancelamento da naturalização, a perda da nacionalidade pela outra causa prevista na regra do II,12CF,- adquirir outra nacionalidade -, tam bém produz, com o seu corolário jurídico, a perda dos direitos políticos, que possuem com o pressuposto de seu gozo a nacionalidade brasileira. A incapacidade civil absoluta decorre de idade inferior a 16 anos, enferm idade ou deficiência mental, ou causa transitória que im peça ex pressar a vontade, com o se vê na regras de III-II-I,3°CC. Consideram na hipótese de perda dos direitos políticos RIBEIRO e CÂNDIDO^^'*; e, ao contrário, com o m era suspensão NIESS, D ECO M A IN e COSTA^^^ Penso que estão certos os que a tom am com o causa de suspensão e não de perda dos direitos políticos, porque a incapacidade civil é um status jurídico passível de mudança. Atinge os direitos políticos a condenação crim inal transitada em julgado, seja qual for o crime, e seja qual for a condenação - III,15CF. 292 MHNDHS, A. C. Introdução à teoria das inelegibilidades, p.80-82. 293 D E C O M A IN , P e d ro R o berto . Elegibilidade e iiieíegibilidades, p .l4 ; C  N D I D O , ], J. Direito eleitoral brasileiro, p. 115; C O STA . A. S. da. Instituições de direito eleitoral: teoria d a inelegibilidade, direito p r o cessual eleitoral e com entários á lei eleitoral, p.73-75; NIESS, P e d ro H e n riq u e Távora. Direitos políticos: elegibilidade, inelegibilidade e ofões eleitorais, 38; RIBKIRO, Fávila. D ireito eleitoral, p.208, M EN D ES c o n sid e ra ap en a s o c a n c e la m e n to d a n a c io n alid ad e c o m o hip ó te se de p e rd a ; to d a s as de m a is se ria m de su sp e nsã o d o s direitos políticos. M E N D E S , A. C. Op. cit.. p.81, 294 RIBBIRO, F. Op. cit., p.208; C  N D I D O , ). |. Op. cit., p.92. 295 D E C O M A IN . P e d ro R ob erto . Op. cit., p. 14; COSTA, A. S. da. Op. cit., p.75; NIESS, R H. T Op. cit., p.39. 203 Entre os autores acima citados, apenas RIBEIRO aponta-a com o causa de perda e não de suspensão, apesar do expresso texto constitucional: “enquanto durarem seus efeitos^^®”. A regra do V III,5 “CF garante que ninguém será privado de seus direitos p o r motivo de crença religiosa ou convicção filosófica ou p o lítica, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação a todos im posta e recusar-se a cum prir prestação alternativa, fixada em lei. A ressalva (“salvo”) autoriza, portanto, que o cidadão seja “privado de direitos”, e p o r isso, é a razão que encontro para RIBEIRO apontar o IV,15CF com o causa de perda e não de suspensão dos direitos políticos"^'. Apontam~na com o causa de suspensão D ECO M A IN e A. S. COSTA’^^. Não esclarece NIESS sua posiçâo'^*^. Adverte C N D ID O que dependerá de disposição legal a fixação do efeito daquela norm a constitucionaP*^® C onfirm am as regras infraconstitucionais a corrente de que a h i pótese do IV,15CF retrata suspensão e não perda dos direitos políti cos. A Lei n“ 8.239, de 04.10.1991, que regulam enta o a r t 143, §§ 1® e 2® da Constituição Federal, que dispõem sobre a prestação de Serviço Alternativo ao Serviço M ilitar Obrigatório, dispõe em seu §§l®-2®, do art.4”, que a recusa implicará o não-fornecim ento do Certificado por dois anos, findo o qual só será em itido o certificado “após a decretação, pela autoridade com petente, da suspensão dos direitos políticos do inadimplente, que poderá, a qualquer tempo, regularizar sua situação m ediante cum prim ento das obrigações devidas” (grifado aqui). É, por conseguinte, caso de suspensão e não de perda dos direitos políticos. No m esm o sentido, a regra do 438CPP, introduzida pela Lei n® 11.689, de 09.06.2008, prevê, expressamente, que: “a recusa ao serviço do júri fundada em convicção religiosa, filosófica ou política im porta rá no dever de prestar serviço alternativo, sob pena de suspensão dos direitos políticos, enquanto não prestar o serviço im posto” (grifado aqui). Consigna, p o r conseguinte, caso de suspensão e não de perda daqueles direitos. O últim o inciso do 15CF, traz a im probidade administrativa, 296 RIBEIRO, H Op. cil., p.208; D E C O M A IN . P. R. Op. cit„ p .l5 ; C  N D ID O . IJ. Op. cit., p.92; C O STA , A. S. da. Op. cit., p.77; NIESS, P. H. T. Op. cit.. p.40. 297 RIBEÍRÜ, F .. Op. cit., p.20S. 298 D E C O M A IN , P. R. O p d t., p,18; C O STA . A. S. da. Op. cit., p,79. 299 NIESS, R H . T. Op. cit.. p. 42-43. 300 C  N D ID O , I- J. O p cit-, p.92. 204 que, tam bém , im porta em suspensão dos direitos políticos^°', inclusive, porque §4°,37CF a ela se refere expressamente, com a seguinte redação: “Art. 37- . . . §4® - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da íiinção pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”. A suspensão po r im probidade adm inistrativa está regulada pela Lei n°8.429, de 2 de ju n h o de 1992, segundo a qual a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsi to em julgado da sentença condenatória (artigo 20 ). Com o se viu acima, a dou trin a diverge de m aneira intensa sobre a natureza das hipóteses fáticas previstas nos incisos do artigo 15 da Constituição Federal, ora apontando-as com o perda, ora com o suspen são dos direitos políticos. Proponho que para interpretar aquelas regras constitucionais seja adotado o critério usado p o r Ruy Barbosa para diferenciar gozo ou exercício dos direitos políticos. No Brasil, entendido gozo com o alistabilidade, gozam dos direi tos políticos todos os brasileiros, maiores de 16 anos, salvo os conscritos, como se vê nas regras insertas em §§2°-l®,14CF. São, portanto, requisitos a nacionalidade brasileira e a idade. Com o esta não se pode perder, somente a perda daquela gera desaparecim ento da alistabilida de, ou seja, do gozo dos direitos políticos. Assim, a perda da nacionali dade implica em perda dos direitos políticos. Daí porque a regra de I,15CF - “cancelam ento da naturalização por sentença transitada em julgado” - deve ser lida englobando, igual mente, qualquer outro fato gerador da perda da nacionalidade, como aqueles previstos em II-I, §4°,12CF - “será declarada a perda da nacio nalidade do brasileiro que: I - tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional; II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos: a) de reconhecim en to de nacionalidade originária pela lei estrangeira; b) de im posição de 301 DH CO M A IN '. P. R. Op. c/f., p. 19; C  N D ID O , J. I. Op. d l., p.92; C O STA , A.S. d a Op. c/f., p. 89; NIESS, . H . T . O p . d f .,4 6 . 2 05 naturalização, pela n o rm a estrangeira, ao brasileiro residente em Esta do estrangeiro, com o condição p ara perm anência em seu território ou para o exercício de direitos civis”. Em todas as demais hipóteses previstas nos incisos II a V, de 15CF, o fato ali descrito não atinge, não elimina, não alcança requisi to do gozo dos direitos políticos, mas sim do seu exercício, razão pela qual, só poderiam as regras infraconstitucionais caracterizá-las como fatos geradores da suspensão dos direitos politicos. É preciso dizer, ainda, e para terminar, que o procedim ento para a efetivação da perda ou suspensão está prevista nos artigos 71 a 81, do Código Eleitoral O artigo 71 traz cinco causas de cancelamento do título de eleitor, entre as quais, as do inciso II - “a suspensão ou perda dos direitos políticos” O §2°, por sua vez, dispõe que: “§2^* - N o caso de ser algum cidadão maior de 18 (dezoito) anos privado temporária ou definitivamente dos direitos políticos, a autoridade que impuser essa pena providenciará para que o fato seja com unicado ao Juiz Eleitoral ou ao Tribunal Regional da circunscrição em que residir o réu”. Essa regra, a m eu juízo, revogou, parcialmente, o artigo 41, da Lei n"818, de 18 de setembro de 1949; “Art.41 - A perda e a reaquisição dos direitos políticos serão declaradas por decreto, referendado pelo Ministro da Justiça e negócios Interiores”. É que, qualquer que seja a hipótese de perda ou suspensão, o títu lo de eleitor será cancelado, não havendo a possibilidade de sua revali dação p or decreto presidencial. Recuperando sua alistabilidade, o cida dão fará nova inscrição eleitoral e terá u m novo título de eleitor. Aquele que perder a nacionalidade brasileira, se a readquirir, segundo o devido processo legal, fará novo alistamento. Nos casos de suspensão da m es m a maneira. Recuperada a capacidade civil, extintos os efeitos da pena crim inal ou da sanção p o r im probidade adm inistrativa, ou cum prida obrigação a todos im posta, o cidadão que não perdeu alistabilidade p o derá voltar a inscrever-se eleitor. Penso que deveria haver {de legeferenda) um procedim ento elei toral distinto para a perda ou suspensão dos direitos políticos, já que. 206 com o disse acima, a perda alcança o gozo, enquanto a suspensão so m ente 0 exercício. Deveria a lei eleitoral apontar para o cancelamento do título apenas para as hipóteses de perda dos direitos políticos, fazen do um a anotação e exigindo a devolução do título eleitoral ao Cartório Eleitoral da Zona respectiva, quando fosse caso de suspensão. Mas não foi isso que fez o legislador, no Código Eleitoral, já que subm eteu qual quer das hipóteses de perda ou suspensão a cancelamento do título. No exercício de seu p od er regulamentador, o TSE baixou a Re solução n^ 21.538, de 14 de outubro de 2003, que '"dispõe sobre o alista mento e serviços eleitorais mediante processamento eletrônico de dados, a regularização de situação de eleitor, a administração e a manutenção do cadastro eleitoral, o sistema de alistamento eleitoral, a revisão do eleito rado e a fiscalização dos partidos políticos”. Nos artigos 51 a 53, aquela Res. TSE n “21.538/03 disciplina o p ro cedim ento para o registro no sistema eletrônico de alistam ento eleitoral das restrições aos direitos políticos. Impõe-se que a autoridade judici ária determ inará a inclusão dos dados no sistema, m ediante com ando FASE, de fato ensejador de inelegibilidade ou de suspensão de inscri ção p o r motivo de suspensão de direitos políticos ou de im pedim ento ao exercício do voto (art.51); se o interessado, através de requerim en to próprio, com provar a cessação do im pedim ento, será com andado o código FASE próprio e/ou inativado, quando for o caso (art.52, §3“). Q uando a restrição alcançar pessoa não inscrita na Justiça Eleitoral ou com inscrição cancelada no cadastro, seu registro será feito diretam en te na Base de Perda e Suspensão de Direitos Políticos (art.51,§2®). Estipula, ainda, quais os docum entos com probatórios de reaqui sição ou restabelecimento de direitos políticos. Nos casos de perda: a) decreto ou portaria, e b) com unicação do M inistério da Justiça; nos ca sos de suspensão: a) para interditos ou condenados - sentença judicial, certidão do juízo com petente ou outro docum ento; b) para conscritos ou pessoas que se recusaram à prestação do serviço m ilitar obrigatório - certificado de reservista, certificado de isenção, certificado de dispen sa de incorporação, certificado do cum prim ento de prestação alterna tiva ao serviço m ilitar obrigatório, certificado de conclusão do curso de formação de sargentos, certificado de conclusão de curso em órgão de formação da reserva ou similar; c) para beneficiários do Estatuto 207 da Igualdade - comunicação do M inistério da Justiça ou de repartição consular ou missão diplomática competente, a respeito da cessação do gozo de direitos políticos em Portugal, na form a da lei; d) nos casos de inelegibilidade - certidão ou outro docum ento. Desse conjunto de norm as regulamentares, infere-se que o TSE adm ite que a suspensão ou a perda seja lançada no sistema, através de um com ando eletrônico, que pode, posteriorm ente, ser novam ente acionado, quando com provada a cessação do impedim ento. Malgrado nâo poder revogar a lei, já que a resolução tem natu reza de regulamento, parece ter a Justiça Eleitoral encontrado forma indireta de diferenciar efeitos para a suspensão ou a perda dos direitos políticos, através de com andos eletrônicos que alteram as informações constantes no sistema ou no banco de dados. Não é demais questionar se, após as regras das Res-TSE n° 21.538/03, ainda possui eficácia a regra legal do Código Eleitoral, em seu artigo 71, II, que m anda cancelar o título eleitoral, seja hipótese de suspensão ou de perda dos direitos políticos. 5. Conclusão. É possível atribuir significado jurídico à distinção entre gozo e exercício dos direitos políticos, m esm o sendo eles direitos fundam en tais. Gozam os alistáveis, exercem os alistados. A Constituição federal atribui alistabilidade aos brasileiros m aio res de 16 anos, salvo os conscritos. Disso resulta que apenas perderá direitos políticos aquele que perder a nacionalidade, já que a idade n in guém pode controlar contra o tempo. Assim, entre as cinco hipóteses previstas no 15CF, apenas o inci so I traz causa de perda, os demais descrevem hipóteses de suspensão dos direitos políticos. 208 o PROBLEMA DA (SUB)REPRESENTAÇÃO POLÍTICA DA MULHER: um tema central na agenda política nacional M a r i a C l a u d ia B u c c h i a n c r i Pinheiro*'"- A realização, no final de abril de 2009, de audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça da C âm ara dos D eputados, voltada à discussão de projeto de leí sobre a discrim inação de gênero nas rela ções de trabalho, revelou a im periosidade de se positivar, de form a mais ampla, e na linha dos diversos com promissos internacionais assum i dos pelo Estado Brasileiro, verdadeiro Estatuto da Igualdade de Gêne ro, capaz de coibir, de m odo eficaz, a perpetuação de com portam entos tendentes à subalterna inferiorização da m ulher não só no ambiente de trabalho, mas, por igual, nas mais diversas esferas da sociedade, aí incluída, necessariamente, a esfera d a participação política. Isso porque, para além da histórica questão vinculada à subvalorização fem inina no am biente profissional - a im plicar dificuldades no processo de recrutam ento e seleção, restrições às prom oções na carrei ra e inferioridade rem uneratória em relação aos demais empregados e funcionários - , a experiência tem dem onstrado que a discrim inação de gênero possui múltiplas dim ensões e está a efetivamente com prom eter outros papéis sociais a serem desem penhados pelos indivíduos em ge ral, e pelas m ulheres em particular. É bom que se diga que essa percepção das coisas, aliada a um tratam ento jurídico-protetivo mais amplo, já são adotados há décadas pelo Reino Unido (Sex Discrimination Act, de 1975) e foram reafirm a dos, pelo Conselho Europeu, na Dírectiva C om unitária 2004/113, na qual se assentou que as discriminações em função do sexo transcendem 0 am biente de trabalho e afetam, p o r igual, outros relevantes papéis sociais. 302 A dvogada; M estra em D ireito e E sta d o pela U n iversidade d e São Paalo; Professora d e P ó s-g ra d u a ç ão e m D ireito HIeitorai ID P/L FG ; P resid e n te d o In stitu to d e D ireito Eleitoral d o D istrito F ederal - IDKDF; Ex-assessora-chefe da Escola lu d ic lá ria Eleitoral do TSE, 209 Em tal Directiva, veiculada n o Jornal Oficial da União Européia de 21/12/2004, assentou-se, p o r exemplo: que “a igualdade entre ho mens e mulheres é um princípio fundam ental da União Européia'' e que deve ser garantido “em todos os domínios"-, a im periosidade de se esta belecerem metas contra a ''discriminação em função do sexo” tam bém “fora da esfera laboraF; e que “a discriminação em função do sexo, in cluindo o assédio e o assédio sexual ocorrem igualmente em áreas fora do mercado de trahalho \ sendo certo que “esse tipo de discriminação pode ser igualmente nocivo, agindo como obstáculo à plena e bem sucedida integração dos homens e das mulheres na via econômica e social”. Finalmente, referida Directiva fez consignar que “a fim de garan tir, na prática, a plena igualdade entre homens e mulheres, o princípio da igualdade de tratamento não obsta a que os Estados-Membros m ante nham ou aprovem medidas especificas destinadas a prevenir ou compen sar desvantagens relacionadas com o sexo" (art. 6°). A grave situação de discrim inação fem inina justificou, p o rta n to, no contexto europeu, a expedição de determ inação vinculante, para im ediata im plem entação pelos Estados m em bros das políticas públicas e das m edidas com pensatórias que se fizerem necessárias para a redu ção d o gender gap'\ aí incluída a questão da sub-representação política das mulheres. Trata-se, pois, de providência revestida de inquestionável gravida de, pois as ''diretivas comunitárias" com o é de todos sabido, vinculam, quanto às suas finalidades e aos seus objetivos, todos os Estados m em bros, que, em não adotando as medidas necessárias à consecução das metas acertadas, podem inclusive ser responsabilizados por sua inércia. Nos dizeres de Olivia M aria Cardoso Gomes^*^^, "Directiva Com u nitária é um ato normativo que pode ser emanado tanto pelo Conselho da União Européia quanto pela Comissão da União Européia. Consiste em um a decisão coletiva aprovada pelos Estados-membros do órgão ex pedidor do documento, que obriga estes Estados a aplicarem a diretiva, mas os deixa livres para escolher a fo rm a e os meios que serão utilizados para se chegar ao objetivo traçado pela mesma” 303 C A R D O S O G O M E S. O livia M aria. O F rm c íp io d a ig u a ld a d e e as d is c rim in a ç õ e s d e gênero. A nálise d a D iretiva C o m u n itá ria n° 2001/113 d o C o n se lh o E u ro p e u e d o Pro jeto d e Lei O rg â n ic a n “ 3/2006 d a A ssem bléia d a R ep ú blica Portu g u esa , )us N a vigandi, Teresina, a n o 13, n. 2128, 29 d e abril d e 2009, acesso e m 18 de m a io d e 2010. 210 o cam inho, pois, é de avanços, e a própria discussão da tem ática está a despertar na com unidade a consciência de que o pleno desenvol vim ento da sociedade depende efetivamente da quebra de parâm etros discrim inatórios que, subalternam ente, estão a im pedir a plena integra ção das pessoas e o livre desenvolvimento da personalidade individual. Vera Lúcia C arrapeto Raposo, em sua obra intitulada “O Poder de Eva - Princípio da Igualdade no âmbito dos direitos políticos. P ro blemas suscitados pela discrim inação positiva^^'^”, alerta que até mesmo o desconhecim ento sobre a real situação fem inina no contexto polí tico qualifica-se com o um obstáculo a mais, quando em discussão a adoção de medidas positivas, capazes de ao m enos atenuarem o déficit de representatividade fem inina, incompatível com o próprio princípio m aior da democracia. Eis 0 que afirma referida autora: “O simples desconhecimento acerca da real situação das mulheres na política fu n c io n a p o r si só como im pedim ento à sua participação. A realização de estudos e a elaboração de estatísticas sobre esta problemática é prática recente. Como bradar com êxito por inovação, quando se ignora o que se pretende inovar? A divulgação de dados concretos e efectivos acerca da real situação das mulheres em todos os sectores da vida funcio n a como um meio de promoção do estatuto das mulheres, na m edida em que conduz à reflexão sobre a sua situação e à averiguação de soluções para eventuais lacunas a colmatar M ais do que isso, impulsiona as mulheres a abandonar a passividade que até hoje as caracterizou e a adaptar um a atitude mais batalhadora e inconformista. Os próprios organismos que poderão potencialmente im pulsionar a entrada das mulheres na actividade pública - sindicatos, associações públicas e, particularmente, partidos políticos, os mais decisivos nesta área - só relativamente tarde se interessam pelo papel das mulheres na política. Afinal, estamos a fa la r de “boys clubs". A inda hoje m uitas destas organizações desconhecem qual a efectiva participação fem in in a nos respectivos raios de acção: tão-pouco sentem curiosidade em averiguar tais dados, pois sabem de antem ão que os resultados lhe seriam desfavoráveis". 304 C A R R A P E T O R A PO SO . Vera Lúcia. "O P o d er d e Eva - P r in cíp io da Ig u a ld a d e n o â m b ito d o s d irei to s p o lític o s. P ro b lem a s su sc ita d o s p e la d isc rim in a ç ã o p o sitiv a ” C o im b ra : A ln ie d in a . 2004 211 A plena identificação, pois, da real situação de representatividade feminina no contexto dos Parlamentos e das Chefias de Executivo, sem falar no âmbito das próprias agremiações partidárias e de seus órgãos de direção, é medida que se impõe, até mesm o para que se tenha exata consciência do “gender-gap”existente na seara da representação política. 2. A REALIDADE BRASILEIRA N o que concerne à participação política das mulheres no Bra sil, dados da Justiça Eleitoral atinentes às últim as eleições municipais, ocorridas em 2008, revelam que, dos 15.143 candidatos a Prefeito, ape nas 1.670 eram mulheres (pouco mais de 10%), e dos 330.630 candida tos a vereador, apenas 72.476 (pouco mais de 20%). O que revela uma inaceitável hegem onia m ascuhna n o contexto das candidaturas políti cas, a se projetar, inevitavelmente, no percentual de m andatos políticos titularizados por mulheres, em relação ao núm ero de cadeiras ocupa das por homens. Tudo isso, frise-se, a despeito do com ando norm ativo inserido n o $ 3® do art. 10® da Lei n° 9.504/97, em sua redação anterior à Lei n “ 12.034/2009, que estabelecia que “Do número de vagas resultantes das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação deverá reservar o m ínim o de trinta por cento e o m áxim o de setenta por cento para candi daturas de cada sexo”. Contudo, a com pleta inexistência de qualquer preceito sancionatório capaz de com pelir as agremiações partidárias à observância da m encionada regra de proporção, associada, ainda, a um a interpretação de m era conveniência, no sentido de que a expressão “deverá reservar" deveria ser com preendida como u m com ando de exortação, de apelo, de m era sugestão, desvestido, portanto, de qualquer força normativa, geraram o completo esvaziamento da norm a, que se to rn o u letra m o r ta no processo eleitoral, sem qualquer repercussão, portanto, no plano dos fatos. A inércia partidária, portanto, na implem entação dos percentuais legais, culm inou p o r gerar a perpetuação da situação de sub~participação fem inina no contexto das disputas político-eleitorais, a despeito do com ando norm ativo do § 3° do art. 10 da Lei das Eleições. 212 Tal circunstância apenas evidencia a im portância que assumem os partidos políticos, quando em discussão qualquer m edida tendente a atenuar o inaceitável “gender-gap” que está a tim brar a representatividade política nacional. É que os partidos possuem o m onopólio das candidaturas políti cas em nosso país (CF, art. 14, § 3^, inciso V), de sorte que um m aior en gajamento fem inino no processo político eleitoral está necessariamente vinculado ao grau de abertura, incentivo e apoio que lhes é fornecido pelas próprias agremiações partidárias, que devem adotar políticas vol tadas à questão de gênero não só em tem a de candidaturas, mas, por igual, em tem a de ocupação de órgãos de direção partidária. As resistências, contudo, a tais com portam entos, são inescondíveis, e levam pensadores com o Vitalino Canas a apelidar as agrem ia ções partidárias de “máquinas de excluir m ulheres’. Nesse sentido, as esclarecedoras as palavras de Vera Lúcia C arrapeto Raposo: “É da atitude partidária que, em últim a instância, depende a intensidade da participação política das mulheres. A inda quando exista um a norm a que preceitue determ inadas actuações, os partidos conservam certa margem de liberdade. A lei belga é disso exemplo. Embora preconize um a quota que os partidos hão de respeitar, nada diz quanto à posição ocupada pelas mulheres em cada lista, de m odo que estes podem colocá-las onde lher aprouver, inclusive em postos inelegívies no fin a l da lista. De facto, esta tem sido a posição adoptada pelos partidos belgas nas eleições para a Câmara dos Representantes, ao passo que nas eleições para o Senado optaram p o r situá-las em postos de mais provável elegibilidade. Desempenhando os partidos u m papel tão relevante no acesso das mulheres a cargos políticos electivos (pois são eles que m onopolizam as candidaturas), não se poderá descurar as suas concepções e o seu m odo de funcionam ento, procurando aperfeiçoá-lo e moldá-lo aos oòjecttvos paritários. A própria posição das mulheres no interior dos partidos não pode ser negligenciada. Os estudos demonstram que a com posição dos principais órgãos partidários é altamente discri minatória. Actualmente, a percentagem de mulheres portu guesas detentoras de cargos directivos nos partidos é ainda mais tênue do que a percentagem de mulheres presentes na Assembléia da República e no Parlamento Europeu. 213 A té 0 m omento, os partidos têm revelado um a perigosa ausência de vontade política em alterar este estado de coisas, circunscrevendo-se as suas actuações em prol da igualdade entre os sexos a acções esporádicas, cujos efeitos facilm ente se esgotam. Vitalino Canas apelida-os de ‘m áquinas de excluir mulheres'”. Mais um a vez com vistas a atenuar o déficit de representatividade fem inina e a superar o total esvaziamento do com ando normativo inscrito no § 3® do art. 10° da Lei n° 9504/97, a Lei n^ 12.034/2009, conhecida com o m ini-reform a eleitoral, voltou a disciplinar o tema, tentando, agora, conferir um m ínim o de força e autoridade normativas à regra que disciplina um percentual m ínim o de cada um dos sexos, quando da apresentação, pelos partidos políticos, de seus pedidos de registro de candidatura para cargos legislativos. Eis a nova redação conferida ao § 3° do art. 10*^ da Lei n° 9.504/97 pela Lei 12.034/2009: § 3° Do núm ero de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o m ínim o de 30% (trinta por cento) e o m áxim o de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo. A substituição da expressão “deverá reservar” por ‘"preencherá” foi a m aneira encontrada pelo legislador ordinário, para expressar seu desígnio no sentido de que a observância da norm a seja, de fato, com pulsória. Contudo, perm aneceu a n o rm a sem qualquer preceito sancionador, autorizando fundadas discussões sobre quais conseqüências recai riam sobre o partido ou sobre a coligação que, ao form ular seu pedido de registro de candidatura, deixasse de observar a cláusula m ínim a de 30% de cada u m dos sexos. E mais: a regra legal em com ento (§ 3® do art. 10 da Lei n° 9.504/97, na redação que lhe deu a Lei n “ 12.034/2009) perm aneceu lim itada aos pedidos de registro para “p a ra a Câmara dos Deputados, Câmara Legislativa, Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais, até cento e cinqüenta por cento do número de lugares a preencher] sem inci dência, pois, nas chefias de executivo, em cujas candidaturas verificamse as maiores disparidades (apenas relembrando, no últim o pleito m u nicipal, pouco mais de 10% dos candidatos a prefeito eram mulheres). 214 o Tribunal Superior Eleitoral, recentem ente, foi provocado a se pronunciar a respeito de qual seria a sanção derivada da não-observância da regra prevista n o § 3° do art. W da Lei n'* 9.504/97. M agistrados e m em bros de Cortes Regionais, preocupados so bre qual procedim ento deveriam adotar na hipótese de receberem um pedido de registro em que não foram observados os parâm etros de representatividade de cada um dos gêneros, subm eteram a questão ao próprio TSE, para que este, então, em processo administrativo, pudesse esclarecer a controvérsia. A discussão não foi singela e abrangeu desde a possibilidade de rejeição total da lista de candidaturas apresentadas - o que geraria a total ausência de candidatos p o r parte desse partido ou daquela coliga ção - até a cogitação de que as agremiações partidárias fossem intim a das para substituírem seus candidatos, cum prindo, assim, a proporcio nalidade exigida em lei. Uma outra opção seria a redução no núm ero de candidatos apresentado, com o corte de algumas candidaturas para que, então, o percentual legal de gênero fosse alcançado. Nada, contudo, ficou definitivamente solucionado, optando a C or te p o r aguardar que um a específica e concreta controvérsia chegasse ao seu conhecimento, para que possa, então, assentar a solução necessária. 3. A AUTONOMIA PARTIDÁRIA E A IMPOSIÇÃO DE PERCENTUAIS MÍNIMOS DE GÊNERO Uma questão, contudo, que pode gerar um debate mais aprofun dado, refere-se à constitucionalidade, ou não, de norm as impositivas de determinadas regras para candidaturas, em face da cláusula constitucio nal da autonomia partidária inscrita no § 1° do art. 17 da Carta Política. Sobre a cláusula constitucional da autonom ia partidária, já as sentou 0 Supremo Tribunal Federal que “O princípio constitucional da autonomia partidária - além de repelir qualquer possibilidade de controle ideológico do Estado sobre os partidos políticos - cria, em favor desses corpos intermediários, sempre que se tratar da definição de sua estrutura, de sua organização ou de seu interno funcionam ento, uma área de reser va estatutária absolutamente indevassável pela ação normativa do Poder Público, vedando, nesse domínio jurídico, qualquer ensaio de ingerência 215 legislativa do aparelho estatal. Ofende o princípio consagrado pelo art. 17, § 1°, da Constituição a regra legal que, interferindo na esfera de auto nomia partidária, estabelece, mediante especifica designação, o órgão do Partido Político competente para recusar as candidaturas parlamentares natas” (ADI 1.063, Rei. Min. Celso de Mello). Em sentido idêntico, a ADI 2.530, em que se reconheceu a inconstitucionalidade de norm a constante da Lei n° 9.504/97 e que previa as cham adas ‘candidaturas natas”. E é nesse contexto que poderia se colocar a questão de cláusula legal impositiva de determ inado ''tipo” ou de determ inada “reserva” de candidatura a m andato político eletivo. Seria tal cláusula inconstitucio nal, por ofensiva da autonom ia partidária? Entendem os que não. É que, muito em bora a cláusula da autonom ia seja inerente ao p ró prio estatuto constitucional dos partidos políticos, conferindo-lhes uma esfera de privacidade e intim idade dogmática e institucional/organiza cional que é infensa à intervenção estatal, isso não significa que tais cor pos intermediários sejam integralmente imunes às regras e aos princípios fundamentais constantes da C arta Política, tal como o é o princípio da igual dignidade de todos e o da não-discriminação entre os sexos. Para além disso, não bastasse a expressa determ inação constitu cional no sentido de que a autonom ia partidária não exime tais agre miações do resguardo aos “direitos fundam entais da pessoa hum ana” (art. 17, caput), o fato é que se m ostra inquestionável a oponibilidade, tam bém aos partidos, enquanto entidades privadas que são - art. 1®da Lei Orgânica dos Partidos Políticos - dos direitos fundam entais, o que decorreria do natural efeito externo ou eficácia horizontal dos direitos que são revestidos do atributo da fundam entalidade (que deixam de ser analisados em sua dim ensão unicam ente voltada às relações trava das entre indivíduos e o p o d er público, para condicionarem, de igual modo, os relacionamentos firmados entre particulares) Não há falar, pois, em soberania partidária, mas, unicamente, em 305 Sobre aplicação h o riz o n ta l d o s dire ito s fu n d a m e n ta is: G O N E T B R A N C O , Pa u lo G ustavo, op. cit., p. 169-180; A BRA N TES; José João N un es. A vinculação das entidades p rivad a s aos direitos fu n d a m e n ta is . Lisboa; A A FD L, 1990; BILBAO UBILLOS, fu a n M aria. La eficácia de los derechos fu n á a m e n ta ie sfr e n te a particulares. M ad rid ; C E PC , 1997; A N D R A D E , José C arlos V iera de. op. cit., p. 141 e ss; HESSE, K o nrad . Dcrecho constitucional y derecho privado. M ad rid ; C ivitas, 1995; SARLET, Ingo. op. cit. 216 autonom ia, que não se sobrepõe ao dever constitucional de observância aos direitos fundam entais (art. 17, caput) e que autoriza, sim, sob tal perspectiva, não só a atuação corretiva do Poder Judiciário, mas, por igual, determ inadas imposições derivadas da lei, tal com o ocorre na hipótese da paridade m ínim a entre os sexos, em tem a de candidaturas políticas. Nesse sentido, Ivan Lira de Carvalho, em seu trabalho “Partidos Políticos: autonom ia, propaganda e controle judicial”^®^: “A autonom ia dos partidos políticos, assegurada pela CF (art. 17), não pode sobrepor-se ao princípio da inafastabilidade, também com sede constitucional (art. 5°, inciso X X X V), segundo o qual nem a lei poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça de direito. H á um choque de princípios (inafastabilidade versus soberania partidária) que se resolve em prol do primeiro, homenageando a supremacia dos interesses públicos, políticos e sociais, na linha do que decidiu o já referido Tribunal Superior EleitoraP^'”. A autonom ia partidária, portanto, está condicionada ao efeti vo respeito, pelas agremiações, aos direitos fundam entais inscritos na Constituição da República, de m odo que ilegítima será, autorizando to das as intervenções cabíveis, qualquer conduta p artidária que se afaste de tais parâm etros inscritos na Lei Fundamental. 4. O EXEMPLO PORTUGUÊS - SANÇÕES ADEQUADAS AO DESCUMPRIMENTO DO PERCENTUAL MÍNIMO DE CADA UM DOS SEXOS Antes de tudo o mais, cum pre m encionar que ainda tram itam , no Congresso Nacional brasileiro, variadas propostas norm ativas contra o déficit de representatividade política da mulher, aí incluídas propostas de em enda à Constituição que prevêem a adoção da m edida mais “ra dicar, consistente na própria reserva de vagas femininas, a serem ado tadas em todas as Casas Legislativas de todas as unidades da federação. Contudo, e ten do em vista que, m esm o após a edição da Lei n° 306 D isponível e m www.jfrn.gov.br/docs/doutrinai93.doc. acesso em 24/05/2010. 307 Rec. 12.990, Rei. Min. E d u a rd o Ribeiro, D fU de 23.09.1996. 217 12.034, que pretendeu conferir m aior densidade norm ativa ao com an do do § 3° do art. 10° da Lei n« 9.504/97, ainda não h á previsão legal de determ inada sanção, a ser aplicada em caso de descum prim ento do pa tam ar m ínim o legal de gênero, m ister considerar, p o r sua pertinência, a experiência de Portugal, quando do processo de criação do Estatuto da Paridade (Lei Orgânica n. 3/2006), Em sua prim eira redação, o projeto previa a presença m ínim a de 33% de cada sexo nas listas de candidatos apresentadas pelos partidos, determ inando, ainda, que os nomes fossem ordenados de form a alter nada entre os gêneros (vale frisar, no ponto, que o sistema português apóia-se na utilização das cham adas ‘listas bloqueadas''). O descum pri m ento do com ando geraria a integral rejeição da lista, com a conse qüente im possibilidade de que qualquer dos candidatos ali apresentado fosse subm etido a escrutínio. Vetado p o r ''desproporcionalidade\ dada a '"excessividade” da san ção im posta (rejeição de toda a lista, com a impossibilidade de apre sentação de nenhum a candidatura), o texto finalmente aprovado traz interessante exemplo, a ser objeto de necessária reflexão: o percentual de 33% de representação m ínim a de cada um dos sexos foi mantido, assim com o a im possibilidade de que, n a com posição das listas, mais de dois candidatos do m esm o sexo sejam posicionados consecutivamente. A inobservância de tais parâm etros gera, de início, um a notificação do partido, para os devidos ajustes. M antido o déficit de representatividade, a lista será afixada publicam ente e divulgada no site da Internet m antido pela Comissão Nacional de Eleições, sempre com a indicação de que está em desconform idade com a lei. Trata-se, até então, de m edida exclusivamente moral, voltada à publicização do nom e de agremiação partidária que não logrou obter o patam ar m ínim o de cada u m dos gêneros em sua lista de candidaturas. Para além disso, o partido que não cum prir os dispositivos de paridade perderão, proporcionalm ente à subrepresentação de um dos gêneros, de 25% a 50% da participação n a subvenção pública de cam pa nhas. O que eqüivaleria, no cenário jurídico nacional, às quotas do fu n do partidário ou, até mesmo, ao tem po de rádio e televisão destinado à propaganda partidária (direito de antena) ou m esm o às candidaturas políticas. 218 Tem-se, agora, interessante m edida não só proporcional, mas, p o r igual, aparentem ente eficaz. A percepção das verbas e repasses públicos, bem assim o acesso aos horários gratuitos de rádio e televisão ficariam condicionados ao efetivo respeito, pelos partidos, do princípio da igualdade de gênero, cabendo referir que a própria im portância assum ida pelo tem po de rá dio e de TV, no contexto das cam panhas políticas e da divulgação p ar tidária, já seria um bom incentivo a que as agremiações estimulassem a formação de lideranças políticas de am bos os sexos. Im aginar que partidos ou coligações que não alcançassem o p a tam ar legal de representatividade p o r gênero pudessem perder até m e tade de seu tem po no rádio e na TV já revela a potencial eficácia da m edida e já perm ite antecipar a possível mobilização de todas as agre miações, na formação de novos líderes e no estímulo a candidaturas de am bos os sexos. Seja qual for a m edida adotada, contudo, o que se deve buscar é a criação de instrum entos efetivos, capazes de com bater a inércia fática que vem perpetuando, no contexto das candidaturas, um a situação de inaceitável desigualdade de gênero e de injustificável subrepresentação fem inina no universo político. As mulheres, m uito em bora constituam a m aioria do eleitorado nacional, persistem p o r se qualificar com o grupo essencialmente vul nerável, a merecer, do Estado, tutela jurídica específica, capaz de lhes assegurar igualdade material de condições, para o pleno exercício de todas suas potencialidades. Nesse contexto, é de toda pertinência que as autoridades legisla tivas reflitam sobre a possibilidade de condicionar a integral percepção das quotas do fundo partidário e o total desfrute do direito de antena ou m esm o do tem po de rádio e televisão destinado à divulgação de candidaturas ao atendim ento, pelas agremiações partidárias, do direito fundam ental que se posiciona no centro de todo o ordenam ento jurídico-constitucional: o da igual dignidade de todos, independentem ente do sexo. 219 220 OS LIM ITES DA PROPAGANDA ELEITORAL E SUA FUNÇÃO NA DEMOCRACIA^"" M a r c u s V in íc iu s F u r t a d o C o e lh o '’'*-' A propaganda eleitoral possui limites quanto ao tempo, ao conte údo, ao agente e à forma, que desem penham a dem ocrática função de garantir a norm alidade e a legitimidade das eleições. Tal limitação não visa im pedir a constitucional liberdade de expressão, m enos ainda de obstar o salutar confronto de idéias e de sufocar a vida política. O dístico constitucional “norm alidade e legitimidade”^ é a razão de ser e a m eta a ser alcançada pelo direito eleitoral. Enquanto n orm ali dade expressa o respeito às regras eleitorais, legitimidade significa a ga rantia da liberdade do voto, pressupondo a igualdade de arm as entre as candidaturas. A criação da justiça eleitoral pela Revolução de 30, cujo slogan era justiça e representação, constituía num a promessa de sanear os costumes políticos do país^“ , tarefa em p erm anente construção. É dizer, p o r sua evolução e por sua missão constitucional, o Judi ciário detêm o poder-dever de intervir no processo eleitoral para as segurar o equilíbrio entre as candidaturas, possibilitando a livre esco lha do eleitor. Nesse diapasão, há de ser estim ulado o debate de idéias, ações e projetos, bem com o coibido o abuso de poder nas eleições. As limitações à propaganda eleitoral devem ser interpretadas à luz dessa finalidade do direito eleitoral. Tradicional posicionam ento da jurisprudência define propagan da eleitoral com o o ato de levar ao conhecim ento geral, propagando-a ou divulgando-a, um a candidatura, m encionando o pleito eleitoral ou o cargo político pretendido, a ação política que se pretende desenvolver 308 Palestra p ro ferid a n o II C o n g re sso B rasiliensc d e D ireito Eleitoral. 5“ 7 d e m aio, p ro m o v id o pela A B R A M P P E e pe lo IDEDH 309 A d v o g a d o m ilitante n o TSE, a u to r do livro D ire ito Eleitoral e P ro ce sso Eleitoral, 2 ^ Edição Ed. R e n o var; D o u to ra n d o pela U n iv ersid ade d e S alam anca; D ire to r S e c re tá rio -G e ra l d o C o n se lh o F ederal da OAB; m e m b ro d a C o m issã o d o S e n a d o p a ra ela b o ra çã o d o n o v o C ó d ig o Eleitoral. 310 C o n stitu iç ã o Federal, art. 14, pa rá g ra fo n o n o . 311 FAUSTO, Boris. H istória G e ra l d a Civilização Brasileira. T o m o III — O Brasil R epublicano. V olume 10. S o cied ade e Política (1930-1964). In tro d u ç ã o G eral de Sergio B uarq ue d e H o la n d a, 9 ' ed„ Rio de laneiro: B e rtra n d Brasil, 2007, p.22, 221 ou as razões para alguém ser considerado apto ao exercício da função pública, com ou sem pedido de voto^^^. Pode ser definida com o os di versos meios utilizados para efetuar a captação lícita de sufrágio. A limitação tem poral da propaganda decorre de um a necessidade de baratear os custos, condensar e m elhor organizar a cam panha elei toral, não possuindo a função de inibir a discussão política fora do pe ríodo de propaganda, entre 06 de julho e até a antevéspera das eleições. É possível a propaganda intra-partidária destinada às prévias eventual m ente realizadas por partidos políticos e na quinzena antecedente das eleições. Desde 48 horas antes e até 24 horas depois do dia de votação, não é possível propaganda em rádio, televisão, comícios e reuniões púbhcas^'^ Até as 22 horas do sábado antecedente à votação podem ser realizadas carreatas, passeatas e manifestação em amplificadores de som. No dia da eleição, é perm itida a manifestação individual e silenciosa de preferência do eleitor por partido político, coligação ou candidato, revelada exclusi vamente pelo uso de bandeiras, broches, dísticos e adesivos/^^ A denom inada m ini-reform a eleitoral ocorrida em 2009 dissipou antiga polêmica sobre os limites da propaganda dos pré-candidatos. Não pode ser considerada propaganda antecipada a concessão de e n trevistas, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, desde que não haja pedido de votos^'\ Igual tratam ento é dispensado pela no rm a à divulgação de atos parlam entares e debates legislativos, bem assim a realização de reunião e seminário, em am biente fechado e custeado p o r partidos políticos, para tratar da organização dos p ro cessos eleitorais, plano de governo ou alianças partidárias visando às eleições. A legislação, no ponto, evidencia que a limitação da propagan da não pode engessar a atividade política.A propósito, a contenção da influência indevida do poder será bem mais facilitada com a ampliação da liberdade de manifestação e expressão de pensam ento e a perm is são da prom oção pessoal. O candidato que utiliza de m étodos ilícitos de captação de sufrágio é mais fortalecido quando o debate político inexiste. D o m esm o modo, a renovação da política é im pedida quando 312 3 13 314 315 TSE, rei. Fclix Fischer, DJ 05/04/2010. C ó d ig o ífleit oral, art. 240, p a rá g ra fo único. Lei 9.504/97, art. 39-A , caput, p ositivo u reite ra d o e n te n d im e n to ju risp ru d e n c ia l. Lei 9.504/97, art. 36 - A , incisos I a IV. 222 são vedados todos os meios de prom oção pessoal do cidadão. A idéia do eleitor de que o político só aparece na época da eleição é reforçada quando é proibida a atividade política fora do período eleitoral. O posicionam ento em relação a temas político-com unitários não pode ser considerado propaganda eleitoral. Por igual, o adesivo com 0 nom e do cidadão posto em um carro ou em u m a tabela de jogos da copa do m undo, sem m enção a pleito, candidatura, pedido de votos ou alusão a alguma circunstância associada à eleição^'^. O abuso deve ser coibido, com o a utilização de outdoor divulgando a aprovação popular de determ inado político^'^, contudo a festa da dem ocracia, expressada pela atividade política, não pode ser posta na ilicitude. A propaganda eleitoral tam bém é lim itada quanto ao conteúdo, objetivando assegurar a paz social, m antendo a urbanidade e o respei to entre os candidatos e partidos políticos. A cam panha não pode ser transform ada em u m ringue de agressões e ofensas. As críticas são p o s síveis, desde que não desbordem para a ridicularização e crimes contra a honra, nom eadam ente a calúnia, difamação e injúria. Não é tolerada propaganda, dentre outras, de desobediência à lei, de perturbação do sossego público, de desrespeito dos símbolos nacionais e de incitam en to contra pessoas ou bens^’®. A propaganda perm itida deve se pautar pela apresentação de idéias e propostas, de análise da situação atual e de divulgação das qualidades dos postulantes a cargos eletivos, contri buindo para a m aturidade dem ocrática do país. Pela influência que possui no processo eleitoral, faz-se necessá rio dissertar sobre o limite de propaganda quanto ao agente público. A propaganda oficial ou institucional é proibida a partir de três meses antes das eleições, salvo os produtos com concorrência no m ercado e os casos de urgência reconhecidos previam ente pela justiça eleitoral. Os gastos de propaganda oficial no ano da eleição não podem superar a m édia dos últim os três anos nem o som atório do ano anterior. Mais relevante, porém , é a proibição constitucional de prom oção pessoal de servidor ou autoridade em cam panhas, atos, obras e program as gover namentais^'^, incidindo o princípio da impessoalidade. A publicidade 316 317 318 319 TSE, R espe 26703. TSE. AI 10010, C ó d ig o Eleitoral, art. 243 ,1 a IX, e Lei n. 5.700/71. C o n stitu iç ão Federal, art. 37, p a rá g ra fo prim eiro.. 223 oficial deve ter o caráter educativo ou de orientação social e seu desvirtuam ento configura abuso de poder. Q uanto à forma, a limitação da propaganda eleitoral visa (a) es tim ular o fortalecimento dos partidos políticos, ao determ inar conste as legendas de todos os partidos coligados na propaganda majoritária e ao prever que filiado a partido coligado nacionalm ente possa ser uti lizada em propaganda regional; (b) a igualdade entre os candidatos, ao proibir brindes - com o camisas, chaveiros, bonés e canetas showmícios e artistas, ainda que candidatos; ao proibir outdoors e ao lim itar as pinturas em m uros a 4 m etros quadrados e determ inar que a veiculação não seja paga; ao proibir mais de 10 inserções na im prensa escrita e ao determ inar o tratam ento isonômico e respeitoso de televisão e rádio e ao distribuir igualitariamente parte do horário eleitoral gratuito, sen do outra parte distribuída de acordo com a representatividade de cada partido; (c) a preservação do patrim ônio público e social, vedando-se propaganda em bens públicos e de uso com um , em árvore e jardins; e (d) a transparência, ao exigir conste o valor da propaganda paga na im prensa escrita e o núm ero de inscrição do CNPJ, CPF e tiragem de propaganda impressa. Além da propaganda eleitoral gratuita de rádio e televisão e paga n a im prensa escrita, a novidade introduzida no cenário eleitoral b ra sileiro é a perm issão da propaganda na internet^^°, que certam ente irá contribuir para realizar as funções preconizadas acima. Isso porque na internet a propaganda deverá ser gratuita e não po derá ser veiculada em sítios oficiais ou de pessoas jurídicas, tenha ou não fins lucrativos. A propaganda deverá ser feita em sítios do candidato, partido ou coli gação, m ediante a remessa de m ensagem eletrônica para endereços ca dastrados gratuitamente, com sistema de descadastram ento pelo desti natário, e p or meio de blogs, redes sociais e similares. O uso da internet, nas últimas eleições presidenciais americanas, revelou-se em im p o rtan te instrum ento nivelador das estruturas dos competidores. Sem dúvida, a rede m undial de com putadores é u m instrum ento m enos oneroso do que a televisão e possui u m a relevante eficácia de transm issão de infor mações e de propaganda. Os meios de com unicação possuem a constitucional liberdade, 320 Lei 9.504/97, art. 57-A a 57-H . 224 regra que prevalece em relação à internet. Contudo, eventuais abusos, discriminações, perseguições e tratam ento privilegiado, não são p er mitidos. O direito à inform ação objetiva é um direito do cidadão e um dever dos órgãos de imprensa. A lei eleitoral, ao disciplinar a conduta dos veículos de comunicação, deve ser interpretada em conform idade com a cláusula constitucional asseguradora do livre pensar, expressar e comunicar. O direito a crítica há de ser preservado, desde que não configure cam panha contrária ao candidato. O aparato judicial deve se concentrar no combate à corrupção eleitoral, gênero de que são espécies a captação ilícita de sufrágio, a conduta vedada do agente público e a irregularidade na arrecadação e gastos de cam panha, ao abuso de poder, seja político, com o uso de m á quinas administrativas, ou econômico, com a utilização em excesso de recursos em cam panhas eleitorais e desvios de conduta. A fiscalização da propaganda eleitoral deve ter em m ente que os limites a ela im pos tos objetivam assegurar a paridade de arm as entre os candidatos, mas não possuem o desiderato de tolher a atividade política antes do perío do de cam panha eleitoral. Assegurar a prom oção pessoal e a liberdade de expressão é um a das formas de estim ular a renovação da política, a contenção dos atos abusivos e a consolidação da dem ocracia, atraindo a participação cidadã da sociedade. Atento a finalidade dem ocrática da limitação da propaganda, o intérprete-aplicador não incorrerá no equívoco de cercear a festa de m ocrática do debate político, necessário renovador da atividade políti ca de representação dos interesses sociais, concentrando-se na tarefa de assegurar ao m áxim o o cum prim ento dos postulados da liberdade do voto e da legitimidade das eleições. 225 226 FIN A N CIA M EN TO D O S PARTIDOS PO L ÍT IC O S E DAS CAMPANHAS ELEITORAIS P a lh a r e s M o r e i r a Reis.'*'^' S um ário - 1. A Questão do Financiam ento de Partidos e de Cam panhas Políticas. 2. O Financiam ento Privado dos Partidos Políticos. 3. O Financiam ento Público dos Partidos Políticos. 4. O Sistema Normativo Brasileiro; a Isenção Tributária. 5. O Sistema Legal de Financiamento, no B rasil 6 . Os Bônus Eleitorais de 1994. 7. O Fundo Partidário na Lei Brasileira. 8. As Despesas Partidárias e de C am panha Permitidas na Legislação. 9. Financiam ento do Uso do Rádio e da Televisão. 10. O Controle Legalmente Exigido para as Finanças Partidárias. A prestação de contas. 11. Efeitos dos Financiam entos sobre os Partidos Políticos. 1. A QUESTÃO D O FIN A N C IA M EN TO DE PARTIDO S E DE CAMPANHAS POLÍTICA S. Os partidos políticos, mesm o sendo entidades privadas, desem penham atividades de interesse público. Com o toda entidade, um par tido político tem um a série de custos íixos para a sua m anutenção e, mesmo, para a sua sobrevivência. Ao lado dessas despesas p erm an en tes, ademais, terá aquelas que ocorrem de tem pos em tempos, relacio nadas com a participação nos pleitos eleitorais. Para fazer face a tais despesas, é óbvio que o partido político n e cessita de receitas, de apoio material e financeiro. Q ue seja este apoio oriundo de seus associados é um a conseqüência natural. E como qual quer outra entidade, poderá prom over mecanism os para um a arreca321 Professor E m érito d a U n iv e rsid ad e Federal de P e rn a m b u c o . P rofesso r C ated rático H o n o rá rio d a U n i v e rsid ad e M o d e r n a de Portugal- C o n fe re n cista h o n o rá rio d a Escola Su p e rio r de A d vocacia R uy da C o sta A n tu n e s, d a O rd e m d o s A dvogados d o Brasil, seção dc P e rn a m b u c o . A dvogado. D o u to r em D i reito e Professor a p o se n ta d o d e C iência Política, e d e D ireito C o n stitu c io n a l d a U n iv ersid ade Federal de Pern a m b u c o . C o o r d e n a d o r A c ad ê m ic o e Professor d c D ireito Eleitoral d a F O C C A - F a cu ld ade de O lin da. D o C o n se lh o Ed ito rial d a R evista Consulex. C o n fe re n cista em co n g re sso s nacion ais e in te rn a cionais. A u to r d e 30 livros, a lg u n s deles em m ais d e u m a edição, e m ais d e 300 titulos, d e n tre artigos e m revistas especializadas, das quais é c o la b o ra d o r p e rm a n e n te , cap ítu lo s de ob ra s coletivas e folhetos, além de artigo s em jo rn a is e p ro g ra m a s c u ltu ra is em rá d io e televisão educativas. 227 dação, eventual ou perm anente, de recursos para a cobertura das des pesas. Deste modo, partidos maiores e mais ricos, dispondo de mais recursos financeiros, poderão fazer cam panhas políticas e eleitorais maiores, usando os veículos e material de propaganda em farta cópia, e assim desestabilizar a igualdade entre os partidos e candidatos que, em tese, deveria existir nas cam panhas. Os mais fracos e mais pobres não têm condições competitivas para tais embates. Daí surgir a grande preocupação entre juristas, políticos, m agis trados e cientistas sociais em relação a este tipo de desigualdade. O tem a do financiam ento dos partidos e das cam panhas políticas tom a ainda um a dim ensão especial quando se sabe que, ao lado dos recursos de origem regular, podem surgir contribuições de precedên cia não m uito adequada. Nestes casos estão os recursos irregularmente obtidos de órgãos ou entidades públicas; contribuições de origem es trangeira; ou m esm o “doações” de particulares que buscarão obter uma contrapartida quando o partido eventualm ente chegar ao Poder. Ade mais, há que se proceder aos lançamentos contábeis de todas as receitas e despesas do partido, dentro e fora do período eleitoral, a fim de que se tenha a necessária transparência da lisura da origem e da aplicação dos recursos. C om ou sem o controle governamental. É prudente, pois, que o cidadão com um saiba de onde vem o di nheiro que financia os partidos políticos e as cam panhas eleitorais. Sem dúvida que a contribuição oriunda dos m em bros do partido é de fácil entendim ento e aceitação. O m esm o não se dará no caso de enorm es contribuições de particulares, de grandes empresas, de recur sos públicos não previstos ou proibidos pela lei e, ademais, de financia m entos oriundos de fontes estrangeiras. As despesas realizadas pelos partidos políticos são relativas, p ri meiro, ao custeio do seu funcionam ento perm anente e, em segundo plano, às relacionadas com as cam panhas eleitorais. Claro que há de se distinguir, do m esm o m odo que no exame das receitas, o das despesas, a fim de se saber quais os dispêndios com atividades regulares ou a aplicação de tais verbas em situações irregulares, pouco éticas ou, até mesmo, criminosas. Existem sistemas políticos em que o financiam ento dos partidos 228 políticos é substancialm ente feito por dinheiro público, enquanto n o u tros a origem é sempre de entidades privadas, não só de indivíduos, mas, sobretudo, de grandes corporações, nacionais e multinacionais (com sede ou filial local). Em nenhum , porém , adm ite-se form alm en te o financiam ento de partidos e cam panhas com recursos financeiros provenientes de Estados ou entidades estrangeiras. A idéia de coibir práticas pouco recomendáveis no financiam en to de partidos políticos e de cam panhas eleitorais teve sua objetivação com leis de caráter penal, buscando reprim ir a corrupção que lastreava certos com portam entos eleitorais. O Reino U nido foi o pioneiro nesta ação, com a Corruption Practices Prevention Act, de 1854. A ele se ju n tou a França, em 1914 e bem assim os Estados Unidos da América, em 1925. Não havia, em lugar algum, qualquer no rm a que disciplinasse a atividade político-partidária a respeito do seu financiamento. Somente depois do térm ino da II G uerra M undial que a República Federal da Alem anha passou a distinguir os partidos políticos das demais asso ciações de pessoas, mas sem que o problem a do financiam ento tivesse regulam entação de qualquer natureza. “Deve-se constatar que os regulamentos a respeito do tema, na sua m aior parte, surgiram a partir do fim dos anos sessenta: 1966, na D inam arca e Suécia; 1967, na A lem anha Federal; 1969, na Finlândia, na Itáha e nos Estados Unidos da América; 1975, na Áustria; 1976, em Portugal; 1977 em Quebec; 1984, na Grécia; 1989, na Bélgica; 1985, na Espanha; 1988 3 1990 na França. Todas foram frequentem ente m odifi c a d a s e c o m p l e t a d a s ” (D ou B L E T , 1990, p. 4.) O disciplinamento dos mecanism os de financiam ento público ou privado dos partidos políticos pode decorrer diretam ente da lei, sem que seja exigida um a base constitucional. “Ademais, um a legislação sobre o financiam ento dos partidos p o líticos pode existir sem que estes inexistam com o pessoas jurídicas. Foi assim na Grécia, que não reconhecia os partidos com o pessoas ju ríd i cas, e isto não constituiu obstáculo para a aprovação de um a regula mentação do seu financiam ento” ( D o u b l e t , 1990, p. 4) A idéia que orienta o financiam ento público dos partidos é funda da nos princípios constitucionais de igualdade entre os participantes do 229 processo eleitoral e da garantia efetiva do exercício, não só da liberdade de expressão, quanto da liberdade de associação, neste campo específico. “Com efeito, n a m edida em que o legislador privilegia o finan ciamento público ou o financiam ento privado dos partidos ou dos can didatos, que se orienta no sentido de fazer o Estado assum ir um a parte das despesas correntes das formações ou exclusivamente as despesas de cam panhas eleitorais, que limite ou não estas últimas, que obrigue os partidos ou candidatos a publicar os orçam entos ou as contas de cam panha, que obrigue os eleitos a declarar seu p atrim ônio o u sua renda, que subm eta as contas dos partidos e dos eleitos a um controle, a inde pendência dos hom ens e das forças políticas se apresentam m odifica d a s ” ( D o u b l e t , 1 99 0 , p . 15). 2. O FINANCIAM ENTO PRIVADO D O S PARTIDOS POLÍTICOS. Em prim eira tese, há a posição de que o financiam ento dos p a r tidos políticos, seja para a sua m anutenção, seja para as cam panhas elei torais, deve ser de cunho privado, eis que se trata de entidades civis de direito privado e sem fins l u c r a t i v o s . (S o s p e d r a , 1996, p. 61) É evidente que os particulares financiadores dos partidos e, em especial, das cam panhas eleitorais, são pessoas que têm interesse nos resultados: todos aqueles que financiam as atividades partidárias con seguem que lhe fique aberta um a via para a obtenção de favores e be nefícios. O u com o diz com propriedade Key, “quem paga o gaiteiro diz o que ele deve tocar, e esta é, com freqüência a história das finanças do partido n um a democracia” ( K e y Jr .: 1962, p. 741). No elenco de fontes financiadoras de origem privada, podem ser agrupados, de um lado os recursos oriundos do próprio partido e de outro os que vêm de entes privados estranhos à agremiação. No p ri m eiro caso estão: a) as contribuições dos filiados; b) as contribuições dos ocupantes de cargos públicos e dos candidatos; c) os recursos de origem patrim onial; 322 O te x to d o a u to r esp a n h o l m e re c e especial a te n çã o p a ra esta p a rte d o e stud o , e servirá d e base p a ra o d e se n v o lv im e n to d o texto. 230 d) os recursos oriundos da venda de publicações e de outras atividades capazes de produzir renda. D entre os recursos provenientes de entes privados, situam-se: a) doações e contribuições; b) empréstimos; c) atividades esporádicas de natureza empresarial, d) receitas atípicas. Rápida análise de tais tópicos deve ser feita em seguida. A ) As contribuições dos filiados - Estas são a prim eira e imediata fonte de financiam ento dos partidos. O riundas de um a prática iniciada pelos partidos de massa, podem ser de m aior ou m enor porte, dependendo do núm ero de filiados e da condição econôm ico-financeira predom inante. O núm ero de filiados tem um a relevância m uito grande para o partido, pois se de um lado evidencia a sua força que pode se transform ar em potência eleitoral, serve igualmente para explicar a origem de recursos financeiros para custeio das atividades regulares perm anentes da instituição. B) As contribuições dos ocupantes de cargos públicos e dos candidatos - M uitos são os partidos políticos que cobram dos “candidatos a candidato” um a contribuição financeira que pode funcionar como um a espécie de jóia para que o partido o aceite com o postulante a cargo eleitoral. A seu lado existe a regra estatutária em várias agremiações de que os seus partidários, u m a vez eleitos, contribuam norm alm ente para o caixa do partido com um percentual sobre sua rem uneração do cargo que ocupa, seja parlam entar ou executivo, p o r eleição ou nomeação. Não se trata mais, como dantes, de simples donativos, porém tais recursos vêm envolvidos pela no rm a de um a contribuição compulsória, que passa a garantir um a receita regular para a agremiação. Tais contribuições, ademais, podem se revestir do caráter de multas impostas p o r infração, ou pela disciplina do grupo, ou ainda pelo descum prim ento de deveres parlamentares. Em conseqüência, m uitos partidos políticos, quando assumem o Governo am pliam substancialm ente o núm ero de cargos de livre nomeação e exoneração, e os preenche com participantes do partido, a fim de que possa, deste m odo, aum entar a arrecadação das contribuições para o caixa d o partido. 231 C) Os recursos de origem patrimonial. - O partido político, como é evidente, não é um a entidade com finalidades lucrativas e, por isso, não é de se esperar que seu patrim ônio venha a gerar receitas, com o atividade normal. Ademais, o patrim ônio de um partido político, do ponto de vista imobiliário, é m uito restrito, tanto assim que norm alm ente muitos deles dispõem de espaços nos prédios do Congresso Nacional para sediar a adm inistração n acio n al A própria legislação brasileira adm ite que os partidos políticos devidam ente registrados no TSE possam usar, gratuitamente, escolas públicas e Casas Legislativas para a realização de suas reuniões ou convenções/^^ No entanto, é perfeitam ente possível que em alguns casos exis tam imóveis destinados a sediar os órgãos do partido e, a seu lado um patrim ônio mobiliário, especialmente equipam ento para as atividades regulares e para as cam panhas eleitorais, que podem ser, em determ i nadas circunstâncias, locados a terceiros, para a realização de reuniões e propaganda, com o carros de som e similares. E esta será um a eventual fonte de renda interna do partido. D) Os recursos oriundos da venda de publicações e de outras ati vidades capazes de produzir renda. - M esmo não tendo finalidades lu crativas, nada im pede que um partido político produza material de di vulgação de suas idéias e de suas teses políticas, sociais e econômicas. Material impresso, como livros, revistas e jornais, e hoje em dia, m ate rial adequado aos meios eletrônicos de com unicação de massa (discos, vídeos, e similares). A im prensa é um meio de com unicação que pode ser adequada m ente usado para a inform ação e o proselitismo políticos. E a venda do material produzido para este fim é igualmente um a fonte de renda para a entidade. Hoje em dia, essas atividades estão com um p o d er bem m enor do que nos m eados do Século XX, dos anos 30 aos anos 60, quando o n a zismo usava o rádio para a divulgação das suas mensagens e dos discur sos hitleristas; quando jornais partidários, especialmente da im prensa comunista, o mais célebre de todos n o m u n do ocidental tendo sido o VHumanité, do Partido C om unista Francês. No Brasil, diversos foram 323 É 0 art. 51 d a Lei n .” 9.096, d e 1995, que, adem ais, respo n sab iliza o p a rtid o politico pelos d a n o s c a u s a d o s co m a realização d o evento. 232 órgãos de cunho socialista e com unista que existiram, desde antes da era varguista e até o regime militar, com o Voz Operária, Problemas, de cunho nacional. E diversos jornais locais, com o a Folha do Povo, no Recife, todos vendidos em bancas e rendendo para o partido custear as despesas de publicação. O utras atividades podem vir a produzir renda para os trabalhos partidários perm anentes ou de cam panha eleitoral, como, p o r exemplo, almoços com militantes e simpatizantes em to rn o de líderes e eventuais candidatos a cargos eletivos, todos eles destinados a angariar recursos para a cam panha, e outros tipos de reuniões festivas. A par dessas receitas, provenientes de fontes internas dos p ar tidos políticos, muitas outras podem existir, de caráter privado, cujas fontes são externas ao partido, como se verá a seguir, detalhadamente: A ) Doações e contribuições - É norm al u m partido político buscar junto aos seus simpatizantes, seja em época de cam panha eleitoral, seja para atender a esporádicas necessidades de fluxo de caixa, doações, na m aior parte das vezes, financeira. Diz-se que podem as doações ser eventualm ente financeiras, p o r que existem outras doações realizadas em bens e serviços para os p ar tidos ou candidatos, com o o aporte de cartazes, faixas, financiamento de horas de estúdios de gravação para produção de fitas de som ou de vídeo para as cam panhas. Não só para as cam panhas eleitorais, mas igualmente para as de referendo, com o já ocorreu, inclusive no Brasil. O u mesm o para o funcionam ento regular do partido. É aquilo que a lei brasileira sobre partidos políticos denom ina de “doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro”. É norm al que a doação feita a um partido político tenha como um dos fundam entos a simpatia do doador pelas idéias ou program a da entidade. No entanto, tam bém sempre foi com um , no Brasil, em áre as onde o antigo Partido Com unista, então na clandestinidade, recebia financiam ento de empresários, o que se chamava de “seguro de vida político”. Não era excepcional que os em presários financiassem, sim ul taneam ente, partido de governo e partido de oposição, norm alm ente os prim eiros vinculados aos proprietários de terras, industriais e com er ciantes, e estes últim os de linha esquerdista. B) Empréstimos - O recurso ao crédito po de ser usado pelos p a r OS 233 tidos políticos para o financiam ento das atividades regulares e para co bertura dos custos de cam panhas. Em préstim os bancários poderão ser obtidos de bancos privados ou governamentais, com juros subsidiados, diferentem ente da cessão de recursos a outras entidades ou indivíduos. Tais empréstimos, na verdade, constituem um meio indireto de subsí dio à entidade para o financiam ento de suas atividades regulares ou das cam panhas eleitorais. C) Atividades esporádicas de natureza empresarial - Não é norm al u m partido político se dedicar a atividades empresariais. Além de espo rádicas, n a sua m aior parte não têm obtido o sucesso adequado. Mas, em alguns casos, é possível que a entidade disponha de instrum entos de produção que possam ser usados para outras finalidades, além daquelas de interesse direto do partido. O exemplo clássico é o da existência de u m parque gráfico, norm alm ente usado para im prim ir jornal ou outra literatura do partido, e ser usado em horas ociosas p ara produzir para terceiros, m em bros ou não do partido, agindo empresarialmente. D) Receitas atípicas - As receitas atípicas são, na m aior parte das vezes de difícil explicação, pois resultam de atividades que possam ser consideradas ilegais, ou se aproxim em bastante desse campo. A prim eira delas é a de doações de origem estrangeira, as quais, em praticam ente todos os sistemas políticos, são proibidas, porque é um m ecanism o de ingerência n a política interna ou externa do Estado que a recebe. Mas não é estranha ao m undo partidário essa prática, e as grandes potências sempre encontraram u m m eio de rem eter recursos financeiros ou materiais para os partidos políticos que possam dissemi n ar idéias em seu prol, para a sua m anutenção e equipam ento ou para a realização de cam panhas eleitorais. Os antigos partidos comunistas, no m undo inteiro, sempre tiveram ligações, não só ideológicas como financeiras, com o Partido C om unista da União Soviética. Os p arti dos políticos alemães, ou fundações a eles ligadas, entidades dos Esta dos Unidos, nos tem pos da guerra fria, principalm ente, países árabes na luta contra os israelenses, sempre canalizaram recursos financeiros para os partidos políticos locais poderem realizar atividades tendentes a influenciar a opinião pública ou as atividades governam entais ou p ar lamentares n um a ou noutra direção. A seu lado, a cobrança de comissões para influenciar em decisões 234 governam entais para obtenção de contratos com o governo, neste caso apenas se considerando a atividade de cobrança deste tipo quando o re sultado seja dirigido ao caixa do partido e não para os seus integrantes, que poderão até, igualmente, usar tais recursos para o financiamento de suas cam panhas eleitorais. A prática da licitação para a escolha dos contratantes para fornecim ento de bens e serviços, em determ inadas circunstâncias, dim inui ou im pede esse tipo de obtenção fraudulenta de recursos, mas em todos dos lugares do m u n do em que se adotam estes mecanismos, existem as válvulas de escape para a contratação sem concorrência, quando as empresas ligadas aos partidos ou a lideres partidários (ou m esm o de propriedade destes) são agraciadas com as contratações. Do mesm o m odo se inclui neste tipo, pela sua enorm e proxim i dade, o tráfico de inform ações privilegiadas. A atividade, considerada crim inosa, é usada, do mesm o m odo, para o financiam ento partidário ou de alguns de seus membros. Não se deve incluir neste entendim ento o uso de tais mecanism os apenas para am pliar a riqueza particular dos políticos, o que, tam bém atividade crim inosa, não se liga necessaria m ente às tarefas partidárias. O utro m odo de financiam ento indireto das atividades partidárias é a cessão de servidores públicos para trabalhar no partido, em detri m ento de suas atividades regulares na adm inistração, ou em empresas públicas. 3. O FIN A N CIA M EN TO PÚBLICO D O S PARTIDOS PO L ÍTIC O S. Em contrapartida, h á a posição de que o financiam ento dos p ar tidos políticos, seja para a sua m anutenção, seja para as cam panhas elei torais, deve ser de cunho público. Os recursos, na sua m aior parte, ou mesm o na totalidade, devem ser oriundos dos cofres governamentais. F undam enta esta corrente a alegação de que o aporte financei ro público daria possibilidade aos partidos políticos pequenos e p o bres para participar da com petição política. C om as necessidades cada vez maiores de recursos para as cam panhas eleitorais, especialmente para atender a propaganda e as atividades de aliciamento de eleitores para ingresso no partido, ou para que votem nos candidatos do partido 235 no dia da eleição, argum enta-se que o partido que disponha de m aior som a de recursos terá oportunidades m aiores de vitória do que os mais fracos economicamente. A análise de S o s p e d r a , neste ponto, é elucidativa: “O financia m ento público veio obedecer, ademais, a outras três razões de im por tância: ao fracasso das regras destinadas a lim itar os gastos eleitorais, ao custo crescente das cam panhas eleitorais conduzidas nos moldes da publicidade comercial e ao crescente reconhecim ento legal do papel público que os partidos desem penham . Finalmente, mais como critério de legitimação que outra coisa, cabe aduzir os argum entos baseados no estabelecimento de um certo grau de igualdade na com petição eleito ral” {S o s p e d r a , 1996 p. 81). O que se pretende, igualmente, é evitar com o financiam ento p ú blico, controlado pelo órgão que supervisiona a atividade eleitoral, a corrupção e o m au uso dos recursos de origem privada. O financiam ento estatal dos partidos políticos se amplia cada vez mais face ao crescimento desm esurado dos seus gastos, especialmente nas cam panhas políticas, com os novos meios de com unicação de m as sa. É a s s i m n a A r g e n t i n a , ( N a t a l e , 1979, p. 95) na F ran ça,^^' ( N a t a LE, 1979, 95) na S u é c i a . ( N a t a l e , 1979.p. 96.) Já na Alemanha, que inicialmente entendia que o Estado deveria assum ir os custos eleitorais, a C orte Constitucional entendeu que esta contribuição era inconstitu cional, pelo fato de poder criar dependência do partido em relação ao governo.-'^' ( N a t a l e , 1979, p. 95) A idéia de financiam ento público das cam panhas eleitorais e dos partidos políticos é antiga, pois na Inglaterra e na França rem ontam à prim eira m etade do Século XX. Torna-se mais com um nos anos sessen ta e se torna atividade regular nos anos setenta, sobretudo nos países europeus (Suécia, 1966; República Federal da Alem anha, 1967; D ina m arca e Finlândia, 1969; Noruega, 1970; Estados Unidos, C anadá e Itá lia, 1974, etc.) 324 A d o ta ç ã ü é em te rm o s d e c o n trib u iç ã o m o n e tá ria p ro p o rc io n a l a o n ú m e ro d e vo to s ob tid o s nas elei ções. A dem ais, os p a rtid o s po lítico s tê m fra n q u ia postal, telefônica e d c tra n sp o rte . 325 N a F ran ç a o E sta d o a ssu m e n ã o só os c ustos eleitorais, c o m o ta m b é m os d a s tra n sm issõ e s d e rádio e d e televisão, e co n trib u i p a ra os gastos do s candid atos. 326 A Suéci-i s u b sid ia o s p a rtid o s políticos. 327 NATALE, cita n d o u m a d ecisão d e 1966. 236 Os m ecanism os de financiam ento público, direto ou indireto, são classificados p o r S o s p e d r a no seguinte elenco: SOSPEDRA, 1996 p. 82 1) Limitação dos gastos: a) dos candidatos; b) dos partidos; c) de terceiros. 2) Regulamentação das doações e contribuições: a)individuais; b) de pessoas jurídicas, em especial de empresas e sindicatos; c) proibição de doações p o r estrangeiros; 3) M edidas fiscais especiais: a) incentivos fiscais; b) isenções; 4) Financiam ento público: a) dos partidos; b) de candidatos; 5) Financiam ento indireto: a) espaço no rádio e televisão; b) locais; c) subsídios à im prensa e a organizações dependentes. Em seguimento, será procedida um a rápida análise de tais tópicos. A limitação dos gastos - O prim eiro aspecto a ser considerado no que concerne ao financiam ento público (e m esm o de origem privada) dos partidos e cam panhas políticas é o do estabelecimento de um lim i te para as despesas realizadas nas cam panhas. O limite pode ser rela cionado com o partido com o um todo, com cada um dos candidatos registrados e, finalmente, estabelecer u m parâm etro para o que podem terceiros interessados contribuir para o financiamento. É adequado que a lei estabeleça um a lim itação para as despesas eleitorais, a fim de que seja im pedido o desequilíbrio entre os diversos grupos, pois sem esta providência poderá desaparecer a igualdade de oportunidades entre os partidos. 237 D ependendo do sistema, pode haver apenas o financiamento público para os partidos políticos, ou apenas para os candidatos. O u tros, ademais, adotam o financiam ento tanto ao partido como entidade quanto aos candidatos individualmente. Estes gastos podem ser controlados pelo Governo e em alguns países as contribuições eleitorais ou partidárias podem ser deduzidas para efeito do Im posto sobre a Renda. Muitos são os sistemas que estabelecem regulamentação das d o ações e contribuições: não só as individuais, com o as de pessoas ju rí dicas, em especial de empresas e sindicatos. Com o se disse antes há sempre proibição de doações p o r estrangeiros. O financiamento público dos partidos políticos pode ser direto ou indireto. Na prim eira hipótese, o Estado distribui recursos entre as agremiações registradas; na outra, assume determ inados gastos ou con cede isenções fiscais ou incentivos. No caso de financiam ento indireto com a cobertura dos gastos de cam panha, é norm al o financiam ento pela concessão gratuita para os partidos e candidatos dos tem pos na program ação de rádio e de televi são, isoladamente ou em redes. É norm al que os governos perm itam aos partidos políticos o uso de espaços públicos para a realização de suas atividades. Em muitos casos, esta cessão é gratuita, noutras apenas é cobrada um a taxa sim bólica. Muitos partidos políticos têm sua sede principal localizadas nos Palácios dos Congressos, com o se disse antes, ou em outros prédios públicos, sendo este o endereço perm anente da entidade. Também existe a cessão de prédios públicos para a realização de convenções ou outras reuniões, sejam estas restritas a filiados ou aber tas ao público em geral. Pode-se estender a noção de cessão de espaços públicos ao uso de vias públicas para a realização de manifestações, tais com o passeatas e comícios. No Direito brasileiro, a garantia constitucional do direito de reu nião está fixada no inciso XVI do art. 5® do texto de 1988, ao assegurar que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo ape nas exigido prévio aviso à autoridade competente”. 238 A regra de 1946 era de cunho mais amplo, quando dizia que “to dos podem reunir-se, sem armas, não intervindo a polícia senão para assegurar a ordem pública. Com esse intuito, poderá a polícia designar 0 local para a reunião, contanto que, assim procedendo, não a frustre ou impossibilite”. Com base nessa norm a constitucional tem -se com o corolário a lei sobre o direito de reunião, que trata da fixação anual, pela autori dade policial de m aior categoria, das praças destinadas a comícios, nas cidades. Se, porém , a fixação se fizer em lugar inadequado que importe, de fato, em frustrar o direito de reunião, qualquer indivíduo poderá re clam ar à autoridade policial indicação de lugar adequado. A autoridade terá dois dias para providenciar e, se não o fizer, ou indicar lugar inade quado, poderá o reclamante im petrar ao Juiz com petente m andado de segurança que lhe garanta o direito de comício, em bora não pretenda n o m om ento realizá-lo. Em tal caso, caberá ao Juiz indicar o lugar apro priado, se a polícia, modificando o seu ato, não o fizer. A celebração do comício, em praça fixada para tal fim, independe de licença da polícia; m as o prom otor do mesmo, pelo m enos vinte e quatro horas antes da sua realização, deverá fazer a devida com uni cação à autoridade policial, a fim de que esta lhe garanta, segundo a prioridade do aviso, o direito contra qualquer que no m esm o dia, hora e lugar, pretenda celebrar outro comício.^-^ De acordo com a legislação brasileira, é assegurado ao partido político com estatuto registrado no Tribunal Superior Eleitoral o direi to à utilização gratuita de escolas públicas ou Casas Legislativas para a realização de suas reuniões ou convenções. A entidade se responsabi liza, no entanto, pelos danos porventura causados com a realização do evento.^^"^ Podem ocorrer subsídios aos jornais e demais publicações p a r tidárias. Ademais, existem as isenções tributárias concedidas a partidos políticos e, em certas situações, às entidades que lhe são dependentes. 328 Lei n." 1.20/, d e 25/10 /1 95 0 - D O U 27/10/1950. D ispõ e so b re o D ire ito d e R eu n ião, art. 3'"329 Lei n." 9096, de 19/9/1995. art. 51. 239 4. O SISTEMA N ORM A TIVO BRASILEIRO: A ISENÇÃO TRIBUTÁRIA. A prim eira questão relativa às finanças dos partidos políticos no Brasil é a da isenção tributária assegurada pela Constituição Federal, desde o texto de 1946.™ Esta regra foi alterada pela EC-18, de 1965/^' que determ inou a disciplina da questão p o r lei com plem entar (e não mais p o r lei ordinária), voltou em 1967 com os requisitos a serem d e term inados em lei (ordinária, portanto);’"'^ regra repetida no texto de 1969. N a Constituição de 1988, a m atéria está no art. 150, VI. Nesta passagem, o Texto Básico veda às três Ó rbitas de Poder a instituição de im postos sobre o “patrim ônio, renda ou serviços dos p ar tidos políticos, inclusive suas fundações”, ficando claro no § 4® que essas vedações “com preendem som ente o patrim ônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais nelas m encionadas”. Por essa razão, quando foi vetado o dispositivo do projeto da lei sobre Partidos Políticos, que estendia essa im unidade tributária aos institutos dos partidos, nas razões do veto, o Vice-Presidente M a r c o M a c i e l fundam entou sua inconform idade no fato de que o projeto extrapolava o previsto naquele artigo, o que dem onstrava vício de inconstitucionalidade. A regra legal ultrapassava os parâm etros fixados no texto da Constituição Federal citado. 5. O SISTEMA LEGAL D E FINA N CIAM EN TO , N O BRASIL. N o Brasil, a Lei nova sobre Partidos Políticos trata da criação do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), adotando, com isto, u m sistema misto de financiamento, 330 C onstituição de 1946, art. 31, V. b - À U nião, aos Estados, ao D istrito Federal e aos M unicípios é vedado: V - la n ç a r im p o s to sobre: b) te m p lo d e q u a lq u e r culto, be n s e serviços de p a rtid o s políticos, instituições d e ed u ca ç ã o e assistência social, desd e que as suas re n d a s seiam ap licadas in te g ra lm e n te n o país p a ra os respectivos fins. 331 E m e n d a C o n stitu cio n al n.° 18, d e 1/12/1965, art. 2°, IV, c: A rt. 2° - E ve d ad o à U nião, aos Estados, a o D istrito F ederal e aos M unicípios: IV - c o b ra r im p o s to s sobre: c) o p a trim ô n io , a re nd a o u serviços d e p a rtid o s políticos e d e in stitu içõ es de ed u ca ç ã o o u de assistên cia social, o b s erv ad o s os requisitos fixaclos e m lei co m ple m e ntar. 332 C o n stitu iç ão de 1967, art. 20 - Ê v e d ad o à U nião, aos Estados, a o D istrito federal e aos M unicípios: III - c ria r im p o s to sobre: c) o p a trim ô n io , a re n d a o u os serviços d e p a rtid o s políticos e de instituições d e ed u ca ç ã o o u d e assis tê n c ia social, o b s erv ad o s o s requisitos fixados em lei. 240 um a vez que estarão presentes os recursos públicos do Fundo Partidá rio ao lado daqueles oriundos de indivíduos e entidades privadas. Os recursos financeiros disponíveis para os partidos políticos aliam-se à isenção tributária já garantida na Constituição desde 1946, com o se viu. As regras legais dispõem sobre a limitação dos gastos eleitorais e partidários p o r indivíduos e grupos, controla as doações, prevê o finan ciam ento público pelo Fundo Partidário ao lado dos recursos privados para as cam panhas, trata do uso de transm issão gratuita de programas de rádio e de televisão, com o se verá a seguir. A legislação, no que concerne às receitas, fixa de logo as proi bições ao recebimento de determ inados tipos de ajuda financeira, en tendendo que a participação desses doadores no processo eleitoral e partidário com prom etem a lisura do pleito em especial e do sistema com o um todo. Assim, a Lei dos Partidos, ao lado da criação do Fundo P arti dário, com o se verá adiante, fixou n o seu art. 31 algumas vedações ao partido político, im pedindo-o de receber, direta ou indiretam ente, sob qualquer form a ou pretexto, certos tipos de contribuição ou auxílio p e cuniário ou estimável em dinheiro, de determ inadas procedências. A Lei n.° 9.504, de 1997, ampliou o elenco de restrições. Já não se fala apenas em partidos, mas igualm ente em candidatos, aos quais se veda receber, direta ou indiretam ente, doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por m eio de publicidade de qual quer espécie, procedente de: I - entidade ou governo estrangeiros (regra nas duas leis); II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações refe ridas no art. 38 da citada lei,” ^ que são as feitas p o r pessoas físicas ou jurídicas diretam ente no Fundo Partidário; 333 A rt. 38. 0 F u n d o Especial d e A ssistência F in a n c e ira aos P a rtid o s Políticos (P u n d o P a rtid ário ) é c o n s titu íd o por: I - m u lta s c p e n alid ad e s p e c u n iá ria s aplicadas nos te rm o s d o C ó d ig o Eleitoral e leis conexas; II - rec u rso s fin anceiro s qu e lhe forem d e stin a d o s p o r lei. em c a rá te r p e rm a n e n te o u eventual; III - do a çõ e s de pessoa física ou juríd ica , efetuadas p o r in te rm é d io de de p ó sito s ba n c á rio s d ire ta m e n te na c o n ta d o F u n d o Partidário ; IV - d o ta ç õ es o rç a m e n tá ria s d a U nião e m valo r n u n c a inferior, cad a ano, ao n ú m e r o de eleitores in scri tos em 31 dc d e z e m b ro d o a n o a n te rio r ao d a p ro p o s ta o rç a m e n tá ria , m u ltip lic ad o s p o r trin ta e cinco centavos de real, e m valores d e ago sto de 1995. § 1“ (V E T A D O ) § 2 » (V E T A D O ) 241 Ill - órgão da adm inistração pública direta e indireta (autarquias, empresas públicas ou concessionárias de serviços públicos, sociedades de econom ia m ista ou fundação m antida com recursos provenientes do Poder Público); V - concessionário ou perm issionário de serviço público; V - entidade de direito privado que receba, n a condição de ben e ficiária, contribuição com pulsória em virtude de disposição legal; VI - entidade de utilidade pública; VII - cooperativa, entidade de classe ou sindical; VIII - pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba recursos do exterior. Houve ainda um a disposição que vedava ao partido político re ceber recursos de instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política, criado ou m antido com recursos do Fundo Partidá rio, que depois desapareceu. Q uando a regra fala em órgãos públicos ou de utilidade pública, o faz no sentido o mais geral possível, englobando os de cunho federal, estadual, m unicipal ou distrital, vinculados a qualquer dos poderes. E a referência a entidade de classe ou sindical é, igualmente, abrangente p o r demais, nela se incluindo as entidades patronais ou de empregados, bem como as de profissionais liberais e de qualquer outra profissão ou atividade. É a tentativa de evitar a participação dos grupos de pressão diretam ente sobre o partido político ou sobre os candidatos a cargos eletivos. 6. OS BÔNUS ELEITORAIS DE 1994. Em 1994, a legislação previa um sistema diferente para controle da arrecadação de recursos. Cada partido político, recebendo as p re visões de arrecadação e de gastos de cada circunscrição, acrescidos do limite que fixasse para a eleição presidencial, solicitava ao M inistério da Fazenda a emissão de Bônus Eleitorais ao portad o r em valor corres pondente ao total de gastos previstos pelo partido para todas as eleições de disciplinadas pela Lei.^^^ Cabia ao M inistério da Fazenda em itir os Bônus Eleitorais ao 334 L e in .° 8.713, d e 30/09 /1 99 3 - D O U 01/10/1993. 242 portador, os quais tinham as seguintes características; “I - indicar o va lor em m oeda da doação, convertido em U nidade Fiscal de Referência (UFIR); II - ser previam ente num erados, para fins de identificação de sua distribuição posterior aos partidos; e finalmente, III - ser emitidos em valores variados”. Ditos bônus eram im pressos com um canhoto, pelo qual o Partido, o candidato ou a própria Justiça Eleitoral poderiam controlar a arrecadação. Recebidos os bônus eleitorais, o órgão de direção nacional do partido repassava aos órgãos regionais os Bônus correspondentes à respectiva circunscrição, os quais eram distribuídos aos candidatos no limite individual perm itido para seus gastos. Deste m odo, toda doação a candidato específico deveria ser fei ta m ediante troca p o r bônus eleitorais, correspondente ao seu valor. E m esm o os recursos próprios do candidato para serem utilizados em sua cam panha, tinham de ser previa e integralmente convertidos em bônus recebidos do Com itê Financeiro. O sistema de bônus eleitorais era o m ecanism o pelo qual preten dia a Justiça Eleitoral exercer o controle da arrecadação. Se cada Partido tin h a recebido bônus em quantidade suficiente para atender às necessi dades de arrecadação na sua circunscrição, posto que a docum entação rem anescente (o canhoto) era o docum ento hábil para a escrituração contábil. Saber-se-ia quem dava os recursos e a quem estes eram desti nados. A própria lei, mesm o assim, estabeleceu as limitações à arrecada ção: era vedado, a partido e candidato, receber direta ou indiretam en te doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de entidade ou governo estrangeiro; órgão da adm inistração pública direta, ressalvado o Fundo Partidário, indireta ou fundação instituída em virtude de lei ou m a n tida com recursos provenientes do Poder Público; concessionário ou perm issionário de serviço público federal, estadual, distrital ou m u n i cipal; entidade de direito privado que receba, na condição de benefici ária, recursos provenientes de contribuição com pulsória em virtude de disposição legal; entidade declarada de utilidade pública federal, esta dual, distrital ou municipal; entidade de classe ou sindical; e, finalm en te, pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba recursos do exterior. 243 A desobediência a este dispositivo, com o partido recebendo recursos de origem vedada nesta Lei ou gastar além dos limites esta belecidos tinham um a sanção direta: a entidade perderia o direito ao Fundo Partidário do ano seguinte. Mas o sistema do Bônus Eleitoral foi furado quando se soube ter havido candidato à Presidência da República que recebia as doações e entregue Bônus em valor duplicadam ente superior ao recebido, carac terizando nítida fraude eleitoral. O sistema não foi repetido na eleição seguinte. 7. O FUNDO PARTIDÁRIO NA LEI BRASILEIRA. No Brasil, a Lei nova sobre Partidos Políticos (n.° 9.096, de 1995) criou 0 Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), adotando, com isto, um sistema misto de finan ciamento para partidos e cam panhas políticas, um a vez que estarão presentes os recursos públicos do Fundo Partidário ao lado daqueles oriundos de indivíduos e entidades privadas. O Fundo Partidário é constituído de multas e penalidades p e cuniárias, recursos financeiros destinados p or lei, doações de pessoas físicas e jurídicas e dotações orçamentárias. Ao lado do Fundo Partidário, controlado pela Justiça Eleitoral, os partidos políticos poderão constituir seus próprios fundos, com d o ações de pessoas físicas ou jurídicas, desde que nestas doações não se incluam as proibidas no art. 31 da Lei.^'^ Os recursos do Fundo Partidário serão aplicados sob a fiscaliza ção da Justiça Eleitoral, que poderá, a qualquer tempo, exam inar a sua utilização. Os recursos do Fundo Partidário são provenientes do Tesou ro Nacional, e consignados no O rçam ento Federal. Estas somas ficam à disposição do TSE em conta especial no Banco do Brasil.^^^ A sua destinação é a m anutenção do partido político, das suas se des e serviços, bem como o pagam ento do seu pessoal, sua propaganda doutrinária e política, o alistamento e a cam panha eleitoral, bem como 335 Estas do a çõ e s p o d e m ser feitas d ire ta m e n te aos ó rg ã o s d e d ire ç ã o p a rtid á ria (n acio n al, estadu al ou m u n ic ip a l). Estes re m e te rã o aos órg ã o s su perio re s d o P a rtid o e à Justiça Eleitoral o d e m o n stra tiv o do seu recebim ento , sua d e stin aç ã o e o b a la n ço co ntábil - art. 39, § 1". 336 A rt. 40. § 1" e 44, § 2“ d a Lei 9.096, d e 1995. 244 a criação e a m anutenção de um instituto de pesquisa e de doutrinação e educação políticas.^^^ A Lei dos Partidos ainda determ ina que o estatuto partidário deve estabelecer especificamente os critérios de distribuição dos recur sos do Fundo Partidário entre os órgãos de nível municipal, estadual e nacional que com põem o partido.^’® 8. AS DESPESAS PARTIDÁRIAS E DE CAMPANHA PERMITIDAS NA LEGISLAÇÃO. D a m esm a m aneira que a legislação cuida das receitas p artidá rias, estabelece parâm etros para as despesas regulares de m anutenção dos partidos e as realizadas para as cam panhas eleitorais. É corolário da utilização de recursos públicos, bem com o de ori gem privada, porém dedutíveis dos tributos devidos, a necessidade de u m a transparência em relação à origem e à utilização desses recursos. Daí a necessidade de se estabelecer, com o decorrência do sistema de financiam ento das atividades partidárias e das cam panhas eleitorais, da divulgação das contas das agremiações. Em conseqüência, as p ro vidências estatuídas na Lei dos Partidos Políticos, de que as entidades apresentem suas contas à Justiça Eleitoral, esta as faça publicar e p erm i ta o seu exame pelas agremiações congêneres.” ^ A Lei n. 9.504, de 1997, estabeleceu mecanism os de controle da 337 A rt. 44. O s re c u rso s o r iu n d o s d o F u n d o P a rtid á rio s erão aplicados: I - n a m a n u te n ç ã o das sedes e serv iços d o p a rtid o , p e rm itid o o p a g a m e n to d e pessoal, a q u a lq u e r título, este ú ltim o até o lim ite m á x im o de v in te p o r cen to d o to ta l recebido; II - n a p ro p a g a n d a d o u trin á r ia e politica; III - n o a lis tam en to e ca m p a n h a s eleitorais; IV - n a cria ç ão e m a n u te n ç ã o d e in s titu to o u fu n d a ç ã o d e p esq u isa e d e d o u trin a ç ã o política, s end o esta aplicação de, n o m ín im o , vin te p o r c en to d o total recebido. § 1". N a p re staç ã o de co n ta s dos ó rg ã o s de dire ç ã o p a rtid á ria de q u a lq u e r nível d e v em ser d is c r im in a das as despesas realizadas co m re c u rs o s do F u n d o Partidário, de m o d o a p e rm itir o co n tro le da Justiça Eleitoral sobre o c u m p rim e n to d o s incisos I e IV deste artigo. § 2°. A Justiça Eleitoral p o d e , a q u a lq u e r te m p o , investigar so b re a ap licação de re c u rso s o r iu n d o s d o F u n d o Partidário. 338 339 A rt. 32, O p a rtid o está o b rig a d o a enviar, a n u a lm e n te , á Justiça Eleitoral, o b a la n ço co n tá b il d o exercí cio findo, até o dia 30 d e abril d o a n o seguinte. $ !" O b a la n ço co ntábil d o ó rg ã o n a cio n al será e n v ia d o ao T rib u n a l Su p e rio r Eleitoral, o d o s órgãos e stadu ais aos T ribu nais R egionais Eleitorais e o do s órg ãos m u n ic ip a is aos Juizes Eleitorais. § 2" A Justiça Eleitoral d e te rm in a , im e d ia ta m e n te, a p ub licação d o s b a la n ço s n a im p r e n s a oficial, e, o n d e ela n ã o exista, p ro c e d e à afixação dos m e sm o s n o C a r tó rio Eleitoral. $ 3" N o a n o e m q u e o c o rre m eleições, o p a rtid o dev e env iar b a la n ce te s m e n sa is à [ustiça Eleitoral, d u ra n te os q u a tro m eses a n te rio re s e d o s do is m eses p o sterio re s ao pleito. 245 arrecadação, da realização de despesas e de responsabilidades p or um e outro evento. Assim, p or exemplo, dá as seguintes responsabilidades aos p arti dos políticos e seus respectivos candidatos durante a cam panha. A re gra geral é a de que “as despesas da cam panha eleitoral serão realizadas sob a responsabilidade dos partidos, ou de seus candidatos, e financia das na form a desta LeiT"° Esta responsabiUdade solidária entre os partidos e candidatos, que reponta n a citada Lei, vem do Código Eleitoral de 1965, quando no seu art. 241 já dispunha que “toda propaganda eleitoral será realizada sob a responsabilidade dos partidos e p o r eles paga, im putando-se-lhes solidariedade nos excessos praticados pelos seus candidatos e adeptos”. Juntam ente com o pedido de registro de seus candidatos, os p ar tidos e coligações com unicarão à Justiça Eleitoral os valores máximos de gastos que farão p o r candidatura em cada eleição em que concorre rem. Cada partido, como é curial, deve estabelecer o seu orçam ento de receitas possíveis e de despesas previstas, de m odo a não ultrapassar os limites que ele próprio se impôs. No entanto, na hipótese de existir coligação partidária, cada p ar tido que a integra fixará o valor m áxim o de gastos de que trata este arti go. É um a salutar alteração da regra anterior. Na no rm a de 1995, estava escrito: “tratando-se de coligação, os valores m áximos de gastos deve rão ser iguais para os candidatos de cada partido que a integra”. Hoje, a norm a de 1997 esclarece que cada partido, coligado ou não com outros, estipula os seus gastos (e suas receitas, obviamente). Assim, “na repar tição do valor máxim o entre os candidatos, que não precisa ser igual, podendo um candidato receber mais do que o outro. O que não pode é a som a de cada um ultrapassar o m áxim o previsto pelo partido”, como ensina Jo e l C â n d i d o . ( C â n d i d o , 1998, p. 407). Em sentido oposto, dizem F l e u r y e M e s s i a s : “A despeito do entendim ento de muitos, em nossa opinião, havendo coligação, os valores declarados p or cada p ar tido não deveriam ser diferentes, na m edida em que a coligação é tida pela Justiça Eleitoral com o único partido, “partido tem porário”. Na p rá tica tem prevalecido a tese de que, sendo o partido o responsável pela prestação de contas, m esm o havendo coligação, e cabendo ao partido 340 Lei n." 9.504. d e 1995, art. 17. 246 com unicar os gastos e não à coligação, cada partido poderá atribuir o valor que m elhor entender a seus candidatos”. ( F l e u r y F i l h o e M e s sia s, 2 0 0 0 , p. 221). Esta tese não prospera, em nosso entender, p o r duas razões: a prim eira, de ordem legal, pela m udança da sistemática, e hoje quem fixa o valor m áxim o dos gastos respectivos é cada um dos partidos in tegrantes da aliança eleitoral. O fato de haver coligação é irrelevante, um a vez que esta pode ser feita entre um partido grande, com muitos candidatos na eleição proporcional, e outro, ou outros partidos m eno res, com núm ero de candidatos m enos avultado. A divisão eqüitativa não será possível, m archando-se para um a proporcionalidade. Portan to, sem sentido o entendim ento, que já foi norm a legal em 1995, de que os gastos deveriam ser repartidos eqüitativamente. Na oportunidade, acena a lei com a penalidade: quando o candi dato ou o dirigente partidário gastar recursos além dos valores declara dos nos term os do citado artigo, fica sujeito o responsável ao pagam en to de um a multa, no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso. Cada partido constituirá comitês financeiros, com a finalidade de arrecadar recursos e aplicá-los nas cam panhas eleitorais. Estes comitês devem ser constituídos para cada um a das eleições, as m ajoritárias e as proporcionais, para as quais o partido apresente candidato próprio, podendo haver reunião, n um único comitê, das atribuições relativas às eleições de um a dada circunscrição. Q uando da eleição presidencial, é obrigatória a criação de comitê nacional e facultativa a de comitês nos Estados e no Distrito Federal, mas som ente quando o partido lançar candidato à mais alta M agistratura da Nação. Criados pelo partido até 10 dias úteis, contados da convenção para a escolha dos seus candidatos, estes comitês financeiros serão re gistrados, até cinco dias após sua constituição, nos órgãos da Justiça Eleitoral aos quais com pete fazer o registro dos candidatos respectivos. No entanto, o candidato a cargo eletivo é que fará, diretamente ou por intermédio de pessoa por ele designada, a administração financeira de sua campanha, o caixa ou tesoureiro da campanha. Esta adm inistra ção financeira usará os recursos repassados pelo comitê, inclusive os re lativos à cota do Fundo Partidário, os recursos próprios do candidato ou doações de pessoas físicas ou jurídicas, na form a estabelecida nesta Lei. 247 Deste modo, ele é o único responsável pela veracidade das in formações financeiras e contábeis de sua cam panha, devendo assinar a respectiva prestação de contas sozinho ou, se for o caso, em conjunto com a pessoa que tenha designado para essa tarefa. O adm inistrador p oderá assinar junto com o candidato, mas não pode assinar sozinho, o que a lei limita ao candidato. Todos os partidos e candidatos são obrigados a abrir conta b an cária, na qual será feito todo o m ovim ento financeiro da cam panha. Apenas a lei ressalva os casos de candidaturas de Prefeitos e Vereadores em m unicípios com menos de 20 mil eleitores, ou naqueles em que não haja agência bancária. Por sua vez, os bancos são legalmente obrigados a proceder à abertura das contas dos candidatos ou dos p a r t i d o s . E s tas contas bancárias têm sua abertura em decorrência de exigência legal e, portanto, não pode o banco criar restrições a essa abertura de conta, qualquer que seja o tipo de conta, conta-corrente, de poupança, etc., ou a fixação de valor m ínim o de depósito ou m ovimentação. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro - ou estimáveis em dinheiro - para as cam panhas eleitorais, mas somente a partir do registro dos comitês financeiros dantes m encionados. Tais contri buições têm os seus limites máximos prefixados em lei, a qual, ademais, deverá ter o correspondente recibo, em itido na form a fixada na lei/^^ A lei especifica as despesas que podem ser aceitas pela Justiça 341 Lei n.® 9.504, d e 1995: A rt.22 - É ob rig a tó rio p a ra o p a rtid o e p a ra os can d id a to s a b rir co n ta ba n c á ria específica p a ra registrar to d o o m o v im e n to fin an ceiro d a ca m p a n h a . § 1° O s b a n c o s são o b rig a d o s a aca ta r o p e d id o d e a b e r tu ra d e c o n ta de q u a lq u e r p a rtid o o u c a n d id a to e sc o lh id o e m convenção, d e stin a d a à m o v im e n ta ç ã o finan ceira d a c a m p a n h a , sen d o -ih e s v e dad o c o n d ic io n á -la a de p ó sito m ín im o . § 2" O disp o sto n este artig o n ã o se aplica aos casos d e c a n d id a tu ra p a ra Prefeito e V ereado r e m M u n i cípios o n d e n ã o haja ag ência ba n cá ria, b e m c o m o aos casos de c a n d id a tu ra p a ra V eread or e m M u n ic í pios c o m m e n o s d e v in te m il eleitores. 342 Lei n .“ 9.504, d e 1995, A rt. 23 - A p a rtir do registro do s c o m itê s financeiros, pe sso as físicas p o d e rã o fazer do a çõ e s em d in h e i ro ou estim áveís e m d in h e iro p a ra ca m p a n h a s eleitorais, o b e d ec id o o dis p o sto n e sta Lei. § 1° As d o a çõ e s e co n trib u iç õ e s de q u e tra ta este artig o ficam lim itadas; I - n o caso de pessoa física, a dez p o r c en to do s re n d im e n to s b ru to s auferido s n o an o an te rio r à eleição; II - n o caso em q u e o c a n d id a to utilize re c u rso s p ró p rio s, ao valo r m á x im o de gastos estabelecido pelo seu p a rtid o , n a fo rm a d esta Lei. 4 2° T oda d o a ç ã o a c a n d id a to específico o u a p a rtid o de v erá fazer-se m e d ia n te recibo, e m form u lário im presso, seg u n d o m o d e lo co n sta n te d o Anexo. $ 3 * A d o a ç ã o d e q u a n tia acim a d o s lim ites fixados neste a rtig o sujeita o in fra to r a o p a g am en to dc m u lta n o valor d e cin c o a de z vezes a q u a n tia e m excesso. § 4° D o a çõ e s feitas d ire ta m e n te nas co n ta s de p a rtid o s e can d id a to s d e v erão ser e fe tu a d as p o r m e io de c h eq u e s c ru z ad o s e nom inais. 248 Eleitoral Tais gastos eleitorais são sujeitos aos registros contábeis que perm itam sua fiscalização, e somente p o dem ser realizados dentro dos limites fixados na lei. A no rm a que divulga o elenco esclarece que o m esm o não é exaustivo, ao usar a expressão ‘'dentre outros'\ São eles os seguintes; I - confecção de material impresso de qualquer natureza e tam a nho; II - propaganda e publicidade direta ou indireta, por qualquer meio de divulgação, destinada a conquistar votos; III - aluguel de locais para a prom oção de atos de cam panha elei toral; V - despesas com transporte ou deslocam ento de pessoal a servi ço das candidaturas; V - correspondência e despesas postais; VI - despesas de instalação, organização e funcionam ento de C o mitês e serviços necessários às eleições; VII - rem uneração ou gratificação de qualquer espécie a pessoal que preste serviços às candidaturas ou aos comitês eleitorais; VIII - m ontagem e operação de carros de som, de propaganda e assemelhados; IX - produção ou patrocínio de espetáculos ou eventos p ro m o cionais de candidatura; X - produção de program as de rádio, televisão ou vídeo, inclusive os destinados à propaganda gratuita; XI - pagam ento de cachê de artistas ou anim adores de eventos relacionados à cam panha eleitoral; XII - realização de pesquisas ou testes pré-eleitorais; XIII - confecção, aquisição e distribuição de camisetas, chaveiros e outros brindes de cam panha; XIV - aluguel de bens particulares para veiculação, p or qualquer meio, de propaganda eleitoral; XV - custos com a criação e inclusão de sítios na Internet; XVI - multas aplicadas aos partidos ou candidatos p o r infração do disposto na legislação eleitoral. 249 9. FINANCIAMENTO DO USO DO RÁDIO E DA TELEVISÃO. H á um a sensível diferença de tratam ento entre a propaganda p ar tidária e eleitoral feita pelo rádio e pela televisão e os demais veículos de propaganda, com o jornais, cartazes e similares. É que os jornais, os locais de fixação de grandes cartazes - outdo ors - e similares, são de propriedade privada, enquanto as emissoras de rádio e de televisão operam p o r concessão do Governo. Tais atos são da com petência do Poder Executivo, porém subm etidos à apreciação do Congresso Nacional.^'’^ Deste modo, pode a Lei dispor sobre o uso do tem po concedido. Esta prática existe desde m uito tempo, com a possibilidade de uso das emissoras de rádio e de televisão para a propaganda partidária e, nas épocas próprias, da propaganda eleitoral. Hoje em dia, tal possibilidade se estende tam bém aos canais de televisão p o r assinatura, ao lado das emissoras de canal aberto. No que interessa em term os de financiam ento dos partidos, a lei diz que as agremiações partidárias têm direito ao acesso gratuito ao rádio e á televisão.^'^^ Q uer dizer, os partidos políticos não pagam às emissoras pelo uso dos canais de som e de som e imagem. Mas não quer dizer que haja prejuízo para as emissoras, um a vez que estas são ressarcidas das despesas com tais emissões. Diz a lei, ex pressamente que “fls emissoras de rádio e televisão têm direito a compen sação fiscal pela cedência do horário gratuito previsto nesta lei”. As norm as sobre propaganda em outdoors e em jornais têm p ro cedimentos de controle, os quais, se desobedecidos, geram multas para os infratores, multas estas que serão incorporadas ao Fundo Partidário. 10.0 CONTROLE LEGALMENTE EXIGIDO PARA AS FINANÇAS PARTIDÁRIAS. A PRESTAÇÃO DE CONTAS. A Constituição Brasileira de 1988, em seu art. 17, exige que cada um dos partidos políticos preste contas à Justiça Eleitoral dos seus re- 343 C o nstitu ição , art. 49 - É d a c o m p c tc n c ia exclusiva d o C o n g re sso N acio nal - X II apreciar os atos de c on ce ssã o e re no va çã o d a co n cessão d e em isso ra s d e rá d io e de televisão. 344 É 0 art, 47 d a Lei n." 9.504, de 1997. 345 Lei n.° 9.096, d e 995, art, 45. 250 cursos financeiros. Por isso, a lei determ ina que a agremiação m ante nha escrituração contábil, em todos os níveis de decisão, de m odo a p erm itir o conhecim ento da origem de suas receitas e a destinação das despesas.^^^ H á dois mecanism os de prestação de contas, o do partido políti co, regulada nos artigos 30 e seguintes da LPP e o dos candidatos, na Lei n ° 9504, de 1997, nos artigos 28 e seguintes. O controle dessas contas é feito pela Justiça Eleitoral, exam inan do, em cada nível político, nacional, regional ou municipal, não só o balanço anual,^**' com o as prestações de contas e as despesas das cam panhas eleitorais.^^® Se necessário, poderá requisitar para o exame das contas 0 auxílio de técnicos dos Tribunais de Contas, da União ou dos Estados. A falta de prestação de contas, ou sua desaprovação (total ou m esm o parcial), implica a suspensão da liberação de novas quotas do Fundo Partidário, sujeitando os responsáveis às penas da lei, inclusive o cancelamento do registro partidário.^^^ Pode a Justiça Eleitoral determ i n ar o saneam ento das irregularidades existentes nas contas partidárias ou de candidatos. Isto quer significar que o órgão partidário responsá vel pelo com etim ento da irregularidade será o único penalizado com a sanção do caput do artigo m encionado, ou seja, a suspensão da libera ção de novas quotas do Fundo Partidário e p unindo-se os responsáveis com as penalidades com inadas na lei, porém , sempre com relação à esfera p artidária responsável pelo com etim ento da irregularidade, sem contam inar os outros órgãos que se com portaram adequadamente.^^® Neste sentido, a lei nova disciplinou diversam ente o procedim en to sancionatório, com o se verá a seguir: N um prim eiro aspecto, determ ina a lei que a suspensão do re passe de novas quotas do Fundo Partidário não deverá sacrificar as fi346 A rt. 30 da Lei n." 9.096, d e 1995. 347 O b a la n ço a n u al é a p re se n ta d o à lu stiça Eleitoral, a n u a lm e n te , até 30 d e abril d o a n o seguinte. Nos a n o s d e eleições, a lé m d o b a la n ç o anual, h a v erá b a la n ce te s m ensais, n o p e río d o d e 4 m eses antes e 2 m eses d e p o is d o pleito. O art. 33 d e ta lh a o q u e o b a la n ço a n u al d e v erá conter, m in im a m e n te . 348 N o caso d e c a m p a n h a eleitoral, o b rig a a lei q u e sejam c o n stitu íd o s c o m itê s d c dirig entes p a rtid á rio s específicos, p a ra m o v im e n ta ç ã o d o s re c u rso s financeiros d a c a m p a n h a , c arac te riz a n d o -s e a re s p o n sa b ilidad e d o s dirig en tes, inclusive d o tesou reiro, os quais re s p o n d e r ã o civil e c rim in a lm e n te p o r q u a is q u e r irreg ularidad e s. T e rm in a d a a c a m p a n h a eleitoral, os c o m itê s a p re se n ta rã o su as co n ta s e re c o lh e rã o os saldo s financeiros e v en tu a lm e n te a p u ra d o s [sobras de cam panha), à te so u ra ria d o p a rtid o (art. 32.33 p 34). 349 A rt. 37 da Lei vigente. 350 § 2'' d o art. 37 da LPP. 251 nanças partidárias e, assim, tal suspensão deverá ser aplicada de forma proporcional e razoável, pelo período de um a doze meses, ou p o r meio do desconto, do valor a ser repassado, da im portância apontada como irregular/^' Consoante a lei nova, n o § 6® sub analise, o exame da prestação de contas dos órgãos partidários tem caráter jurisdicional. C om este dis positivo legal foi encerrada um a das grandes discussões a respeito da natureza da decisão que apreciava as contas partidárias e eleitorais e, portanto, “dessa forma, essas decisões perfazem coisa julgada, em tonos materiais e formais, sem possibilidade de rediscussões futuras”. ( A g r a , 2010, p. 13). Por outro lado, em sendo um a decisão jurisdicional a que de saprova total ou parcialm ente a prestação de contas dos órgãos p arti dários, desta caberá recurso para os Tribunais Regionais Eleitorais ou para o Tribunal Superior Eleitoral, conform e o caso. Tal recurso, diferentem ente de todos os demais recursos eleito rais, que não podem ser recebidos com efeito suspensivo na form a do art. 257 do Código Eleitoral de 1965, o relativo à desaprovação da pres tação de contas será sempre recebido com efeito suspensivo, conforme a ressalva legal. E, como resultado desse recurso, as prestações de con tas desaprovadas pelos Tribunais Regionais e pelo Tribunal Superior poderão ser revistas para fins de aplicação proporcional da sanção apli cada, m ediante petição trazida aos autos da prestação de contas. D enúncia fundam entada de filiado, de delegado de partido, re presentação do Procurador Geral ou iniciativa do Corregedor, poderá levar os Tribunais Eleitorais a determ inar o exame da escrituração de partido, bem como de qualquer ato que possa violar prescrições legais ou estatutárias que disciplinem os filiados em m atéria financeira. Para tanto, poderá até determ inar a quebra do sigilo bancário das contas dos partidos.^^^ Um partido político pode exam inar as contas dos outros, mensais ou anuais. N a Justiça Eleitoral, 15 dias depois de publicados os balanços 351 0 § 3- e m c o m e n to diz a in d a q u e além d a san ç ã o d a su sp e n sã o das q u o ta s d o F u n d o p a rtid á rio , não p o d e r á ser aplicada a san ç ã o d e susp en são , caso a p re staç ã o d e c o n ta s n ã o seja julgada, pelo ju íz o o u trib u n al c o m p e ten te, apó s 5 (cinco) ano s d e su a ap rese n ta ç ão 352 A rt. 35. Q u e b ra o sigilo b a n c á rio das co n ta s d o p a rtid o , m a s n ã o das co n ta s de seus dirigentes. H á u m p ro je to e m c u rs o n o C o n g re sso N acio nal q u e tra ta d este assu nto, p e rm itin d o ig u a lm e n te o exam e das c o n ta s do s dirig en te s partid á rio s. 252 financeiros, será aberto o prazo de 5 dias para impugnação. Em conse qüência, poderá, além de impugná-las, relatar fatos e indicar provas, pedindo a abertura de investigação de qualquer ato que viole as prescri ções legais e estatutárias que sujeitem partidos e respectivos filiados^^^. As sanções a que poderão ser subm etidos os partidos políticos pelas violações concernentes às norm as de conteúdo de controle finan ceiro são relativas à suspensão da liberação das quotas do Fundo P arti dário: suspensão até que a Justiça Eleitoral aceite esclarecimentos sobre recursos de origem não m encionada ou não esclarecida; suspensão por um ano, no caso de recebimento dos recursos financeiros vedados pela lei; suspensão p o r dois anos, no caso de recebim ento de doações cujo valor ultrapasse o limite legal, acrescido de m ulta correspondente aos valores que ultrapassarem tal limite. Tais mecanism os, de controle das finanças dos partidos, refletem o interesse cada vez crescente de controlar a origem dos recursos finan ceiros de que dispõem os entes partidários para seu funcionam ento e a realização de suas cam panhas. É preocupação m undial o controle das finanças partidárias, pois com isto se im pede a deformação do processo eleitoral fundado no m au uso dos recursos públicos, por um lado, e pelo abuso do poder econômico, por outro. Esta preocupação sempre existiu, desde a Redemocratização, quando já constavam na Lei de 1950 norm as a respeito do assunto, as quais, de certa form a foram repeti das nas de 1965, 1971 e 1979. Por tais regras, pretendia-se controlar os gastos eleitorais, fixando as quantias máximas que os seus candidatos pudessem despender, pessoalmente, com a própria eleição, e os limites das contribuições e auxílios dos seus filiados, Igualmente, pretendeu-se dar ao partido a gratuidade na publica ção de todos os docum entos e notas, o que foi igualmente vetado, por inconstitucionalidade, eis que qualquer subsidio ou isenção tributária somente poderá ser concedido p o r lei específica, o que não é o caso. Considera o sistema de especial im portância a atividade p erm a nente do partido, de um lado, e a existência de um instituto desta or dem. Assim, a Lei destina para a prim eira destas duas atividades um máximo, e para a outra u m m ínim o, da quinta parte (20%) da quota do fundo que cabe ao partido para cada um a delas. 353 Parágrafo ú n ic o d o art, 35. 253 Pretende-se, com tais providências, que não haja desculpas das agremiações para não se m anter em funcionam ento perm anente, a si e a um a entidade subordinada, com a finalidade de realizar um dos objetivos básicos do partido político, que é o de doutrinar o eleitor e, especialmente, o seu filiado. 11. EFEITOS DOS FINANCIAMENTOS SOBRE OS PARTIDOS POLÍTICOS. Sem a m enor dúvida que os financiadores dos partidos políticos e das cam panhas eleitorais adm item a hipótese de haver um retorno, seja em dividendos políticos, seja em vantagens sociais, econômicas e financeiras, diretas e indiretas. Há, pois, que se distinguir entre o financiam ento púbUco e o fi nanciam ento privado dos partidos políticos e, especialmente, das cam panhas eleitorais em relação a candidatos a cargos executivos ou a ca deiras parlamentares, no que concerne a um a eventual contraprestaçào das agremiações e candidatos aos seus financiadores. No caso dos financiam entos privados, especialmente daqueles oriundos de pessoas físicas e de entidades jurídicas com fins lucrativos, o retorno do financiam ento - o “dividendo político”- pode se realizar em favores a ser obtidos da parte dos órgãos públicos, a realização de contratos sem licitação ou processo com petitivo semelhante, o apa drinham ento político a candidatos a cargos públicos que dispensem a admissão p o r concurso público. É claro que, naqueles países em que os processos competitivos são decorrentes de concursos ou certames outros de caráter público, as possibilidades são dim inuídas. Mas, há sempre um a via lateral, como a dispensa de licitação para certas con tratações, a nomeação dos afilhados políticos para cargos de confiança. Situações que estão previstas em lei e que, em princípio, sendo rigoro samente legais, podem , no entanto, estar longe dos princípios éticos. É com um que líderes do m undo dos negócios venham se tornar líderes partidários exatamente pelas facilidades que passam a obter no trato com a coisa pública, e o seu aporte de recursos financeiros ao p a r tido torna os dirigentes da agremiação deles dependentes.N orm al é que determ inados indivíduos endinheirados se candidatem a determ inados 254 cargos eletivos, “com prem o m andato”, com o se diz em linguagem correntia, exatamente para obter facilidades para a realização dos interes ses pessoais e empresariais. Neste ponto, a via é de m ão dupla, eis que ao lado do interesse do em presário em se candidatar para, de posse do mandato, ter facili dades no trato com as autoridades relacionadas com o seu negócio, há igualmente interesse partidário em que os endinheirados participem das chapas a fim de contribuírem pessoalm ente para o trabalho eleito ral, em term os financeiros.’'^" O abuso do Poder Econôm ico nos processos eleitorais já m ere ceu, da parte do Autor, análise especial em trabalho anterior, há mais de 20 anos (nada m udou, portanto), quando foram estudadas situações em que candidatos endinheirados com pareciam a cidades interioranas, em todo o Brasil, a fim de estabelecer acordos políticos pelos quais os chefes políticos locais se com prom etiam a carrear a votação sob seu controle para os candidatos que se com prom etessem a cobrir as despe sas feitas pela m anutenção do eleitorado cativo. Isto porque “os chefes políticos do interior suportam de m odo p erm anente o ônus de um a clientela eleitoral, à qual assistem antes, d u rante e depois do pleito eleitoral. Fazem, em m atéria assistencial, m uito daquilo que caberia ao Poder público com petente executar através de obras assistenciais que, ou não existem, ou funcionam mal em muitos m unicípios”. ( C a s t r o , 1976, p. 28). No m encionado trabalho foi analisado o abuso do Poder E conô mico no processo eleitoral, nas suas diversas formas, inclusive n a h ip ó tese em que determ inado candidato, pelo fato de ser rico, entendia que p oderia fazer política e cam panha eleitoral com a arm a do dinheiro, e até que ponto esta atividade é considerada fraude à lei e sancionada. (R eis, 1982, p. 99). O financiam ento público, n o entanto, altera o quadro, quando perm ite ao partido se to rn ar m enos dependente dos autores das g ran des contribuições financeiras. C om o diz S o s p e d r a , a relação dinheiro/ 354 Muitaii vezes, este tip o d e c a n d id a tu r a é de tal m o d o c o n s id e ra d o “normal", q u e o c an d id a to se c o m p ro m e te a, se eleito, n ã o rec eb e r os s u b sid ie s pela a tividad e p a rla m e n ta r, d o a n d o -o s a u m a en tid a d e filantrópica; p o r o u tr o lado, é c o rre n te que, n a s c a n d id a tu ra s ao S e n ado , u m do s su p len tes seja o fin a n c ia d o r d a ch ap a e, d u ra n te o p e río d o , lo n g o de 8 a n os, d o m a n d a to , o titu la r se afaste p a ra o su plen te a ss u m ir o cargo. 255 p o d er ocorre entre as grandes empresas e os partidos burgueses, de um lado, e de outro entre os partidos socialistas e as organizações sindi cais. Todavia, nada im pede que as linhas de financiam ento se cruzem e grandes empresas, norm alm ente de posição política de direita, venham a financiar partidos de esquerda, já “sentindo o cheiro” de um a possível virada no exercício do Poder. A idéia básica do financiam ento público dos partidos políticos e das cam panhas eleitorais centra-se n o fato de que, em sendo os recur sos oriundos do orçam ento governamental, e divididos p o r um órgão igualmente público, - no caso brasileiro, pela Justiça Eleitoral - deverão estar submetidos a um m ecanism o de transparência m aior do que os oriundos do setor privado. E, em conseqüência, se saberá até que ponto os recursos públicos estarão influindo nas condutas dos partidos e dos candidatos a cargos eletivos. O que se vê, no entanto, é a previsão de despesas e a prestação de contas, dos partidos e dos candidatos, apresentarem núm eros que, empiricamente, se nota que são pautados na irrealidade. N úm eros finan ceiros que, de nen h u m m odo, correspondem às necessidades básicas do material m ínim o de um a cam panha eleitoral, são apresentados como correspondendo à totalidade das despesas legalmente permitidas. Em síntese bastante elucidativa, P i l a r d e l C a s t i l l o estabelece as suas posições sobre os sistemas privado e público de financiamento eleitoral. Para ela, “um sistema de financiam ento que descanse am plam en te nos ingressos privados; a) é, contrariam ente ao que possa parecer, mais eficaz frente à corrupção porque torna os partidos mais vulneráveis perante o eleito rado e os obriga a cuidar de sua credibilidade, em grau m aior que se o Estado lhe garantisse, em qualquer caso, os recursos; b) induzirá os partidos a realizar um a m elhor gestão de seus o r çamentos; c) constitui um a form a de participação política; d) fomenta um a relação de confiança entre partidos e eleitores; e) estimula o trabalho das organizações locais dos partidos e fa vorece a dem ocracia interna; 256 f) p or último, é o m odo de financiam ento que corresponde à n a tureza jurídico-privada dos partidos tal com o tem sido interpretada pela jurisprudência co n stitu cio n al E, em conclusão, propõe que “a revisão das norm as sobre o finan ciamento dos partidos políticos deverão orientar-se para os seguintes objetivos: a) liberalizar as contribuições privadas aos partidos políticos, que procedam de pessoas físicas ou jurídicas; b) desgravar as doações privadas, estim ulando essencialmente aos pequenos e m édios contribuintes; c) desgravar as cotas dos filiados; d) equilibrar a hoje m uito descom pensada relação entre financia m ento público e privado, com o objetivo de conseguir progressivam en te u m maior peso da segunda sobre a primeira; e) lim itar o increm ento das subvenções anuais para atividades or dinárias dos partidos, como máximo, ao correspondente ao IPC (hoje não há limite algum); f) exigir a prévia auditoria dos balanços contábeis que os partidos apresentam ao Tribunal de Contas”. ( C a s t i l l o , 1994, p. 53 ) 12. O IN TERC M B IO DAS IN FO RM AÇÕ ES SOBRE OS RECURSOS PARTIDÁRIOS. Em 2006, através da Portaria C onjunta N° 74, de 10 de janeiro de 2006, que Dispõe sobre o intercâmbio de informações entre o Tribunal Superior Eleitoral e a Secretaria da Receita Federal e dá outras provi dências, foi estabelecido um procedim ento pelo qual se pretende obter, para efeito de controle, inform ações relativas a prestação de contas dos candidatos a cargos eletivos e dos comitês financeiros de partidos p o líticos. Informações estas, atinentes a cada pleito eleitoral, são relativas às fontes de arrecadação de recursos, financeiros ou não, especificando os doadores, as quantias recebidas, os beneficiários (candidatos ou p ar tidos políticos) e, não sendo valores em dinheiro, o núm ero do do cu 257 m ento fiscal relativo à prestação de serviços e fornecim ento de m erca dorias na cam panha eleitoral^^^ Os dois parágrafos ao art. 1° tratam , o 1°, da extensão da no rm a à prestação anual de contas dos partidos políticos e o 2° do processam en to das informações a serem enviadas ao Governo. Já o art. 2° versa sobre a fiscalização do uso indevido dos recur sos financeiros, ou não, nas cam panhas eleitorais ou nas atividades dos partidos políticos, quando perm ite a qualquer cidadão apresentar d e núncia à Secretaria da Receita Federal sobre o fato alegado.^^^ Logicamente, levando-se em consideração o calor de um a cam panha política, ou m esm o a emulação decorrente do confronto latente entre as agremiações partidárias, a norm a conjunta estabelece precau ções sobre as possibilidades de m au uso do m ecanism o que se pretende salutar para evitar as deformações financeiras n o processo eleitoral e na operacionalização do próprio partido político. Por isso, ela deverá ser subm etida ao exame prelim inar na p ró pria Secretaria da Receita Federal, onde será classificada, como I - inepta, quando não observar a exigência contida no § do art. 2° ou for encaminhada de forma distinta da prevista no § 2° do mesmo artigo; 3 55 A rt. 1" 0 TribunaJ S u p e rio r Eleitora) (TSE) e n c a m in h a rá à S ecretaria d a R eceita F ederal (SRF), em c o n fo rm id a d e c o m p ra z o s e p ro c e d im e n to s p o r ele fixados p a ra c ad a pleito eleitoral, in fo rm a çõ e s re lativas a p re staç ã o d e co ntas d o s c an d id a to s a carg o s eletivos e d o s co m itês financeiros d e p a rtid o s p oliticos, especificando: I as fo ntes d c arre c ada ç ã o , c o m a in d ic a ç ã o d o n ú m e r o d e inscriç ão n o C a d a s tro d e Pessoas f ísicas (C P F ) o u n o C a d a s tro N acion al d a Pessoa Jurídica (C N P J) d o s respectivos do ado res; II os re c u rso s recebidos, fin anceiro s o u não, e u tilizado s n a c a m p a n h a eleitoral, c o m a in d ic a çã o de d atas e valores; III - o n o m e d o ca n d id a to o u co m itê fin a n c e iro ben eficiário d a doação, c o m in dicação d o n ú m e ro de inscriç ão n o C N P J e d a c o n ta ba n c á ria utilizada; IV - o n o m e d a p e ss o a física o u ra z ão social d a p e ss o a ju ríd ic a e resp ectiv o n ú m e r o de inscrição n o C P F o u n o C N PJ, os v alores recebidos, a d a ta e. q u a n d o fo r o caso, o n ú m e ro d o d o c u m e n to fiscal, relativos à p re staç ã o d e s e r \iç o s e fo rn ec im e n to d e m e rc a d o ria s n a c a m p a n h a eleitoral. 356 A rt. 2°. Q u a lq u e r cid a d ão p o d e rá ap re se n ta r d e n ú n c ia à SRF sobre us o in d e v id o d e recu rsos, fin ancei ros ou não, em c a m p a n h a eleitoral o u n a s ativ id ades d o s p a rtid o s políticos. § l o A d e n ú n c ia d e v erá ser fo rm alizada p o r escrito, con tend o: I - identificação d o de n u n c ia n te , c o m a ind icação d o n o m e , e n dereço , n ú m e r o d o títu lo d e eleitor e de inscrição n o CPF; II - identificação d o d e n u n c ia d o , c o m a indicação, n o m ín im o , d o n o m e o u d o n o m e em p resarial, d o n ú m e ro de inscriç ão n o C P F ou n o CN PJ, e do resp ectivo d o m ic ilio fiscal, o u d e elem en tos qu e p e r m i ta m lev ar a essa identificação; III - d escrição d e ta lh a d a d o s fatos a p o n ta d o s c o m o irreg u lares, c o m a in dicação d e d a ta s e valores envolvidos, a c o m p a n h a d o s d o s d o c u m e n to s co m p ro b a tó rio s. § 2” A d e n ú n c ia deverá ser e n c a m in h a d a à C o o rd e n a ç ã o -G e ra l d e Fiscalização (Cofis) d a SRF. p a ra o e n d ereç o E sp lan ada dos M in istério s - A n e x o d o M in istério d a Fazend a - 2o a n d a r - a la A, sala 201 Brasília/Dl- - C E P 70048-900, p o r in te rm é d io d a E m p re sa Brasileira d e C o rre io s e Telégrafos - ECT, m e d ia n te Aviso d e R ec e b im e n to (AR). 258 II - improcedente, quando os elementos analisados não indicarem indícios de irregularidades tributárias. Finalmente, poderão ser consideradas procedentes, na form a do inciso III, quando os elementos analisados indicarem indícios de irre gularidades tributárias. Com o efeito concreto e direto dessa classificação as denúncias ineptas e im procedentes serão arquivadas, enquanto as procedentes se rão encam inhadas à unidade da SRF da jurisdição do domicílio fiscal do denunciado, com vistas à inclusão na program ação da fiscalização. Tudo subm etido ao m anto do sigilo, conform e determ ina o C ó digo Tributário Nacional, que im pede a SRF de divulgar as denúncias recebidas. O objetivo direto e m aior dessa verificação da Secretaria da Re ceita Federal é de verificar eventual com etim ento de ilícitos tributários. Primeiro, no caso de prestações de contas dos candidatos a cargos eleti vos e dos comitês financeiros de partidos políticos e dos próprios p arti dos políticos. Em segundo lugar, sobre eventuais denúncias procedidas p o r cidadãos sobre uso indevido de recursos, financeiros ou não, em cam panha eleitoral ou nas atividades dos partidos políticos. Não ficará a este respeito a Secretaria da Receita Federal restrita às prestações de contas de candidatos e partidos políticos e das de núncias recebidas. Poderá usar todas as inform ações disponíveis nos sistemas inform atizados da Receita Federal. Sobretudo as declarações de ajuste anual do im posto de renda da pessoa física e nas declarações de inform ações econômico-fiscais da pessoa jurídica, docum entos que serão exam inados para identificar doações a candidatos, comitês finan ceiros e partidos políticos, bem como gastos realizados po r eleitores na form a do art. 27 da Lei n^ 9.504, de 30 de setem bro de 1997, sem prejuízo da instituição pela SRF, no âm bito de sua competência, de de clarações específicas dos fornecedores de m ercadorias ou prestadores de serviço para cam panhas eleitorais. Desses exames poderão resultar, em prim eiro lugar, eventuais sanções dentre as previstas na legislação fiscal, no caso de omissão de informações. Para tanto, essas declarações serão confrontadas com as contidas nas prestações de contas de candidatos, comitês financeiros e partidos políticos. 259 Na eventualidade de declarações omissas ou fraudulentas, susce tíveis de ensejar a existência de infrações tributárias, a Receita Federal inform ará ao TSE a circunstância, e isso sem prejuízo da adoção dos procedim entos cabíveis no âmbito de sua competência. De acordo com a Portaria conjunta referida, e de caráter exemplificativo as irregulari dades, além da omissão de doações recebidas, poderão ser considera dos 0 fornecim ento de m ercadorias ou prestação de serviços por pessoa jurídica, cuja situação cadastral perante o CNPJ revele a condição de inapta, suspensa ou cancelada, ou, ainda, inexistente; tam bém , a pres tação de serviços p o r pessoa física com CPF inexistente ou cancelado; uso de docum entos fiscais falsos ou fraudulentos; a simulação de ato, inclusive po r m eio de interpostas pessoas e bem assim qualquer fato que dê causa a suspensão de im unidade tributária de partido político, na form a do arts. 9®^^’ e 14^^^ do Código Tributário Nacional. 357 Lei n" 5.172, cie 25 de outubro de 1966. C ó d ig o T rib u tá rio N acional. A rt. 14. O d is p o sto n a alinea c d o inciso IV d o artigo 9° é s u b o rd in a d o à o b serv ân c ia d o s seguintes requ isitos pelas en tid a d e s nele referidas; I - n ã o d istrib u íre m q u a lq u e r parcela de se u p a trim ô n io o u de su as rend as, a q u a lq u e r título; (Redução ciada pela Lei Complementar n " 104. de 10.1.2(1(11) Se b e m q u e o C ó d ig o T rib u tá rio N acio nal te n h a sido p u b lic a d o c o m o lei o rd in á ria e sem essa d e n o m in a ç ã o , foi re c ep c io n a d o pela C o n stitu iç ão d e 1988 c o m o Lei C o m p le m e n ta r e, assim , suas alteraçõ es d e p e n d e rã o d e n o r m a d e igual qualificação. Cfr. REIS, Palhares M oreira. A l e i C o m p lem en ta r n a C onstituição de 1988. Belo H orizonte; E ditora Fó ru m , 2007, p, 44. II - ap lic arem in te g ra lm e n te , n o Pais, os seus re c u rso s na m a n u te n ç ã o dos seus objetivos institucionais; III - m a n te re m e sc ritu ra çã o d e suas receitas e de spe sas e m livros rev estido s d e fo rm alid ad e s capazes d e ass e g u ra r sua exatidão. § 1“ N a falta d e c u m p rim e n to do dis p o sto neste artigo, o u no § 1“ d o a rtig o 9", a a u to rid a d e co m p e ten te p o d e s u sp e n d e r a ap licação d o benefício. § 2° O s serviços a q u e se refere a alín e a c d o inciso IV d o artig o 9" são exclusivam ente, os d ire ta m e n te rela c io n ad o s c o m os o bjetivos institu cio nais d a s e n tid a d e s de q u e tra ta este artigo, previstos n o s re s pectivo s estatu to s o u atos constitutivos. 358 Lei n." 9.504,de 1997. A rt. 23. A p a r tir d o registro d o s c o m itê s financeiros, p esso as fisicas p o d e rã o fazer do a çõ e s em d in h e iro ou estim áveis e m d in h e iro p a r a ca m p a n h a s eleitorais, o b e d ec id o o disp o sto n e sta Lei. § 1" As do a çõ e s e co n trib u iç õ e s d e qu e tra ta este artigo ficam lim itadas; I - n o caso de pe sso a física, a dez p o r c e n to d o s re n d im e n to s b ru to s a u fe rid o s n o a n o a n te rio r à eleição; I I ' n o caso e m qu e o ca n d id a to utilize re c u rso s p ró p rio s, ao valor m á x im o d e gastos estabelecido pelo seu p a rtid o , n a fo r m a d e sta Lei. § 2" T oda d o a ç ã o a c an d id a to especifico o u a p a rtid o d e v erá fazer-se m e d ia n te recibo, e m fo rm u lá rio im presso, se g u n d o m o d e lo co n sta n te d o Anexo, § 3° A d o a ç ã o d e q u a n tia acim a dos lim ites fixados n este a rtig o sujeita o in fr a to r ao p a g am en to de m u lta n o v a lo r de cin c o a dez vezes a q u a n tia em excesso. $ 4" As do a ç õ e s d e re c u rs o s finan ceiro s s o m e n te p o d e rã o ser e fetuad as n a c o n ta m e n c io n a d a n o art. 22 desta Lei p o r m e io de; (Redação d ada pela Lei m." / 1.300, de 2006) I - ch eq u e s c ru z a d o s e n o m in a is o u tra n sfe rê n cia eletrô nica de dep ósito s; (Incluído pela Lei n.° IL 3 0 0 , de 2006) II - d e p ó sito s em espécie de v id a m e n te iden tificad os até o lim ite fixado n o inciso I d o § 1" deste artigo. (In clu íd o pela i c i n . " } 1.300, d e 2006) i 5" Ficam v e d ad a s qu a isq u e r d o a çõ e s e m din h e iro , b e m c o m o de troféus, prê m io s, aju das d e q u a lq u e r e spécie feitas p o r can d id ato , en tre o reg istro e a eleição, a pessoas físicas o u ju ríd icas. (Incluído pela Lei 260 A SRF inform ará tam bém qualquer infração ao disposto nos arts. 2 3 / '' 27-'"" e 81-'"* da Lei no 9.504, de 1997. BIBLIOGRAFIA AGRA, Walber de M oura e CAVALCANTI, Francisco Queiroz. Co mentários à nova lei eleitoral. Lei n.° 12.034, de 29 de setembro de 2009. Rio de Janeiro. Forense, 2010. C ND IDO , loel I. Direito Eleitoral Brasileiro, 7* ed. revista e atual. Bau ru, SP: EDIPRO, 1998. CASTILLO, Pilar dei. Objectivos para una Reforma de la Legislación sobre Financiación de los Partidos Políticos. In La Financiación de tos Partidos Políticos. M adrid: Centro de Estúdios Constitucionales, 1994. CASTRO, Francisco Ferreira de. A C am panha Eleitoral no Piauí. Revista Brasileira de Estudos Políticos Belo Horizonte: Universidade Federal de M inas Gerais, 1976, n.° 8. DOUBLET, Yves-Marie. Le Financement de la Vie Politique. Paris: Presses Universitaires de France, 1990. FLEURY Filho, Luiz Antônio e MESSIAS, Itapuã Prestes de. Direito Elei toral. Lei n. 9.504/97 - Doutrina e Jurisprudência. S. Paulo: Saraiva, 2000. KEY Jr. W. O: Política, partidos y Grupos de Pressión, M adrid: Instituto de Estúdios Politicos, 1962. NATALE, Alberto Derecho Político, Buenos Aires: Depalma, 1979. i i M l .3 0 0 . iíe 2 0 0 6 ) 359 l.ei n." 9.504,d e 1997. Art. 27. Q u a lq u e r eleitor p o d e rá realizar gastos, em ap o io a c a n d id a to d e sua preferência, até a q u a n tia equ iv a len te a u m mil UFIR, n ã o sujeitos a contabilização, d e sd e q u e não re em bolsados. 360 Lei n.° 9.504,de 1997. A rt. 81. As d o a çõ e s c c o n trib u iç õ e s d e pessoas ju ríd ic a s p a ra c a m p a n h a s eleito rais p o d e rã o ser feitas a p a rtir d o registro d o s co m itês financeiros d o s p a rtid o s o u coligações. $ 1" As do a ç õ e s e c o n trib u iç õ e s de qu e tra ta este artigo ficam lim itad as a do is p o r c en to d o fa tu ra m e n to b r u to d o a n o a n te rio r à eleição. S 2" A d o a ç ã o de q u a n tia acim a d o lim ite fixado n este artig o sujeita a pe sso a ju rídica ao p a g a m e n to de m u lta n o v a lo r de cin c o a d ez vezes a q u a n tia em excesso. 4 3" Sem prejuízo d o dis p o sto no p arágrafo anterior, a pessoa ju ríd ic a q u e u ltrap a ssa r o lim ite fixado no § l" esta rá sujeita à p roibição d e p a rtic ip a r de licitaçõe.s p ú blicas e d c c eleb rar co n tra to s c o m o P o der Público pelo p e río d o d e cinco an o s, p o r d e te rm in a ç ã o d a justiça Eleitoral, e m pro c e sso n o q ual .seja asse g u ra d a a m p la defesa. 361 .lurisia brasileiro; M in istro d o Supremo Tribunal Federal e P residen te d o Tribunal Superior Eleitoral, 261 REIS, Palhares Moreira: O Abuso de Poder Econômico no Processo Eleitoral, m Realidade Eleitoral Brasileira, Paulista (PE): Editora GTB, 1982. REIS, Palhares Moreira. A Lei Complementar na Constituição de 1988. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2007. SOSPEDRA, Manuel Martinez: Introducción a los Partidos Políticos. Barcelona: Ariel Derecho, 1996. 262 F ID E L ID A D E P A R T ID Á R IA R ic a r d o L e s v a n d o w sk i" ’- 1. REFLEXÕES ACERCA DOS PARTIDOS POLÍTICOS É necessário consignar que em um a dem ocracia representativa com o a nossa, os partidos políticos desem penham um papel funda mental, porquanto, no dizer de Canotilho, são ''organizações aglutinadoras dos interesses e mundividência de certas classes e grupos sociais impulsionadores da formação da vontade popular \ C om efeito, a partir do advento do Estado Social, no final da P ri meira G rande G uerra, a lei deixou de ser a expressão de um a anôni m a vontade geral, no sentido rousseauneano da expressão, conform e queriam os ideólogos do Estado Liberal de Direito dos séculos XVIII e XIX, passando a representar o resultado da vontade política de um a m aioria parlamentar, form ada a p artir de vontades fragm entárias pree xistentes no seio de sociedade. ^ No Brasil, como se sabe, os partidos políticos sofreram as vicis situdes da alternância cíclica entre regimes dem ocráticos e ditatoriais, o que impediu, com raras exceções, que desenvolvessem um a base ide ológica consistente, capaz de libertá-los do fenôm eno que M auri ce Duverger, trilhando a senda aberta p o r Robert Michels, identificou com o o dom ínio oligárquico dos dirigentes partidários, cujo apanágio é '*0 apego a velhas fisionomias e ao conservadorismo” ^ Os partidos de quadros e de massas, vinculados às camadas p o pulares, com matizes ideológicos mais pronunciados, surgiram apenas em um a fase mais recente da história do País, com o conseqüência do 362 C A N O T IL H O , José Joaq u im G om es. D ireito constitucional e teoria da Constituição, edição. C o im bra; A lm e d in a , 1998. p. 308. 363 SILVA, D a n iela R om anelli da. D em ocracia e Direitos Políticos. C am p in as: E d ito r-A utor. 2005, p. 62. 364 FLEISCHF.R, D avid. O s p a rtid o s politicos. In: AVELAR. Lucia e C IN T R A A n to n io O tá v io (orgs.). Sistem a politico brasileiro: u m a introdução..São Paulo: UNESP, 2004, p. 249. 365 D U V E R G E R , M aurice. Os p a rtid o s politicos.Rio d e Janeiro; Z ahar, 1970, pp. 197, 366 SILVA, D a n iela R om anelli, op. cit., loc. cit. 263 processo de industrialização, que se acelerou a partir do térm ino da Segunda G uerra Mundial. Em que pesem, porém , as imperfeições que ainda caracterizam 0 sistema partidário brasileiro, não há dúvida de que, hoje, os partidos políticos são indispensáveis ao processo dem ocrático, não apenas p o r que expressam a m ultiplicidade de interesses e aspirações dos distintos grupos sociais, mas, sobretudo, porque concorrem para a formação da opinião pública, o recrutam ento de líderes, a seleção de candidatos aos cargos eletivos e a mediação entre o governo e o povo. 2. O A D V EN TO DA D EM O C RA C IA PARTICIPATIVA É bem verdade que a participação do povo no poder, atualmente, não ocorre mais apenas a partir do indivíduo, do cidadão isolado, ente privilegiado, e até endeusado pelas instituições político-jurídicas do li beralismo, dentre as quais se destacam os partidos políticos^^l O final do século XX e o início do século XXI certam ente en tra rão para a História com o épocas em que o indivíduo se eclipsa, surgin do em seu lugar as associações, protegidas constitucionalm ente, que se m ultiplicam nas cham adas “organizações não governamentais” vol tadas para a prom oção de interesses específicos, tais com o a proteção do m eio ambiente, a defesa do consum idor ou o desenvolvimento da reform a agrária. Esse fato, aliado às deficiências da representação política tradicio nal, deu origem a alguns institutos que dim inuem a distância entre os cidadãos e o poder, com destaque para o plebiscito, o referendo, a ini ciativa legislativa, o veto popular e o recall, dos quais os três prim eiros foram incorporados à nossa Constituição (artigo 1 4,1, II e III, da CF). 367 LÊW A N D O W SK I, E n r iq u e Ricardo. Reflexões e m to r n o d o p rin c íp io re p u b lic a n o ”. In; C arlo s M ário d a Silva Velloso, R o b e rto R osas e A n to n io C arlo s R o d rig u e s d o A m a ra l { C oo rd s,>.Pn«í:»píos co n stitu cionais fu n d a m e n ta is : estudos em h o m en a g em ao professor I w s G a nd ra M artins. São Paulo; Lex Editora, 2005. p,381. 368 M ILL, lo h n Stuart. Considerações sobre o governo representativo. São Paulo: IBRASA, 1958, p. 49, o b s erv a 0 seguinte: “desde q u e é impossível a todos, em u m a co m u n id a d e que exceda a u m a única cidade pequena, participarem pessoalm ente tão-só de a lgum as porções m u ito peq u en a s dos negócios públicos, seguc-se q u e o tipo ideal d e g o v ern o perfeito te m de ser o representativo" 264 3. A IM P O R T  N C IA D A F ID E L ID A D E P A R T ID Á R IA Não há negar que a dem ocracia representativa, exercida por meio de mandatários recrutados pelos partidos políticos, por indispensável, ^ subsiste em sua integralidade em nosso ordenam ento poUtico-jurídico, embora com plem entada pelo instrumental próprio da democracia participativa (art. 1", parágrafo único, da CF). Com efeito, segundo a nossa Carta Magna, a soberania popular (art. r , I, da CF) é exercida fundamentalmente por meio do sufrágio universal (art. 14, caput, da CF), constituindo a filiação partidária con ditio sine qua non para a investidura em cargo eletivo (art. 14, § 3°, IV, da CF). Mas para que a representação popular tenha um mínimo de au tenticidade, ou seja, para que reflita um ideário com um aos eleitores e aos candidatos, de tal modo que entre eles se estabeleça um liame em tom o de valores que transcendam os aspectos meramente contingentes do cotidiano da política, é preciso que os que mandatários se m ante nham fiéis às diretrizes programáticas e ideológicas dos partidos pelos quais foram eleitos. “Sem fidelidade dos parlamentares aos ideários de interesse cole tivo'' - ensina Goffredo Telles Júnior “definidos nos respectivos pro gramas registrados, os partidos se reduzem a estratagemas indignos, a serviço de egoísmos disfarçados; e os políticos se desmoralizam”. A fidelidade partidária, porém , conquanto represente um passo im portante para o fortalecim ento do sistema partidário brasileiro, não constitui, ao contrário do que im aginam alguns, um a panaceia univer sal, cum prindo ter presente a lúcida advertência feita pelo M inistro Nelson Jobim, em conferência que proferiu sobre o assunto: ‘'Falar-se em fidelidade partidária, sem ter a consciência real do que se passa no processo de escolha dos candidatos é um equívoco. Precisamos ter noção do que se passa, para colocar sobre a mesa a discussão de temas como distrito eleitoral, sistema de eleições mistas etc.; debater claramente 369 "Todo p o d er e m a n a d o p o v o que o exerce p o r m eio de representantes eleitos ou diretam ente, nos term os desta Constituição'.' 370 TELLES fÜ N lO R . Goffredo. A d e m o c ra c ia particip ativa. In: Keviífn d a Faculdade de Direito. U n iv e r sidade d e São Paulo, vol. 100, 2005, 117. 371 /O B IM , N elson. D ireito e p ro c e sso eleitoral n o Brasil. In; M alh eiro s, A n tô n io C arlo s e o u tro s (C o o r ds.). Inovações do hkiva Código C.ívii Sáo Paulo: Q u a rtie r Latin, s/d , p. 195. 265 esse tipo de situação para entendermos o que se passa em termos político eleitorais no País". Com o se sabe, a sanção de perda de m andato por infidelidade partidária foi introduzida no Brasil pela Em enda Constitucional n° 1, editada pela Junta Militar, em 17/10/1969, que alterou a redação do art. 152 da Constituição de 1967. Mas recordem os tam bém que, em 1985, de form a consentânea com o clima de redem ocratização que imperava no País, a Em enda Constitucional n° 24 deu nova redação ao m encionado dispositivo constitucional, suprim indo as hipóteses de perda de m andato p o r infi delidade partidária, assegurando, ademais, a mais ampla liberdade de criação de partidos políticos, respeitados o regim e dem ocrático, o plu ralismo partidário e os direitos fundam entais, dentre outros valores. A Assembleia Constituinte de 1988 não se afastou do espírito que presidiu a elaboração da EC n® 24/85, adotada no am biente de redem o cratização, deixando de incluir no rol do art. 55 da C arta Magna, que trata da perda de m andado de deputado e senador, qualquer sanção por infidelidade partidária. Isso levou José Afonso da Silva a concluir que a Constituição de 1988 372 "Perderá o m a n d a to no Seriado Federal, na C âm ara dos D eputados, m s A ssem bléias Legislativas e nas C âm aras M un icip a is quer}! p o r a titu d e s o u pelo voto, se opu ser às diretrizes leg itim a m en te estabelecidas pelos órgãos de direção p artidária ou d eixa r o p a rtid o sob cuja legenda fo i eleito. A perda do m a n da to será decretada pela Justiça Eleitoral, m ed ia n te representação do partido, assegurado o direito de am pla defesa." 373 “A rt. 152. É livre a criação de p artidos políticos. Sua organização e fu n c io n a m e n to resguardarão a sobera nia nacional, o regime democrático, o pluralism o pa rtidá rio e os direitos fu n d a m e n ta is da pessoa h u m a n a u r. 374 "Art. 55. Perderá o m a n d a to o D e putado o u Senador: I - q u e infringir q u a lq u er das proibições estabele cidas no artigo anterior: 11 - cujo proced im en to f o r declarado incom patível com o decoro parlam entar; III - q ue deixa r de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça p a rte d as sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou m issão p o r esta autorizada; I V - q u e perd er ou tiver suspensos os direitos políticos; V - q u a n d o o decretar a Justiça Eleitoral, n os casos previsto s nesta C onstituição; V! - q u e sofrer condenação crim inal em sentença transitada em julgado. § 1° - Ê incom patível com o decoro p a rla m en tar, além dos casos definidos no regim ento interno, o abuso d as prerrogativas asseguradas a m em b ro do Congresso N a cional o u a percepção de vantagens indevidas. § 2" - N os casos dos incisos 1 ,11 e VI, a perda do m a n d a to será decidida pela C âm ara dos D eputados ou pelo Senado Federal, p o r voto secreto e m aioria absoluta, m ed ia n te provocação da respectiva M esa ou de p a rtid o político representado no Congresso N a cional, assegurada am p la defesa. $ 3® - Nos casos previstos rios incisos III a V, a p e rd a será declarada pela M esa d a Casa respectiva, d e ofício ou m e d ia n te provocação de q u a lquer de seus m embros, ou de p a rtid o político representado no Congresso Nacional, assegurada a m p la defesa. $ 4" A renúncia de p a rla m en ta r su b m etid o a processo q ue vise ou possa le v a rá perda d o m andato, nos term os deste artigo, terá seus efeitos suspensos até as deliberações fin a is de que tratam os §íS 2° e 3°." 375 SILVA, José A fo nso da. Curso de Direito C onsfilu cio n a l Positivo. JO ed.. São Paulo: M alheiros, J995, p. 386-387. 266 “não perm ite a perda do m andato por infidelidade partidária. A o contrário, até o veda, quando no art. 15, declara vedada a cassação dos direitos políticos, só adm itidas a perda e a suspensão deles nos estritos casos indicados no mesmo artigo”. É que o dispositivo em com ento proíbe, de form a expressa, a cas sação de direitos políticos, estabelecendo, taxativamente, as hipóteses de sua perda ou suspensão, sem n en h um a referência à hipótese de infidehdade partidária. Na m esm a hn h a de entendim ento, Clèm erson M erhn Clève afir m a que, no sistema constitucional brasileiro, a circunstância de o p ar lam entar “não perder o m andato em virtude de filiação a outro partido ou em decorrência do cancelamento da filiação por ato de infidelidade é eloqüente. A inda que doutrinariam ente o regime do m andato possa sofrer crítica, é induvidoso que, à luz do sistema constitucional em vigor, o m andato não pertence ao partido”.^'^ Não foi esse, contudo, o entendim ento fixado pelo Tribunal Su perior Eleitoral ao responder afirm ativamente à C onsulta 1.389/DF, consubstanciada na seguinte indagação: “O5 partidos e coligações têm 0 direito de preservar a vaga obtida pelo sistema eleitoral proporcional, quando houver pedido de cancelamento de filiação ou de transferência do candidato eleito por um partido para outra legendaV\ Feitas essas considerações, observo que é inegável o esforço pelo fortalecimento da dem ocracia no Brasil, tanto do Poder Legislativo, com o do Poder Judiciário, e, principalm ente, dos partidos políticos, que são atores centrais do processo eleitoral. Que a soberania popular seja exercida de form a cada vez mais plena e consciente. 376 “7 - cancelam ento da naturalização p o r sentença transitada em julgado; I I - incapacidade civil absoluta; III - condenação crim inal transitada em julgado, era^uanto d urarem seus efeitos; I V - recusa de cum prir obrigação a todos im posta ou prestação alternativa, nos term os do art. 5", V I I I ”. 377 C LÈVE, C lè m erso n M erlin. Novo re g im e c o n stitu cio n al d o s p a rtid o s políticos. F idelid ade p a rtid á ria v in c u la n d o v o tação e m proc e sso d e im p e a c h m e n t. R evisibilidade d o s ato s p a rtid á rio s pelo íudiciário. C o m p e tê n c ia d a Justiça Eleitoral. In: C adernos de D ireito C onstitucional e Ciência Política, n. 24. São Paulo: RT, 1998. p. 217-218. 378 C LÈVE, C lè m erso n M erlin. N o vo regim e c o n stitu cio n al d o s p a rtid o s políticos. F idelid ade p a rtid á ria v in c u la n d o v o ta ç ão em proc e sso d e im p e a c h m e n t. R evisibilidade do s atos p a rtid á rio s pelo Íudiciário. C o m p e tê n c ia d a Justiça Eleitoral. In: C a d e rn o s d e D ireito C o n stitu c io n a l e C iência Política, n. 24. São Paulo: RT, 1998 , p. 217-218.. 267 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 3^ edição. Coimbra: Almedina, 1998. CLÈVE, Clèmerson Merlin. Novo regime constitucional dos partidos políticos. Fidelidade partidária vinculando votação em processo de im peachment. Revisibilidade dos atos partidários pelo Judiciário. C o m petência da Justiça Eleitoral. In: Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, n. 24. São Paulo: RT, 1998DUVERGER, Maurice. Os partidos políticos. Rio de Janeiro: Zahar, 1970. FLEISCHER, David. Os partidos políticos. In: AVELAR, Lucia e C IN TRA Antonio Otávio (orgs.). Sistema político brasileiro: uma introdu ção..São Paulo: UNESP, 2004. JOBIM, Nelson. Direito e processo eleitoral no Brasil. In: Malheiros, Antônio Carlos e outros (Coords.). Inovações do novo Código Civil. São Paulo: Q uartier Latin, s/d. LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. Reflexões em to rn o do princípio republicano”. In: Carlos M ário da Silva Velloso, Roberto Rosas e A n tonio Carlos Rodrigues do Amaral {Coords.).Princípios constitucionais fundamentais: estudos em homenagem ao professor Ives Gandra Martins. São Paulo: Lex Editora, 2005. MILL, John Stuart. Considerações sobre o governo representativo. São Paulo: IBRASA, 1958. SILVA Daniela Romanelli da. Democracia e direitos políticos. Campinas: Editor-Autor, 2005. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 10 ed., São Paulo: Malheiros, 1995. TELLES JÚNIOR. Goífredo. A dem ocracia participativa. In: Revista da Faculdade de Direito. Universidade de São Paulo, vol. 100, 2005. 268 IN VESTIG A ÇÃO JUD ICIAL ELEITORAL P O R ABUSO DE PO D ER E C O N Ô M IC O O U ABUSO DE P O D E R P O L ÍT IC O S ilv io R o m e r o Beltrão'^'-' Sum ário: 1- Introdução; 2- Abuso de p od er econôm ico e político; 3Potencialidade lesiva; 4- Ação de investigação judicial eleitoral; 4.1Efeitos da ação de investigação judicial eleitoral; 4.2- Legitimidade ativa e passiva; 4.3- M om ento para a propositura d a AIJE; 4.4- Competência; 5- Conclusão; 6- Bibliografia. 1. IN TR O D U Ç Ã O Diante das Eleições de 2010 tem a dou trin a a missão de descrever os principais aspectos legais do direito eleitoral e suas principais inter pretações segundo a jurisprudência dos Tribunais superiores, realizan do as criticas necessários ao estudo e aplicação prática das norm as ju rí dicas específicas. É nesta linha que o do u trinado r deve apontar as atuais coordenadas dispostas pelo Direito Eleitoral e dem onstrar a solução para os conflitos de interesses. Assim, o presente trabalho delim ita o estudo da ação de investigação judicial eleitoral com o m eio processual de combate ao abuso de poder econôm ico e político, apontando o ca m inho que deve o interprete utilizar para a aplicação do direito ao caso concreto. A ação de investigação eleitoral, prevista no art. 22 da Lei C om plem entar no. 64/90, tem p o r objeto apurar o uso indevido, desvio ou abuso do poder econôm ico ou do poder de autoridade, ou a utilização indevida de veículos ou meios de com unicação social, em benefício de candidato ou de partido político. 379 )uiz d e D ireito. Ex- D e se m b a rg a d o r Eleitoral d o TRE-PH, Professor de D ire ito Civil d a Faculdade de D ire ito d o Recife-U FPE, M estre e D o u to r em D ireito Civil p e la UFPE. 380 A rt. 22. LC 64/90. Q u a lq u e r p a rtid o político, coligação, c a n d id a to o u M in isté rio P ú blico Eleitoral p o d e rá re p re s e n ta r à Justiça Eleitoral, d ire ta m e n te ao C o rre g e d o r-G e ra l o u R egional, re la ta n d o fatos e in d ic a n d o provas, in dícios e circ u n stân c ia s e p e d ir a b e r tu ra d e investigação judicial p a ra a p u ra r uso in de vido , d esvio o u a b u so d o p o d e r e c o n ô m ic o o u d o p o d e r d e a u to rid a d e , o u u tilização in d e v id a de veículos ou m eio s de c o m u n ic a ç ã o social, en i b enefício de ca n d id a to o u de p a rtid o político, o b e d ec id o o segu in te rito: 269 Assim, a ação de investigação judicial eleitoral trata de fatos ju rídicos que envolvem as transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, o uso indevido, desvio ou abuso do poder econôm ico ou político em detrim ento da liberdade do voto, a utilização indevida de veículos ou meios de com unicação social e a captação ilícita de sufrágio. As transgressões quanto à origem de valores pecuniários, segun do a doutrina de A driano Soares da Costa^®* dizem respeito a qualquer fato que contrarie as norm as sobre obtenção e gastos de recursos para fins eleitorais. O uso indevido dos veículos e meios de com unicação social diz respeito a fatos que envolvam a utilização de meios de com unicação publica^^^, os quais são explorados por particulares através de concessões públicas, buscando evitar que tais veículos sejam utilizados em benefí cio de grupos ou agremiações partidárias. Nesse m esm o sentido, devese coibir que a propaganda institucional seja usada com a finalidade de influir no certam e eleitoral favorecendo determ inado candidato.^^^ Por sua vez, a captação ilícita de sufrágio, prevista no art. 41-A da Lei 9.504/97^^\ consiste na atuação vedada ao candidato que fica im pedido de doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública. Por fim, o abuso de poder econôm ico e político, segundo Marcos Ramayana, “é toda a conduta ativa ou omissiva que tenha potencialida de para atingir o equilíbrio entre candidatos que almejam determinado pleito eleitoralP^'^ 381 A d ria n o Soares d a C osta, In stituições d e D ire ito Eleitoral, 6''. Ed., Belo H o rizonte: Del Rey, 2006, pág. 528. 382 A rt. 37, p a rá g ra fo 1°. d a C o n stitu iç ão Federal: “§ I" - A p u b lic id a d e d o s atos, p ro g ram a s, ob ras, s e r viços e c a m p a n h a s d o s ó rg ã o s pú blicos d e v erá te r c aráter educativo, in fo rm a tiv o o u d e orie n ta ç ão social, dela n ã o p o d e n d o co n s ta r no m e s, sím bo lo s o u im a g e n s q u e ca r a c te riz e m p ro m o ç ã o pessoal de a u to rid a d e s o u serv id ores públicos. 383 A p ó s as c o n v ençõ es d o s p a rtid o s políticos, q u a n d o se inicia o p e río d o d e p ro p a g a n d a eleitoral lícita, deve a lustiça Eleitoral fiscalizar c o m rigo r as p eça p u blicitárias v eiculadas p e lo P o d e r Público, de m o d o a p ro ib ir e co ib ir os excessos, ap en a s a d m itin d o aquelas p eças q u e sejam e m in e n te m e n te in fo r m ativas, n ecessárias p a ra alg u m a finalidad e coletiva. C o sta , op. cit. p. 534. 384 A rt. 41-A . R essalvado o d isp o sto n o art. 26 e seu s incisos, co n stitu i captaç ã o d e sufrágio, v e d a d a p o r esta Lei, o c an d id a to doar, oferecer, p rom eter, o u entregar, ao eleitor, com o fim d e o b te r-lh e o voto, b e m ou van ta g em pessoal d e q u a lq u e r natureza, inclusive em p re g o ou fu n ç ã o pública, desd e o registro d a c a n d id a tu r a até o dia da eleição, inclusive, so b p e n a de m u lta de m il a c in q ü e n ta mil Ufir, e cassação d o registro o u d o d ip lo m a , o b s e rv a d o o p ro c e d im e n to p rev isto n o art. 22 da Lei Com plem entar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei n“ 9.840. de 28.9.1999) 385 M arco s R am ayana, D ire ito Eleitoral, 8". Ed., N iterói; Im p e tu s, 2008, pág. 399, 270 As três prim eiras hipóteses não serão estudadas no presente tra balho, o qual se restringe a ação de investigação judicial eleitoral nos casos de abuso de poder econôm ico e político. Assim, diante da necessidade de estudar as formas de combate às condutas de abuso de po d er econôm ico e político dos candidatos, diante das eleições de 2010, o presente trabalho pretende estudar o seu conceito e natureza jurídica, bem com o os aspectos processuais da ação de investigação judicial eleitoral. 2, ABUSO DE PO D ER E C O N Ô M IC O E PO LÍTIC O . O abuso de p od er econôm ico e político está disposto no art. 22 da Lei C om plem entar 64/90 e consiste, segundo o Autor José Jairo Gomes, no uso nocivo e distorcido de meios de com unicação social; propagan da eleitoral irregular; fornecim ento de alimentos, m edicamentos, m ate riais ou equipam entos agrícolas, utensílios de uso pessoal ou doméstico, m aterial de construção; oferta de tratam ento de saúde; contratação de pessoal em período vedado; percepção de recursos de fonte proibida.^®^ Esta é a m esm a idéia de A driano Soares da Costa onde o partido político pode obter recursos quer públicos, quer particulares com a fi nalidade de divulgar as suas idéias e plataforma política, contudo não poderão esses recursos ser utilizados ilegalmente no sentido de co m prar votos, ou adquirir a preferência do eleitorado explorando a sua miséria, fome e falta de instrução. Se isto ocorrer, com a distribuição de alimentos, dentaduras, sapatos, telhado, tijolo, haverá evidente abuso de poder econômico. O que se pretende proteger com a punição do abuso de poder econôm ico e político é o equilíbrio entre os candidatos que participam do pleito eleitoral. Especificamente, o abuso de p o d er econôm ico define-se, na li ção de Joel C ândido “no emprego, em todo o período das campanhas eleitorais, pelos partidos políticos, coligações ou candidatos, de recur sos que, mesmo oriundos de fonte lícita, pela desproporção de seus altos valores para com os objetivos a que se destinam, venham desigualar a 386 José la iro G o m es, D ire ito Eleitoral, Belo H o rizo nte: Del Rey, 2008, pág. 350. 387 C osta, op. cit. p. 530. 271 busca pelos votos em relação aos demais partidos políticos, coligações ou candidatos’\^^^ Assim, 0 que se combate no abuso de poder econôm ico é a vanta gem dada a um a coletividade de eleitores, beneficiando-os ou não, com a finalidade de obter-lhes o voto, sendo necessária a probabilidade de influenciar no resultado do pleito.’*^^ É evidente que o poder econômico exerce um a forte influência no resultado do pleito eleitoral, contudo, não é esta a idéia de eleições dem o cráticas e igualitárias, onde deveria prevalecer a ideologias partidárias. Investigação judicial. Imprensa escrita. Jornal. Criação. Proximidade. Eleição. Distribuição gratuita. Noticias. Fotos e matérias. Favorecimento. Candidato. Uso indevido dos m eios de comunicação social. Tiragem expressiva. Abuso do poder econômico. LC 64/90 - I) Jornal de tiragem expressiva, distribuído gratuitamente, que em sua edições enaltece apenas um candidato, dá-lhe oportunidade para divulgar suas idéias e, principalmente, para exibir o apoio político que detém de outras lideranças estaduais e nacionais, mostra potencial para desequilibrar a disputa eleitoral, caracterizando uso indevido dos meios de comunicação e abuso de poder econômico, nos termos do art. 22 da LC 64/90 (TSE - Ac. 688/ Xanxerê-SC - Rei. Ministro Fernando Neves da Silva - j . 21.06.2004) Deve-se destacar que em alguns casos o ato abusivo pode trazer repercussão em um a eleição para vereador, não provocando nenhum a repercussão em eleição m ajoritária para prefeito, e vice-versa. Nesses casos, deve o Juiz Eleitoral p onderar no m om ento da apli cação da n orm a jurídica, verificando as conseqüências para a eleição e se houve repercussão na manifestação do eleitor através do v o to .^ Por outro lado, o abuso de poder político, segundo a lição de Adriano Soares da Costa, “é o uso indevido de cargo ou função pública, com a finalidade de obter votos para determinado candidato. Sua gravi dade consiste na utilização o m únuspúblico para influenciar o eleitorado, com desvio de finalidade”. 388 389 390 391 Joel J. C â n d id o , D ire ito Eleitoral Brasileiro, 13^ Ed., B auru; Hdipro, 2008, pág. 142 C o sta , op. cit. p. 531 idem . Id em , p. 530 272 Segundo Adriano Soares é necessário que o abuso de poder polí tico tam bém expresse a hipótese de im probidade adm inistrativa assim, a atividade adm inistrativa pode ser caracterizada com o ilícita do ponto de vista eleitoral.^'^^ Representação. Procedência. Declaração de inelegibilidade. Recurso. Rejeitada preliminar de intempestividade. Em face das provas acostadas aos autos, conArmou-se a utilização de programa habitacional, financiado com recursos da união, para beneficiar candidatura. Comprovado o abuso de poder político, sendo obrigatória e irretocável a aplicação do disposto no art. 1° da lei complementar n° 64/90. Recurso a que se negou provimento. Decisão unânime.(TRE-PE, Des. Leopoldo de Arruda Raposo, RE 5880, j. 05.09.2002) Assim, segundo a lição de Joel Cândido, o abuso de poder políti co 'g 0 emprego, em todo o período das campanhas eleitorais, por quem exerce atividade politica-partidária, de prática que afronte a ética, a li berdade de voto, a moralidade para o exercício do mandato eletivo ou os bons costumes que devem reinar no Estado Democrático de D ireito’.^^^^ Não se im pede que o adm inistrador pleiteie votos tendo p o r base a sua atuação diante da adm inistração pública, explorando a sua boa gestão, assim, como os seus opositores utilizam sua m á gestão diante da coisa pública para dem onstrar a necessidade de m udar de adm inis trador. Desta forma, nada im pede que o adm inistrador dem onstre a sua boa gestão com o motivação para a continuidade administrativa, não podendo ser tolhido ao candidato apresentar em sua cam panha as con quistas de sua adm inistração, onde do mesm o m odo, deve ser garanti do aos partidos de oposição o direito de m ostrar tam bém a atuação, os desmantelos e as improbidades dos atuais m andatários e seus candida- tos.-'^‘^ 392 “A buso d e p o d e r político, p o rta n to , dev e ser visto c o m o a a tiv id a d e im p ro b a d o a d m in is tra d o r, com a finalidad e d e influ en ciar n o pleito eleitoral d e m o d o ilícito, d e se q u ilib ra n d o a disputa. Sem im p r o bid ade, n ã o h á a b uso d e p o d e r politico: “a ção po pu la r. C o n d e n a ç ã o q u e n ã o d e s a b o n a o im p ug na d o. Inexistência c o n o ta çã o de im p r o b id a d e n o ato im p u g n a d o , n ã o h á lu g a r p a ra a in c idê ncia d a alínea ‘h’, inc. I, art. I", d a LC 64/90(R JTSE 3 /95 /3 06 e segts.) C osta, op. cit. p. 531. 393 C ân d id o , op. cit. p. 142. 394 C o sta , op. cit. p. 530. 273 3. POTENCIALIDADE LESIVA Merece destaque a discussão que a jurisprudência travou a res peito da potencialidade lesiva, onde o TSE, inicialmente, entendia que era indispensável a dem onstração do nexo de causalidade entre a con duta lesiva e o resultado das eleições. Atualmente, o entendim ento jurisprudência! que se tornou d o m inante a partir do Resp. 19.553, relatado pelo M inistro Sepulveda Per tence, dispõe que é suficiente a dem onstração da potencialidade lesiva para a procedência da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, não sen do necessária a dem onstração do nexo de causalidade. 1. Para a configuração de abuso de poder político, não se exige nexo de causalidade, entendido esse como a comprovação de que o candidato foi eleito efetivamente devido ao ilícito ocorrido, mas que fique demonstrado que as práticas irregulares teriam capacidade ou potencial para influenciar o eleitorado, o que torna ilegítim o o resultado do pleito. 2. Se fossem necessários cálculos matemáticos, seria impossível que a representação fosse julgada antes da eleição do candidato, que é, aliás, o mais recomendável, visto que, com o disposto no inciso XIV do art. 22 da LC n.“ M /90, somente neste caso poderá a investigação judicial surtir os efeitos de cassação do registro e aplicação da sanção de inelegibilidade. 3. Prova incontroversa de que o candidato utilizou o DNOCS, arvorando-se de verdadeiro “administrador” com o m eio para desequilibrar o pleito e angariar votos, com a construção de passagens molhadas em vários municípios cearenses vinculadas a sua candidatura. 4. Inelegibilidade que se decreta, a teor do art. 22, XIV da Lei Complementar 64/90. (TRE-CE, IJE n.“ 11.025, Ac. n.“ 11.025, de 6.12.2004, Rei. Des. José Eduardo Machado de Almeida) A potencialidade lesiva é, assim, a probabilidade que tem o ato lesivo de influenciar no resultado das eleições, não sendo necessária a efetiva dem onstração matem ática do nexo de causalidade entre o ato lesivo e o núm ero de votos conquistados de form a irregular. Nesse sentido, ensina José Jairo Gomes: Nessa perspectiva, ganha relevo a relação de causalidade entre o fato imputado e o desequilíbrio do pleito, im pondo a presença de líame objetivo 2 74 entre tais eventos. Todavia, não se faz necessário - até porque, na prática, isso não seria possível - provar que o abuso influenciou concretamente os eleitores, a ponto de levá-los a votar efetivamente no candidato beneficiado. Basta que se demonstre a provável influência na consciência e vontade dos cidadãos. Note-se que, do ângulo lógico, a probabilidade oferta grau de certeza superior à mera possibilidade. O provável é verossímil, ostenta a aparência de verdade embora com ela não se identifique plenamente.^^^ Nesse m esm o sentido, entende Adriano Soares Costa, o qual es clarece que som ente haverá abuso relevante se, concretam ente, trouxer possibilidade de modificar o resultado da eleição.^®^ Por sua vez, recentemente, o TSE, em apreciação de processo envolvendo conduta vedada, em decisão aparentem ente contraditória afastou a análise da potencialidade lesiva, para a verificação da conduta vedada, esclarecendo que a potencialidade haveria de incidir apenas no m om ento da aplicação da penalidade. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2004. CO N D U T A VEDADA. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. REALIZAÇÃO DE N O V O PLEITO. ELEIÇÕES INDIRETAS. PRO VIM EN TO. L A jurisprudência do TSE considera que a configuração da prática de conduta vedada independe de sua potencialidade lesiva para influenciar o resultado do pleito, bastando a mera ocorrência dos atos proibidos para atrair as sanções da lei Precedentes: REspe n° 2I.151/PR , Rei. M in. Fernando Neves, DJ de 27.6.2003; REspe n° 24.739/SP, R e i Min. P eçanha M artins, D l de 28.10.2004; REspe n° 21.536/ES, Rei. M in. F ernando Neves, DJ de 13.8.2004; REspe n" 26.908, desta relatoria, DJ de 12.2.2007. 2. O juízo de proporcionalidade incide apenas no momento da fixação da pena. Precedentes: AgRg no REspe n° 25.358/CE, desta relatoria, DJ de 8.8.2006; REspe n° 26.905/RO, Rei. Min. G erardo Grossi, DJ de 19.12.2006; REspe n° 26.908/RO, desta relatoria, DJ de 12.2.2007. 3. Quanto à captação ilícita de sufrágio, o TSE considera despicienda a potencialidade da conduta 395 G om es, op. cit. p. 355. 396 “D esse m o d o , o co n ce ito d e a b u so d e po d e r, e c o n ô m ic o o u político, é relacionai: ap en a s h á a bu so ju rid ic a m e n te relevante se, c o n cretam e n te , tro u x e r p ossib ilidad e d e m o d ific a r o resu ltad o d a eleição. A ssim , ap en a s n o c o nte x to d o caso co n c re to p o d e rá scr o b s e rv a d a a ex istên cia de abu so relevante pa ra in c o a r a san ç ã o d e inelegibilidade.” C osta, op.cit. p. 531. 275 para influenciar no resultado do pleito. Precedentes; REspe n° 26.118/M G, Rei. M in. G erardo Grossi, DJ de 28.3.2007; AG n° 3.510/PB, Rei. Min. Luiz Carlos M adeira, DJ de 23.5.2003; REspe n° 21.248/SC, Rei. Min. F ernando Neves, DJ de 8.8.2003; REspe n° 21.264/AP, Rei. M in. Carlos Velloso, DJ de 11.6.2004. 4. U m a vez reconhecida a captação ilícita de sufrágio, a m ulta e a cassação do registro ou d o diplom a são penalidades que se im põ em ope legis. Precedentes: AgRg no RO n® 791/MT, Rei. M in. M arco Aurélio, DJ de 26.8.2005; REspe n° 21.022/CE, Rei. M in. Fernando Neves, DJ de 7.2.2003; AgRg n o REspe n° 25.878/RO, desta relatoria, DJ de 14.11.2006. 5. A jurisp rud ência do TSE tem com preendido que “(...) prevendo o art. 222 do Código Eleitoral a captação de sufrágio com o fator de nulidade d a votação, aplica-se o art. 224 d o m esm o diplom a n o caso em que houver a incidência do art. 41-A da Lei n" 9.504/97, se a nulidade atingir mais d a m etade dos votos” (REspe n° 21.221/MG, Rei. Min. Luiz Carlos M adeira, DJ de 10.10.2003). 6. É descabida a diplom ação dos candidatos de segunda colocação, haja vista a votação obtida pelo candidato vencedor, de 51,61% dos votos válidos. 7. Pelo princípio da sim etria im plicitam ente correlacionado com o art. 81, § 1", d a CF, a renovação do pleito n o últim o biênio do m an dato ocorre em eleição indireta, a cargo do Poder Legislativo local. Precedentes: REspe n° 21.308/SC, Rei. M in. Barros M onteiro, DJ de 21.6.2004; AgRg no M S/PE n» 3.634/PE, Rei. M in. Ari Pargendler, DJ de 24.9.2007; Ag n° 4.396/MS, Rei. Min. Luiz Carlos M adeira, DJ de 6.8.2004; REspe n° 21.432/ MG, Rei. M in. Francisco P eçanha M artins, DJ de 25.6.2004; C ta n° 1.140/DF, Rei. M in. G ilm ar Mendes, DJ de 10.10.2005. 8. Recursos especiais providos para cassar o diplom a dos recorridos p o r infringência ao art. 41-A da Lei n° 9.504/97, aplicar a penalidade cabível pela prática de conduta vedada (art. 73, §§ 4° e 5", da Lei n° 9.504/97) e determ inar a realização de eleição indireta no M unicípio de Caxingó/PI.(Respe. N 27.737/Pl, rei. Min. José Delgado. Informativo TSE n. 1/2008, p. 7 - DJ de 1°.2.2008) Ora, no caso acima dem onstrado, contrariando boa parte da atu al jurisprudência foi desprezada a análise da potencialidade, d eterm i nando que seria suficiente para a cassação do registro a existência do ato lesivo. Contudo, acredito que deva prevalecer o entendim ento pela ne 276 cessidade de apreciação da potencialidade lesiva, em face de situações práticas em que m esm o sendo um ato contrário ao ordenam ento ju rí dico não é suficiente para desequilibrar a disputa eleitoral. O objeto tutelado pelo direito eleitoral, nesses casos, é proteger a norm alidade e legitimidade das eleições contra a influência do p o der econôm ico ou político, onde diante de um fato que não dem onstre efetivamente a im putação da força para causar o desequilíbrio, não há como se falar em abuso de poder. Nesse sentido, pode-se exemplificar pelo caso em concreto julga do pelo TSE: Representação. Prefeito. Candidato à reeleição. Conduta vedada. Art. 73, II e VI, b, da Lei n” 9.504/97. Uso de papel timbrado da prefeitura. Publicidade institucional no período vedado. 1. O uso de uma única folha de papel timbrado administração não pode configurar a infração art. 73, II, da Lei n* 9.504/97, dada a irrelevância conduta, ao se tratar de fato isolado e sem prova que outros tenham ocorrido. da do da de 2. O art. 73 da Lei n° 9.504/97 visa à preservação da igualdade entre os candidatos, não havendo como reconhecer que um fato de somenos importância tenha afetado essa isonom ia ou incorrido em privilégio do candidato à reeleição. 3. A intervenção da Justiça Eleitoral deve ter como referência o delicado equilíbrio entre a legitimidade da soberania popular manifestada nas urnas e a preservação da lisura do processo eleitoral. 4. Para restar demonstrada a responsabilidade do agente público pelo com etimento do ilícito eleitoral instituído pelo art. 73, inciso VI, alínea b, da Lei n® 9.504/97, é indispensável a comprovação de que o suposto autor da infração tenha autorizado a veiculação de publicidade institucional nos três meses que antecedem o pleito. 5. Conforme entendimento contido no Acórdão n“ 5.565, por se tratar de fato constitutivo do ilícito eleitoral, cabe ao autor da representação o ônus da prova do indigitado ato de autorização. 6. Hipótese em que não ficou configurada a potencialidade da conduta vedada para interferir no resultado das eleições. 277 Recurso especial conhecido e provido. Medidas cautelares prejudicadas.(Recurso especial eleitoral n. 25.073/BA, rei. Min. Caputo Bastos. Informativo TSE n. 6/2006, p. 8) 4. ALTERAÇÕES IN TR O D U ZID A S PELA LEI N. 12.034/2009 Recentemente a Lei 12.034/09 introduziu um a im portante altera ção ao art. 41-A da Lei 9.504/77, com dispositivos que visam positivar 0 posicionam ento dom inante do TSE. O prim eiro deles, contido no parágrafo prim eiro, determ ina que “para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido expli cito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.” A verificação da existência de captação ilícita de sufrágio vai d e pender da interpretação do caso, em especial n a verificação da conduta do candidato, m esm o que não exista o pedido explicito de voto. O u seja, a interpretação deverá se prender à intenção expressa na declaração de vontade, o com portam ento e as circunstâncias que en volveram a manifestação da vontade. Desse modo, a interpretação deve atender ao com portam ento adotado pelo candidato, diante da situação do fato concreto, não acolhendo integralmente o sentido literal da lin guagem, mas atendendo ao espírito da intenção form ada na declaração ou na conduta tomada. “os mesmos critérios que explicam a construção da declaração emitida ou comunicada, devem governar, também, a interpretação que não é mais do que a sua reconstituição. Os critérios objetivos de apreciação, que esclarecem, tendo em vista o conjunto de circunstâncias, o significado social da palavra usada - tanto no emprego da linguagem falada, como os usos do comércio e as concepções dominantes na consciência social comandam, igualmente a interpretação: porque, na normalidade dos casos, concorrem, essencialmente, para determinar também a concreta situação objetiva das partesP'^^ 397 E m ilio Betti, Teoria G eral d o N eg ó cio Juridico, Trad. F e rn a n d o d e M ira n d a , E d ito ra C o im b ra , C o i m bra, 1969, pág. 256. 278 Por sua vez, em Com entários à Nova Lei Eleitoral, Walber Agra e Francisco Queirós, expõe que: “para aferir se houve ou não captação ilícita de sufrágio, é necessário que se leve em consideração todas as ca racterísticas que 0 fa to pretendido como ilícito encerra: o tipo de eleitores, 0 grau de desenvolvimento socioeconômico, o local em que se realizou a conduta, as carências da população etcP^^ N outra form a de pensar, não é possível p u n ir o candidato por promessas de cam panha, com o objetivo de melhorias públicas, as quais naturalm ente fazem parte do discurso político de todos os candida- tos/^^ Por outro lado, a Lei 12.034/09, tam bém introduziu no art. 41A, em seu parágrafo segundo a possibilidade de cassação do diploma ou do registro daquele que tenha praticado atos de violência ou grave ameaça, com o objetivo de obter votos. “Houve também uma ampliação da conduta típica, passando a incidir nas condutas praticadas através de violência ou grave ameaça a pessoa. Ou seja, se a violência ou qualquer tipo de grave ameaça, como coação, for realizada com o propósito de captação de voto, resta configurada a conduta enfocada (art. 41 A, parágrafo 2°. Da Lei n. 9.5 04 /9 7)^ Por ultimo, a Lei 12.034/09 põe um ponto final na discussão quanto ao prazo m áxim o para a interposição da AI)E, determ inando que : “fl representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação." 5. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL Nos term os do art. 22 da Lei C om plem entar n. 64/90, a ação de investigação judicial eleitoral é o rem édio próprio que visa com bater os abusos de poder econôm ico e político. D entre esses abuso de poder, 398 W alb er de M o u ra Agra, Fran cisco Q u e iro z C avalcanti, C o m e n tá r iu s à N ova Lei Eleitoral: E d ito ra F o rense, Rio de Janeiro, 2010, pág. 80. 399 “N ão há pro ib ição n e n h u m a à c ap taç ã o do sufrágio, de m a n e ira lícita, u m a vez qu e faz pa rte da pró p ria essência d a p r o p a g a n d a po lítica eleitoral. Todavia, o q u e deve s er r e p rim id a é a c aptaç ã o a d q u irid a d e fo rm a ilícita, através d e a rtim a n h a s , d a c o m p ra d e v otos, p rin c ip a lm e n te p o rq u e o p o v o in c u lto e caren te se to r n a pressa fácil p elo fascínio q u e a ca b a m d e s p e rta n d o m u ito s h o m e n s e lo qü entes, q u e en tre ta n to , só e n x e rg a m o p o d e r pela ótica d a ex tra ç ão de ben efício pessoal.” Id em , pág. 77. 400 Idem , pág. 81 . 279 estão contidas aquela figuras consideradas vedadas pela lei 9.504/97, em seu artigo 73 a 78. O Art. 19 da LC 64/90 dispõe que as transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, abuso de poder econôm ico ou político, em detrimento da liberdade do voto, serão apuradas mediante investi gações jurisdicionais realizadas pelo corregedor-geral e corregedores Regionais Eleitorais. Mas essas trans gressões devem ser apuradas mediante 'procedimento sumaríssimo’, provocado por representação à Justiça Eleitoral, feita por qualquer partido político, coliga ção, candidato ou Ministério Público, com relato de fatos, indicação de provas, indícios e circunstâncias, com rito estabelecido no art. 22 da LC 64/90.^*“ A ação de investigação judicial eleitoral tem natureza jurídica constitutiva negativa, vez que determ ina a cassação do registro, e um a natureza declaratória, quando declara a inelegibilidade p o r três anos. Assim, a pretensão jurídica nos casos de investigação judicial eleitoral visa à declaração de abuso de poder político ou econômico, com a decretação da inelegibilidade do candidato p o r três anos, a partir da eleição onde houve a condenação, bem como, a cassação do registro, dependendo do estado em que se encontre o processo.^°^ 5.1. EFEITOS DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL Os efeitos da ação de investigação judicial eleitoral estão previstos no art. 22, XIV da Lei C om plem entar 64/90, e podem ser: a) a decretação a inelegibilidade do candidato e das pessoas que contribuíram para o fato, para a eleição em questão; b) a declaração de inelegibilidade dos representados para as eleições a se realizarem nos 03(três) anos subseqüentes à eleição em questão; c) a cassação do registro do candidato diretam ente beneficiado."’®'^ 401 Soares, op. cit. p. 512. 402 A rt. 15. T ran sita d a e m ju lg a d o a d ecisão q u e d e c la ra r a inelegibilidade d o can d id ato , ser-lh e-á n e g a d o registro, o u cancelado, se já tiver sid o feito, o u de cla ra d o n u lo o d ip lo m a , se já expedido. 403 Soares, op. cit. p. 517. 280 Contudo, tais efeitos devem ser m elhores explicitados, principal mente o efeito da cassação do registro, vez que o m om ento do julga m ento vai ser im portante na determ inação das sanções que podem ser aplicadas pelo magistrado. Q uanto à decretação de inelegibilidade para as eleições que se re alizam no m om ento da prática do abuso de poder, tal m edida constitui u m a sanção pela prática de ato abusivo, com o fim de impossibilitar a participação do representado no pleito. Antes e depois das eleições, a resolução judicial há de decretar a inelegibilidade do representado para a eleição em que se deu o abuso do poder econômico ou de autoridade(“essa eleição”), porque do contrário não poderá o Ministério Público, ou o representante (autor da ação), propor recurso contra diplomação ou ação de impugnação de mandato eletivo, com o pres creve o art. 22, inc. XV. Se após as eleições transitar em julgado a decisão sobre a inelegibilidade do represen tado, como atacar sua diplomação sem que a inelegi bilidade seja nessa eleição, mas apenas nas próximas? 0 inc. XIV do art. 22 da LC 64/90 prescreve, com o um dos efeitos atribuídos à AIJE, a declaração (rectius; decretação) da inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato.^"^ Por sua vez, a com inação de pena de inelegibilidade p o r três anos, im pede que o representado participe d a próxim a eleição, pois, o prazo da pena tem início a p artir da eleição em que foi praticado o abuso. Tal com inação está prevista no art. 1°. da LC 64/90: Art. 1“ São inelegíveis: 1 - para qualquer cargo: d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apuração de abuso do poder econôm ico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3 (três) anos seguintes; Por fim, a cassação do registro do candidato significa a desconstituição do seu registro para aquela eleição em que se deu o abuso de 404 Id em , p. 518. 281 p o d er político e econômico, tornando inexistente o registro de sua can- didatura/^^ Contudo, p ara que produza realmente efeitos de cassação à ação deve transitar em julgado até a diplomaçào do candidato eleito, pois, caso o seu trânsito em julgado ocorra tão-som ente após a diplomação do candidato será necessário o m anejo do recurso contra a diplomação ou da ação de im pugnação de m andato eletivo para a produção dos efeitos desejados/^^ Para que eles se deflagrem, é necessário que a decisão possua carga majidaraental relevante, o que não ocorre quando a AIJE é julgada após a diplomação dos eleitos na eleição em que o abuso de poder se deu. Logo, para que haja esse efeito concreto, no plano fátíco, mister é que seja interposto o recurso contra a diplomação, para cassar os efeitos do diploma concedido ao candidato inelegível. Se tal remédio não for manejado, a inelegibilidade cominada potenciada não surtirá efeitos práticos, podendo o candidato inelegível exercer seu mandato integralmente.'*®^ H á ainda um a diferenciação, em relação aos efeitos, em caso de captação ilícita de sufrágio, onde o recurso contra a sentença tem efeito m eram ente devolutivo, p odendo a determ inação judicial ser cum prida de imediato, inclusive se o candidato já tiver sido diplom ado e estiver exercendo o seu cargo. “(...) C aptação ilícita de sufrágio. (...) Constitucionalidade do art. 4 I-A d a Lei n“ 9.504/97. A usência de efeito suspensive (art. 257 do Código Eleitoral). Execução im ediata. (...)” (Ac. de 4.4.2006 no REspe n" 25.902. rei. M in. Gerardo Grossi.) “(...) A rt. 41-A d a Lei n° 9.504/97. Constitucionalidade. (...) A cassação do registro ou do diplom a em decorrência da captação ilícita de sufrágio não gera declaração de 405 Soares, op. d t . p. 525. 406 C A PT A Ç Ã O ILÍCITA D E R EC U RSO S O U G A ST O S IL ÍC ITO S. Possibilidade d e a n te cip a ç ã o d o ju l gado, co m a cassação d o dip lo m a . A lteração d a lei realizada em 10 de m a io d e 2006. A rt. 3 0 -A. Q u a l q u e r p a rtid o p olitico o u co ligação p o d e rá re p re s e n ta r à Justiça Eleitoral re la ta n d o fatos e in d ic a n d o pro vas e p e d ir a ab e r tu ra d e investigação judicial p a r a a p u ra r c o n d u ta s e m d e sa c o rd o c o m as n o rm a s d e sta Lei, relativas à arre c a d a ç ã o e gastos de recursos. (Incluido pela Lei n" 11.300, de 2006) § L' N a a p u ra çã o d e qu e tra ta este artigo, aplicar-se-á o p ro c e d im e n to prev isto n o art. 22 da Lei Com plementar n" 64, de 18 de maio de 1990, n o q u e couber. (Incluído pela Lei n° 11.300. de 2006) § 2" C o m p ro v a d o s captação o u gastos ilícitos de re c u rso s, p a ra fins eleitorais, será n e g a d o d ip lo m a ao c an d id ato , o u cassado, se já ho u v e r sido o u to rg a do . ( Incluido pela Lei n° 11.300, de 2006) 407 Idem , p. 526. 282 inelegibilidade. (...)” (Ac. r f 25.241, de 22.9.2005, rei M in. H um berto Gomes de Barros; no m esm o sentido o Ac. n° 882, de 8.11.2005, rei. M in. Marco Aurélio.) “(•••) I - É constitucional e tem aplicação im ediata o art. 41-A da Lei das Eleições, de acordo com en tendim ento consagrado no TSE (REspe n" 25.215/RN, rei. Min. C aputo Bastos, julgado em 4.8.2005, publicado no D} de 9.9.2005). (...)” (Ac. n° 25.295, de 20.9.2005, rei. Min. Cesar Asfor Rocha.) Nesse sentido, é interessante a fixação dos efeitos da ação de in vestigação judicial eleitoral no caso de abuso de poder econôm ico e político, conforme o quadro exemplificativo abaixo: a) Sentença prolatada antes da eleição: a. Decretação da inelegibilidade nessa eleição e po r mais três anos; b. Cancelam ento do registro do candidato; c. Impossibilidade do representado concorrer ao pleito; b) sentença prolatada após a eleição e antes da diplomação: a. Decretação da inelegibilidade nessa eleição e p o r mais três anos; b. Cancelam ento do registro do candidato; c. Impossibilidade do candidato eleito ser diplomado. c) sentença prolatada após a diplomação: a. Decretação da inelegibilidade nessa eleição e po r mais três anos; b. Envio dos autos ao M inistério Público para propositura de recurso contra a diplomação ou AIME - ação de im pugnação de m andato eletivo; Em conclusão, de form a esclarecedora, ensina A driano Soares da Costa: Se a sentença sobre abuso de poder econôm ico ou político transitar em julgado antes da diplomação dos eleitos, terá por efeito o cancelamento do registro de candidatura, tornando nenhuma(inexistente) a proclamação dos resultados. Os votos do candidato 283 inelegível são reputados nulos, não sendo computados para qualquer efeito. Se, doutra banda, o trânsito em julgado da sentença de procedência ocorrer após a diplomaçào, serão remetidos, para o Ministério Público, cópias do processo, para que este interponha recurso contra diplomaçào ou ação de impugnação de mandato eletivo. Seja com o for, tanto em um remédio, com o no outro, o que o Ministério Público visará é a resolubilidade dos efeitos da diplomação e apenas isso. A inelegibilidade foi decretada em sede de AIJE, para essa eleição e para a que ocorrer nos próximos três anos. O fato de tal decretação já não servir de supedáneo para desefícacização do diploma, com a necessidade da propositura de nova ação (art. 22, inc. XV da LC 64/90), se deve a uma opção política do legislador, cuja conseqüência foi tornar inócua, em larga medida, a utilidade prática da 5.2. LEGIM IDADE ATIVA E PASSIVA. O art. 22, caput, da Lei C om plem entar 64/90 determ ina que qual quer partido político, coligação, candidato ou o M inistério Público p o derá p ro p o r ação de investigação judicial eleitoral p o r abuso de p oder político ou econômico. Por outro lado, a legitimidade passiva será do candidato bene ficiado pelo abuso do poder político ou econôm ico e qualquer pessoa que tenha praticado o ato proibido p o r lei, seja candidato ou não. Deve-se ressaltar que se o abuso de p o d er econôm ico for pratica do po r pessoa que não seja candidato, m as visando beneficiá-lo, ocor rerá a figura do litisconsorte passivo necessário, onde todos deverão ser citados para contestar a ação. Contudo, tendo a ação de investigação judicial eleitoral a finali dade de tornar o candidato inelegível, bem com o de terceiros que con corram para o ato, não há a hipótese de litisconsorte necessário com o partido político ao qual o candidato é filiado, podendo, todavia, o partido intervir no processo com o interessado, em face da dependência da relação jurídica com o candidato. ^ 408 Soares, op. cit. p. 574. 409 Id em , p. 539, 284 5.3. MOMENTO PARA A PROPOSITURA DA AIJE. Não há especificamente a fixação de um prazo pela LC 64/90 para o ajuizamento da ação de investigação judicial eleitoral. A lei não fixou o seu term o iniciai. Contudo, o entendim ento Jurisprudencial é o de que o term o ini cial se dá com o registro do candidato, m esm o aguardando recurso. E o term o final ocorre até a data da diplomação, conform e a nova redação do artigo 41-A, da Lei 9.504/97. A fixação do prazo final pela Lei 12.034/09 está de acordo com o entendim ento predom inante do TSE. Ação de investigação judicial. Prazo para a propositura. Ação proposta após a diplomaçâo do candidato eleito. Decadência consumada. Extinção do processo. A ação de investigação judicial do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 pode ser ajuizada até a data da diplomaçâo. Proposta a ação de investigação judicial após a diplomaçâo dos eleitos, o processo deve ser extinto, em razão da decadência. Nesse entendimento, o Tribunal julgou extinto o processo. Unânime. Representação n. 305/MG, Rei. Min. Sálvio de Figueiredo, em 27/03/2003.‘’“* 6. CONCLUSÃO Em face das diversas decisões do TSE, pode-se verificar que não há um a uniform idade nos julgados em term os de ação de investigação judicial eleitoral, existindo jurisprudência de to d a ordem , o que dificul ta 0 estudo deste tipo de ação. C ontudo, diante do tem a discutido no presente trabalho é pos sível concluir que a ação de investigação eleitoral somente pode ser proposta após a realização do registro, todavia, os fatos relacionados à representação podem ser anteriores ao próprio registro. Inicialmente, a legitimidade para a propositura da ação é atribu ída ao M inistério Público, e concorrentem ente pode ser proposta pelos partidos políticos, coligações e pelo próprio candidato, sendo a legiti m idade passiva no candidato beneficiado pelo abuso de p o d er político 410 R am ayana, op. cit. p. 418. 285 e econôm ico e de qualquer outra pessoa que tenha dado causa ao abu so, inclusive o partido político. O objetivo principal da ação de investigação judicial eleitoral é dem onstrar a potencialidade lesiva capaz de desequilibrar as eleições em razão de conduta abusiva de p o d er econôm ico ou político. Seus efeitos são a cassação do registro e a inelegibilidade do can didato se 0 julgam ento for realizado, com o trânsito em julgado, antes das eleições. Contudo, se o julgamento for posterior as eleições, so m ente possibilitará a declaração de inelegibilidade, p odendo utilizar as provas constituídas no processo com o base para fundam entar ação de im pugnação de m andato eletivo ou recurso contra diplomação. 7. BIBLIOGRAFIA Agra, Walber Moura; Cavalcanti, Francisco Queiroz. Comentários à Nova Lei Eleitoral, Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. Cândido, Joel J., D ireito E leitoral Brasileiro, 13^. Ed., Bauru: Edipro, 2008. Costa, Adriano Soares da. Instituições de Direito Eleitoral, 6*. Ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2006. Gomes, José Jairo, Direito Eleitoral, Belo Horizonte: Del Rey, 2008. Ramayana, Marcos, Direito Eleitoral, 8*. Ed., Niterói: Impetus, 2008. Serejo, Lourival, Programa de Direito Eleitoral, Belo Horizonte: Del Rey, 2006. Stoco, Rui; Stoco, Leandro de Oliveira, Legislação Eleitoral Interpre tada, 2®. Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. 286 ELEIÇÕES 2010 “FICHA SUJA” & QUESTÕES CONSTITUCIONAIS T h a l e s T á c i t o P o n t e s L u z d e P á d u a C e rq i ie i ra ^ " O projeto de iniciativa popular (PLP n° 518/2009) que altera a Lei C om plem entar n° 64, de 18 de maio de 1990, para incluir hip ó te ses de inelegibilidade que visam proteger a probidade adm inistrativa e a m oralidade no exercício do m andato, foi aprovado n a C âm ara dos D eputados, no dia 11 de maio, com a redação proposta pelo D eputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), designado pela Comissão de C ons tituição e Justiça e de C idadania (CCJ) para em itir parecer sobre as em endas de Plenário, e será agora apreciado pelo Senado Federal. Para m elhor com preensão da polêm ica em to rn o dessa p ro p o s ta, faz-se necessário u m relato histórico dos fatos. Por força do prim eiro precedente no Tribunal Superior Eleitoral (RO n® 1.069/04) e da C onsulta 1.607/TSE (Procedim ento A d m i nistrativo n° 19.919/08), os M inistros Bros Grau, Ari Pargendler, Caputo Bastos e Marcelo Ribeiro entenderam que a matéria “vida pregressa” somente poderia ser disciplinada p o r lei com plem entar, consoante o art. 14, § 9°, da C onstituição de 1988, não vingando, assim, a robusta tese do M inistro Ayres Britto de que o tem a p o deria ser apreciado sob 0 prism a da “condição de elegibihdade im plícita‘“ ^”. Em que pese o brilhantism o da tese e da diferenciação histórica entre “inelegibilidade” e “condição de elegibilidade”, o TSE não adotou o voto revolucionário do M inistro Ayres Britto. Debalde a Associa ção de M agistrados Brasileiros ingressou com a ADPF n° 144-DF, já que a Suprema Corte, p o r maioria, manteve o entendim ento de que a m atéria “vida pregressa” som ente p o d e ser regulam entada p o r lei com plem entar. 411 P ro m o to r tie Justiça e Eleitoral e m M in as G erais e V ic e-D ire to r d a Escola Jud iciária Eleitoral d o TSE, A utor de diversas ob ra s de D ireito Eleitoral, e n tre elas Tratado d e D ireito Eleitoral, 5 to m o s e c o la b o ra d o r da R ádio Justiça em m a té ria d e D ire ito Eleitoral. 412 Por este a sp ecto, s e g u n d o o M in is tro C a rlo s Ayres Britto, a v id a p re g re ssa , c o m o espé c ie d o g ê n e ro “m o r a lid a d e eleitoral", s e ria d e n o m in a d a “c o n d iç ã o d e e le g ib ilid a d e im p lícita ” (TSE - R O n" i 069/0 4, c o n h e c id o c o m o “C a s o E u ric o M ir a n d a ”), p o r q u a n to n ã o p re v is ta n o ro l ex p lic ito d o art. 14, § 3°, d a C o n s titu iç ã o d e 1988, e s im n o art. 37, p o r in te rp r e ta ç ã o s istem ática. 287 Corolário, a apresentação do projeto de iniciativa popular pelo M ovimento de Combate à C orrupção Eleitoral (MCCE), que se consti tui um a rede com posta de 44 organizações da sociedade civil e que deu início à “C am panha Ficha Limpa” que recolheu milhares de assinaturas^'^ em todo o País, visando a tão sonhada lei que im pede candidatos “fichas sujas” de exercerem a cham ada capacidade eleitoral passiva. A proposta original (PLP n" 518/09) previa a condenação em prim eira instância ou, conform e o crime, a denúncia recebida p o r órgão colegiado com o suficientes para im pedir a candidatura a cargos eleitorais. C om o defendem os à época, a vita anteacta, com o im peditivo de u m a candidatura, p o r decorrer do princípio da m oralidade, deve ter u m “critério objetivo”, jam ais “subjetivo” (sujeito ao “h u m o r” de prom otores e juizes), em face do “garantismo eleitoral” que deve n o r tear as relações jurídicas eleitorais, de que é exem plo-m or o art. 16 da Constituição. O “critério objetivo”, a nosso sentir, deve ser, no mínimo, um a con denação em segundo grau de jurisdição, jamais condenação em primeira instância^'\ pois destas cabem recurso ao STJ e STF (ou TSE, se maté ria eleitoral), sendo que nestes, além de inexistir efeito suspensivo, não se rediscute matéria fática, apenas de direito. Com isso, mais de 90% das condenações em segundo grau são confirmadas nos Tribunais Superiores e, como tal, a segurança juridica é consagrada. Isto é im portante porque o princípio da inocência(artigo 5°, LVII, C F/ 88) somente se aplica ao Direito (Eleitoral ou C om um ) Criminal e 413 B astariam u m m ilh ã o e tre z e ntas m il assinaturas. 414 N a é p o c a d a Lei C o m p le m e n ta r n* 5 (de 29.04.1970 - D ita d u r a ) , existia prev isão q u e torn ava inelegí veis c an d id a to s q u e tivessem d e n ú n c ia rec eb id a p o r c rim e c o n tra a lei d e segu ran ç a nacio nal, co ntra a a d m in is tra ç ã o pú b lic a etc. (A rt. í», I - São inelegíveis, para q u a lquer cargo eletivo: n) os que ten ha m sido condenados ou respondam a processo ju dicial, instaurado p o r d en ú n cia do M inistério Público rece bida pela a u to ridade ju d iciá ria com petente, p o r crim e contra a segurança nacional e a ord em política e social, a econom ia popular, a f é pública e a a d m inistração pública, o p a trim ô n io ou pelo direito previsto no art. 2 2 desta Lei C om plem entar, e nq u a n to não absolvidos ou p e n a lm en te reabilitados) N a é p o c a da d ita d u ra , s u rg ira m in ú m e ro s pro cesso s eiveis e c rim in a is v is a n d o e xclusivam ente to rn a r inelegíveis a lg u n s c and idato s, N e sta ép o ca , o TSE, p o r 4 v o to s a 3, d e cla ro u a in c o n stitu c io n alid ad e d a alínea "n" d e sta Lei C o m p le m e n tar. O STF, c o n tu d o , d e r r u b o u o e n te n d im e n to d o TSE. Todavia, su rgiu a Lei C o m p le m e n ta r n“ 64/90, n o in c iso I, g, tra ta n d o d a vita anteacta d a pessoa, q u e p o d e ria to rná-la inelegível. M as c o m a Revisão C on stitu cio n al, so m e n te p o r lei co m p le m e n ta r é q u e p o d e ria h a v e r u m a re g u la m e n ta çã o d a inelegibilidade d e c o r re n te d e vita anteacta, lei esta q u e p o d e ser a d e iniciativa popular. 288 não ao Cível-Eleitoral(cf. STF, Recurso Extraordinário 86.297 e TSE, RO 1069/04). O u seja: se o candidato for im pugnado num a AIRC por faltar-lhe m oralidade (vida pregressa ou anteacta duvidosa devido à condenação crim inal por im probidade), este continuará inocente até prova em contrário. Mas, na linha do Direito Eleitoral Cível, não p o d e rá ele se candidatar a cargo eletivo pela falta de requisitos que validem sua candidatura (alçada à categoria de inelegibilidade preexistente). Por essa razão, o critério objetivo da m oralidade (na espécie de vita ante acta) deve estar previsto em lei complementar, já que garantidor dos postulados da dignidade de pessoa hum ana e da cidadania. C om a aprovação do Substitutivo apresentado pelo D eputado José Eduardo Cardozo, prevaleceu a m elhor técnica jurídica, consubs tanciada na “condenação p o r órgão colegiado”, para íins de ser decla rada a inelegibilidade. Contudo, a legislação vigente prevê o cabimento de recurso dessa decisão, o que no entender dos defensores da “Ficha Limpa” serve tão som ente para adiar a sentença deíinitiva, dada a d e m ora para a análise de processos no Judiciário. A solução encontrada pelo parlam entar foi então estabelecer prioridade para o julgamento desses processos A REDAÇÃO APROVADA PELO PLENÁRIO DA C  M A RA DOS DEPUTADOS A principal novidade em relação ao texto elaborado pelo grupo de trabalho que analisou o tema é a possibilidade de o candidato apresentar recurso com efeito suspensivo na Justiça onde possui processo pendente, 0 que perm itirá a candidatura na esfera eleitoral, mas, po r outro lado, exigirá seja conferida prioridade ao julgamento do processo pelo cole giado. A negativa ao pedido resultará no cancelamento do registro da candidatura ou do diploma do eleito. Explica o D eputado José Eduardo Cardozo que a finalidade do efeito suspensivo é conciliar o desejo da sociedade de evitar que pessoas sem “íicha limpa” disputem cargos eletivos com o direito ao contraditó rio e à ampla defesa. Assim, é de se concluir que o candidato condenado em segunda instância p o d erá concorrer, p o r força do disposto no art. 16-A da Lei n<^ 9.504/97, com a redação dada pela Lei n° 12.034/09, 289 m as desde que requeira prioridade no julgam ento do recurso in ter posto contra tal decisão. Assim, o candidato processado terá duas o p ções ao recorrer da sentença que o condena em segunda instância; es p erar a dem ora do processo e ficar inelegível enquanto seu recurso for julgado ou p edir o efeito suspensivo para que possa disputar as elei ções; porém , no segundo caso, seu processo será julgado mais rapi dam ente. Só vai pedir o efeito suspensivo quem acreditar que poderá ter êxito no tribunal; quem quiser apenas adiar a própria condenação não vai concorrer. Isto im pedirá que o candidato ardiloso se beneficie da dem ora da Justiça para concorrer no pleito eleitoral de outubro, eis que antes havia a necessidade de trânsito em julgado para a suspensão dos direitos políticos e tam bém para configurar-se a inelegibilidade prevista n o art. 1°, I, e, da LC n° 64/90. A p a rtir de agora, a inelegi bilidade decorrerá da “vida pregressa”, leia-se, condenação p o r órgão colegiado, p o r 8 (oito) anos, não cabendo falar em ofensa ao princípio da inocência, que se aplica som ente na esfera penal e não na cíveleleitoral. O u seja: inelegibilidade não se confunde com crime. O C O N C E ITO “GARANTISTA” DE V IDA PREGRESSA Evidente que “vida pregressa” rem ete-nos ao exame da conduta do cidadão durante o exercício do m andato (“conjunto da obra”) como critério objetivo válido para a condenação em “segunda instância” (leiase, TJ, TJM, TRF ou TRE), quer em face da com petência originária (no caso de agente com foro por prerrogativa de função, em matéria penal) quer da competência recursal (na hipótese de im probidade adm inistra tiva ou m atéria penal de agentes sem foro privilegiado). Isto é a virtude aristotélica do “m eio-term o”, pois dota a sociedade de um instrum ento para im pedir que políticos desviados concorram e ao mesm o tem po lhes perm ite um a espécie de redenção, a saber: ■ N ível 1. C andidato com condenação a p a rtir de segunda ins tância p o r crim e o u im probidade adm inistrativa^'^ Sanções: (i) su s pen sã o dos direitos políticos (art. 15, III, CF) enquanto durarem os 415 Im p r o b id a d e A d m in is tra tiv a d e v e c o m p o r o rol d a m o ra lid a d e , n a esp é c ie d e "vita anteacta", p o r q u e te m reflexo p e n al. Já n o s d e m a is caso s d e açõ e s civis p ú b lic a s, e n te n d e m o s que, p o r s e r m a té n a cível e n ã o c rim in a l o u cível c o m reflexo p e n a l, n ã o p o d e e n s e ja r im p u g n a ç õ e s d e c a n d i d a tu r a s p o r este p rism a . 290 efeitos da condenação; e (ii) inelegibilidade prevista no art. 1^, I, e, da lei de iniciativa popular (oito anos após o cum prim ento da p en a por infrações ali previstas). (Tam bém nestes casos restaria preservado o princípio da inocência [do direito penal]). ■ Nível 2. C andidato que cum priu toda a pena (ou a teve extinta pela prescrição ou outra causa prevista em lei) e tam bém o período de suspensão dos direitos políticos ou inelegibilidade prevista na LC 64/90 p oderá concorrer novamente, um a vez que a Constituição proíbe “pena de caráter perpétuo” Trata-se, na verdade, de um a oportunidade para o candidato analisar se o eleitor o perdoou (ou não) dos desvios com eti dos no pretérito - redenção. REGRAS PARA A INELEGIBILIDADE A redação aprovada pelo Plenário da Câm ara dos D eputados es tabelece com o causas de inelegibilidade a condenação pela prática de crimes dolosos e aqueles de m aior potencial ofensivo, isto é, com pena de dois anos ou mais; im probidade adm inistrativa; abuso de autorida de cuja punição seja a perda do cargo; crimes eleitorais puníveis com cassação do diplom a ou do registro da candidatura; doações ilegais e o afastamento p o r sanção disciplinar, no caso de m agistrados e integran tes do M inistério Público. RETROATIVIDADE DA NOVA LEI Entendem os que a lei não retroagirá sob pen a de violação à coi sa julgada (art. 5°y XXXVI, CF). Por outro lado, não há que se falar em aplicação im ediata da lei aos processos anteriores à sua entrada em vigor p o r configurar-se ofensa ao princípio da segurança jurídica (art. 5®, caput c/c arts. 16 e 60, § 4°, IV, todos da Constituição - c f ADI n “ 3.685-DF, sobre o princípio da segurança jurídica e sua inclusão como cláusula pétrea). Isto porque não é possível “restrição de direitos políti cos” nos processos em curso. Desta forma, o nosso entendim ento é que a nova lei somente terá aplicação aos feitos que se iniciarem a partir de sua publicação no Diário Oíicial da União. O utro ponto controvertido reside em saber se acaso a lei for san cionada pelo Presidente da República “até ju n h o de 2010” valerá nas 291 eleições de outubro vindouro, em face do art. 16 da Constituição Fede ral (princípio eleitoral da “anualidade e um dia”). Segundo o MCCE, se a lei for aprovada até o mês de junho, leia-se antes das convenções partidárias, aplicar-se-á às eleições de 2010, haja vista que a LC n° 64/90, que materializou as regras para o retorno do voto direto no Brasil, culm inando com a eleição de Fernando Collor de Mello, foi declarada constitucional tanto pelo TSE (Consulta n° 11.173/90), quanto pela maioria dos M inistros do STF (ADI n® 354/90), oportunidade em que ficou assentado que o art. 14, § 9^ da Constitui ção não remete ao seu art. 16. Não existindo hierarquia entre norm as constitucionais, o prim eiro dispositivo (art. 14, § 9°) seria tão somente um a exceção ao art. 16 da C arta Republicana. A premissa, data venia, é falsa, pois a LC 64/90 veio apenas m aterializar/regulam entar o artigo 14, §9° da CF/SS**^^, razão pela qual foi aceita a m enos de “um ano e um dia” do pleito. Isto não significa que doravante toda m udança em inelegibilidades poderá ofender a cláusula pétrea do princípio da segurança insculpido no artigo 16 da C F/ 88. O julgamento da ADI 354 foi, sem dúvida, um a espécie de fu n dação para a Casa da Democracia, mas não a pedra angular. Isto porque a maioria dos M inistros da Corte entendeu o processo eleitoral de for m a restrita (o art. 16 da CF proibiria m udança adjetiva/processual, mas não substantiva/material, diferenciando “direito eleitoral” [art. 22 , 1] de “processo eleitoral” [art. 16]), enquanto os demais manifestaram um a com preensão ampla do processo eleitoral, envolvendo alistamento de eleitores (e habilitação dos partidos na escolha de candidatos), registro dos candidatos à propaganda, votação e apuração, proclamação e diplomação dos eleitos, e legislação partidária. Neste sentido, excerto da decisão em que o TSE im pediu m u d an ças na legislação partidária por afronta ao art. 16 da Constituição: (...) N u m a visão teleológica, historicam ente vinculado à preocupação de coibir o casuísm o d a história eleitoral, traduzido em alterações das regras do jogo, de m o d o a 416 “Rejeição pe la m a io ria - v e n cid o s o Relator e o u tro s M in istro s - d a argu iç ã o de in c o n stitu c io n a ü d a d e d o art. 27 d a Lei C o m p le m e n ta r 64/1990 (Lei de Inelegibilidades) e m face d o art. 16 da CF: p revalência d a tese, já vito rio sa n o T rib u n a l S u p e rio r Eleitoral, de que, c u id a n d o -se de d ip lo m a exigido pelo art. 14. ) 9", d a C a rta M agna, p a r a c o m p le m e n ta r o r e g im e c o n stitu c io n a l d e inelegibU idades, à sua vigência im e d ia ta n ã o se p o d e o p o r o art. 16 d a m e sm a C onstituição." (RE 129.392. Rei. M in. Sepúlveda Per tence, ju lg a m e n to e m 17-6-1992, Picnário, D J d e 16-4-1993.) 292 adaptá-las, às vésperas de cada pleito, às conveniências previsíveis da corrente partid ária de sustentação do regim e autoritário. Disso, data venia, sigo convencido. Para n ão frustrar a n o rm a constitucional - essencial à relativa estabilidade d a disciplina jurídica de disputa do poder, que é da essência do regim e dem ocrático (Bobbio) - o conceito de processo eleitoral, para os efeitos de gizar o raio de incidência do art. 16 - p o d e não cobrir toda m atéria de Direito Eleitoral, mas, p or o utro lado, há de ir além dele, n a m edida, pelo m enos, e m que do Direito Eleitoral se exclua o objeto da legislação partidária. {Proc. n" 12.388, Rei. M in. Sepulveda Pertence). Como evolução desse pensam ento, o STF, no julgamento da ADI n° 3.685-DF^^s proposta pela OAB, Armou entendim ento de que o art. 16 da Constituição se configura CLÁUSULA PÉTREA e, portanto, im possível de ser violada p o r em enda constitucional (EC n® 52/06). Im a gine-se, então, p o r um a lei complementar. As principais ADI 's sobre o artigo 16 da CF/88 são: - A D I 4.307-REF-MC, Rei. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 1111-2009, Plenário, D}E de 5-3-2010 - A D I 4.298-MC, voto do Rei. Min. Cezar Peluso, julgamento em 7-10-2009, Plenário, DJE de 27-11-2009 - A D I 3.741, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 6-92006, Plenário, DJ de 23-2-2007 - A D I 3.685, R ei Min. Ellen Gracie, julgamento em 22-3-2006, Ple nário, D f de 10-8'2006 - A D I 3.345 e 3.365, R ei Min. Celso de Mello, julgamento em 25-82005, Plenário, Informativo 398 -A D I 718, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 5-11-1998, Plenário, DJ de 18-12-1998). No mesmo sentido: A D I 733, Rei. Min. Se púlveda Pertence, julgamento em 17-6-1992, Plenário, DJ de 16-6-1995 - A D I 354, Rei. Min. Octavio Gallotti, julgamento em 24-9-90, DJ de 22-6-01 4 17 N esta A D I, e m q u e se d iscu tiu a c o n stitu c io n a lid a d e d a EC i r 52/06, q u e alte ro u a re d a çã o d o art. 17 d a C F /8 8 p a ra p ô r fim à verticalização d a s coligações, o STF c o n sa g ro u o e n te n d im e n to de qu e seq u er e m e n d a c o n stitu cio n al p o d e violar o art. 16 d a C o nstituição , p o r se tra ta r de cláu sula p é tre a - e x pressão d o p rin c íp io d a s e g u ran ç a ju ríd ic a d o art. 5“, cap ut, logo, v ed aç ã o m a te ria l explícita ao p o d e r co n stitu in te d e riv a d o refo rm ad o r, c o n fo rm e art. 60, § 4", IV d a CK P o r força desse e n te n d im e n to , a v erticalização d a s coligações foi m a n tid a nas eleições d e 2Ü06 e s o m e n te d e sa p a re ce rá nas eleições de 201 0 . C o n fe rir ou tra s A D I 's sobre o artig o 16 da CF/88: 293 Im portante destacar que o M inistro Ricardo Lewandowski, na ADI 3345 (Rei. Min. Celso de Melo), muito bem relem brou o conceito de “processo eleitoral”(art. 16 da CF/ 88) definido pelo plenário STF: “N aquele julgam ento, adem ais, o Suprem o Tribunal Federal estabeleceu que só se po de cogitar de com p ro m etim en to do princípio d a anterioridade, q u an d o ocorrer: 1) o ro m pim ento da igualdade de participação dos partidos políticos e dos respectivos candidatos no processo eleitoral; 2) a criação de deform ação que afete a n orm alidade das eleições; 3) a in trod ução de fator de p ertu rbação do pleito; ou 4) a prom o ção de alteração m otivada p o r propósito casuístico”. Entendemos, assim, que a disciplina da “vida pregressa” deve respeitar o art. 16 da Constituição, até porque mudanças no processo eleitoral às portas da eleição, ainda que com bons motivos, ainda que diante de um forte apelo popular(o que afasta “propósito casuístico” da nova lei mas não afasta o “rom pim ento da igualdade de participação de partidos e candidatos no pleito eleitoral”), viola os fundam entos Repu blicanos pela adoção da teoria maquiavélica de que “os fins justificam os meios”. M udar as regras do jogo no meio do campeonato, ainda que haja motivação suficiente, não deixa de ser casuísmo com batido pelo Constituinte de 1988 (“casuísmo do bem”) com a criação do art. 16 da C F / 88. Portanto, é preciso obtemperar a discussão. Não podem os nos perverter pelo intelectualismo de superfície, colocando acima da Carta Republicana o rigorismo aparente ou adotar a m áxim a de que os fins justificam os meios. Não podem os tratar os m em bros do Parlamento com o verdugos, porque a evolução de um a sociedade não se faz às pressas ou p o r cima de valores, mas sim cultivando nos corações hum anos a necessidade de mudança. O tem po golpeará as tradições, o alvião do progresso m o dificará a paisagem e as transformações políticas gradativas e serenas renovarão a vida intelectual do eleitor. Assim, não resta dúvida de que aceitar a luta é necessário, mas 294 sem olvidar que construir o diálogo da harm onia e do equilíbrio é sem pre melhor. Agradar a todos é m archar p o r u m cam inho largo, onde se esconde a m entira das convenções. Do contrário, no que nos diferen ciaríamos daqueles que criticamos com veemência? Com o criticar o “casuísmo do mal” se aceitarmos o “do bem ” ? Por isto a necessidade do respeito ao prim ado da lei e da ordem (art. 16 da CF), guiando-nos por cam inhos objetivos e perenes. Vale aíirmar, p o r derradeiro, de que servirá as longas discussões públicas inçadas de discórdias e aflições ? À evidência, ao final de to das elas, restaria motivos para separatividade e odiosas dissensões, em extremo prejuízo à sociedade, já que um a im portante lei de iniciativa popular poderia se perder em discussões odiosas. 295 296 CAPTAÇÃO ILÍCITA DE ARRECADAÇÃO E GASTOS. ANÁLISE DO ART. 30-A DA LEI ELEITORAL W a lb e r d e M oura Agra"" ORIGEM DO ARTIGO 30-A O art. 30-A foi inserido na legislação eleitoral pela Lei n.“ 11.300/2006. Ele surgiu diante do clamor da sociedade p o r in stru m en tos jurídicos que pudessem atacar o problem a de “caixa dois de cam pa nha”. T inha a seguinte redação: “Q ualquer partido político ou coligação poderá representar à justiça eleitoral, relatando fatos e indicando p ro vas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as norm as desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos.” Posteriormente, a Lei 12.034/2009 alterou o art. 30-A, lim itan do a extensão de sua im petração para até quinze dias da diplomação: “Q ualquer partido político ou coligação poderá representar à justiça eleitoral, no prazo de quinze dias da diplomação, relatando fatos e in dicando provas, e p edir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as norm as desta Lei, relativas à arrecada ção e gastos de recursos.” O que a alteração de 2006 almejou criar foi um a representação sem prazo determ inado para seu ajuizamento, im pedindo a diplom a ção ou ensejando a cassação.'*'^ Seu intento principal constituiu-se em ser um instrum ento de punição para quando a evidenciação de afronta 418 M estre pela U FPE , D o u to r pela U F P E /U n iv e rsitá degli Studi d l Firenze; P ó s -D o u to r pela U niversité M o n te s q u ie u B ordeaux IV; V isiting R esearch Scholar o f C a r d o z o Law School- Professor V isitante da U niversita degli Studi d i Lecce; P ro fessor V isitante d a U niversité M o n te s q u ie u B ord e au x IV; D ire to r d o IBEC - In stitu to B rasileiro d e E stu d o s C on stitu cion ais; M e m b r o C o rre s p o n d e n te d o C E R D R A D I - C e n tre d 'E tud es et d e Rech erch es s u r les D ro its A fricains et su r le D é v elo p p e m e n t In s titu tio n n el des Pays e n D é v elop pe m e nt. Professor d a U n iv e rsid ad e C ató lica d e P e rn a m b u c o . P r o c u r a d o r d o Estado d a P e rn a m b u c o . A dvogado. C o n se lh e iro Seccional d a O A B/PE. P resid ente d a C o m is sã o d e D ireito E leitoral d a OA B/PE. 419 A re p re sen ta ç ã o é cabível p a ra p re serv aç ã o da c o m p e tê n c ia e g a ra n tia da a u to rid a d e das decisões elei torais. JA R D IM , Torq u arto . D ireito Eleitoral Positivo. 2 ed., Brasília: Brasília Jurídica, 1998. P I 88. 297 as regras vigentes de arrecadação e gastos ocorresse tem po depois da eleição, quando os prazos para as ações e recursos eleitorais já tivessem sido exauridos. A modificação im plem entada pela Lei 12.034 impediu que essa representação fosse intentada a qualquer mom ento, im pondo um lapso tem poral intransponível de quinze dias. Parte da doutrina já vinha reclamando a instituição de um ter m o determ inado para a im petração dessa ação específica. Agora, com a nova redação desse dispositivo, estabeleceu-se prazo decadencial de quinze dias, contados da diplomação - o mesm o prazo decadencial para a ação de im pugnação de m andato eletivo (AIME). Nesse sentido, com a inclusão no dispositivo de prazo para propositura da Represen tação, todas as discussões a respeito do tem a restaram sepultadas. Tal modificação vai exigir dos participantes do pleito eleitoral uma m aior acuidade na fiscalização das eleições, dem andando que a constata ção de acintes a lisura da arrecadação e gastos seja evidenciada em tempo hábil, caso contrário, opera-se o prazo decadencial Pode-se objetar que as evidências de utilização de “caixa dois”, por exemplo, auferidas em um lapso mais longo, deixará os infratores sem nenhum a punição na seara eleitoral. Isto é um a verdade. Todavia, a segurança jurídica é um dos p i lares do Direito, e o resultado da eleição não pode ser enodoado por sus peitas ad infinitum da ocorrência de condutas ilícitas de financiamento."'^® Alguns doutrinadores vociferam contra a inclusão do citado ar tigo e tam bém contra sua modificação. Joel Cândido afirma que a sua criação fora inútil, haja vista ainda ser aplicável o art. 22 da Lei da Inelegibilidades.^^* Já Alexandre Luis M endonça Rollo critica sua m odifi cação, asseverando que houve a m era repetição de instrum ento idên tico, dispondo o ordenam ento jurídico de instrum ento para coibir tais práticas.'’^^ Pode-se, de form a hipotética, argum entar que o prazo para a implementação dessa representação poderia ser mais elástico, contudo, não é de bom alvitre deixar um fato jurídico passível de im pugnação por tem po indeterm inado, m orm ente quando ele é consectário de uma expressão da soberania popular. 420 A G RA , W alb er d e M o u ra & CA VA LCA N TI. Franci.'>co Q u e iro z . C om entários à N ova Lei Eleitoral. Rio d e Janeiro; Forense, 2010. P. 48. 421 C  N D ID O . José )oel. D írrífo £/fiío ra/fim si/eíro . 13 ed., B auru: Bdipro, 2008. R468. 422 lo ã ü F e r n a n d o C arv alh o . R O LLO . A lb e rto (O rg .). “D e sv io s n a A rre c a d a ç ã o e n o s G a sto s d e R e c u r sos nas C a m p a n h a s E leitorais - a R ep res e n ta ç ã o d o art. 3 0-A . São Paulo; A tlas, 2010. R 120. 298 QUESTÕES PROCESSUAIS Sua taxionomia é de um a ação de conhecimento, cujo nome ju rí dico é representação ou reclamação. Ela não pode ser classificada como uma prestação jurisdicional de natureza penal, haja vista não produzir os efeitos apanágios dessa seara. Configura-se com o uma ação de natu reza cível, modulando-se pelos procedimentos inerentes a Lei 64/90 e ao Código de Processo Civil. O stenta partido político, legalm ente constituído, ou coligação, a prerrogativa de apresentar à Justiça Eleitoral, no prazo perem ptório de quinze dias da diplomação, com a especificação dos fatos e a in d i cação das provas, a abertura de investigação judicial para apurar con dutas em desacordo com as norm as relativas à arrecadação e gastos de recursos eleitorais (art. 30-A, caput, da Lei 9.504/97). C om o falou-se anteriorm ente, a legitimidade ativa para se en trar com a Representação pertence ao partido político ou a coligação. Excluiu-se dessa prerrogativa os candidatos e os cidadãos, não se p o dendo dar interpretação extensiva para incluí-los. Restringiu-se essa le gitimação porque, teoricamente, os partidos e as coligações dispõem de maiores condições de analisar as prestações de contas dos candidatos de form a abrangente, identificando possíveis infrações. O M inistério Público, mesm o sem indicação legal, possui ta m bém legitimidade, em razão de que se encontra em seu m ister velar pela ordem jurídica e pelo regime dem ocrático, sendo essas atribuições com inações constitucionais que não podem ser mitigadas p o r m an d a mentos infraconstitucionais. A sua esfera de incidência abrange a arrecadação e gastos prove nientes da cam panha eleitoral, descartando todas as demais matérias fáticas. M esmo assim, seu alcance se configura bastante amplo, atin gindo toda a arrecadação, em suas múltiplas formas, e todos os gastos, nas mais variadas modalidades. Entrelaça-se, umbilicalmente, com o o financiamento das cam panhas eleitorais, tem a que sucinta amplos de bates em todo o mundo. Sua finalidade é im pedir a utilização de meios que possam desnivelar os candidatos em disputa, privilegiando uns em detrim ento de outros, ou seja, o caixa dois. A arrecadação e gasto de cam panha se re velam no ponto fulcral do Direito Eleitoral, sendo essa Representação 299 mais um a possibilidade de velar pela lisura dos pleitos. Todavia, se o intento se configura em acabar realmente com o caixa dois, de m elhor alvitre é estabelecer o financiamento público com o única form a de fi nanciam ento eleitoral, expungindo definitivamente fontes escusas de financiamento. A conduta praticada em desacordo com a Lei Eleitoral deve ser dolosa, com a firme e deliberada vontade de infringir os parâm etros legais estabelecidos. As condutas culposas não tipificam o acinte n arra do, pois foge do tipo delineado norm ativam ente. Se de form a clara, não houve intenção de realizar a conduta, em razão de escusa substancial, não se pode aplicar a reprim enda prevista por ausência de tipificação. Zaffaroni e Perangeli lecionam que dolo é um a vontade individu alizada em tipo, que obriga o reconhecim ento de sua estrutura em dois aspectos: o reconhecim ento pressuposto ao querer e o próprio querer.""^^ Dessa forma, o dolo é a vontade consciente e direcionado a reali zar a conduta prevista no tipo, de form a livre e consciente. Se as provas acarreadas aos autos não certificarem que esse dolo realmente existiu, traduzido na vontade consciente de burlar as com inaçôes inerentes a arrecadação e gastos de cam panha, não se pode tipificar a com inaçào do art. 30-A do Código Eleitoral. A captação ilícita de arrecadação e gastos eleitorais é um crime próprio, pois apenas pode ser realizado pelo candidato ou por pessoa por ele designada, o adm inistrador financeiro (art. 20 da Lei n. 9.504/97). Ambos são solidariamente responsáveis pela veracidade das informações financeiras e contábeis da cam panha (art. 21 da Lei n. 9.504/97). N enhu m a outra pessoa pode realizar a conduta tipificada porque carece de pre visão legal. Se outra pessoa se responsabilizar por tais atos, não pode ser ela im putada em razão da ausência de previsão legal. Todavia, mesm o a conduta podendo ser realizada pelo candida to ou pelo adm inistrador por ele determ inado, a sanção apenas inci de contra aquele que disputa o pleito eleitoral. Assim, a sanção do art. 30-A apenas com ina o candidato, podendo o adm inistrador financeiro ser tipificado em outras condutas do Código Eleitoral ou do Código Penal. 423 Zaffaroni e Pierangeü. M a n u a l de Direito P enal Brasileiro. Parte G eral São Paulo: P. 481. 300 dos Tribunais, Podem ser im petradas as Representações do art. 30-A contra can didatos, desde que sejam intentadas antes da diplomação, contra candi datos eleitos ou suplentes. Teoricamente o prazo é até quinze dias após a diplomação, contudo, não há nen h u m im pedim ento que ela ocorra antes da eleição. A possibilidade de ela ser oferecida contra suplentes baseia-se no fato de que eles podem entrar com a referida ação contra o can didato eleito, assum indo o posto, caso sua dem anda obtenha sucesso, mesm o tendo com etido infrações mais graves a regulamentação de fi nanciam ento de cam panhas eleitorais. Se não se pudesse entrar contra suplentes, eles poderiam utilizar de caixa dois e, posteriorm ente, tentar im pugnar o m andato dos candidatos eleitos. A com petência para o exame dessas representações é determ ina do consonante a esfera de abrangência dos órgãos eleitorais. Será c o m petente o juiz eleitoral para as infrações nos pleitos municipais; os Tri bunais Regionais Eleitorais nas eleições estaduais; e o Tribunal Superior Eleitoral, nas eleições nacionais. C om provando-se a captação ou gastos ilícitos de recursos para fins eleitorais, atestando-se sua gravidade a norm alidade do pleito eleitoral, com inou-se a sanção de negação do pedido de diplom a ou sua cassação, se já houver sido outorgado (art. 30-A, § 2®, da LE). Dantes não havia a possibilidade de im posição de pena de inelegibilidade porque tanto a criação quanto a alteração do art. 30-A tin h am sido realizados p o r leis ordinárias e a aplicação desta rep ri m enda apenas pode ser im putada p o r lei complementar.^'^ C om a prom ulgação da “Lei Ficha Limpa”, Lei C om plem entar n “ 135/2010, os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou profe rida p o r órgão colegiado da Justiça Eleitoral, p o r corrupção eleitoral, po r captação ilícita de sufrágio, p o r doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de cam panha ou p o r conduta vedada aos agentes públicos em cam panhas eleitorais que im pliquem cassação do registro ou do diploma, serão inelegíveis pelos próxim os oito anos a contar da elei ção. Assim, com a prom ulgação da “Lei Ficha Limpa” a sanção se configura na perda do registro ou a cassação do diplom a, bem como 424 T O Z Z I, Leonel. Direito Eleitoral. Aspectos Práticos. 2 ed., P o rto Alegre; V erb o Jurídico, 2006. P. 15. 301 a condenação de inelegibilidade pelo prazo de oito anos a contar da eleição em que houve constatação de captação ilícita de arrecadação e gasto de cam panha. Até a im plem entação da lei n° 12.034/2009, o prazo para a interposição dos recursos nas ações ajuizadas com base no art. 30-A da Lei 9.504/97 era de vinte e quatro horas, nos term os do art. 96, § 8°, des ta m esm a Lei/^^ Seguia o rito sólito das Representações, sem nenhum prazo diferenciado. Agora, o interstício é aum entado para três dias. C om essa determ inação legal, paciíicou-se o entendim ento de que 0 processo de prestação de contas tem índole jurídica, sem que se possa im putar que ela se caracteriza com o u m processo de natureza administrativa. Com o a modificação norm ativa expressa que o prazo recursal é de três dias, a contar da publicação no Diário Oficial, conclui-se que essa decisão é um ato jurídico, pois apenas de um a decisão judicial pode-se im petrar recurso. C om fundam ento no art. 30-A não é possível a propositura de recurso contra expedição de diplom a porque as hipóteses de cabimento não incluem arrecadação e gastos eleitorais, sendo a possibilidade de im petração numerus clausus, o que im pede o elatério de suas hipóteses p o r via doutrinária ou adm inistrativa.“^^ C ontudo, p o r meio de altera ção legislativa, o recurso contra expedição de diplom a pode ser im pe trado no caso de captação ilícita de sufrágio. A representação do art. 30-A não pode ser confundida com a ação de investigação judicial eleitoral. Ambas apenas apresentam com similaridade o rito descrito na Lei C om plem entar n. 64/90. Q uanto as diferenças elas são muitas, como, p o r exemplo, a legitimidade ativa, as hipóteses de incidência, a sanção, a tipificação etc. 425 A gR -A l - A gravo R eg im en tal e m A gravo d e In s tru m e n to n “ 11957 - são )o ão batista/SC ; R elalor(a) M in . A L D IR G U IM A R à E S PA SS A R IN H O J U N I O R ; A c ó rd ã o de 27/04/2010. 426 B A RR ETTO , Lauro. D as Representações no Direito Processual Eleitoral. São Paulo: E dipro, 2006. P. 119. 427 A rt. 262. O re c u rs o c o n tra e x pediçã o d e d ip lo m a c a b e rá s o m e n te n o s segu in tes casos: I - inelegi bilid ade o u in c o m p a tib ilid a d e d e c a n d id ato ; II - e rrô n e a in te rp re ta ç ã o d a lei q u a n to à aplicação d o s istem a d e re p re sen ta ç ã o p ro p o rcio n a l; III - e rro d e d ire ito o u d e fato n a a p u ra ç ã o final, q u a n to ã d e te rm in a ç ã o d o q uo c ie n te eleitoral o u p a rtid á rio , c o n ta g e m d e vo to s e classificação d e can d id ato , ou a sua co n te m p la çã o so b d e te rm in a d a legenda; IV - c on ce ssã o o u de n eg a ç ã o do d ip lo m a em m an ifesta c o n tra d iç ã o c o m a p ro v a dos autos, nas h ip óteses d o art. 222 d e sta Lei, e d o art. 41-A d a Lei n^ 9.504, d e 30 d e se te m b ro de 1997. (Redação dada pela Lei n 9,840, de 28.9.1999) 302 PR O PO RC IO N A LID A D E E AS SANÇÕES PREVISTAS N O ART. ART. 30-A Q ualquer acinte as disposições contidas na Lei 9.504/1997 é su ficiente para aplicação da reprim enda prevista no art. 30-A? A rejeição de contas, p o r si só, representa motivo para evidenciar conduta que m a cule os dispositivos norm ativos sobre arrecadação e gastos eleitorais? Parte-se do pressuposto que não é qualquer mácula as norm atizações que regulam entam a arrecadação e gastos eleitorais ou a mera rejeição de contas que cerceiam a representação auferida pelo voto p o pular. Constitui-se em presunção jwn '5 tantum, que necessita ser depre endida dentro do contexto ao qual estar inserida. Resta clarividente que na hipótese de descum prim ento das regras acerca da arrecadação e gastos eleitorais, outras infrações podem ser configuradas, com o captação ilícita de sufrágio, abuso de poder eco nôm ico e político, rejeição das contas, perda do fundo partidário, etc. Contudo, a sanção prevista no artigo ora analisado apenas perm ite que a imposição do im pedim ento ao recebimento do diplom a ou sua cassa ção, bem com o a declaração de inelegibilidade. Portanto, dentro de um a análise sistêmica, qualquer um a das sanções m encionadas somente pode ser aplicada se houver antes um prévio juízo de proporcionalidade, analisando-se se a m ácula praticada enseja, de foram racional, a imposição de um a dessas duas medidas extremadas. O princípio da proporcionalidade, na terminologia alemã, ou p rin cípio da razoabilidade, na terminologia anglo-americana, exerce uma im portante função no sentido de limitar os direitos fundamentais. Ele é um instrum ento imprescindível para a aplicação dos direitos fundam en tais diante de casos concretos. Originariamente utilizado no Direito Ad ministrativo, foi trasladado para o Direito Constitucional e obteve gran de desenvolvimento principalmente na Alemanha, pela jurisprudência do Tribunal Constitucional alemão. De uma forma bastante sintética po demos defini-lo como um princípio que tem o objetivo de evitar o excesso. 428 N este m e sm o sen tid o é o p o s ic io n a m e n to dc lo à o 1-crnando Ciarvalho. R O I.l.ü , A lb e rto (O rg .), "lUeições n o D ire ito B rasileiro ”. In: A n á lise c ju lg a m e n to d a s P resta çõ e s d e C o n ta s. Sãu Paulo: Atlas, 2010. F. 114. 303 impedindo a desproporção entre os meios e os fins a serem alcançados/^^ Para tanto, parte-se de três elementos básicos: o objetivo almejado deve ser condizente com a ordem constitucional e moralmente defensável; os meios escolhidos devem ser adequados para a execução do objeto, pro porcionando um a simetria entre ele e os meios para sua consecução; e a situação fática deve favorecer o objetivo previsto, ou seja, a realidade e as circunstâncias que cercam o objeto devem justificar a sua escolha e os meios de sua execução.'*^*^ Não se pode perder o axioma que o principal ator do processo eleitoral é o povo, e que a intervenção das decisões do Poder Judiciário têm o fator teleológico claro e transparente de assegurar lisura aos plei tos, im pedindo afrontas a isonomia que deve perm ear a relação entre os candidatos. A soberania popular se configura com o o néctar de le gitimidade do regime democrático, obrigando que as decisões judiciais se atenham a esse esquadro normativo. Torná-la ancilla de decisões judiciais, muitas vezes praeter e contra legem, significa relegar o m ar co norm ativo vigente, tornado as decisões populares subordinadas as decisões judiciais. O im pedim ento de recebimento do diplom a ou sua cassação ape nas pode ser aplicado se o acinte realizado, às regras de arrecadação e gastos eleitorais, for suficiente para m acular o processo eleitoral, im pe dindo o livre pronunciam ento da vontade popular. Infrações de m enor monta, que não provocaram alterações no processo eleitoral não pode ensejar a reprim enda analisada, sob pena, do Poder Judiciário se tornar o oráculo da vontade popular. Para o deferimento da Representação do art. 30-A não há ne cessidade de ser comprovada a potencialidade l e s i v a , o u seja, pouco im porta se o resultado da captação ilícita ou gasto influiu ou não no resultado da eleição.^^^ Contudo, a lesão a captação ilícita de arrecada ção e gastos não pode ser u m a infração de bagatela, um a quantidade 429 G U E R R A FILH O , W illis Santiago. “P rincípio d a p ro p o rc io n a lid a d e e te o ria d o direito”. In: Direito constitucional - Estudos e m hom ena gem a Paulo Bonavides. São Paulo: M alheiros, 2001. P. 111. 430 A G RA , W alb er d e M o u ra . C u rs o d e D ireito C o n stitu cio n al. 6 ed., Rio d e Janeiro; E d ito ra Forense, 2010. P. 210. 431 O ex am e d a p o te n c ialid ad e n ã o se v in c u la ao re su lta d o q u a n tita tiv o das eleições. R C E D n" 69 8 /T O , de m in h a relatoria, Dfe d e 12.8.2009. 432 D E L G A D O , José A ugusto. A Ç À O D E IN V E S T IG A Ç Ã O JU D IC IA L EL EITO R A L RELATIVA A AR R E C A D A Ç Ã O D E C A M P A N H A . ART. 30 DA LEI 9.504/97. A rtig o a ser p ub lic a d o e m livro coletivo d a OAB. 304 insuficiente de dinheiro não pode ensejar a reprim enda devida. H á n e cessidade de se provar que houve um acinte profundo as regras basila res do financiamento eleitoral, m ontando-se um a estrutura paralela de caixa dois. Diante da necessidade da utilização do princípio da proporciona lidade, utilizando-a em topois específicos, a rejeição de contas de candi dato ou comitê financeiro não é requisito inexorável para a aplicação da sanção descrita no art. 30-A. Rejeitadas as contas, urge perscrutar quais os motivos que leva ram a tal decisão, sem que, de form a imediata tenha que aplicar a san ção prevista no art. 30-A. A pena im plem entada tem que se ater ao conteúdo do princípio da proporcionalidade, ponderando se as infra ções cometidas são suficientes para o cerceamento do recebimento do diplom a ou sua cassação. Nesse diapasão é que foram acrescentados, pela Lei n. 12.034/2009, nos §§ 2° e 2®-A do art. 30 da Lei n. 9.504/97 o seguinte conteúdo, que, sob o prism a do dogm atism o positivista, agasalha o que fora dito antes. Os dois m encionados parágrafos afirm am que erros formais e m ate riais corrigidos não autorizam a rejeição e a com inação de sanção a candidato ou partido; e que erros formais ou materiais irrelevantes no conjunto da prestação de contas, que não com prom etam seu resultado, não acarretarão a rejeição de contas. Inexiste im pedim ento normativo para que u m a prestação de con tas seja rejeitada pela inobservância de determ inados aspectos formais descritos em lei. No entanto, tais acintes, de m aneira tópica, sem a densificação de outras circunstâncias, não serve de suporte lógico para a aplicação das sanções descritas no art. 30-A. Estes fatos serão apenas idôneos para provocar a punição consectária se elas forem suficientes para desequilibrar o processo eleitoral, norm alm ente ensejando o abu so do p o d er econôm ico ou político. Por hipótese alguma, a perda do registro ou a cassação do diplo m a pode ocorrer pelo desrespeito de aspectos m eram ente formais ou fato de somenos im portância. Uma coisa é o recebimento de recursos de órgão ou instituição im pedida de doar, outra é o recebimento de um a pequena quantia sem que se tenha providenciado o recibo eleito ral correspondente. 305 Em sentido contrário, se as contas forem aprovadas há prova et de juris de im pedim ento a confecção da Representação do Art. 30-A? De form a inexorável não. A aprovação de contas não serve de pressu posto negativo, p o r impossibilidade jurídica do pedido, para a realiza ção da ação. A sua conseqüência é que o autor da Representação deve apresentar provas contundentes que não foram devidamente analisadas na análise da prestação de contas, ou seja, o escorço probatório deve ser obrigatoriam ente bastante plausível p ara forcejar o prosseguimento do pedido. Inexiste óbice para que a Representação do art. 30-A possa ser aplicada durante o pleito, sem que as contas de cam panha tenham sido julgadas. Não há problem a algum, contudo, o autor da Representação terá o ônus de m elhor fundam entar seu pedido, sob pena de indefe rim ento da inicial, por ausência de material probatório m ínim o (art. 282, VI, do Código de Processo Civil). A vantagem de se im petrá-la depois da prestação de contas é que o seu autor terá a disposição todo 0 trabalho técnico realizado pela Justiça Eleitoral, podendo, a partir das informações recebidas, m elhor fundam entar a im pugnação intentada. Se essa análise for considerada imprescindível, o prazo fatal para o seu julgamento é de até oito dias antes da diplomação (art. Art. 30, § V da Lei 9507/97). PR O C ED IM EN TO D O ART. 22 DA LEI COM PLEM ENTAR 64/90 A Representação de captação ilícita de arrecadação e gastos elei torais segue o rito do art. 22, da Lei C om plem entar 64/90, naquilo que couber, ou seja, adequando-se as suas íinalidades específicas. Nesse sen tido, a principal diferença era que antes da promulgação da Lei Ficha Limpa não havia a imposição da sanção de inelegibilidade. Atualmente, h á inelegibilidade de oito anos. Permite-se a formação de litisconsórcio passivo facultativo q u an do houver candidatos ou cidadãos que se encontrem nas mesm as h i póteses de cabimento dessa ação, em virtude de condutas conexas, ensejando economia processual e celeridade no desenrolar da lide. Necessita-se da formação de litisconsórcio ativo necessário em toda a Representação em razão do art. 30-A para que o partido político ao 306 qual pertença o candidato possa se defender, tendo em vista o gravame que o ameaça. A Representação contra captação ilícita de arrecadação e gastos de cam panha obriga a formação de litisconsórcio necessário passivo entre o representante e o partido político do qual faça parte, em razão dos gravames perpetrados a ambos. M esmo supondo que não houve prejuízo na representação do sistema proporcional, inconteste resta a perda de m andato de seu correligionário, o que prejudica os interesses partidários. Quando ela se direcionar contra conduta do Chefe do Executivo, consonante orientação do Tribunal Superior Eleitoral, tom a-se obriga tório que seu vice seja cham ado a participar e a se defender de todos os atos processuais, não se tratando mais de uma relação subordinada entre o mandatário do Executivo e seu respectivo vice/^^ Dessa forma, houve modificação da jurisprudência que anteriormente estava conso lidada no TSE que não exigia a citação do vice para participar no pro cesso como litisconsórcio. N a Representação contra Chefes do Executivo, há necessidade de citação de seu vice respectivo, sob pena de se m acular o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa de forma irremediável. M esmo que a formação da chapa seja indivisível, no exercício de suas atribuições funcionais, o vice tem am pla autonomia para o desem pe nho de suas atividades, podendo responder ou não em conjunto com o Chefe do Executivo, dependendo da conduta que lhe é imputada. Nesse caso, a exigência de litisconsórcio passivo não decorre de lei, mas de natureza jurídica de direito material. Q uem ocupa as mesmas atribuições de relator é o Corregedor Eleitoral, velando para que o processo tenha o rito adequado para seu deslinde. Em âmbito municipal, o Juiz Eleitoral competente exerce todas as funções atribuídas ao Corregedor, cabendo ao representante do M i nistério Público Eleitoral as atribuições deferidas ao Procurador-Geral e ao Procurador Regional Eleitoral (art. 24 da LI). Na esfera estadual, tal função é exercida pelo Corregedor Regional e, em âmbito federal, pelo Corregedor-Geral. O Corregedor Eleitoral ou o Juiz de Direito, ao despachar a ini cial, notificará o representando do conteúdo da petição, entregando-lhe 307 segunda via, para que ofereça defesa no prazo devido, com a juntada de docum entos e rol de testemunhas. A petição inicial será indeferida quando não houver tipificação de conduta ilícita ou quando lhe faltar algum requisito considerado essencial pelos arts. 282 e seguintes do Código de Processo Civil. Exige-se que ela seja subscrita p o r advogado devidamente habilitado. A oportunidade para requerim ento de produção probatória para o im petrante se concentra na petição inicial; não sendo ela requeri da nesse m om ento processual, não pode, posteriorm ente, ser deferi da. Correlatamente, a oportunidade para o réu requerer sua produção probatória se concentra na contestação à petição inicial, não podendo ser deferido posteriorm ente. Nos dois casos, o instituto da preclusão im pede a apresentação de provas em outra oportunidade. Se para a comprovação dos fatos alegados na inicial houver ne cessidade de docum entos em poder de terceiros, há necessidade que na petição inicial seja indicada quais são esses docum entos, seu nexo de causalidade com os fatos narrados e com quem eles se encontram, pedindo sua apreensão para que sejam anexados aos autos. Permite-se a concessão de lim inar para a suspensão do ato que deu motivo à representação quando for relevante o fundam ento, e do ato im pugnado puder resultar a ineficiência da medida, caso seja julga do procedente. Convém ao magistrado eleitoral verificar atentamente os dados circundantes do processo, para apenas conceder a liminar se se convencer da verossimilhança das alegações, constatar o relevante fu n dam ento alegado e atestar a possibilidade de dano irreparável. Exemplo claro é o Juiz Eleitoral conceder lim inar para sustar distribuição de m a terial de construção por parte de candidato em época eleitoral. Esse pedido de lim inar não se destina a antecipar o mérito, ele apresenta natureza acauteladora, n a m edida em que se destina a im pe d ir a consecução de determ inadas práticas que m aculem a liberdade de escolha do cidadão. De form a alguma se antecipam os efeitos da sen tença, com o o cancelamento do registro de candidatura e a decretação da inelegibilidade. Indeferindo o corregedor a inicial ou retardando-lhe solução, o interessado pode renová-la perante o Tribunal, que decide no prazo de vinte e quatro horas. Persistindo ainda a situação de irregularidade, pode-se levar a dem anda ao conhecim ento do Tribunal Superior Elei 308 toral para que as medidas necessárias sejam tomadas. Atente-se que inexiste recurso se a petição inicial for indeferida, p odendo o requeren te im petrá-la novam ente perante a instância superior/^^ O prazo para apresentação da contestação é de cinco dias. Toda a matéria pertinente à defesa deve ser apresentada nesse momento pro cessual, inclusive o rol de testemunhas, sob pena de preclusão, não podendo ser posteriormente requerida/^^ A inquirição de testemunhas arroladas pelo representante e pelo representado é realizada no prazo de cinco dias, até um m áximo de seis testemunhas, que comparecerão independentemente de intimação. Primeiro, serão ouvidas as testemunhas de acusação, e posteriormente as de defesa. Após a oitiva das testemunhas, no prazo de três dias, o corregedor pode proceder a todas as diligências que determinar, ex officio ou a reque rim ento das partes. Dentro dessas diligências, inclui-se a possibilidade de ouvir terceiros referidos pelas partes ou testemunhas que conheçam os fatos e as circunstâncias que possam influir na decisão do feito. A lei lhe possibilita, ainda, a requisição de docum entos em poder de terceiros. Realizando-se as diligências, as partes e o M inistério Público podem apresentar as alegações finais no prazo com um de dois dias. Term inada essa etapa, os autos seguem conclusos para o corregedor apresentar seu relatório sobre os dados apurados. O relatório deve ser assentado no prazo de três dias e os autos encam inhados ao Tribunal competente, no dia imediato, com pedido de inclusão incontinenti do feito em pauta. Chegando ao Tribunal, o Procurador-G eral ou Regional Eleitoral terá vista dos autos por quarenta e oito horas para se p ro n u n ciar sobre as imputações e conclusões do relatório. Se a ação de investigação judicial eleitoral for julgada proceden te, o órgão com petente da Justiça Eleitoral declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, aplicando-lhes as sanções: a) decretação da inelegibilidade, p o r oito anos, do requerido e d quem tenha contribuído para a prática do ato contado da eleição; 433 A G RA , W alber de M o u ra & VHLLOSO, C arlos M ario d a Silva. Elem entos de D ireito Eleitoral. São Paulo: Saraiva, 2009. R 268. 434 C  N D ID O , José J. Inelegihilidades no D ireito Brasileiro. São Paulo: E dipro, 2003. P. 262. 309 b) cassação do registro do candidato diretam ente beneficiado pela captação ilícita de arrecadação e gastos eleitorais; c) cassação do diplom a do beneficiado de form a direta pelo ato, se a decisão ocorrer posteriorm ente à eleição, ou im pedim ento à sua concessão, se a decisão for proferida depois da eleição, mas antes de sua expedição. A inelegibilidade especificada é a cominada, advinda de um a san ção estipulada pela legislação eleitoral. Ela declara a inelegibilidade pre sente e protrai seu efeito no elastério de oito anos contados da eleição. Esse efeito consta de todas as decisões judiciais nesse tipo de ação, seja antes da diplomação, seja após esse pronunciam ento judicial. A decre tação da inelegibilidade é conseqüência direta da sentença do art. 30-A, ocorre de forma imediata, sem a necessidade de nenhum outro processo judicial. Esse efeito foi um dos fins almejados pela referida ação, e se não pudesse ser um a decorrência de seus efeitos, ela perderia o sentido. CONCLUSÃO A Representação descrita no art. 30-A, indubitavelmente, terá u m a grande repercussão no pleito de 2010, podendo se constituir em um instrum ento jurídico de grande valia para a moralização dos gas tos eleitorais. Somente deve ser ressaltado que a soberania popular não pode ser m aculada por um processo de judicialização, desm esurado e teratológico, que possa até m esm o cercear a vontade livre e altaneira do povo. 310 IN FEDELIDA D E PARTIDÁRIA: Ativismo judicial. Efeitos e conseqüências para os suplentes. W a l t e r d e A g r a Júiiior*"'’'’ SUMÁRIO: 1. Considerações iniciais - 2. Histórico e norm atização da fidelidade partidária - 3 . 0 ativismo judicial e a fixação de procedim ento específico - 4. Legitimidade ativa e passiva dos suplentes - 5. Conclusão. PALAVRAS-CHAVE: fidelidade legitimidade de suplentes; prazo. partidária; perda de mandato; 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. “Todo poder em ana do povo, que o exerce p o r meio de represen tantes eleitos ou diretamente, nos term os desta Constituição.” Esta é a premissa básica e a base da dem ocracia brasileira inserida no parágrafo único do prim eiro artigo da Constituição Federal. Neste postulado está sedim entado o princípio da soberania popular brasileira, de onde se constata que o povo é fonte e titular do poder. C om a constituição das sociedades m odernas ficou cada vez mais difícil o povo exercer diretam ente o poder dele emanado. Por isso o exercício do poder do povo passou a ser feito, em regra, por meio de representantes p o r eles escolhidos dentro de um regime democrático. Entrementes, dem ocracia não é um conceito absoluto ou tam pouco um a form a de exercício de poder pré-definida com caracterís ticas imutáveis, que tenham que ser preenchidas para que um governo venha a ser tido com o democrático. Os conceitos e requisitos ensejadores à definição de dem ocracia são mutáveis com o tempo, devendo adaptar-se a sociedade, mas sempre tom ando como base a necessidade de efetivação da soberania popular. Sob esse aspecto, a dem ocracia não é um m ero conceito político 435 M esire pein U N IC A P - PE; Professor da U niversidade Federal d a Paraiha - UFPB; Presidente da C o m is são N acional de E x a m e de O rdem ; Especialista em Direito Eleitoral; E x -P rom otor de lustiça no Estado de Pernam buco; Ex-P rocurador Geral de João Pessoa; A dvo gado Militante. 311 abstrato e estático, mas um processo de afirmação do povo e garantia dos direitos fundam entais que o povo vai conquistando no decorrer de sua história**^^. Em nosso país vigora o regime de dem ocracia participativa que, segundo o conceituado constitucionalista português J. J. Gomes Canotilho^^^ é a form a mais alargada de concurso dos cidadãos para a tom a da das decisões muitas vezes de form a direta e não convencional. Por outro lado, em nosso regime democrático, a relação política não é bilateral, ou seja, existente apenas entre o eleitor (povo) e o eleito (representante). Essa relação é tripartite, pois se insere neste contexto um a relação entre o partido político e o eleitor, e outra entre os preten sos representantes e o partido político. Deste viés multi-relacional é que surge a vinculação conceituai e concepcional de fidelidade partidária. C om efeito, esta vinculação entre o eleito e a vontade dos eleitores tam bém foi tem a de abordagem de Hans Kelsen^^^ que assim sinteticamente pontuou: “A resposta à questão de saber se, de lege ferenda, o m em b ro eleito de u m corpo legislativo deveria estar juridicam ente obrigado a executar a vontade de seus eleitores e, portanto, a ser responsável para com o eleitorado d ep end e d a opinião sobre a am plitude em que é desejável que se concretize a idéia de dem ocracia. Se é dem ocrático a legislação a ser exercida pelo povo, e se por m otivos técnicos, é impossível estabelecer u m a dem ocracia direta e se torna necessário conferir a função legislativa a u m parlam en to eleito pelo povo, então é d em ocrático garantir, tanto quanto possível, que a atividade de cada m em b ro do parlam ento reflita a vontade de seus eleitores.” Nos term os postos, o controle popular da atividade dos repre sentantes eleitos é feito observando o regime dem ocrático partidário e o sistema representativo, sendo o partido político o instrum ento do povo para exercer o seu poder e para cobrar de seus representantes o exercício de sua vontade. 436 SILVA, José A fonso da. C u rs o de dire ito co n stitu cio n al positivo. 30 ed. rev. e atual. São Paulo; M alheiros, 2008. R 125 437 C A N O T IL H O , José lo a q u im G om es. C o n stitu iç ã o D irig e n te e V in cu lação d o Legislador. C o n trib u to p a ra a co m p re e n sã o das n o rm a s co n stitu cio n ais pro g ram á tic a s. C o im b ra : C o im b ra Ed., 1994. R 410. 438 KELSEN, H ans. T eoria geral d o d ireito e d o estado. 3 ed. trad. Luiz C arlo s Borges. São Paulo; M artin s Fontes. 1998. p. 417. 312 C om isso os partidos políticos surgem com o centro de manifes tação da vontade do povo que, juntam ente com instrum entos de par ticipação direta no poder político pelo povo, instituem a dem ocracia participativa. Em decorrência do regime dem ocrático social ou participativo, os partidos políticos exercem u m a função de m ecanism o de expressão da vontade popular, com o form a de prom over m aior fiscalização das decisões políticas desses representantes, criando assim a função-dever de fidelidade do político ao partido pelo qual concorreu à eleição. Segundo Fávila Ribeiro'*'’^, o partido político é um grupo social de relevante am plitude destinado à arregim entação coletiva, em torno de idéias e de interesses, para levar seus m em bros a com patilharem do poder decisório nas instâncias governamentais. N o m esm o norte é o magistério do mestre Pinto Ferreira^^"^ para quem os partidos políticos são considerados grupos sociais, regulados pelo direito positivo, con gregando eleitores para a conquista do poder político e para a realiza ção de determ inado programa. Assim diante dos conceitos de dem ocracia participativa e de partidos políticos, tais como postos, pode-se afirm ar que, como bem pontificou 0 trabalho monográfico do acadêmico Victor Filgueiras de Oliveira^"*', p o r m im orientado, que é som ente nesse regime político de governo dem ocrático participativo, com a atuação decisiva das agre miações partidárias, onde se é possível defender a idéia de fidelização do eleito ao partido político pelo qual concorreu à eleição, m ediante a estruturação de um processo cujo fim seja decretar a perda do m andato destes representantes p o r desfiliação partidária sem justa causa. Só através de tal concepção é que os partidos políticos, enquanto órgãos agregadores e expoentes da vontade popular, poderão exercer algum tipo de controle sobre os donos de mandato político, para que estes, ao cum prir os programas partidários, venham agir em benefício de toda a coletividade e não de seus próprios interesses. 439 RIBEIRO, Fávila. D ireito eleitoral. 5 ed. Rio de Janeiro; Forense, 1998. p. 325. 440 C IT T A D IN O . Gisele. P o d e r fudiciário, /a tiv ism o Judiciário e D e m o crac ia , Alceu, vol. 05. n. 09. p 108. 441 SA N TO S, Leticia P im e n ta M ad e ira Santos. A re g u la m e n ta çã o d a fidelidade p a rtid á ria à luz d o ativis m o judiciário. Texto e x tra íd o e m 21.01.2009 d o |u s N avigandi. h ttp ://ju s2 .u o l.c o m .b r/d o u trin a /te x to . a sp ? id = l 1156- 313 Assim, para abordar a questão da fidelidade partidária temos que enfrentar e responder o seguinte questionamento: Q ual a natureza dessa relação jurídica estabelecida entre governantes e governados, ou seja, se esta relação implica num a liberdade de atuação daqueles em face destes, ou se evidencia certo condicionam ento na atividade dos representantes pelos representados?? A m eu sentir o condicionam ento e vinculação passam a ser cada vez mais presente e necessário. 2. H IST Ó R IC O E N ORM A TIZA ÇÃO DA FIDELIDADE PARTIDÁRIA Na história positiva do Brasil, já houve um a previsão constitucio nal contida da C arta M agna de 1967, segundo a qual o eleito perdia o m andato quando não seguia as diretrizes do partido no qual tinha sido eleito. Atente-se para o conteúdo dos arts. 35, V e art. 152, parágrafo único com a redação dada pela EC n° 01/69, in Uteres: Art. 35 Perderá o m andato o dep utad o ou senador: 1- ] V - que praticar ato de infidelidade partidária, segundo o previsto no parágrafo único do artigo 152. Art. 152 A organização, o funcionam ento e a extinção dos partidos políticos serão regulados em lei federal, observados os seguintes princípios: [...] Parágrafo único. Perderá o m andato no Senado Federai, na C âm ara dos D eputados, nas Assembléias Legislativas e nas C âm aras M unicipais q uem , p o r atitude o u pelo voto, se opuser às diretrizes legitim am ente estabelecidas pelos órgãos de direção partidária ou deixar o partido sob cuja legenda foi eleito. A p erda do m an dato será decretada pela Justiça Eleitoral, m edian te a representação do partido, assegurado o direito de am pla defesa. Portanto, a história norm ativa do Brasil já previu em sede cons titucional a fidelidade partidária de form a completa e precisa, determ i nando a perda do m andato por ato de infidelidade partidária. Ocorre que o espírito da no rm a que perm eou aquele preceito constitucional - em bora de caráter efetivo e preciso - se baseou na te n tativa de m anter o bipartidarismo, expor u m a dem ocracia aparente e o 314 dom ínio dos generais do nebuloso período ditatorial que dom inou o Brasil. C om os procedim entos para retom ada da dem ocracia no país, essa norm atização da fidelidade partidária e da perda do m andato aos infiéis foi revogada pela EC n° 25/85, não sendo tam bém prevista pela C onstituição Federal de 1988. Atualmente, em bora não se tenha um trabalho norm ativo cons titucional ou infraconstitucional para m odular a questão da fidelidade partidária, tem -se que esta garantia está implícita na nossa form a de dem ocracia e inserida no com ando constitucional contido no §1° do art. 17 da Carta Magna, todavia, conferindo aos partidos políticos o trato desta m atéria em sede interna corporis. “Art. 17 É livre a criação, fusão, incorporação e extinção dos partidos politicos, resguardados a soberania nacional, o regim e dem ocrático, o pluripartidarism o, os direitos fundam entais d a pessoa h u m an a e observados os seguintes princípios: [...] § r É assegurada aos partidos políticos autonom ia para definir sua estru tu ra interna, organização e funcionam ento e para adotar os critérios de escolha e o regim e de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação en tre as candidaturas em âm bito nacional, estadual, distrital ou m unicipal, devendo seus estatutos estabelecer normas partidária.” (grifei) de disciplina e fidelidade Posteriormente fo i editada a Lei n° 9.096/95 (Lei dos Partidos Po líticos) que deixou de trazer diretrizes específicas sobre o tema, res tringindo-se a apontar que a questão de fidelidade partidária era um a questão interna corporis. A positivação da fidelidade partidária está inserida atualmente no nosso ordenam ento jurídico p o r interm édio de decisões e posicio nam ento jurisprudencial Seja p o r força da Resolução 22.610 do TSE, seja em face de resposta da Consulta 1398 form ulada p o r partido polí tico e respondida pelo Tribunal Superior Eleitoral. 315 3. O ATIVISM O JUD ICIAL E A FIXAÇÃO DE PR O C ED IM EN TO ESPECÍFICO A prim eira vista poder-se-ia pensar ser inconstitucional - por violação à ordem democrática e as funções precípuas de cada um dos poderes - o fato do Poder Judiciário, sob a alegação da necessidade de suprir o legislador nacional, estar legislando sobre este tema. Mas a crise de imagem e a inação p o r que vem passando o Poder Legislativo, tem feito com que o Poder Judiciário - fu n d a d o na impar cialidade e confiabilidade dos tribunais que lhes conferem força e legitimi dade - tenha que intervir para disciplinar, ainda que temporariamente, determ inadas situações im postas pela necessidade da sociedade, o que justifica a aparente invasão a com petência reservada ao Congresso N a cional. Ademais, o entendim ento externado pelo TSE sobre fidelidade partidária, ainda que em sede de legislação excepcional, foi validada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgam ento dos M andados de Segurança n° 26.602, 26.603 e 26.604. Ao assim proceder, o Tribu nal “Guardião da Constituição” chancelou e convalidou constitucional mente as norm as erigidas pelo Tribunal Superior Eleitoral sobre fideli dade partidária. Sobre esta possibilidade é sempre conveniente trazer o escólio de Gisele Cittadino^^^ que assim pontificou sobre o assunto: “Não se pod e negar que as C onstituições das dem ocracias contem porâneas exigem u m a interpretação construtiva de n orm as e dos princípios que as integram , e, nesse sentido, as decisões dos tribunais - especialm ente em face de conflito de direitos fundam entais - têm necessariam ente o caráter de “decisões de princípio”. N o entanto, a despeito do fato d a dim ensão inevitavelmente “criativa” da interpretação constitucional - dim ensão presente em qualquer processo herm enêutico, o que, p o r isso m esm o, n ão coloca em risco, a lógica da separação dos poderes os tribunais constitucionais, ain d a que reco rram a argu m en to s que ultrapassem o direito escrito, devem proferir “decisões corretas” e não se envolver n a tarefa de “criação do direito”, a p artir de valores preferencialm ente aceitos.” 442 B A R B I, Celso Agrícola. C om entários ao Código de Processo Civil. 9 ’ ed. Rio d e Janeiro: Forense, 1994, p. i 74. voL {. 316 No caso da fidelidade partidária, mister se faz a intervenção do Poder Judiciário com o escopo de integrar princípios, norm as e garan tias constitucionais, proferindo verdadeira decisão de princípio. Tudo isso sem perder de vistas a impossibilidade de reiteração de procedi mentos desta natureza, sob pena de instauração de um a verdadeira d i tadura do judiciário. Apresenta-se bastante o portuna a conclusão sobre o assunto tra zida p o r Letícia Pimenta'*'*^ ao expor: “Dessa form a, exsurge do posicionam ento doutrin ário pátrio e estrangeiro a n ítida lição de que o ativismo judiciário não significa de m aneira algum a u m a lesão à separação dos poderes constitucionalm ente assegurada, já que a decisão do Poder Judiciário seria sem pre no sentido de conjugar a sua qualidade de destinatário dos com andos constitucionais e, ao m esm o tem po, de aplicador das mesm as, con fo rm and o assim as demais n o rm as do o rd enam en to e as condutas concretas subm etidas à análise.” Logo, tem-se como necessária e absolutamente constitucional a in tervenção ativista do Poder Judiciário no caso da fidelidade partidária. Transposta a legalidade e necessidade do ativismo judicial para re gulamentar os casos de fidelidade partidária, mister se fa z enfrentar uma das grandes problemáticas ainda reinantes quanto ao tema de infideli dade partidária, qual seja: a legitimidade dos suplentes para pleitear a declaração de infidelidade e o termo a quo para a dedução deste pleito. A Resolução n° 22.610 do Tribunal Superior Eleitoral estabelece no caput e no parágrafo segundo do art. l° o s entes legitimados para intentar 0 pedido de declaração de infidelidade partidária. Vejamos: “Art. 1".- O p artido político interessado p o d e pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da p erd a de cargo eletivo em decorrência de desfiliação p artidária sem justa causa. (...) § 2*.- Q u an d o o p artid o político não form ular o pedido d en tro de 30 (trinta) dias d a desfiliação, pod e fazê-lo, em n o m e próprio, nos 30 (trinta) dias subseqüentes, quem tenha interesse jurídico ou o M inistério Público.” 443 ALVIM, Ih e rc z a A rru d a . D a assistência litisconsorcial n o C ó d ig o brasileiro. R evista de Processo. São Paulo: R I. n° 11/12. ju lh o /d e z e m b ro d e 1978, pp. 45/46. 317 Da leitura da referida norm a tem-se que são legitimados ativamen te para pleitear a perda do cargo eletivo: a) O partido político e, subsidiariamente, b) O Ministério Público e c) quem tiver interesse público. Dúvidas não restam quanto a legitimidade do partido político em pleitear a perda do cargo eletivo do antigo partidário que, elegendo-se p o r aquele partido, deixou sem justa causa aquela agremiação partid á ria, para em outra figurar. Ora, se o m andato pertence ao partido, este é e será sempre o interessado m aior em preservar o m andato, de onde se extrai a sua legitimidade ordinária para figurar no pólo passivo. Já o M inistério Público Eleitoral, com o fiscal da lei e da socieda de, poderá tam bém pleitear a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de infidelidade partidária, mas, nestes casos, este pleito só p oderá ocorrer, se e quando, decorrido o prazo legal de 30 (tinta) dias do fato e o partido ao qual pertencia o exercente do m andato não o tiver pleiteado. Atente-se que a legitimidade do M inistério Público Eleitoral é subsidiária, só existindo quando o partido não tiver form ulado o pe dido de decretação de perda do cargo. A Resolução 22.610 ainda estabelece com o legitimado para plei tear a decretação da perda do cargo eletivo do m andatário que se desfiliou aos que tenham interesse jurídico. Atente-se que a legitimação neste caso é extraordinária - feita em decorrência de dispositivo n o r mativo -, mas para tanto m ister se faz a cabal dem onstração de interesse jurídico. Interesse jurídico não se confunde com interesse processual, p o lítico ou processual. O interesse político, puro e simples, não enseja esta legitimação. N em m uito menos o interesse processual. Nestes casos o interesse dom inante é o interesse jurídico, ou seja, é o interesse ligado diretam ente a pretensão a ser deduzida, de m odo que esta possa afetar diretam ente o legitimado. Para Celso Agrícola Barbi'^'*"' “o interesse é jurídico quando, entre o direito em litígio e o direito que o credor quer proteger com a vitória daquele, houver um a relação de conexão ou de dependência, de modo que a solução do litígio pode influir, favorável ou desfavoravelmente, sobre a posição jurídica de terceiro” 444 ALVIM , Thereza A rru d a . D ireito Processual de E star e m juízo. São Paulo: RT, 1996. p. 207. 318 No mesmo norte está sedimentado o escólio de Thereza Alvim**"^^ ^ que assim finca a sua doutrina sobre o interesse jurídico também analisan do os efeitos sobre terceiros: “O interesse será jurídico se a esfera jurídica do terceiro p u d er ser atingida de fato, isto é, pelos fundam entos de fato e de direito d a sentença ou pela própria decisão, de forma indireta, tenha ele en trad o ou não no processo”, “Só será jurídico o interesse do terceiro, se a decisão judicial da lide, ou seja, do pedido que n ão foi, nem por ele, n em contra ele, feito, p u d er vir a afetar relação jurídica sua com o assistido, p u d e r ser atingido por atos executórios afetando sua esfera jurídica, ou, ainda, p u d er ser alcançada sua esfera jurídica, atual ou potencialmente.” Diante deste prisma convém abordar o tema da legitimidade dos suplentes para pleitear a decretação da perda do mandado por infideli dade. 4. LEG ITIM ID A D E ATIVA E PASSIVA D O S SUPLENTES Inicialmente, não se pode perder de mente que nos cargos p ro porcionais não se tem um lim itador de quantos suplentes devem ser diplomados, cabendo ao livre arbítrio de cada ente diplom ador estabe lecer um parâm etro, tudo nos term os do art. 215 do Código Eleitoral que assim estabelece: “Art. 215. Os candidatos eleitos, assim como os suplentes, receberão diploma assinado pelo Presidente do Tribunal Regional ou da Junta Eleitoral, conforme o caso. Parágrafo único. Do diploma deverá constar o nom e do candidato, a indicação da legenda sob a qual concorreu, 0 cargo para o qual fo i eleito ou a sua classificação como suplente, e, facultativamente, outros dados a critério do iuiz ou do Tribunal”. Em recente decisão lançada pelo egrégio Tribunal Superior Elei toral, restou assentado o entendim ento de que os suplentes devem ser diplomados até a terceira suplência por partido ou coligação, sem qual445 AI.VIM , Ihc re z a A rru d a . D a assistência litisconsorcial n o C ó d ig o brasileiro. R evista de Processo. São Paulo: R I, n" 11/12, ju lh o /d e z e m b ro d e 1978, pp. 45/46. 446 AI.\'1M , ih e re z a A rru d a . D ireito Processual d e E star em lu i/o . São Paulo: RT. 1996, p. 207. 319 quer im pedim ento de que, em sendo necessário, possam os suplentes posteriores tam bém solicitar as suas respectivas diplomações. Para m aior comprovação do entendim ento jurisprudencial sobre o assunto atente-se para o que restou lançado n a Consulta n° 23.097 sob a relatoria do Min. Enrique Ricardo Lawandowski, cuja em enta publicada em 06.08.2009 assim aponta: “PROCESSO A D M IN ISTR A T IV O . DfPLOM AÇÁO. SUPLENTES. CRITÉRIO. D IPLO M AÇÀO A TÉ TERCEIRO SUPLENTE. REM ANESCENTES. NO M EAÇ ÃO . FACULDADE. 1 - A diplotnação de suplentes deve ocorrer até a terceira colocação, facultando-se aos demais suplentes o direito de solicitarem, a qualquer tempo, os respectivos diplomas. 2 - M antém -se o entendim ento de que, nas hipóteses de infidelidade partidária, somente o 1“ suplente do partido detém interesse jurídico, um a vez que poderá assumir o m andato do parlam entar eventualmente condenado (CTA 1.482/DF, Rei. Min. Caputo Bastos). Precedentes.” (grifei) Estabelecido o critério delim itador para a entrega física dos d i plomas aos suplentes, ao m enos até a terceira colocação, facultando-se aos demais o direito de solicitação, a qualquer tempo, dos seus respecti vos diplomas, tem -se agora que enfrentar se os suplentes - devidamente diplomados - tam bém possuem legitimidade para a interposição visan do a declaração de perda de m andato do mandatário. No que pertine ao tem a relativo a migração partidária de suplen tes, o TSE tem entendido que se trata de matéria interna corporis do partido político, posto que inexistindo m andato p o r eles exercido, o tem a fugiria da com petência da Justiça Eleitoral, pois só competeria a Justiça Eleitoral analisar controvérsia de questões internas das agre miações partidárias quando houver reflexo direto no processo eleitoral, com a ressalva de que tal controle jurisdicional não interfira na sua au tonom ia, garantida pelo § 1^ do art. 17 da Constituição Federal. Por interm édio da Consulta n® 1.679/DF da relatoria do Ministro Arnaldo Versiani, recentemente confirm ada pela Consulta n “ 1.680/DF, assim ficou decidido: ‘'CONSULTA. SUPLENTE. SENADOR. MUDANÇA. AGREMIAÇÃO. INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. 320 }. No recente julgam ento do Agravo Regimental na Representação n" 1.399, relator Ministro Felix Fischer, o Tribunal decidiu que a mudança partidária de filiados que não exercem mandato eletivo, como na hipótese de suplentes, consubstancia matéria interna corporis, e escapa da competência da Justiça Eleitoral. 2. Em face desse entendimento, não há como se enfrentarem questionamentos relativos à eventual migração partidária de suplente de senador 3. Consulta não conhecida." (grifei) O entendim ento acima exposto, tem sido a regra no tocante a suplentes que pretendem ver declarada a perda do m andato de outro suplente - sem que este esteja no exercício da titularidade do cargo. Entrementes, no que pertine a declaração de perda de titular de m andato pleiteado p o r suplente, a situação é bem outra. Ora, um suplente pode pleitear a declaração da perda do cargo de um detentor de cargo eletivo sim, po r u m a questão m uito simples: ele dispõe de interesse jurídico em ver um dos exercentes de m andato eleito pelo seu partido ou coligação perder o m andato, posto que, em havendo a perda, ele - o suplente - será, inapelavelmente, quem ira assum ir o mandato. Daí a conclusão que se chega - decorrente da interpretação do § 2° do art. 1^ da Resolução do TSE n° 22.610 - de que o suplente, p o r pos suir interesse jurídico, pode pleitear a declaração da perda do m an d a to de parlamentar. Ademais, este entendim ento já está consolidado no Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que apenas o 1° suplente do partido detém legitimidade ativa, decorrente da expectativa imediata de assunção ao cargo, como restou decidido na PET n° 2.789/PE, DJe de 1.9.2009 e na Resolução n° 23.097/RJ, DJe de 21.9.2009, ambas da relatoria do Min. Ricardo Lewandowski. Assim tem-se definido que, em regra, a perda de m andato de su plentes é matéria interna corporis. Já para a perda do m andato eletivo de um parlamentar, a cão poderá ser manejada, apenas, pelo prim eiro suplente p o r ser este o beneficiário direto com a declaração da perda do mandato. Agora merece, tam bém , especial realce os casos em que um ou mais suplentes assume a titularidade do cargo, ainda que em caráter 321 tem porário em razão de licença de saúde ou para assumir outro cargo. Neste caso, com o o suplente está no efetivo exercício do m andato, a sua suplência passa a ser exercida pelo suplente subseqüente que passa a ter 0 interesse jurídico - e, por conseguinte, a legitimidade - para encetar a ação declaratória com vista à perda do m andato p o r parte do suplente. Com efeito, o trintídio decadencial para o partido ou para os legitimados subsidiaria e extraordinariamente propor a ação visando a declaração da perda do mandato, nos termos da Resolução n° 22.610 do TSE, terá início tão somente quando o suplente efetivo exercício do mandato pelo suplente infiel. N este sentido, atente-se para a jurisprudência do TSE: “REPRESENTAÇÃO. FIDELIDADE PARTIDÁRIA. D EPU TA D O FEDERALSUPLENTE. DESFILlAÇÃO P ARTIDÁRIA. JUSTA CAUSA. SUBSTITUIÇÃO. LICENÇA. INTERESSE. DECAD ÊNCIA. A R T 1°, § 2<>. RESOLUÇÃO-TSE N ° 22.610/2007. 1. A disciplina da Resolução-TSE 22.610/2007 não é aplicável aos suplentes que se desligam do partido pelo qual fo ram eleitos, pois estes não exercem m andato eletivo. Tratar-se-ia, portanto, de questão interna corporis. (Cta 1.679/DE, R ei M in. Arnaldo Versiani, no mesmo sentido, 0 RO 2.275/RJ, R ei Min. Marcelo Ribeiro e a RP L399/SP, de m inha relatoria). 2. Nos casos em que o suplente assume o exercício do mandato em razão de licença, há o dever de fidelidade ao partido pelo qual se disputou as eleições. Em tais hipóteses, os suplentes ostentam a condição de mandatários, de modo que eventual infidelidade partidária não mais se restringe a esfera interna corporis. (Cta. 1.714, de minha relatoria, DJe 24.9.2009). 3. A contagem do prazo de 30 (trinta) dias que a agremiação partidária possui para ajuizar o pedido de decretação de perda de mandato p o r infidelidade partidária ( a r t 1°, § 2° da Res.-TSE 22.610/2007) inicia-se com posse para substituição do mandatário. No caso, ocorrida aposse em 12.9.2007 e ajuizada a ação apenas em 4.2.2009, reconhece-se a decadência do direito postulado. (TSE. R e i Min. Félix Fischer. P E T 2979. DJe 02.02.2010)" (grifei) E mais!!! Com o restou dito anteriorm ente, com o o m andato p e r 322 tence ao partido e não ao candidato ou a coligação, apenas o suplente do partido terá legitimidade para encetar a ação necessária visando a declaração da perda do cargo do suplente infiel. Neste sentido merece especial atenção recente decisão exarada pelo TSE, cuja em enta restou assim grafada: “A G R A V O REGIM ENTAL. PETIÇÃO. PERDA. MANDATO ELETIVO. INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. RES. TSE N° 22.610/2007. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. SUPLENTE. CO LIG AÇÃO PARTIDÃRIA. 1. Inviável o agravo que não ataca todos os fu n d a m ento s da decisão impugnada, permanecendo íntegra sua conclusão. (Súmula 182/STI). 2. N a linha da jurisprudência desta Corte, o mandato pertence ao partido, e não à coligação, razão pela qual o suplente desta não detém legitimidade ativa ad causam para integrar a lide na qualidade de liíisconsorte.” (TSE. REI. Min. Marcelo Ribeiro. P E T 26864. DJe 10.03.2010) (grifei) Assim, resta especificado os casos de legitimação, ativa e passiva, dos suplentes para propor ou defender-se de procedim entos ou ação tendentes a declaração da perda do m andato p o r infidelidade partid á ria. 5. CONCLUSÃO Em apertada síntese, podem os extrair conclusões no sentido de que o ativismo judicial praticado pela TSE, ao regular o tem a de infide lidade partidária, externou u m viés da nossa dem ocracia relacionando a vinculação dos m andatos aos partidos, ao m esm o tem po em que exal tou a tríplice e m útua relação na seara eleitoral, onde se apresentam três elementos interligados: partidos, candidatos eleitos e eleitores. Desta vinculação nasce a fidelidade partidária com o decorrência da interpretação do § 1° do art. 17 da C arta Magna, im pondo vincula ção às propostas partidárias, pelo que o m andato não mais pertence ao exercente, mas ao partido que representa. Para proteger esse tema, necessário se faz a regulamentação do tema, excepcionalmente, p o r ativismo judicial que estabeleceu as p re missas básicas para a proteção e exercício deste direito. Exercício este 323 que fica condicionado, cumulativamente, ao tem po e a legitimidade o r dinária ou subsidiária ou extraordinária. Neste viés, merece destaque a possibilidade dos suplentes - que exerçam a primeira suplência - pleitearem a declaração da perda de m andato p o r infidelidade, bem com o destes perderem a sua condição de suplência p o r decisão adm inistrativa dos partidos quando não es tiverem no exercício do mandato, ou p o r decisão da Justiça Eleitoral quando do exercício do mandato, ainda que temporariamente. Tudo isso sem perder de m ente que o início do prazo decadencial, no caso dos suplentes, dá-se com o início do exercício do mandato, bem como que como o cargo pertence ao partido quem poderá plei tear a sua vacância será o suplente do partido do candidato infiel, não podendo o suplente da mesm a coligação, mas de partido distinto do político infiel, pleitear tal intento. Estas nuances e relevos atinentes a infidelidade partidária, revela e acentua um a faceta salutar à democracia: o fortalecimento dos p arti dos políticos, dentro do pluripartidarism o ensejando formas para cum prim ento das metas e planos propostos quando da candidatura como tentativa de extirpar a prostituição partidária. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVIM, Thereza Arruda. Da assistência litisconsorcial no Código brasileiro. Revista de Processo. São Paulo: RT, n° 11/12, julho/dezem bro de 1978. ALVIM, Thereza Arruda. Direito Processual de Estar em Juízo. São Paulo: RT, 1996. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. C ontributo para a com preensão das norm as cons titucionais programáticas. Coimbra: C oim bra Ed., 1994. CITTADINO, Gisele. Poder Judiciário, Ativismo Judiciário e Dem o cracia. Alceu, vol. 05. n. 09. KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. 3 ed. trad. Luiz Carlos Borges. São Paulo: M artins Fontes, 1998. OLIVEIRA, Victor Filgueiras de. O processo de perda de cargo eletivo 324 p o r desfiliaçào partidária: análise constitucional e Jurisprudencial da fidelidade partidária. Trabalho monográfico depositado na biblioteca da UFPB. Dez/2009. PINTO FERREIRA, Luiz. Curso de direito constitucional. Rio de Ja neiro: Freitas Bastos, 1964. RIBEIRO, Fávila. Direito eleitoral. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. SANTOS, Letícia Pim enta M adeira Santos. A regulamentação da fi delidade partidária à luz do ativismo judiciário. Texto extraído em 21.01.2009 do JuS Navigandi. http;//]us2 .uol.com.br/doutrina/texto.asp?td=l1156. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 30 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2008. 325 326