a cláusula apositiva: estrutura articuladora do discurso

Transcrição

a cláusula apositiva: estrutura articuladora do discurso
LUCÍLIA CASTANHEIRA DE AQUINO
A CLÁUSULA APOSITIVA:
ESTRUTURA ARTICULADORA DO DISCURSO
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
BELO HORIZONTE
2001
LUCÍLIA CASTANHEIRA DE AQUINO
A CLÁUSULA APOSITIVA:
ESTRUTURA ARTICULADORA DO DISCURSO
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Letras da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais,
como parte dos requisitos para a obtenção
do grau de Mestre em Língua Portuguesa,
elaborada sob a orientação da Profa. Dra.
Maria Beatriz Nascimento Decat.
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Belo Horizonte
2001
Dissertação defendida publicamente no Programa de Pós-graduação em Letras
da PUC Minas e aprovada pela seguinte Comissão examinadora:
______________________________________
Prof. Dr. Luiz Carlos de Assis Rocha (UFMG)
____________________________________________
Prof. Dr. Johnny José Mafra (PUC Minas)
____________________________________________
Profa. Dra. Maria Beatriz Nascimento Decat (PUC Minas)
Orientadora
Belo Horizonte,
de
de 2001.
Profa. Dra. Ivete Lara Camargos Walty
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras
PUC Minas
Dedicatória
À Raquel, ao Rodrigo, à Bárbara.
Agradecimentos
A Deus, pelas graças concedidas.
À Profa. Maria Beatriz Nascimento Decat, pela orientação segura, pela amizade
e pelo exemplo de dedicação à Pesquisa e ao Ensino.
À Secretaria de Estado da Educação, pela licença concedida.
À Universidade de Itaúna, pelo apoio oferecido.
A todos os meus familiares, colegas e amigos, em especial Vicente Geraldo,
Lucirene, Meire, Cristina e Angélica.
Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em Letras, pela presença
acolhedora e prestimosa.
SUMÁRIO
LISTA DE QUADROS E TABELAS
RESUMO
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO
1.1
1.2
1.3
1.3.1
1.3.2
1.4
Pág.
Delimitação do objeto de estudo e justificativa .................................................. 11
Objetivos ........................................................................................................... 23
Metodologia ...................................................................................................... 24
O corpus: constituição e caracterização .............................................................. 24
Suporte teórico .................................................................................................. 27
Plano da dissertação ........................................................................................... 29
CAPÍTULO 2 - A APOSIÇÃO: TRAJETÓRIA E CARACTERIZAÇÃO
2.1
2.2
2.3
2.4
2.4.1
2.4.1.1
2.4.1.1.1
2.4.1.1.2
2.4.1.1.3
2.4.1.2
2.4.1.3
2.4.1.4
2.4.2
2.4.2.1
2.4.2.2
2.4.2.3
2.4.3
2.4.3.1
2.4.3.2
2.4.3.3
2.4.3.4
Introdução ........................................................................................................ 30
A aposição em forma de sintagma simples......................................................... 34
A aposição em forma de sintagma oracional ...................................................... 39
A cláusula apositiva na lingüística moderna....................................................... 46
Cláusula apositiva parentética: funções textuais interativas................................ 49
A elaboração tópica do texto ............................................................................. 52
Os parênteses e o conteúdo tópico ..................................................................... 53
Os parênteses e a formulação lingüística do tópico ............................................ 57
Os parênteses e a construção textual.................................................................. 62
Parênteses com foco no locutor ......................................................................... 66
Parênteses com foco no interlocutor .................................................................. 69
Parênteses com foco no ato comunicativo em si................................................. 73
A cláusula apositiva como mecanismo de inserção ............................................ 76
Inserção com função de "explicação"................................................................. 79
Inserção com função de "esclarecimento".......................................................... 80
Inserção com função de "correção".................................................................... 81
A cláusula apositiva e o processo de "reconstrução" .......................................... 83
A repetição........................................................................................................ 84
O reparo ............................................................................................................ 86
A paráfrase........................................................................................................ 88
A adjunção ( ou adendo )................................................................................... 89
CAPÍTULO 3 - FUNÇÕES TEXTUAIS DA CLÁUSULA APOSITIVA NO
PORTUGUÊS
3.1
3.2
Considerações iniciais ....................................................................................... 93
As cláusulas apositivas: tipos e funções............................................................. 97
3.2.1
3.2.1.1
3.2.1.2
3.2.1.3
3.2.1.4
3.2.1.5
3.2.1.6
3.2.1.7
3.2.1.8
3.2.1.9
3.2.2
3.2.2.1
3.2.2.2
3.2.2.3
3.2.2.4
3.2.2.5
3.2.2.5.1
3.2.2.5.2
3.2.2.5.3
3.3
Apositivas: construções parentéticas.................................................................. 98
Função de "exemplificação" .............................................................................. 98
Função de "esclarecimento" ............................................................................ 103
Função de "retoque" ........................................................................................ 112
Função de "ressalva" ....................................................................................... 117
Função de "justificativa" ................................................................................. 118
Função de "busca de denominação"................................................................. 119
Função de "explicitação do valor de uma palavra no contexto"........................ 123
Função de "marcação do estatuto discursivo de um fragmento no texto".......... 124
Função de "manifestação atitudinal do locutor em relação ao assunto" ............ 125
Apositivas: mecanismos de inserção e reconstrução ........................................ 126
Função de "avaliação" ..................................................................................... 127
Função de "correção" ...................................................................................... 128
Função de "reparo".......................................................................................... 128
Função de "paráfrase explicativa".................................................................... 130
Função de "adendo" ........................................................................................ 131
O adendo como "acréscimo"............................................................................ 132
O adendo como "explicitação"......................................................................... 134
O adendo como "ilustação" ............................................................................. 134
Incidência da cláusula apositiva no corpus pesquisado .................................... 136
CAPÍTULO 4 - CONCLUSÃO .......................................................................................140
ABSTRACT ................................................................................................................. 144
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 145
LISTA DE QUADROS E TABELAS
Pág.
QUADRO I -
Comparativo das classificações de alguns apostos...........38
QUADRO II -
O aposto simples: funções.................................................94
QUADRO III -
Orações apositivas: incidências das funções...................136
TABELA 1 -
Ocorrências de aposto simples .........................................95
TABELA 2 -
Ocorrências de aposto simples e clausular........................95
TABELA 3 -
Resumo das ocorrências de cláusulas apositivas.............137
-8-
RESUMO
No presente trabalho, faz-se um estudo, numa
abordagem funcionalista, da cláusula apositiva em português tanto
em textos de língua oral, quanto em textos de língua escrita.
Inicialmente,
fez-se
uma
incursão
por
alguns
gramáticos
tradicionais, visando levantar questões acerca da conceituação e dos
papéis sintático-semânticos da aposição em forma de sintagma
simples e clausular. Em seguida, procedeu-se a uma análise geral
das cláusulas apositivas, dentro de uma abordagem pragmáticodiscursiva,
enfocando,função
textual-interativa
de
natureza
parentética bem como seu papel na progressão temática, quando
então elas se caracterizam como elemento articulador do discursso.
O corpus da pesquisa foi constiuído de um conjunto de textos
narrativos e dissertativos, orais e escritos pertencente ao acervo de
Decat (1993), de cem textos dissertativos de alunos do terceiro grau
e de alguns textos de jornais.
PALAVRAS CHAVE:
Cláusula apositiva
funções textuais
articulação do discurso
Enquanto a língua é um rio caudaloso,
longo e largo, que nunca se detém em seu
curso, a gramática normativa é apenas um
igapó, uma grande poça de água parada,
um
charco,
um
brejo,
um
terreno
alagadiço, à margem da língua. Enquanto
a água do rio/língua, por estar em
movimento, se renova incessantemente, a
água do igapó/ gramática normativa
envelhece e só se renovará quando vier a
próxima cheia. Meu objetivo, atualmente,
junto
com
muitos
lingüístas
e
pesquisadores, é acelerar ao máximo essa
próxima cheia...
(Bagno, Marcos 1999:10)
Capítulo 1
INTRODUÇÃO
1.1.Delimitação do objeto de estudo e justificativa
O conceito de aposição sob a forma de sintagma simples ou
mesmo sintagma oracional não é suficientemente esclarecido pelas nossas
gramáticas tradicionais. Uma breve incursão por algumas dessas gramáticas e
compêndios de análise sintática da língua portuguesa mostra que há uma falta
de consenso acerca da conceituação, da identificação e, sobretudo, da
diferenciação do aposto instanciado lingüisticamente como sintagma simples
ou sintagma oracional. Isso decorre do fato de que a abordagem do processo
apositivo por parte de nossos gramáticos tradicionais atém-se exclusivamente
ao nível sentencial, sem levar em conta o co-texto em que se insere. Tudo isso
sem falar na mistura de conceitos sintáticos e semânticos na sua definição.
As análises dadas pelos nossos autores tradicionais, além de se
prenderem apenas ao nível sentencial, deixam um outro ponto a observar. É
que a grande maioria dos autores se vale de um corpus escrito, apresentando
dados ( às vezes de pouca vitalidade ) da modalidade literária, como se pode
verificar nos exemplos abaixo:
(1) “Eu, Brás Cubas, escrevi este romance com pena da galhofa e a tinta da
melancolia”. ( M. A.) – apud Rocha Lima (1994:255 ).
(2) “Para um homem se ver a si mesmo, são necessárias três coisas: olhos,
espelho e luz”.( Vieira) – apud André,(1995:256 ).
(3)
“Debaixo do juazeiro grande, todo um rebanho de retirantes se
arranchara: uma velha, dois homens, uma mulher nova, algumas
crianças”. ( Raquel de Queiroz ) – apud Faraco e Moura (1996:23)
(4)
(5)
"Era o tenente Maurício acompanhado do coronel”. (J.L. Rego) – apud
Faraco e Moura (1996:23).
“Nós já tínhamos imaginado, mamãe e eu, fazer uma grande
peregrinação”. (G. Aranha) – apud Cunha (1984:101).
Algumas vezes, é bom que se diga, são mencionados dados
oriundos de fonte não-literária, como os de música popular brasileira. Veja-se
o exemplo:
(6) -“E a morte, o destino, tudo estava fora de lugar”. (Geraldo Vandré) – apud
Terra (1997:113).
A caracterização do aposto não tem sido fácil nem clara como se
pôde constatar pelas divergências encontradas nas gramáticas pesquisadas.
Nelas, o aposto é considerado:
-
-
“um substantivo ou locução substantiva”(Câmara Jr.,1977:57);
“um adjunto colocado ao lado de, adjuntado”.(Bueno,1968:72);
“adjunto adnominal, que vem ao lado de um substantivo, termo essencial
ou integrante, com a mesma função do termo a que se liga”.(Nascentes,
1959:51);
“termo acessório sob a forma de um substantivo ou frase de certa
extensão” (Ali, M. Said, 1966:127)..
Ao lado desses autores aparece também Kury (1973:99), que
classifica o aposto como “substantivo, adjetivo (ou locução), pronome,
advérbio ou oração”. Acrescenta, ainda, que esses termos que funcionam
como apostos partilham a mesma função sintática do fundamental (termo a
que se referem).
Góis (1960:111) chama-o genericamente de “ adjunto atributivo”,
que tanto pode ser um adjetivo, o próprio aposto, uma expressão ou locução
adjetiva, um adjetivo, um substantivo, um vocativo ou até mesmo uma
- 12 -
“cláusula latente”. O que o autor chama de adjunto atributivo é a função que
corresponde ao que hoje se denomina de adjunto adnominal.
Cunha (1984:162) considera o aposto uma “oração” ou um “termo
que pode estar presente em todos os sintagmas oracionais, inclusive no agente
da passiva e no vocativo”.
O aposto é comparado em tais gramáticas com o adjunto
adnominal, com o predicativo e até mesmo com adjunto adverbial. Góis
(1960), Nascentes (1959) e Bechara (1989) foram alguns dos autores que
admitiram a semelhança entre o aposto e o adjunto adnominal.
Em construções do tipo praça da República, Serra da
Mantiqueira, Bechara (1989) aponta para o fato de que muitos autores não
consideram como aposto a expressão encabeçada por preposição, como nos
exemplos indicados, dando-a como adjunto adnominal. Afirma, ainda, que
“ambas as análises são aceitáveis, mas nos inclinamos para a aposição."
(Bechara, 1989:214).
Atualmente, a maioria das gramáticas já admitem apostos
preposicionados como: o mês de março, a cidade de Itaúna, levando em
consideração que a preposição não desfaz a aposição.
O chamado aposto circunstancial é empregado, segundo Bechara
(1989:214), para exprimir circunstâncias de tempo, causa, comparação; e
constitui, para o autor, aposto mesmo quando antecedido de preposição,
conjunção ou advérbio. Veja-se:
(7)
Rainha esquece o que sofreu vassala (ou seja, Quando rainha, esquece
o que sofreu quando vassala).
Já Kury (1973:57) prefere analisar tais
estruturas como
predicativos circunstanciais de orações adverbiais com predicado nominal.
- 13 -
Quando as gramáticas tradicionais apresentam o aposto como um
adjetivo, nota-se que alguns autores o classificam, nesse caso, como aposto
predicativo ou aposto circunstancial, equiparando-o com o predicativo e o
adjunto adverbial. Veja-se:
(8) Satisfeitos, os alunos corriam pelo pátio.
(9) Impulsivo e rixento, seus colegas o
(Luft,1985:45).
evitaram.
Nesses exemplos, os adjetivos destacados são considerados por
Luft (1985) apostos atributivos ou explicativos.
Kury (1973), como já disse, não considera tais adjetivos como
apostos. Classifica-os como predicativos atributivos:
(10) Os Castanheiros, grandes e concentrados, ouviam subir a seiva .( Eça) apud Kury (1973:59).
Em casos como do exemplo (11) - semelhante a (7) acima, Kury,
como foi dito anteriormente, classifica o adjetivo destacado como predicativo
circunstancial.
(11)
Pobre, lutou muito para formar-se.
Com relação à estrutura subordinada ou coordenada do aposto,
também notou-se uma certa divergência entre os autores.
Alguns dos gramáticos, como, por exemplo, Melo (1978),
consideram-no como um adjunto adnominal e, assim sendo, ele representa um
processo de subordinação de um substantivo sem conectivo. Essa afirmação
- 14 -
vem contrapor-se ao fato de que algumas gramáticas tradicionais postulam
que o aposto e o seu fundamental (termo a que se refere) exercem a mesma
função sintática (podendo-se, inclusive,
suprimir um dos termos da
construção sujeito/aposto, sem comprometê-la). Esta característica atribui à
construção apositiva o estatuto de coordenação.
Como se vê, parece que não há um consenso entre os autores no
que se refere à relação fundamental/aposto, coordenação x subordinação.
Num computo geral, fica clara a relação de dependência entre esses termos.
De qualquer modo, isso pode significar que a relação do aposto com o
elemento ao qual se liga não é fácil de se definir, podendo constituir-se como
uma relação de coordenação ou de subordinação.
Outra discrepância que aparece entre esses gramáticos refere-se
aos apostos sem pausa, nos quais há um substantivo que designa profissão ou
título hierárquico, seguidos de substantivos próprios personativos. Existem
divergências em se estabelecer qual termo constitui o aposto, como em O
jogador Roberto Carlos. Em Góis (1960), considera-se como aposto o
substantivo comum, jogador. Já em Rocha Lima (1973) e em Bechara (1978),
o aposto seria o substantivo próprio, no caso do exemplo dado, Roberto
Carlos.
Quanto à conceituação do aposto como sintagma simples,
constata-se unanimidade entre os autores no reconhecimento do seu caráter
explicativo e na sua classificação como um termo acessório que se instancia
como adjunto adnominal ou como adjunto adverbial.
Quanto ao seu papel semântico, cumpre-lhe explicar outro termo
(que lhe é anterior) dito fundamental, e é bom que se repita, “do qual herda a
mesma função sintática” (Kury: 1973 e Nascentes:1959).
- 15 -
A pausa que lhe é dada na fala é representada por vírgulas ou dois
pontos na escrita (Cunha:1984).
Esse autor afirma, como já se afirmou, que o aposto pode estar
presente em todos os termos oracionais, até mesmo no vocativo e no agente
da passiva.
Essa mobilidade do aposto, que permeia toda a estrutura frasal,
pode ser constatada através dos exemplos extraídos dele, Cunha (1984:164166), que lista as seguintes possibilidades de ocorrência:
a) no sujeito:
“Nós tínhamos imaginado, mamãe e eu, fazer uma grande
peregrinação”. ( G. Aranha, OC,470).
b) no predicativo:
“Ele era o famoso Ricardão, o homem Pequeno”das beiras do Verde.
(G. Rosa, GSV,203).
c) no complemento nominal:
“Dona Tonica tinha fé na sua madrinha, Nossa Senhora da Conceição,
e investiu com muita arte e valor”. ( M. de Assis, OC, 1, 583).
d) no objeto direto:
“Duas especialidades tinha a padaria: os bolachões e as roscas que
me referi em seguida por causa do estranho nome que lhe deram”. ( J.
Amado, HMI, 18).
e) no objeto indireto:
“Casara-se com um bacharel da Paraíba o Dr. Moreira Lima. Juiz em
Pilar”. ( J.L. do Rego, MVA,96).
f) no agente da passiva:
“O nosso candidato, o poeta Martins Júnior, era combatido pelo
candidato baiano Felinto Bastos” (G. Aranha, OC,575).
g) no adjunto adverbial:
- 16 -
“Você não tem relações aqui, no Rio, menino?” (L. Barreto,
REIC,123).
h) em outro aposto:
“Um dos pretendentes a comprar a loja era um português, seu Leal
dono do Quindorá, engenho a dois passos do Vaza-Barris, perto da
Taperoá e junto à vida”.
(J. Amado, HMI,173).
i) no vocativo:
“ Peri, guerreiro livre, tu és meu escravo, tu me seguirás por toda
parte, como a estrela grande acompanha o dia”. (J. de Alencar, OC, 11138).
A esses casos listados por Cunha, acrescentem-se mais dois
retirados de Silva (1978:12):
j) no predicativo do objeto direto:
“ Aclamaram-no representante da classe, Cargo de responsabilidade”.
l) no adjunto adnominal:
“ trouxeram material de Pedro, o nosso colega”.
Como foi dito, as várias ocorrências do aposto em diversas
configurações estruturais já eram percebidas pelos nossos estudiosos
tradicionais, que, com isso, mostram a mobilidade do aposto em forma de
sintagma simples no interior das sentenças.
Quanto à origem do aposto, Luft (1976:143) e Bechara (1978:229)
consideram-no proveniente de uma oração subordinada adjetiva explicativa,
com apagamento do operador ( o pronome relativo) e da cópula. De caráter
transformacional, esta é uma posição antiga na gramática tradicional, como se
pode observar na Gramática Philosófica, de Barbosa (1871), que assim se
manifesta a esse respeito:
- 17 -
a todo apellativo ou adjetivo ou complemento qualificativo com sua
preposição, quando em conjunção se acham appostos ao sujeito ou atributo da
proposição, se entende sempre o relativo conjuntivo que, com o verbo
substantivo, ou no indicativo, ou no particípio em –ndo, equivalendo a uma
proposição incidente ( = relativa), como: O Tejo, rio principal da Europa (que
é um); Lisboa, cidade das mais nobres do mundo (que é uma ) (...) ( Barbosa,
1981:284-285).
Luft (1976) e Bechara (1989) afirmam que é comum encontraremse exemplos de períodos em que o aposto aparece coordenado a uma oração
subordinada adjetiva explicativa, conforme se verifica nos exemplos abaixo:
(12) “O poço da Catingueira, o mais onça da Ribeira do Banabuiu ,que em
1825 não pôde esturricar, sumia-se quase na rocha, entre enormes
oiticicas, de um lado, e do outro o saibro do rio”. ( M. de Paiva- D.
Guidinha do Poço- São Paulo: 1952:22) apud Luft (1976:14)
(13) "Um cunhado dela, irmão do finado Peçanha, que ali morava , não me
chamava de outra maneira”. (M. de Assis,1959:343) apud Bechara
(1989:29).
Para os autores citados, esse fato demonstra que a justaposição
entre o aposto simples e a oração adjetiva explicativa marcava a semelhança
semântica entre eles: ambos possuíam um valor esclarecedor com relação ao
fundamental. Essa relação faz com que o aposto e a oração adjetiva
explicativa subseqüente tenham a mesma função sintática. Tal ocorrência
permite concluir, segundo as gramáticas tradicionais, que há evidência, como
já se disse, de um vínculo entre o aposto, o predicativo e o adjunto adnominal.
A relação semântica existente entre o predicativo e a aposição possibilita
dizer que também ela, a aposição sintagmática, serve para explicar, resumir,
identificar e, finalmente, esclarecer o antecedente. Conseqüentemente, é
possível dizer-se que a aposição pode ser vista como uma construção de
cunho explicativo, esclarecedor.
- 18 -
A questão da necessidade da pausa entre o aposto
e o seu
fundamental levantada pela maioria dos gramáticos, também merece uma
observação. Essa não é uma condição obrigatória, uma vez que o aposto
restritivo, por exemplo, não vem entre vírgulas. Ressalte-se, porém, que a
ausência da pausa implica uma relação semântica mais estreita entre os
elementos envolvidos, que, com o passar do tempo, tendem a incorporar-se de
uma forma mais estreita ao conjunto frasal.
Os diferentes graus de coesão entre o aposto e o fundamental
constituem um modelo de análise discutível, entre os autores tradicionais.
É interessante observar que as gramáticas tradicionais insistem
na necessidade das pausas para a caracterização da aposição, simples ou
clausular. Isso decorre, talvez, do fato de eles, os gramáticos, perceberem que
a pausa na aposição marca a ruptura sintática entre o aposto e o termo que
chamam de fundamental, possibilitando discernir uma aposição de um
predicativo ou de um adjunto adnominal.
Por conseguinte, esse tipo de argumentação se mostra inadequada
ou insuficiente, uma vez que não consegue definir certos casos de aposição,
como a clausular, por exemplo, que ultrapassam o chamado nível sentencial.
São casos semelhantes ao do exemplo abaixo, que são muito comuns,
atualmente, na linguagem escrita de jornais e revistas:
(14) Não resisto à tentação de me referir à crise fabricada por militares da
aeronáutica sobretudo da reserva, no finalzinho de 1999. E que se
prolongou no violento e inexplicável episódio do "reveillon" do Forte
Copacabana. Que precisa ser enfrentado com mais coragem e decisão
pelo presidente Fernando Hemrique na verdade o único atingido. ( Acílio
Lara- Estado de Minas,02/01/00 )
- 19 -
Observe-se que as cláusulas apositivas em destaque apresentam
uma configuração estrutural sintática diferente da apositiva (relativa)
tradicional uma vez que se apresentam isoladas pelos pontos finais e não mais
intervirguladas, ou após dois pontos, como era de costume. Observe-se
também que, no campo semântico, elas ampliam não apenas um sintagma
simples que lhes vem anteposto (o fundamental).
Elas fogem ao modelo
tradicional, pois, na verdade, a informação veiculada
por essas cláusulas
apositivas se refere a toda uma unidade de informação1 que vem anteposta a
ela.
Esse recurso utilizado pelo locutor caracteriza um mecanismo de
adjunção
ou adendo que, segundo
Koch et al
(1990), constitui um
acréscimo que se presta a completar a informação anterior. “O falante sente a
necessidade de enfatizar ou reavivar na mente do interlocutor uma informação
já presente no universo do discurso” ( Koch et al,1990: 172).
O exemplo (14) foi extraído de um texto dissertativo da linguagem
escrita. Mas, também na linguagem oral, pode-se observar a ocorrência de
cláusulas apositivas com características sintático-semânticas voltadas mais
para o campo discursivo, o que implica dizer que uma taxonomia tradicional
não conseguiria enquadrá-las.
Veja-se o exemplo (15), onde o informante, falando de sua tese de
mestrado em Química, interrompe o fio de seu discurso e insere apostos
oracionais, visando fazer retoques de informações anteriores. Esses retoques
visam “reformular as informações precedentes, precisando-as por meio da
repetição de elementos nelas contidos e os acréscimos de elementos
diferentes” (Jubran,1997: 05).
1
Entenda-se por unidade de informação a tradução dada por Decat (1999) para “Idea unit”, conceito
postulado por Chafe (1980). A unidade informacional será melhor comentada no capítulo teórico deste
trabalho.
- 20 -
(15)
I: ... um modelo ele ele é formulado em cima de uma série de
resultados experimentais que ocê tem disponíveis na época depois
você ... acumula certos resultados e vê que esse modelo fica furado
aí cê parte pra outro então ... e :: em vez de achar essa ênfase o que
que a gente acha é uma ênfase assim em distribuição eletrônica em
número QUÂNtico em coisas DA linguagem entendeu? (1) quer
dizer em aspectos ... detalhes da linguagem entendeu? Quer dizer em
aspectos ... detalhes da linguagem ..
D: uhn ...
I: química então ... na verdade eh :: coisa que a gente percebe um ensino
distorcido (2) quer dizer em vez d’ocê ensinar ... uma relação entre
eh teorias ... e modelos e os experimentos cê tá ensinando uma
linguagem ... que o aluno inclusive fica perdido naquele meio né?
ele não sabe pra quê que ele faz aquilo ... (DO1M,6,198-208)2 .
Na cláusula destacada de número (1) - quer dizer em aspectos ...
detalhes de linguagem entendeu? Quer dizer em aspectos ... detalhes de
linguagem química o locutor retoca a informação anterior, tornando-a mais
clara. Acrescente-se, ainda, o fato de a cláusula apositiva de número (2) - quer
dizer em vez d'ocê ensinar ... uma relação entre eh teorias ... e modelos e os
experimentos cê tá ensinando uma linguagem ... ter uma cláusula apositiva do
tipo relativa explicativa, encartada nela: que o aluno fica perdido ali naquele
meio. Há, portanto, uma superposição de apostos em forma de cláusulas.
Nesses exemplos, as cláusulas apositivas parecem pertencer a todo
um complexo sintático-semântico que extrapola as possibilidades de uma
análise tradicional, quer seja no campo sintático, quer seja no campo
semântico.
As gramáticas tradicionais, num âmbito geral, conceituam as
orações apositivas como sendo aquelas que são apostos da oração regente,
funcionando, às vezes, com matizes circunstanciais de um substantivo daquela
2
Nesta pesquisa, foi utilizado o corpus de Decat (1993) na análise realizada por ela. Por esse motivo, as
referências, nos exemplos, colocadas entre parênteses, seguirão as normas adotadas por Decat.
- 21 -
oração. Elas teriam as mesmas características dos apostos circunstanciais, que,
segundo Bechara (1978), como já foi dito, servem para exprimir
circunstâncias de tempo, causa, comparação; e, segundo Kury (1984:82-83),
exprimem circunstâncias de causa, de concessão, de conseqüência, de fim e de
condição.
Esses autores afirmam, ainda, que a orações apositivas são
chamadas de adjetivas por terem o valor de adjetivo. São introduzidas por um
pronome relativo e “como exprimem uma qualidade inerente ao substantivo,
com valor de meros apostos, podem ser eliminadas sem prejuízo da oração”,
segundo Luft (1985:158). Sua função é, segundo esses mesmos gramáticos,
apenas estilística: servem para dar ênfase, reforço. Do mesmo modo, também
para Faraco e Moura (1996:350-351) as “relativas explicativas não limitam o
sentido do antecedente. Acrescentam-lhe uma informação, que pode ser
eliminada, sem causar prejuízos para a compreensão lógica da frase”.
Por uma questão de delimitação do assunto aposição, que é amplo
e muito diversificado, neste trabalho far-se-á o estudo da mesma sob a forma
de cláusulas apositivas, presentes nos gêneros dissertativo e narrativo nas
modalidades oral e escrita da língua portuguesa.
As cláusulas apositivas (isoladas, ou não) aqui estudadas são: as
do tipo relativa explicativa (introduzida por um pronome relativo); a apositiva
do tipo substantiva, isto é, imediatamente colocada após dois pontos; e as
cláusulas apositivas introduzidas por expressões parentéticas do tipo isto é, a
saber, quer dizer, ou seja, etc.
Isso porque numa investigação inicial das cláusulas apositivas no
corpus aqui adotado, pôde-se constatar que, elas podem exercer variadas
funções – à semelhança da aposição em forma de sintagma simples. E
algumas dessas funções de cunho pragmático-discursivo são desconhecidas da
- 22 -
literatura corrente. Tais funções podem ocorrer tanto nos dados de língua oral
quanto nos de língua escrita.
Diante dos problemas apontados até aqui, faz-se necessário um
estudo que enfoque as cláusulas apositivas no âmbito do discurso, sob uma
abordagem funcional e pragmática. Tal abordagem poderá contribuir para
uma melhor compreensão do processo de aposição em si e da sua
manifestação através de cláusulas que se articulam com outros componentes
intra e extra-sentenciais.
Na efetivação dessa empresa, procurar-se-á
observar se as
cláusulas apositivas são meros "termos acessórios", que podem ser retirados
sem prejuízo do sentido das frases, como afirmam nossos gramáticos
tradicionais - ou se elas constituem mecanismos essenciais para a coerência
textual, interferindo na elaboração tópica do texto, ou, até, se constituem
mecanismos que, ao provocarem descontinuidades na progressão temática,
objetivam ainda a coerência do ato comunicativo, visando a interação entre
os interlocutores.
1.2. Objetivos
Conforme se sabe, a língua oral vem atraindo, nos tempos atuais,
a atenção dos estudiosos da linguagem, que procuram enfocá-la em seu estado
de uso real pelos falantes, confrontando-a, muitas vezes, com a escrita.
Partindo do pressuposto de que essas duas modalidades de língua
se relacionam num continuum, o presente trabalho se propõe a atingir os
seguintes objetivos no estudo que empreende acerca da aposição clausular:
a) redimensionar o conceito de aposição, considerando a cláusula
que a expressa como elemento discursivo , tanto oral quanto escrito;
- 23 -
b) demonstrar, à luz de visão interativa, que as cláusulas apositivas
constituem construções parentéticas, que interferem na elaboração
tópica dos textos;
c) mostrar que as cláusulas apositivas também constituem
mecanismos de desaceleração-descontinuidade, na progressão
temática, sob a forma de mecanismos de inserção ou de
reconstrução.
d) verificar
o comportamento da cláusula apositiva nas
modalidades de língua oral e escrita
dos gêneros narrativos e
dissertativos de língua portuguesa.
1.3. Metodologia
1.3.1. O corpus: Constituição e caracterização
A investigação das cláusulas apositivas, nesta pesquisa, baseia-se
em dados lingüísticos que visam considerar a linguagem como instrumento de
interação, em função do seu uso oral ou escrito.
A idéia de que a língua oral e a língua escrita eram oponentes
dentro dos estudos lingüisticos já está modernamente superada. Também a
primazia dada à língua escrita – que ainda hoje existe, mesmo que em menor
escala – com relação à linguagem oral não se apresenta mais para os
lingüistas como uma verdadeira realidade.
Modernamente, tanto a linguagem escrita quanto a linguagem oral
constituem simplesmente modalidades de uso dentro de uma perspectiva
interacional, perspectiva essa que visa o estudo dessas duas modalidades
dentro de um continuum.
- 24 -
Segundo Koch (1987) as diferenças existentes entre as duas
modalidades - oral e escrita - não são bastantes para que possam ser
consideradas como oponentes, uma vez que existe uma escrita informal que
se aproxima da fala formal, dependendo do tipo de situação comunicativa.
Sendo assim, o que se pode afirmar é que a escrita formal e a fala informal
constituem pólos opostos de um contínuum, ao longo do qual se situam os
diversos tipos de interação verbal.
Marcuschi (1996) afirma que tanto a fala como a escrita
apresentam variações. Assim sendo, uma comparação entre ambas deve tomar
como critério básico de análise uma relação fundamentada no continuum dos
gêneros textuais, para se evitar dicotomias estritas. Assim, este autor coloca a
noção de funcionamento da língua como decorrente das condições de
produção, da atividade dos produtores e dos receptores dos textos, situados
em contextos reais de uso, ou seja, a língua como atividade situada e cujas
estratégias fogem, às vezes, do que se convencionou chamar de sistema
lingüístico.
A postura assumida pelo falante “no evento interativo de maior ou
menor focalização no envolvimento interpessoal ou na informação veiculada
é que define as especificidades de cada discurso”. (Tannen 1986, apud Val
1996:146).
Ambos os discursos, oral ou escrito, são contextualizados de
acordo com as circunstâncias específicas de cada um. Tanto um quanto o
outro se baseia num processo interativo que leva o interlocutor a produzir
sentidos, ativando sua capacidade de pressuposição e inferências.
O corpus aqui pesquisado é constituído de um conjunto de textos
narrativos e dissertativos , orais e escritos do acervo de Decat (1993); de cem
textos dissertativos de alunos do terceiro grau e de alguns textos de jornais.
- 25 -
Para melhor explicitar o acervo de Decat, tem-se i) discursos orais - dez
narrativas de experiência pessoal em situação de perigo de vida ou medo; dez
discursos dissertativo-argumentativos contendo exposições orais sobre
trabalhos acadêmicos (dissertação de Mestrado ou tese de Doutorado); ii)
discursos escritos: a) do acervo de Decat (1993) - dez narrativas de
experiência pessoal relatada quando da coleta dos dados orais, dez
dissertativos extraídos dos trabalhos acadêmicos correspondentes à exposição
no momento da coleta dos dados orais; b) cem textos dissertativos de alunos
do terceiro grau; c) alguns textos do jornal Estado de Minas.
Os informantes dos discursos do acervo de Decat são cinco do
sexo feminino e cinco do sexo masculino, todos com nível de escolaridade
superior.
No presente trabalho considera-se cláusula apositiva, como foi
frisado anteriormente, as do tipo relativas explicativas ( introduzidas por
pronome relativo), as apositivas do tipo substantiva ( pospostas a dois
pontos), as apositivas introduzidas pelas expressões do tipo a saber, quer
dizer, ou seja etc. As deste último tipo pertencem ao grupo das apositivas
introduzidas por "indicadores explícitos de aposição" (Quirk et al, 1985:1307,
apud Nogueira, 1999:33)
Não se levou em consideração a cláusula "principal" dentro do
conceito das Gramáticas Tradicionais, uma vez que os estudos sobre a mesma
se atêm ao nível sentencial. Aqui, referendou-se a relação das cláusulas
apositivas numa ótica funcional- discursiva dentro de um contexto maior de
uso da linguagem.
O termo cláusula foi usado para toda estrutura provida de verbo .
Mesmo que fossem dois ( ou mais ) núcleos verbais (repetidos ), considerou-
- 26 -
se uma só ocorrência clausal. Veja-se como exemplo, o de número (16),
extraído de Decat (1993:83)
(16) "teria que ... que podar daqui e dali e terminaria ... terminaria reduzindo
... né? então aquilo me preocupou desde o princípio ... né? ( NDO
6F,6,190-193)
Quanto ao levantamento
quantitativo apresentado no capítulo
três, deste trabalho, ele se prestará como suporte para a análise qualitativa das
cláusulas apositivas na abordagem funcional-discursiva, e possibilitará
observar-se a inter-relação entre o grau de ocorrência das funções dessas
cláusulas e a modalidade lingüística - oral e escrita - em que foram usados.
1.3.2. Suporte teórico
Quanto à linha de abordagem teórica, adotar-se-á
uma ótica
funcionalista, apresentando o texto num nível discursivo, o qual mostre a
articulação da aposição clausular tanto no interior de períodos e parágrafos,
quanto no interior de seqüências textuais.
Essa opção não significa o desconhecimento da importância dos
estudos tradicionais, que, apesar de suas lacunas, são de grande valor, uma
vez que apontam para caminhos a investigar.
O enfoque funcionalista se explica pelo fato de ele possibilitar
uma abordagem da língua em seu processamento e como decorrente de
escolhas feitas por seus usuários.
A já citada falta de consenso entre os gramáticos tradicionais em
determinarem o status morfo-sintático-semântico para a aposição traz,
atualmente, uma certa dificuldade ao processo ensino/aprendizagem no
tocante aos estudos da mesma, apesar de já se encontrar um grande número de
- 27 -
obras publicadas visando a eficácia no desenvolvimento das habilidades
lingüísticas, à luz da lingüística moderna e isso se justifica, pelo fato de ser
somente através da linguagem que os indivíduos transmitem suas
experiências, ascendem à cultura e exercem seu direito de cidadania. Para
tanto, é mister que se leve em consideração o conceito de língua numa
perspectiva enunciativa/discursiva, a qual considere as condições de produção
da linguagem, e, que entenda, também, que a língua só tem existência de fato
no dialogismo, ou seja, como forma de interação social. Segundo Val, “a
linguagem veicula a atividade mental do homem e funciona como
articuladora de sua visão de mundo. As idéias construídas sobre o real se
concretizam na linguagem, em um espaço social e histórico bem definido”.
Val (1996:14). Ao se considerar a língua como uma atividade social, levar-seá em conta a contextualização da linguagem, pois ela ultrapassa “os limites da
sentença e avança na análise de sentenças contextualizadas em textos
extensos” (Castilho:1990:21).
Pelo que se observou, crê-se que realmente haja uma necessidade
de que seja feito um estudo do processo da aposição que se baseie no
enunciado; numa abordagem funcional e pragmática que considere o texto
num nível discursivo. O termo texto será considerado, segundo Val (1993),
como sinônimo de discurso oral ou escrito, "unidade lingüística comunicativa
básica, uma ocorrência lingüística oral ou escrita, de qualquer extensão,
dotada de unidade sócio-comunicativa, semântica e formal”. (Val, 1993:3-4).
Para se constatar o estatuto da aposição clausular como um dos
elementos de organização discursiva, serão tomados, como pressupostos
teóricos, as
postulações de Jubran (1997 ) sobre as funções textuais e
interativas dos parênteses, e os estudos de Koch et al (1990) sobre as
descontinuidades na progressão temática. Originariamente concernentes à
- 28 -
descrição da língua oral, os resultados dos estudos dos autores acima serão
aqui estendidos à análise de dados da modalidade escrita do português.
Com relação ao termo discurso, ele
será considerado, neste
trabalho, como postula Castilho:
Discurso é o mesmo que interação lingüística em presença; discurso é
conversação (envolve todo o processo enunciativo: locutor, interlocutor, o
assunto, a rede de imagens que os falantes fazem de si mesmos e das
pressuposições relativas ao assunto)”. (Castilho:1990:20)
1.4. Plano da Dissertação
Além deste capítulo de
introdução, o presente trabalho
compreende, ainda, dois capítulos e uma parte de considerações finais.
No segundo capítulo, discutem-se os pressupostos teóricos que
embasaram o estudo aqui realizado, pressupostos esses que, como já foi dito,
se assentam em dois grandes pilares: o das funções interativas dos parênteses
de Jubran (1997) e as descontinuidades na progressão temática, de Koch et al
(1990).
No capítulo três, faz-se uma análise geral das funções da cláusula
apositiva no corpus
pesquisado, observando-se seu procedimento nas
modalidades oral e escrita da língua, tanto no gênero narrativo, quanto no
dissertativo.
A seguir, dando fecho ao trabalho, apresentam-se considerações
de ordem final, à guisa de conclusão, que constituirão uma espécie de balanço
dos resultados obtidos.
- 29 -
CAPÍTULO 2
A aposição: trajetória e caracterização
2.1. Introdução
O fenômeno da aposição
foi percebido desde a antigüidade,
aproximadamente a partir do século XVI. Também nessa mesma época é que
surgiu o termo aposição nas primeiras Gramáticas Latinas. No entanto, a
aposição
somente foi verdadeiramente fixada como conceito que designa propriedades
sintáticas da palavra ou da proposição, na passagem entre os séculos XIX e
XX. Tal como outras categorias funcionais (o epíteto, o complemento de
circunstância) , a aposição era vista como uma figura da retórica, Bernard
Colombat, estudando a origem medieval das figuras de construção, identifica a
aposição como uma delas: prolepsis, syllepsis, zeugma, synthesis, antitosis,
evocativo, appositio, synecdoche. A existência da noção de aposição é
atestada desde a retórica latina ( ... ). Às vezes, ela é designada pelo nome de
epixegese, do grego epexegesis que significa explicação adjunta. (Nogueira,
1999:17).
Somente aos poucos é que a aposição foi tomando o campo
gramatical dentro da categoria do nome nas gramáticas latinas. O que era
analisado nas gramáticas latinas como aposto passa a ser considerado um
substantivo atributo que concordava com o seu antecedente em gênero e
número, nas línguas românicas.
Na língua portuguesa, a aposição era vista como um adjunto
atributivo, hoje, adjunto adnominal. Essa função pode ser encontrada em
gramáticas que antecederam a Nomenclatura Gramatical Brasileira, como a de
Góis (1960), já citada no capítulo 1, deste trabalho.
Como foi dito ali, modernamente, a aposição, principalmente a
clausular, exerce papéis importantes nos textos orais e escritos. Na linguagem
escrita, a cláusula apositiva chega até mesmo a se apresentar - apesar de ser
considerada uma cláusula subordinada - desgarrada3 da oração principal. Isso
acontece
com
muita
freqüência
em
textos
da
linguagem
escrita,
principalmente na linguagem jornalística.
Mas, é interessante observar que, no âmbito da Gramática
Tradicional, Bechara (1978) já fazia referência ao caso desse tipo de
apositivas chamadas desgarradas, quando afirmava:
As orações apositivas admitem ainda uma expressão resultante do cruzamento
da construção conectiva com a construção justaposta. Dizendo: uma coisa vos
confessarei, que os portugueses são homens de ruim língua, misturam-se dois
tipos:
a) uma coisa vos confessarei: os portugueses são homens de ruim língua
(justaposição);
b) Eu vos confessarei que os portugueses são homens de ruim língua (conexão).
Nestas circunstâncias, a pontuação pode ser diferente da do trecho acima. A
oração que contém o substantivo pode terminar por ponto, e o apôsto
encabeçado por "que", iniciar com letra maiúscula, dando a impressão de
oração à parte: "O noctivago sente na sua individualidade, nos calos e no seu
nariz, a doce impressão panteísta das árvores e dos calhaus. Que este globo
muito bem feito. (Camilo, A Brasileiras de Prazins, 314, Ed. 1882).
A oração que este globo está muito bem feito é, parece-me, apôsto de "doce
impressão", e não subordinada causal como pensa o professor Daltro Santos
no comentário de nº 280 da Antologia Nacional. (Bechara, 1978:135-136).
3
O termo “desgarrada” é utilizado por Decat (1999) para designar a cláusula apositiva que se apresenta, na
língua escrita, formalmente independente da cláusula matriz, constituindo um período à parte.
- 31 -
Pode-se perceber a hesitação de Bechara ao conceituar a cláusula
Que este globo está muito bem feito, quando ele faz a afirmação “parece-me
apôsto de doce impressão”. Apesar de já perceber o fato de a cláusula em
grifo ser desgarrada, ele hesita em dar uma clara definição das características
sintático-semânticas da mesma. A gramática tradicional não responde a essa
dúvida, porque, como já foi dito, sua abordagem vê a aposição como uma
construção meramente sintática, superficialmente semântica, nada pragmáticodiscursiva; e acrescente-se, ainda, bem distanciada de um contexto
comunicativo.
A cláusula apositiva desgarrada, segundo Decat (1999), constitui
uma estrutura em que a apositiva se apresenta de uma forma sintática
independente da cláusula matriz, como que formando uma unidade
informacional (“idea unit”, segundo Chafe, 1980) por si mesma. Conforme
aponta Decat (1999:27) trata-se, para Chafe, de um “jato de linguagem que
contém toda a informação que pode ser manipulada pelo falante num único
foco de “consciousness” (ou estado de consciência, conforme Kato,
1985:35)”.
Esclarece, ainda, a autora, que para Chafe a unidade informacional
pode "ser expandida por intermédio de mecanismos variados, dentre os quais
as
cláusulas
complemento
e
as
cláusulas
relativas
restritivas"
(Decat,1999:27). A partir de tal constatação, Decat estabeleceu a “diferença
entre encaixamento e hipotaxe ou entre integração estrutural e opção
organizacional” (op.cit,p.27), o que, segundo a autora, poderia esclarecer "a
questão da (in)dependência das cláusulas". Decat realizou um teste sobre
graus de dependência entre tais cláusulas e os resultados obtidos levaram às
seguintes considerações, dentre outras:
- 32 -
1. a proximidade semântica e a semelhança estrutural entre orações
coordenadas e subordinadas conduzem a dificuldades na distinção entre
esses dois processos;
2. o comportamento diferenciado das cláusulas substantivas e adjetiva
restritiva, de um lado, e das adverbiais e apositivas, de outro, decorre do
fato de as primeiras constituírem estruturas de encaixamento, ou seja,
integradas estruturalmente em outra cláusula numa função de
ARGUMENTO, fazendo parte, portanto, de uma mesma unidade de
informação. Já as segundas (as apositivas) funcionam como ADJUNTOS,
caracterizando-se como opções organizacionais do discurso, constituindo,
pois, unidades de informação à parte.(Decat, 1999:29).
Ainda segundo a autora, essa relação de dependência menor faz a
cláusula caminhar para uma independência sintática da qual
origina o
desgarramento.
E esse fato vem comprovar a grande incidência de cláusulas
subordinadas
(como a apositiva, por exemplo) constituindo sozinhas
enunciados, como atesta o exemplo a seguir:
(17) Criticados pelas organizações da "moderna" esquerda, o PT e seu braço
sindical, a
CUT, toda a legislação trabalhista rapidamente virou a
responsável pelos males que assolam os órgãos de representações de
classe, tornando-se sua revogação talvez a última peça restante para
favorecer o capital predatório. Substituí-lo por algum tipo de arcabouço,
que assegure o mínimo de direitos, no entanto, trata-se de outra história.
Que depende de poder político econômico - que o diga o ex-ministro
Edward Amadeu, que em 1998 recebeu com aquiescência o projeto do
então presidente da Federação das indústrias cariocas (Firjan). Artur João
Donato". (Estado de Minas 01/01/2000 ).
A cláusula apositiva em grifo é do tipo relativa explicativa que se
apresenta desgarrada, semelhante a um adendo (ou afterthought), com a
função de um acréscimo da informação veiculada pelo termo história. A
apositiva desgarrada (destacada) é de natureza enfática e aparece em forma de
um adendo (Koch et al, 1990).
- 33 -
Essa apositiva desgarrada da principal, constituindo um período à
parte, abrange um discurso maior do que a sentença, e traz uma informação
que vai além do simples fato de esclarecer um fundamental. Seu fundamental
é, na verdade, todo o contexto ao qual se integra.
Nossos autores tradicionalistas, como já foi dito na introdução deste
trabalho, analisaram a cláusula apositiva apenas no nível sentencial, a partir de
um corpus escrito que, na maioria das vezes, era retirado do registro literário.
Assim, a aposição sintagmática simples apresenta ainda hoje uma
classificação um tanto quanto divergente. Havia e há muitas contradições na
sua caracterização. Como já se disse, o aposto simples, por exemplo, era
comparado a um substantivo (Câmara Jr.,1961:57), um adjetivo, (ou locução),
pronome, advérbio ou oração (Kury, 1984:99). Também alguns autores o
comparavam ao adjunto adnominal, ao predicativo e ao adjunto adverbial. (Cf.
Góis (1960), Nascentes (1959) e Bechara (1989)).
A única unanimidade encontrada, como já se sabe, é quando aqueles
autores reconhecem o caráter explicativo da aposição e a sua característica de
termo acessório. Consideravam-no também de pouca importância para a
estrutura frasal. No entanto, reconhecem sua mobilidade, como está bem
exemplificado em Cunha (1980), e como foi apontado na introdução deste
trabalho.
2.2. A aposição em forma de sintagma simples
A aposição, sob forma de sintagma simples ou de sintagma
oracional, constitui comentários acerca do fundamental, do conteúdo
proposicional da cláusula anterior, ou, até mesmo, de uma unidade
- 34 -
informativa, ou seja, algo anteriormente expresso e que vai além de um
simples fundamental.
Dentro da relação semântico-pragmática de correferência entre os
termos de uma aposição, Câmara Jr. ( 1961:47 ), afirma que "a aposição é uma
seqüência, que gira em torno de um centro, e que se apresenta distinta de
seqüências de caráter centrífugo (no qual cada elemento tem o seu próprio
ponto de referência)". Essa correferencialidade chega a ser vista como
característica fundamental da aposição. Embora isso ocorra, existem
estudiosos do assunto que não consideram a correferencialidade como
determinante da aposição, uma vez que ela não está presente em algumas
estruturas que normalmente são analisadas como apositivas. É o caso da
aposição restritiva, na qual a aposição constitui, juntamente com o
fundamental, uma única unidade de informação. Tanto é assim que, nesse
caso, inexistem as pausas (na fala) e os sinais de pontuação (na escrita).
Exemplo:
(18)
A cidade de Itaúna é universitária.
O aposto restritivo de Itaúna é também chamado de aposto
especificativo por alguns gramáticos, como Kury (1973), por exemplo.
Várias são as relações semânticas da aposição em forma de
sintagma simples. Além de restringir ou
especificar o fundamental, esse
sintagma pode, ainda, segundo Luft (1985:43 ), ser:
1- Definitório - quando define o fundamental:
Carlos Gomes, glória da música brasileira, escreveu uma opera imortal - O
Guarani.
2- Enumerativo - quando apresenta uma enumeração:
- 35 -
Os recém-chegados, um francês, um italiano e dois alemães, tomaram assento
à mesa.
3- Atributivo, explicativo: geralmente com conotações adverbiais - expresso
por sintagmas preposicionais; com o antecedente muitas vezes suprimido:
Satisfeitos, os alunos corriam pelo pátio.
Kury (1973) chama o aposto atributivo ou explicativo de aposto
atributivo ou predicativo. Esse autor apresenta ainda o aposto recapitulativo,
cuja função é recapitular ou resumir o fundamental. Veja-se o exemplo a
seguir:
(19) Ao princípio era um só; depois dez, vinte, trinta, mulheres e homens ...
tudo a contemplar o Jó.
Luft (1985:44) atribui as seguintes conotações adverbiais ao
aposto em forma de sintagma simples:
ü causal:
Impulsivo e rixento, seus colegas o evitaram ( porque era, por ser ... )
ü concessivo:
Especializado na matéria, ninguém o consultou.
ü Temporal:
Em criança, era vivo e irriquieto.
ü condicional:
Reprovado, que dirão teus pais?
ü comparativo:
Pomba sem fel, deixou-se lograr, etc.
A função de aposto enumerativo é também chamada de
recapitulativa por Cunha e Cintra (1985:162), onde ele cita, como exemplo:
- 36 -
(20)
Tudo no homem passeia: o corpo e a alma, os olhos e a imaginação. (J.
de Alencar, OC. IV, 666)
Melo (1978), além das circunstâncias de causa, tempo,
comparação e concessão, já exemplificadas anteriormente, aponta a função de
modo ou situação para esse tipo de aposto. Veja-se:
(21)
Murinhém atravessou rápido a campina e apresentou-se em frente de
Camicrã, chefe dos tapuias. (Alencar, Ubirajara, p.127) apud Melo
(1978:79)
Em nossas gramáticas tradicionais, o papel semântico da aposição,
em forma de sintagma simples, já era bastante diversificado, como o é
atualmente. Ele restringe, explica, define, atribui qualidades, recapitula, enceta
várias circunstâncias, enumera, resume o fundamental que o antecede.
Veja-se o quadro I, demonstrativo de algumas funções da aposição
em forma de sintagma simples, extraídas de algumas gramáticas tradicionais.
- 37 -
Quadro I - Comparativo das classificações de alguns apostos
Exemplos de alguns apostos
Função Morfológica
Função SintáticoSemântica
1- "Carlos Gomes, José de Alencar, Pedro Américo Substantivo e adjetivo
são algumas de nossas glórias nacionais".( Mattoso
Câmara".
2- "Anchieta, o fundador de São Paulo, era jesuíta". Locução adjetiva
Apostos atributivo ou
predicativo
Aposto explicativo
( Silveira Bueno )
3- "Alexandre, rei da Macedônia, venceu Dário, 1.
locução adjetiva
rei dos persas". ( Antenor Nascentes ).
locução adjetiva
2.
4- "Renato, amigo nosso, não nos abandonou (Said Substantivo
Aposto explicativo
Aposto explicativo
Ali )
5- "Fruta verde é nociva". ( Said Ali )
Adjetivo
6- "A diretora do colégio tem cabelos louros". (Said Locução adjetiva
Aposto especificativo
Aposto especificativo
Ali )
7-"Meu trabalho está terminado". 9 Said Ali )
Pronome possessivo
8- "Não gosto de discursos compridos". (Gama Locução adjetiva
Aposto especificativo
Aposto especificativo
Kury )
9- "Cidade de Roma". (Gama kury )
Locução adjetiva
Aposto especificativo
10- "Montes Pirineus". ( Gama Kury )
Substantivo/adjetivo
Aposto especificativo
11- "Bela, todos a cortejam". ( Gama Kury)
Adjetivo
Aposto atributivo ou
predicativo
12- "Ao princípio era um só, depois, dez, vinte, Pronome indefinido
Aposto resumitivo
trinta homens... tudo a contemplar Jó". ( Gama
Kury )
13- "Você, sua besta, fez-me dar um trambulhão". Pronome possessivo + Aposto
( Carlos Góes )
substantivo
atributivo
ou
predicativo
14- "Tu, i meu amor, estás cada vez mais magra". Pronome possessivo + Aposto predicativo
(Mira Mateus)
substantivo
15- "João, todo contente, partiu para os EUA". Locução adjetiva
Aposto
atributivo
(Celso Cunha )
predicativo
16- "Tudo no homem passeia, o corpo, a alma, os substantivos
Aposto enumerativo
olhos e a imaginação". (Celso Cunha)
17- "O poeta Olavo Bilac ..."
18- "O romance Dom Casmurro"(Rocha Lima).
Substantivo próprio
Substantivo
Aposto especificativo
Aposto especificativo
19- "A lagoa Rodrigo de Freitas". ( Rocha Lima )
Substantivo próprio
Aposto especificativo
20- "O rio Tejo..."( Rocha Lima )
Substantivo próprio
Aposto especificativo
- 38 -
ou
2.3. A aposição em forma de sintagma oracional
Quanto à aposição em forma de cláusulas, as gramáticas
tradicionais chamam essas cláusulas, de adjetiva explicativa e substantiva
apositiva. E, como o aposto, servem apenas para acrescentar uma informação
às cláusulas que as antecedem.
Nas gramáticas tradicionais, a cláusula apositiva, não raras vezes,
é considerada similar a outros tipos de cláusulas. Apenas em Bechara (1978) é
que se pode observar que a cláusula apositiva já era considerada à semelhança
da “oração absoluta”, isto é, “apositiva-absoluta”. Esse tipo de apositiva, que
se apresenta após um ponto final, é coincidente com a cláusula apositiva
“desgarrada”, segundo Decat (1999), como já foi apontado anteriormente.
Bechara acrescenta, também, que as orações adjetivas explicativas, hoje
apositivas, “não assumem apenas o sentido qualificativo, elas podem ainda
exprimir relações de fim, causa, conseqüência, concessão ou serem
adversativas”. Bechara, 1978;144).
Em Diniz (1964), também não há uma clara definição da cláusula
apositiva. Veja-se a diferença que ele estabelece entre as construções “Sei uma
coisa: que não serás aprovado nos exames” e “Eu lhe disse: não serás
aprovado nos exames”:
( ...). Enquanto no primeiro exemplo, em cada uma das duas orações do
período encontram-se todos os seus termos essenciais e integrantes, no
segundo exemplo o verbo _ “disse”, da primeira oração, tem por objeto direto
a oração seguinte. Embora seja isso uma verdade, não se admite seja a
segunda oração _ “não serás aprovado nos exames”, Uma oração
subordinada substantiva objetiva direta; devemos antes analisar essa oração
do mesmo modo que a primeira como absoluta, reconhecendo na frase, a
existência de dois períodos simples. Compreenda-se a razão dessas duas
- 39 -
soluções diversas: no primeiro exemplo, a segunda oração _ “que não serás
aprovado nos exames” regida de um conectivo (“que”) de subordinação, não
poderia deixar de ser subordinada; no segundo exemplo, a segunda oração _
“Não serás aprovado nos exames” com verbo no indicativo e não regida de
conectivo de subordinação, não poderia ser subordinada embora servindo de
objeto direto da primeira oração. (...) (Diniz, 1964:48-49).
Como se pode observar, as orações que o autor coloca em
discussão se apresentam após dois pontos, o que caracteriza formalmente,
segundo a gramática tradicional, a cláusula apositiva de natureza substantiva.
Ao final do excerto, não há como se concluir se as cláusulas em destaque são
substantivas objetivas diretas, se são apositivas, ou se são “períodos simples”.
A verdade é que a oração não serás aprovado nos exames não poderia ser
substantiva objetiva direta, segundo o autor, embora ele afirme que ela é
objeto direto da oração anterior. Não se vê, também, nenhuma das conjunções
integrantes “que” e “se” que tradicionalmente introduzem as orações
substantivas. Logo, ela não constitui uma substantiva. Nada fica claramente
definido.
Em resumo, pode-se dizer que os autores tradicionais, de um
modo geral, consideram certas orações justapostas como coordenadas
assindéticas e vêem a cláusula apositiva como oração absoluta, ou, às vezes,
como uma oração principal ou coordenada antecipada no corpo da oração
anterior4.
Kehdi (1982) faz um amplo estudo da aposição oracional,
abordando desde a colocação do "aposto" na oração e do "aposto oracional"
no período, chegando até às orações justapostas. É bom lembrar que os
estudos sobre a aposição clausular analisavam a cláusula apositiva ora
4
Sendo esse assunto também de natureza complexa, o seu desenvolvimento mais acurado estrapola o tema
deste trabalho. Por esse motivo, não será aprofundará no mesmo, dentro de uma perspectiva tradicional.
- 40 -
como "oração absoluta”, ora como oração adverbial, ora como substantiva,
reduzidas ou não, indo até as orações desenvolvidas (introduzidas por um
pronome relativo).
Aponta, também, este autor, que a cláusula apositiva, geralmente,
se pospõe à cláusula anterior, que contém em seu final o termo chamado
fundamental. Se esse termo fundamental estiver no início da oração anterior, a
cláusula apositiva pode aparecer imediatamente após ele, adquirindo, então, as
características de cláusulas parentéticas. Esse caso vem coincidir com as
apositivas parentéticas (a serem aqui estudadas), cujas funções são de clarear,
exemplificar, justificar, reparar, explicitar, etc, a informação anterior. No caso
em que a apositiva se refere não a um termo da oração antecedente, mas a essa
como um todo, observa Kehdi que o caráter de aposição é menos perceptível.
Quanto à relação das cláusulas apositivas com as orações
coordenadas, esse mesmo autor afirma que há uma diferença semântica e uma
diferença formal entre elas. As cláusulas apositivas, por constituírem uma
"explicitação do antecedente", pode-se sempre antepor-lhes uma expressão
parentética, como "isto é", "a saber". Se, ao contrário, se antepuserem as
conjugações coordenativas "e', "ou" ou "mas", seriam obtidas estruturas
"canhestras ou inaceitáveis" (Kehdi,1982:126). Kehdi cita um exemplo
extraído de Machado de Assis:
(22)
Não tive filhos: (isto é) não transmiti a nenhuma criatura o legado da
nossa miséria.
Substituindo-se o “isto é” pelas conjunções coordenativas “e”,
“ou” e “mas” o resultado seria “estranho” ou “inadmissível”.
Com relação ao fato de as cláusulas apositivas, às vezes, se
assemelharem às cláusulas adverbiais devido às circunstâncias que aquelas
- 41 -
podem apresentar, as observações dadas por Kehdi (1982) apesar de se
referirem à aposição sob forma de sintagma, podem se estender à aposição
sob forma de cláusulas:
Queremos, contudo, assinalar que o aposto pode ter, também, valor
circunstancial porque, como elemento procedente de uma subordinada adjetiva
explicativa, acaba herdando desta as noções circunstanciais que ela acumula.
(... )
Para explicar esse fato, é necessário fazer algumas considerações prévias
sobre as orações subordinadas adverbiais em geral ( ... ), podemos constatar
que elas são introduzidas por conjunções subordinativas, monemas funcionais,
de valor explícito: embora exprime concessão; se exprime condição, etc. São,
portanto, sintagmas autônomos, o que lhes possibilita certa mobilidade no
interior do período. (... )
Ora, (...) já assinalamos que o aposto circunstancial corresponde ao
predicativo de uma subordinada adverbial, com elipse do conectivo e do verbo
de ligação. Representante de uma subordinada, esse aposto pode permutar
pela frase, à semelhança do que ocorre com a oração circunstancial.
(Kehdi,1982:144-146).
O autor declara ainda que, quando o aposto se afasta mais do
fundamental, o "caráter circunstancial" passa a ser mais perceptível, porque
ele perde o seu caráter atributivo. O que as gramáticas apresentam como
aposto circunstancial são exemplos de apostos distanciados ao máximo do
respectivo fundamental.
Kehdi (1982) afirma, ainda, que "a parentética é, a rigor, uma
coordenada que, em vez de colocar-se após uma outra, vem interrompê-la,
como que antecipando-se a ela". Exemplifica e comenta:
"O meu ideal, que fosses médico, havia de realizar-se".
Normalmente o aposto oracional segue-se à oração antecedente:
"O meu ideal de realizar-se: que fosses médico'.
Neste caso, podemos perceber que o valor parentético desaparece (...) (Kehdi,
1982:169-170).)
- 42 -
Ele assinala que essa não é uma única marca que caracteriza as
parentéticas: a mudança de tom (indicada na escrita por sinais específicos de
pontuação) pode fazer com que uma cláusula seja intercalada.
As "orações intercaladas" de citação, que são consideradas por
alguns autores como principais, apresentam, segundo Kehdi, razões formais
que justificam a sua classificação como parentéticas. "Não só são
pronunciadas em um tom diferente com relação à outra oração, como também
se deslocam com relação a esta". (Kehdi, 1982:172).
Em alguns outros lingüistas modernos, como, por exemplo, Perini
(1989), percebe-se que a relação tanto sintática quanto semântica da cláusula
apositiva com os demais sintagmas é de subordinação. Assevera esse autor
que "complexos nos quais a oração subordinada é vinculada ao resto do SN
através de um elemento relativo, tirado de uma pequena lista: que, o qual,
quem, cujo e onde. (...) aparecem tipicamente com função de modificador".
(Perini, 1989:22).
Em Souza e Silva & Koch (1986) lê-se:
As orações relativas, denominadas adjetivas na gramática tradicional, podem
ser de dois tipos: as restritivas, que funcionam como sintagmas adjetivais e
apresentam-se encaixadas na posição de modificador do nome, conforme a
regra SA O2 e as apositivas, que funcionam como aposto e se originam de
frases coordenadas na estrutura profunda, razão pela qual serão examinadas
no capítulo referente à coordenação (Souza e Silva & Koch, 1986:113).
Subentende-se que as cláusulas apositivas são de natureza
coordenada e, no que diz respeito à coordenação de orações, as autoras alegam
serem as orações coordenadas estruturalmente independentes, não exercendo,
assim, função sintática "dentro da outra". Não há o encaixe de uma oração no
lugar de um dos termos da outra, como ocorre na subordinação.
- 43 -
As autoras acrescentam que essa operação de coordenação de duas
ou mais orações tem, por parte do locutor, o objetivo de estabelecer entre elas
determinado tipo de relação significativa. Por esse motivo, julgam que não é
possível afirmar que essas orações sejam "independentes entre si". Afirmam
ainda:
As relativas apositivas, por seu valor de aposto, originam-se de orações
coordenadas e se encaixam ao lado do SN que contém o elemento idêntico.
Denominadas explicativas, pelas gramáticas tradicionais, distinguem-se das
restritivas, porque estas resultam de orações subordinadas e se encaixam,
dentro do SN. ( Souza e Silva & Koch, 1986:130-131 )
Apontam as autoras uma outra distinção entre as "relativas
apositivas" e as restritivas dada por fatores de ordem semântica e pragmática.
As restritivas indicam limitação na referência ao antecedente, isto é, fazem
uma asserção sobre um subconjunto do conjunto universo a que se refere, e as
"relativas apositivas" “fazem uma
asserção sobre todos os elementos do
conjunto representado pelo antecedente (que pode ser, evidentemente, um
conjunto unitário)”. Não havendo delimitação nesse caso. E as autoras
exemplificam:
(23)
As obras primas que foram premiadas são valiosas (apenas aquelas que
foram premiadas, não todas).
(24)
As obras primas, que foram premiadas, são valiosas (todas as obrasprimas foram premiadas).(apud Souza e Silva & Koch, 1986:114)
Assim, o uso das vírgulas, nas relativas apositivas, é "uma
decorrência de fatores sintático-semânticos e não um critério de classificação".
- 44 -
E assim, para se fazer uma distinção entre relativa restritiva e uma apositiva
depende-se do contexto a que pertençam. Não se pode deixar de lado, é claro,
os fatores pragmáticos que envolvam as relativas apositivas. Quanto a isto,
Souza e Silva & Koch afirmam que esses fatores não podem ser
desconsiderados, porque que as relativas apositivas exprimem, em grande
número de casos, o conhecimento de mundo do locutor, a sua pressuposição
acerca do conhecimento do interlocuotr, as crenças partilhadas por eles, etc.
Como se vê, continua em discussão o caráter coordenado ou
subordinado das cláusulas, e entre elas o da cláusula apositiva.E quanto a isto,
Decat (1999), no seu artigo sobre a (in)dependência de cláusulas já citado
anteriormente, enquadra as cláusulas apositivas “desgarradas” no rol das
cláusulas que representam opções organizacionais para o usuário da língua, e,
conseqüentemente, independentes. De acordo com os estudos feitos pela
autora, pode-se concluir que, das cláusulas apositivas, pelo menos as do tipo
relativa explicativa são vistas como cláusulas que se apresentam de forma
coordenada sintaticamente às cláusulas com as quais se relacionam.
A aposição sob forma de cláusula será vista, então, como uma
opção organizacional do discurso por parte do locutor, que a seleciona como
um dos recursos expressivos e, sobretudo, como recurso de coesão, levando-se
em conta o objetivo que se pretende alcançar junto ao interlocutor.
Também Souza e Silva & Koch (1986), há pouco citadas,
referenciam, com relação ao processo de coordenação ou subordinação, as
colocações feitas por Bally:
no caso de frases ligadas, tem-se um enunciado único, resultante de um só ato
de fala. Na coordenação, trata-se de dois enunciados, resultantes de dois atos
de fala diferentes, em que o segundo toma o primeiro como tema: tem-se uma
estrutura semântica em que ocorre uma sucessão de enunciados.(Souza e Silva
& Koch, 1986:115).
- 45 -
Em suma, parece que o processo de coordenação e subordinação
tradicional carece de ser discutido dentro de uma ótica das relações
semântico/pragmáticas as quais são estabelecidas dentro de enunciados que se
apresentam, por sua vez, ligados às intenções do falante.
2.4. A cláusula apositiva na lingüística moderna
Como se sabe, os dados deste trabalho foram embasados numa
perspectiva em que se somaram aspectos da teoria de Koch et al (1990) e
Jubran (1997).
Postulam esses estudiosos que o discurso oral dialogado constitui
um processo de gerenciamento
verbal em curso. Os teóricos do grupo de
Koch at al (1990) estudam a descontinuidade na progressão temática e
mostram os fenômenos da inserção , que são elementos parentéticos e
seqüências laterais; e a reconstrução , que é constituída pelas repetições, os
reparos, as paráfrases e os adendos ( ou "afterthoughts")
no interior da
unidade discursiva, objetivando as funções comunicativas e interacionais
dessas unidades.
A teoria de Jubran (1997) apresenta uma tipologia das funções
textuais-interativas exercidas por parênteses em textos falados. Essa teoria é
de cunho textual-interativo e obedece a princípios e critérios pragmáticointerativos, para uma classificação das funções pragmático-textuais das
inserções parentéticas . Segundo Jubran (1997), os parênteses são um dos
recursos pelos quais os interlocutores articulam o texto falado. É através deles
que são explicitadas avaliações “que os interlocutores fazem do quadro sócio-
- 46 -
comunicativo no qual interagem, pondo à mostra o processamento discursivo”
(Jubran, 1997:01).
Esses parênteses podem ocasionar desvios momentâneos do
quadro de relevância tópica de um segmento textual, tendo como objetivo
conjugarem o interativo com o textual. Constata-se, então, que, de um lado, há
os parênteses que são mais desviantes do tópico e, de um outro lado, há os
parênteses menos desviantes do tópico; mesmo os parênteses mais desviantes
têm uma repercussão no texto: apesar de quebrarem a função temática,
acabam incidindo “dominantemente sobre o ato enunciativo” (Jubran,
1997:02). E essa ocorrência demonstra que, na verdade, esse tipo de estratégia
parentética está “perspectivando as condições enunciativas necessárias à
própria existência do texto”(Jubran, 1997:02).
A partir desses fatos, Jubran estabelece uma tipologia de funções
textuais-interativas dos parênteses, chegando a quatro grandes classes que
envolvem fatores implicados pelas perspectiva textual-interativa, que
enfocam: (a) a construção tópica do texto, (b) o locutor, (c) o interlocutor e (d)
o ato enunciativo.
Dentro dessas funções parentéticas, relacionadas com os
enunciados de relevância tópica (por manterem conexões de conteúdo com
eles), a autora citada postula as funções parentéticas de: esclarecimento,
analogia, exemplificação, justificativa, correção, ressalva, retoque e
desdobramento de informações tópicas.
Outra teoria na qual este trabalho se apoiará, como já se disse, é a
de Koch et al (1990) onde são estudados os aspectos do processamento do
fluxo de informação, relacionando-o à progressão do tema no discurso oral
dialogado. Estabelece essa teoria que o fluxo de informação pode se
desenrolar no interior das unidades discursivas de duas maneiras: i)
- 47 -
naturalmente, de modo contínuo e por isso mais rápido; ii) obstaculizado,
provocando descontinuidades, acarretando um ralentamento na progressão
temática. Segundo esses autores,
as descontinuidades, que muitas vezes subvertem a organização canônica dos
constituintes da frase, podem desenvolver funções pragmático-interativas,
devendo ser examinadas à luz do modus comunicativo postulado por Mônnink
(1980) apud (Koch et al 1990:147).
E com base essencialmente no fenômeno de descontinuidade
(rematização parafrástica) é que os autores analisam os diferentes recursos de
inserção e de reconstrução.
Dentro do processo de inserção no tema das chamadas frases
hóspedes
existem
várias
funções
comunicativas:
de
contato,
de
esclarecimento, citações, atenuações, ressalvas, indicações atitudinais e
modais, avaliações, correção + esclarecimento.
O processo de reconstrução pode efetuar-se por mecanismos de
repetição (que constituem os reparos e as paráfrases), ou por mecanismos de
adjunção (que são informações dadas sob forma de adendos ou aposições). O
adendos são acréscimos a posteriori (aferthought), os quais os autores
consideram como sendo categoria prototípica desse tipo de reconstrução.
Como tais teorias constituem o suporte da presente pesquisa que
pretende realizar uma análise da aposição na sua forma clausular, tanto na
língua oral quanto na língua escrita, passa-se, nas próximas seções , à
apresentação das mesmas, inserindo-se, de quando em vez, um exemplo do
corpus desta pesquisa, visando uma comparação à priori entre teoria e corpus
utilizado, e, ao mesmo tempo, já referendar a adoção de tais teorias.
- 48 -
2.4.1.
Cláusula
apositiva
parentética:
funções
textuais
interativas.
Os aspectos formais da cláusula apositiva, tais como as pausas que
a separam do conjunto, a mudança de tom indicada na escrita por sinais
específicos de pontuação, fazem com que esse tipo de construção se aproxime
de um mecanismo de parentetização, que vem sendo descrito no discurso oral
por diversos pesquisadores, dentre os quais destaca-se, neste trabalho, como já
colocado, Jubran (1997), que vê os parênteses sob uma perspectiva textual interativa e classifica essas inserções parentéticas, como já foi dito, com base
em princípios e critérios de funções pragmático-textuais exercidas por elas.
Essa perspectiva textual-interativa vê o interacional inerente ao
lingüístico e a interação verbal como resultado do exercício de uma
competência comunicativa que se realiza por meio de textos. E é por meio
desses textos que os interlocutores executam interativamente procedimentos
parentéticos, explicitando as suas avaliações acerca do contexto sóciocomunicativo onde interagem. E essa formulação do que se diz vem repercutir
no que se diz; daí que, segundo Jubran (1997) "os parênteses operam desvios
momentâneos do quadro de relevância tópica de um segmento textual" Jubran
(1997:03). E esses desvios podem ser identificados e caracterizados porque
possuem "marcas formais típicas de elemento inserido".
Ao conjugarem o interativo com o textual, os desvios parentéticos
do tópico discursivo podem apresentar desvios momentâneos do quadro de
relevância tópica de um segmento textual. Isso quer dizer que os parênteses
são desvios, caracterizados de acordo com o critério do tópico textual. E
como se disse, essa propriedade dos parênteses vai englobar os seguintes
- 49 -
traços: i) incide sobremaneira sobre o ato enunciativo, mas, ainda que
quebrem o fluxo temático, mantêm condições enunciativas necessárias à
compreensão do texto; ii) e, ao contrário, quando os parênteses são menos
desviantes do tópico, ou seja, quando se referem mais aos enunciados de
relevância
tópica,
esclarece-os,
amplia-os,
exemplifica-os,
indicando
características pragmáticas para a sua ocorrência.
Os parênteses são vistos como menos desviantes quando incidem
mais sobre a construção do tópico discursivo, e são menos desviantes e, logo,
mais típicos, quando, ao quebrarem o fluxo temático, focalizam o processo de
enunciação em si.
As cláusulas apositivas, aqui em estudo, parecem identificar-se
com a primeira classe de parênteses da tipologia proposta por Jubran (1997),
ou seja, daquela tipologia que inclui parênteses voltados para a elaboração dos
tópicos discursivos, principalmente no que diz respeito ao conteúdo tópico e à
formulação lingüística
desse conteúdo. Segundo a autora, esse tipo de
parentetização é menos desviante do tópico, porque mantém “conexões de
conteúdo” com ele. Dessa maneira, são as propriedades formais de
parentetização (pausas, possibilidade de interrupção sintática do enunciado em
que se encaixam e posterior retomada do mesmo, marcadores de suspensão e
de retorno tópico do elemento inserido) que justificam ser esta primeira classe
de natureza parentética.
As cláusulas apositivas refletem em si dados da situação
enunciativa, os quais referendam um ato de interação. Então esses aspectos
pragmático-discursivos devem ser vistos como básicos, subdeterminando
todos os tipos de procedimentos parentéticos dessas cláusulas. Vale lembrar
também
que a construção
tópica resulta da interação colaborativa dos
interlocutores. Jubran et al (1992) retomam o conceito de tópico, tomando-o
- 50 -
não como “polarizador”, mas, antes, como decorrente do processo
comunicativo. Veja-se:
O tópico decorre de um processo que envolve colaborativamente os
participantes do ato interacional na construção da conversação, assentada
num complexo de fatores contextuais, entre os quais as circunstancias em que
ocorre o intercâmbio verbal, o conhecimento recíproco dos interlocutores, os
conhecimentos partilhados entre eles, sua visão de mundo, o background de
cada um em relação ao que falam, bem como suas pressuposições. ( Jubran et
al, 1992:361)
Segundo Jubran (1997), as funções textuais-interativas dos
parênteses são vistas como um dos recursos pelos quais os interlocutores
articulam os textos falados; porém, verificou-se que esse procedimento
parentético pode estar presente tanto nos textos orais quanto em alguns textos
escritos, quando o locutor aciona seus conhecimentos lingüísticos e os de
mundo visando a interação. Ainda através de procedimentos parentéticos, os
interlocutores explicitam as avaliações que fazem do quadro sociocomunicativo onde ocorre a interação, demonstrando assim o seu
processamento discursivo. Algumas dessas características do processo de
parentetização coincidem com as características funcionais das cláusulas
apositivas que serão demonstradas no capítulo de análise dos dados. Jubran
(1997) afirma que
... os parênteses operam desvios momentâneos do quadro de relevância tópica
de um segmento textual. Tais desvios são assinalados por marcas formais
típicas de elemento inserido, que permitem precisar a sua identificação e
delimitação" (Jubran, 1997:01).
Esses desvios momentâneos dos parênteses de um quadro de
relevância tópica de um segmento textual também ocorrem com as cláusulas
- 51 -
apositivas, uma vez que, com esse recurso, o interlocutor visa manter a
coerência, ou seja, a continuidade de sentidos que pode ser percebida pela
conexão conceitual cognitiva dos elementos lingüísticos que são claramente
visíveis na superfície do texto tanto oral (quanto escrito). É nesse sentido que
as cláusulas apositivas se assemelham a algumas construções parentéticas
“marcando o processo formulativo-interacional que refletem dados da situação
de enunciação”.( Jubran,1997).
Da segunda classe de parênteses da tipologia de Jubran, que se
refere aos parênteses com foco no locutor, ocorreu, como se disse, apenas uma
função encontrada no corpus do presente trabalho; e é a que se refere a
manifestações atitudinais do locutor em relação ao assunto, que como já foi
dito, será explicitada no próximo capítulo deste trabalho.
Quanto ao processo de referenciação entre os fatores envolvidos
nessa tipologia, vale lembrar o que Nogueira (1999) afirma acerca desse
processo e sua relação com as cláusulas apositivas:
O emprego de uma estrutura apositiva como estratégia de referenciação não
está relacionado apenas a uma função textual, mas também a funções
cognitivas de introdução e identificação de referentes no discurso, bem como a
funções argumentativas, particularmente quando o locutor manifesta, por meio
dessa
referenciação,
sua
opinião
sobre
tópicos
discursivos.
(Nogueira,1999:80-81)
2.4.1.1. A elaboração tópica do texto
Jubran (1997) subdivide essa primeira classe de parênteses em
três outras subclasses: a) parênteses que mantêm conexão de "conteúdo" com
o tópico; b) parênteses que visam a formulação linguística dos tópicos e c)
parênteses que se referem à construção textual.
- 52 -
As subdivisões dessa classe - elaboração tópica do texto - parecem
ter ligação teórica com as postulações de Chafe (1985) sobre o envolvimento.
O autor classifica o envolvimento em três tipos, segundo Cruz (1998)
envolvimento do falante consigo mesmo (ou ego-envolvimento); envolvimento
do falante com o ouvinte; e, o envolvimento do falante com o assunto.
Segundo esse autor, o ego-envolvimento se explicita com maior nitidez no
uso de pronomes da primeira pessoa (...) e em expressões do tipo “quero
dizer”, “não sei”, “como eu disse”.
(...) o envolvimento com o ouvinte ocorre quando o falante emprega a segunda
pessoa (singular/plural) ou, ainda, quando trata seu interlocutor pelo nome.
Ou ainda no ato de responder à uma pergunta do ouvinte ou quando é o
próprio falante que faz uma solicitação ao seu ouvinte.
(...) o envolvimento do autor com o assunto se exprime através do uso de
alguns “itens lexicais”, tais como “advérbios” e “adjetivos”. (Cruz 1998:30)
2.4.1.1.1. Os Parênteses e o conteúdo tópico
Como o foco dos parênteses dessa classe recai sobre o tópico
discursivo, ocorre uma atenuação da propriedade de desvio tópico, que é
particularizadora da parentetização. Nesses casos, como se viu, as marcas
formais do processo parentético tais como as pausas, as interrupções, os
marcadores de suspensão, tanto na fala quanto na escrita, é que fazem com
que se possa discernir um processo de parentetização.
Esses enunciados são chamados de mecanismos facilitadores da
compreensão, uma vez que esclarecem o tópico discursivo que os antecede.
Nessa dimensão poder-se-ia dizer que eles constituem mecanismos de coesão,
promovendo a coerência, a aceitabilidade textual. Nessa classe de parênteses,
tanto da modalidade oral quanto da escrita, o locutor emprega pistas da fala
que indicam o seu envolvimento que, segundo Cruz (1998) pode ser notado
pelo uso de determinados pronomes e pelas auto-indicações.
- 53 -
Segundo Jubran (1997) essa classe de parênteses (correlacionados
com o conteúdo tópico) engloba esclarecimentos, analogias, exemplificações,
justificativas, correções, ressalvas, retoques, reiterações ou desdobramento de
informações tópicas, constituindo, como afirma a autora,
recursos de
elucidação do tópico discursivo.
A função de exemplificação pode ser observada no exemplo (25),
retirado de Jubran (1997). Observe-se que o locutor, ao usar tal recurso, revela
um conhecimento sobre o assunto abordado, cooperativas, baseando-o na
evidência de exemplos, o que, segundo Jubran (1997), gera a aceitação do
interlocutor com relação ao que foi dito.
(25) cooperativas também são ... entidades ... realmente bastante ...
significativas ... dentro de uma conjuntura ... ou dentro da conjuntura ...
nacional por exemplo para citar especificamente o caso ... do nosso país
... sabemos por exemplo que países altamente evoluídos e avançados ...
como é o caso por exemplo da Suécia ... que é um país que pratica na
opinião de algum ... um socialismo considerado como democrático ...
têm nas cooperativas uma espécie de suporte ou de tripé ... para o seu
desenvolvimento ... (DID REC-131) (apud Jubran 1997:4)
Na função de esclarecimento, segundo Jubran (1997), o locutor
"detalha dados expostos nos enunciados topicamente relevantes".
Observe-se o exemplo (26) retirado do corpus desta pesquisa que
mostra um caso de exemplificação:
(26) I: (...) então ocê discute eh o o método o quê que di/o quê o quê que,
você o que que diz né? Acerca de método do método do método de
aprender de como as pessoar aprendem tal como ... discutido por
essas diferentes propostas ... o relacionamento disso.
D:
[ sei
I:
com determinados métodos mais adequados para ensinar psicologia
... por exemplo fala-se muito que ocê num vá c/ em psicologia cê
num vai falar do fogo ce pôr as pessoas no fogo então se isso ... então
... o quê que ocê vai fazer? ... você vai eh:: ... eh eh ter como método
- 54 -
de ensino por exemplo dinâmica de grupo ... ta? ... qual a origem
disso ... né? E como ...
D: uhn uhn
(DO8F, 21, 781-797)
A cláusula apositiva nele destacada preenche as mesmas
características - de exemplificação – comentadas anteriormente.
As funções de ressalva, retoque e justificativa, relacionadas com
o conteúdo tópico, constituem as últimas das lista das funções relacionadas
com o conteúdo tópico reencontradas no corpus usado no presente trabalho.
Segundo Jubran (1997), com a função de ressalva o interlocutor
amplia ou reduz a extensão do significado de uma proposição. O interlocutor
visa "ajustar" a significação dessa proposição. No exemplo (27), dado pela
autora citada, nota-se que a expressão parentética “reduz a informação anterior
onde a qualidade de raciocínio lógico e abstrato parecia genérica e atribuída
a todos os membros da classe dos juristas”: (Jubran,1997:04).
(27)
Inf. a linguagem ... o raciocínio lógico ... abstrato ... do jurista ... bem
claro que de todo ... deveria ser de todo não é... é bonito ... é o algo bem
próprio dele ... ( EF REC - 337) (Jubran, 1997:4 )
Examine-se, agora:
(28)
Fomos para casa sem esquecer de comprar toneladas de Buscopan
injetável, drágeas e até vejam só supositórios - que por grande sorte
minha – não foram usadas. ( NE7M, 01, 23-27)
Também nesse exemplo, o locutor faz uma ressalva com relação
aos supositórios comprados que por grande sorte minha – não foram usadas.
- 55 -
Com a função de retoque o interlocutor 'reformula a informação
precedente precisando-a por meio da repetição de um elemento nela contido"
(Jubran 1997:05). A esse elemento anterior o locutor acrescenta também
elementos diferentes sem se desviar, porém, do conteúdo semântico da
informação dada. O informante visa, assim, retocar a informação dada,
objetivando, como já foi dito, a compreensão
do texto por parte do
interlocutor. Observem-se o exemplo (29), fornecido por Jubran (1997), e o
exemplo (30), que foi retirado do corpus usado neste trabalho, nas quais a
função de retoque aparece sob a forma de uma cláusula apositiva parentética.
(29) L1 e logicamente indo ao banco levando essa proposta eles me trouxeram
... eles me deram de volta uma série de duplicatas para que eu assinasse e
... eu e o fiador ... e isso então foi entregue de volta. (D2 RJ – 355)
(Jubran, 1997:05)
(30) eh eh verifiquei nos próprios dados que eu já (es)tava começando a
trabalhar que eu tinha outro tipo de elipse [que era uma elipse lexical ]
eh quer dizer não é elipse ... uma retomada ... que era uma retomada
lexical ... com um novo sintagma nominal ... ou o mesmo repetido ... não
é? (DO9M, 14, 515-521 )
No exemplo (30), a preocupação do informante em retocar a
informação sobre elipse fez com que usasse duas cláusulas apositivas. A
primeira que era uma elipse lexical tem a função de retoque. A segunda, ainda
versando sobre elipse, faz uma retificação corrigindo o item anterior elipse, no
caso. A expressão
quer dizer,
caracterizadora, segundo Koch
que introduz a referida cláusula, é
et al (1990), de uma reformulação de um
conteúdo já dito, mantendo com ele um "teor de metalinguagem".
A função de justificativa, segundo Jubran (1997),
também
pertence ao grupo das classes de parênteses que são correlacionados com o
- 56 -
conteúdo tópico, pois mantém conexões com o conteúdo anterior,
explicitando-o. Sua característica parentética é materializada ( como se pode
observar no exemplo (31) retirado do corpus desta pesquisa ) através das
pausas, representadas pelas reticências na linguagem escrita. O recurso
parentético é utilizado, nesse exemplo, com a clara intenção de justificar que
as determinadas idéias são reificadas porque é vantagem.
(31)
TODO ELE: ... Como uma unidade ... está PERmeado pela idéia da
mentalidade científica ... que é FUNCIONAL ... a um determinado tipo
de ideologia ... tá? é um determinado tipo de de sistema ... né? que ele
garanti ... né? ah ele reiFICA determinadas idéias ... que é vantagem ...
ná? Que você:: eh não só as as popularize como você faça com que as
pessoas acreditem nelas ... né? ( DO8F,18,645-653).
2.4.1.1.2. Os parênteses e a formulação lingüística do tópico
De caráter metalingüístico, essa classe de parênteses é constituída
por fragmentos discursivos que se desviam da centração tópica para
focalizarem o sistema verbal utilizado pelos locutores com o objetivo de
reformulá-lo lingüisticamente. Segundo Jubran (1997), focalizam a própria
linguagem explorando o sistema de signos lingüísticos. Nesse caso,
necessário,
é
ainda, que se leve em conta não apenas as relações
metalingüísticas, mas também as relações entre usuários e signos. Os
enunciados metalingüísticos utilizados pelo locutor caracterizam-se por
propósitos interacionais.
No rol dessas operações metalingüísticas encontram-se os
procedimentos de busca de denominação e de confirmação ou rejeição de
opções lexicais. Essas operações metalingüísticas ocorrem quando o locutor,
- 57 -
"suspendendo momentaneamente o tópico discursivo, declara ao interlocutor
que está processando opções lexicais ou solicita a colaboração dele para a
escolha de denominações". (Jubran, 1997:06).
Das funções parentéticas que focalizam o processamento dos
tópicos discursivos oferecidas pela autora citada, apenas duas serão estudadas
nesta pesquisa.: a busca de denominação e a explicitação do valor de uma
palavra no texto.
A função de busca de denominação,
segundo Jubran (1997),
pode vir concretizada através de vários recursos.
a) introduzidas pelas expressões do tipo mais precisamente,
sobretudo, isto é, quer dizer acompanhadas de uma opção lexical, retificando
ou corrigindo uma opção lexical anterior aos parênteses. O locutor, utilizando
esse recurso, está confirmando que a segunda opção, a parentética, é mais
apropriada que a anterior. A autora cita exemplos dessa função - busca de
denominação - com sintagmas. Segue-se o exemplo de
número (32),
integrante do corpus desta pesquisa, onde essa função é exercida por uma
cláusula apositiva parentética, numa narrativa oral.
(32) aí eu pus minha raiva toda lá fora ... como se diz ... soltei
os cachorros em todo mundo ... aí ... mas uma situação de
raiva assim sempre tem né? (NO1M, 15,570-574)
O locutor reformula o item lexical raiva para soltei os cachorros
em todo mundo, que ele julga mais apropriado para expressar a raiva que
sentia, com a expressão “como se diz”; o locutor aciona, através desse recurso
lingüístico, um mecanismo interativo. Segundo Cruz (1998:69), “ao acionar a
- 58 -
língua, buscando interação, o locutor está comprometido com o conteúdo que
produz”;
b) outro recurso segundo Jubran, usado na busca de denominação
é a justaposição ou alternância de sinônimos no interior de parênteses, que
podem se excluir ou reforçar uns aos outros, e, por acumulação, transmitir o
significado desejado. Veja-se o exemplo abaixo transcrito de Jubran:
(33)
Inf. mostra ... num é? nesse trechozinho ... ou nessa citação ... que os
três ... saberes ... ou três perspectivas ou três linhas ou três maneiras ...
de se olhar o direito ... mostra que ... todas três ... na realidade ...
definem ... classificam ... e têm ... proposições ... sobre as relações ...
pertinentes ao direito ... (EF REC 337) (apud Jubran 1997:08)
c) a função de busca de denominação pode, também, segundo a
autora citada, vir representada por frases "que registram um procedimento
metalingüístico pela presença de termos da linguagem-objeto e da
metalinguagem". (Jubran, 1997:08). Comparem-se os exemplos (34) – de
Jubran – e (33), anteriormente transcrito.
(34)
Inf. bom ... o que eu vejo lá na ... na ... praia o pessoal joga muito aquelas
raquetes assim ... jogam vôlei ... tênis de praia que se chama aquilo com
raquetes ... é tênis de praia ... vôlei ... isso que eu vejo na praia ... né?
(DID POA- 45) (apud Jubran 1997:8)
A cláusula parentética traz um termo objeto tênis de praia e um
comentário metalingüístico que focaliza a expressão que se chama
conteúdo aquilo com raquete;
- 59 -
e o
d) há também os parênteses denominados de comentários
parentéticos do locutor a respeito de uma opção lexical. Esse tipo de
parentetização faz um comentário acerca da adequação, ou não, da opção
lexical feita.
No exemplo (35), de Jubran, pode-se notar que o parêntese a
palavra neutralizar não sei se se aplica bem faz uma observação sobre a
adequação ou não da escolha do verbo neutralizar para descrever a atitude
dos
países
vencedores
da
Segunda
Grande
Guerra,
de
ajudarem
economicamente o Japão, país vencido:
(35)
Inf. elas (as economias industriais aliadas que ganharam a Segunda
Guerra) resolveram ... trazer ... a economia japonesa para seu lado ... tá
claro? ... quer dizer ... a palavra neutralizar ... não sei se se aplica bem ...
mas resolveram mostrar ao Japão que não eram os inimigos que eles
estavam do mesmo lado ... que todos podiam em termos industriais ... se
desenvolver ... (EF RJ379) (apud Jubran 1997:08)
e) existem ainda, segundo Jubran (1997), parênteses introduzidos
pelas expressões digamos assim, podemos dizer assim, por assim dizer, vamos
dizer assim que, precedendo ou sucedendo uma opção lexical, indicam se a
escolha dessa opção aproxima-se do que o locutor pretende comunicar.
Por meio dessas expressões, o locutor sinaliza, para o interlocutor, uma certa
imprecisão na formulação linguística dos enunciados que produz, antecipandolhe uma possível "falha" de funcionamento do código, no uso que dele faz. Tais
expressões têm, assim, esse intuito interacional e revestem-se de um teor
metalinguístico, exatamente porque testam as possibilidade comunicativas dos
signos previstos no código.
( Jubran, 1997: 09 )
- 60 -
No exemplo (36), retirado do corpus
desta pesquisa, pode-se
observar esse tipo de comentário parentético a respeito da
opção lexical
perceber, o comentário que vem introduzido pela expressão digamos assim e
apresenta-se sob a forma de uma cláusula apositiva. Veja-se, também, o
exemplo (37), retirado de Jubran.
(36)
... eu pra começar eu eh eh achava que era tudo a mesma coisa (então)
elipse de modo geral e acho que qualquer um pensava o mesmo ... até eu
perceber né? lembrar, digamos assim que negócio de sujeito de primeira
e de segunda pessoa é uma coisa completamente diferente
são
exofóricos pela situação né? primeira e Segunda pessoa é o falante e o eo
interlocutor dele ... ao passo que terceira pessoa é que é uma coisa muito
mais ampla né?
(DO9M,13:454,470).
(37)
L2 e agora sairam uns ... uns temperos mais ... mais novos digamos
assim ... porque têm dois anos mais ou menos ... que é esse puro purê ...
(D2 POA- 291) (apud Jubran, 1997:09).
Ainda dentro desta classe de parênteses, que visa o processo de
seleção lexical, existem aqueles que parecem referendar mais ainda o processo
interacional, a partir do momento em que há uma co-participação dos
interlocutores na construção do texto. Segundo Jubran ( 1997:09 ) são aqueles
casos em que o locutor "interrompe momentaneamente o desenvolvimento do
tópico discursivo, a fim de, entre parênteses, chamar o interlocutor para dentro
do texto". A intenção do locutor é pedir ajuda ao interlocutor a fim de
encontrar uma denominação - como no exemplo (38) - ou deixar ao
interlocutor a escolha de um lexema entre as alternativas que lhe são
colocadas, como no exemplo (39).
- 61 -
(38) L1 : o governo acha ... o governo acha que a solução do ... do chamado
... como é nome?
L2 : é a UPC ou ...
L1: é UPC e ...
L2: índice de ...
L1: índice de correção monetário ... é a solução para ... éh ... corrigir a
inflação (D2 RJ- 55) (Jubran, 1997:09)
(39) Inf.
o ser e o dever ser na realidade social ... eles se: éh : ...
complementam andam juntos ... o ser e o dever ser ou seja o mundo
real e o mundo ideal ... ou irreal [ eu num num ... como vocês
queiram chamar ] ... esses dois vi: vem ... lado a lado na realidade
social ... (EF REC - 337) (apud Jubran, 1997:09)
Nessas classes de parentetização relacionadas com a elaboração
tópica do texto ( correlacionadas com o conteúdo tópico), observa-se, como
pôde-se ver até agora, um teor de referencialidade textual, no desenrolar do
ato comunicativo. E, segundo Jubran (1997), essa monitoração é local e
contínua no processamento do texto falado. Essa monitoração local e contínua
visa "a produção de um texto capaz de funcionar comunicativamente" (Jubran,
1997:09).
2.4.1.1.3. Os parênteses e a construção textual
Estes tipos de parênteses, que se referem à construção textual, são
metadiscursivos como os parênteses estudados na seção anterior. Isso porque
eles trabalham a estrutura textual. Jubran (1997) adaptou os estudos que
Borillo (1985) fez acerca de expressões e enunciados metadiscursivos
indicadores da construção do discurso. Para tanto, levou em consideração,
- 62 -
primeiramente, apenas os enunciados e expressões que apresentaram
características parentéticas, adquirindo, assim, propriedades de inserção
parentética. Em segundo lugar, averiguou até que ponto as funções apontadas
por Borilo eram realizadas por parênteses. A autora concluiu que esses
fragmentos metadiscursivos que têm a função de assinalarem a estruturação do
texto possuem características interacionais. Eles, ao organizarem o discurso,
facilitam a formulação e a apresentação do texto, ocasionando a recepção do
mesmo.
Segundo Jubran (1997:10), Borilo classifica os marcadores da
estruturação textual em três categorias: a progressão lógica, a composição ou
disposição e a argumentação.
À progressão lógica pertencem os enunciados metadiscursivos
que "asseguram a progressão seqüencial do discurso, estabelecendo relações
anafóricas entre enunciados sucessivos" Jubran ( 1997:10 ). Ao garantirem a
progressão textual, tais enunciados garantem a coesão e a coerência textuais.
Esses marcadores são do tipo: a isto se acrescenta ..., a seguir, em primeiro
lugar, a partir daí ..., para completar ..., o que conduz a ... também verbos de
movimento que indicam progressão no eixo espaço-temporal: continuar,
seguir, chegar a, passar a, levar a.
Ao esquema de composição pertencem as expressões ou
enunciados que fazem parte da elaboração discursiva "operando como fatores
de interação e organização textuais". (Jubran,1997:10). Eles assinalam as
diferentes fases de estruturação textual: introdução, desenvolvimento e
conclusão. Tais são eles: para introduzir, para concluir, a título de
introdução, ou, de conclusão. Podem ainda conferir a uma seqüência
- 63 -
discursiva o papel que ela deve assumir - como, por exemplo, de resumo: em
síntese, resumindo, em resumo; de ênfase: insisto, sublinho, destaco; de
informação paralela: entre parênteses; e outros.
Ao esquema argumentativo, também de natureza metadiscursiva
(pois indica como funciona o discurso) pertencem os enunciados que
traduzem: objeções, concordâncias, suposições, demonstrações, ilustrações
(contesto, objeto que, a partir de ... concluo que ... confirmo, suponho, à guísa
de demonstração ou de ilustração etc).
Desses três esquemas, as informações parentéticas podem se
justapor ao esquema de composição do texto e simultaneamente eles podem
assinalar tanto progressão lógica de um tópico (através de relações intratópicas), quanto assinalarem progressão na globalidade do texto (através de
relações inter-tópicas).
Às relações intra-tópicas, Jubran atribui duas funções parentéticas:
i) de marcação de subdivisões de um tópico discursivo e ii) a de marcação de
retomadas do tópico no interior de um mesmo segmento discursivo.
A função de marcação de retomadas intra-tópicas, segundo a
autora citada, acontece quando há interrupção do tópico inserindo-se uma
digressão e retomando-se o tópico em seguida.
Às vezes essa função - de retomada tópica - aparece na estrutura
global do texto, marcando retomadas, articulando a montagem do mesmo.
Através do exemplo (40) abaixo, Jubran demonstra a terceira
função dos parênteses relacionados com a construção textual - é a função de
- 64 -
marcação de fases de estruturação do texto tais como: a introdução, o
desenvolvimento e a conclusão.
(40) Inf. pra ele: Durkheim ... primeiramente vem o direito ... o até mesmo os
mo: res ... que estudaram ... vem .. de maneira secundária ... o principal já
no tempo né? de Durkhein era o direito ... como máximo ... num é? para
impor normas ... e ... finalizando mesmo o direito reproduz ... todas as
formas essenciais ... e é apenas ... estes que precisamos conhecer (EF RE337) (apud Jubran, 1997:12)
Jubran (1997) aponta ainda a função de marcação do estatuto
discursivo de um fragmento no texto, que constitui a última função dos
parênteses que se referem à montagem textual. E exemplifica:
(41)
inf. a ética do dever ser do ou do que deveria ser ainda mais entendeu?
((I.L.A.)) ... olhe antes que eu esqueça ... um parêntese - ... na realidade
social - talvez eu esqueça isso de futuro ... por isso vou dizendo logo
agora - ...(Jubran, 1997:13)
A cláusula grifada - olhe antes que eu esqueça ... um parêntese constitui, segundo a autora, um segmento encartado em outro e que contém a
informação de que, na realidade social, o ser e o dever ser se complementam,
e que é dada em seguida após o locutor inserir um outro parêntese
justificando: talvez eu esqueça isso no futuro ... por isso vou dizendo logo
agora.
- 65 -
2.4.1.2. Parênteses com foco no locutor
Nessa classe de parênteses, segundo Jubran (1997), o falante se
introjeta no texto que produz e essa introjeção provoca desvios do tópico do
discurso. Os parênteses decorrentes dessa introjeção do locutor trazem
opiniões do mesmo acerca de seu papel discursivo de locutor-instanciador do
discurso. Apesar de provocar desvios do tópico discursivo, esses parênteses se
articulam com a base informacional das proposições que criam o contexto.
Segundo Jubran, "o envolvimento do locutor com sua função
enunciativa e/ou com o assunto que aborda faz parte de um intercâmbio
verbal entre os interlocutores".(Jubran, 1997:13). De um modo geral, não
houve ocorrência de cláusulas apositivas nessa classe de parênteses, no
corpus deste trabalho. Ela aparece em apenas uma função desta classe:
manifestação atitudinal do locutor em relação ao assunto.
Jubran lista as funções abaixo dentro dessa classe de parênteses.
A primeira delas é a auto-qualificação ou auto-desqualificação do
locutor para discorrer sobre o assunto. Exemplifica:
(42) Inf. Sabemos por exemplo ... nós que entramos aqui nesse sindicato no
ano de mil novecentos e setenta e quatro ... das carências
deficiências que o sindicato apresentava por não ... possuir uma
sede ... adequada ... (DID REC 131) (apud Jubran, 1997:131)
O locutor se autoqualifica para falar sobre sindicato, por possuir
vivência sindical. Este exemplo demonstra o envolvimento do locutor com o
assunto sobre o qual está discorrendo. Como também aponta Cruz (1998:54),
- 66 -
uma “outra forma de expressão do ego-envolvimento é o emprego do pronome
pessoal do caso reto “nós”. Ao adotá-lo o locutor demonstra capacidade de
interação”.
É bom afirmar, novamente, que em todos os exemplos dessa classe
parentética, com foco no locutor, ocorre o “ego-envolvimento”.
Já no exemplo (43), o locutor se auto-desqualifica
para falar
sobre o tema - uma atividade profissional - da qual ele não
se sentia
qualificado para falar.
(43)
Doc. como é que são as marcações no estado?
L1 como é que são as marcações no estado? bom você devia perguntar
isso ao técnico e não a mi, eu sou apenas um : um usuário das
marcações eu acho aqui nós já temos certas entradas relativamente bem
sinalizadas ...(D2 SSA - 98) (apud Jubran, 1997:14)
A segunda função é a de manifestação de interesse ou desinteresse
pelo assunto. O informante, através da construção parentética, demonstra
interesse
ou
desinteresse
em
desenvolver
o
tópico
proposto
pelo
documentador (Jubran, 1997:14). Veja-se:
(44) Doc. Dona 1. Além da participação do artista ... no filme quais os outros
elementos importantes na sua opinião para que o filme seja bem aceito
pelo público?
Inf. fundo musical né? ... eu acho que influi bastante ... eu já falei para
você cenários né?
Doc. uhn
uhn ....
- 67 -
Inf. sei lá mais o que cenários musical ... o tema do filme né? (DID SP
234) (apud Jubran, 1997:14)
Uma terceira função dos parênteses com foco no locutor é a do
desconhecimento do assunto proposto pelo interlocutor. Nela, o informante
declara ao interlocutor que desconhece o tema abordado por ele. Veja-se:
(45) Doc. e como é que a senhora Acha que é elaborada uma peça de teatro
antes dela ser apresentada?
Inf. ah aí você pegou porque eu não sei não s como é
elaborada? ...
deve ser como na televisão eles preparam o o o : : ... o a peça ... e : :
devem dividir o o os ... o o as partes para os artistas deve Ter um ensaio
meDOnho.(DID SP 234) (apud Jubran, 1997:15)
A função de manifestação atitudinal do locutor em relação ao
assunto - é um tipo de parênteses no qual o locutor manifesta um julgamento
"sobre a probabilidade de serem verdadeiras as proposições expressas por
ele"(Jubran, 1997:15). No exemplo (46), Jubran demonstra essa função:
(46)
Doc. o senhor que o presidente pode estabelecer regras
... normas ... de : em torno do sindicato que ele :
preside ... essas normas ele decidirá só? Sozinho ele
decidiria eu quero que seja feito isso isso isso e isso?
Inf. normalmente existe ... acredito eu ... um
colegiado ... é graças a este colegiado
... que o
senhor presidente vais evidentemente pautar: suas
decisões ... (DIDSP 235) (Jubran, 1997:15)
- 68 -
A autora apresenta ainda dentro da classe - com foco no locutor - a
função de indicação da fonte enunciadora do discurso, através da qual o
locutor se intromete no texto "circunscrevendo como foco enunciativo a sua
própria perspectiva" (Jubran, 1997:15). O locutor atribui pontos de vista sobre
o assunto a fontes não identificadas, eximindo-se assim, da responsabilidade
do que é dito. Usam-se expressões do tipo ouvi dizer
(47)
Inf. ... e ficar em casa tomando seu cafezinho comendo seu sanduíche e e
... ((risos)) e assistindo filme ... eu acho que o que mais prende o pessoal
que a gente ouve e vejo o o o os come/ e e eu ouço os comentários eu
acho que são os filmes que passam principalmente nos fins de semana ...
agora novelas também né? (DIDF SP -234 ) (apud Jubran, 1997:16)
2.4.1.3. Parênteses com foco no interlocutor
A classe de parênteses com foco no interlocutor
cristaliza a
função fática da linguagem, acentuando-se a interação entre os interlocutores.
Há um intercâmbio entre locutor e interlocutor que marca sua presença na
superfície textual, no momento em que há uma suspensão momentânea do
tópico discursivo para que, nesse ínterim, se coloque em evidência
informações sobre "o papel discursivo do interlocutor".(Jubran, 1997:16 ).
Essa presença na superfície textual é também postulada por Chafe (1995),
conforme aponta Cruz (1998:30), para o qual “o envolvimento com o
interlocutor ocorre quando o locutor emprega pronomes da segunda pessoa
(singular ou plural) (...) ou quando é o próprio falante que faz uma solicitação
ao seu ouvinte".
- 69 -
Jubran coloca seis sub-funções desses parênteses centrados no
interlocutor:
i) estabelecer a inteligibilidade do texto - são seqüências
parentéticas que esclarecem proposições tópicas. Veja-se:
(48) Doc. qual a manifestação que a senhora nota ... ah : : por parte do público
... depois de uma representação teatral? ...
Inf. como qual a manifestação você pergunta?
Doc. como é que o público se manifesta ou depois de terminado um ato
no intervalo ou depois da peça? ... no que diz respeito Á praça em si?
Inf. eu não a :: não acho assim qu eles ... aplaude, : : (DID SP - 234)
(apud Jubran, 1997:17)
ii) evocar conhecimento partilhado do tópico. Nessa função, há
um consenso entre locutor e interlocutor acerca do conhecimento do tópico ou
de detalhes sobre o mesmo. Esse consenso une locutor e interlocutor através
da primeira pessoa do plural ou pelo uso do pronome você(s) que representa o
interlocutor no texto.
(49) Inf. não é tão raro o caso de : : polimastia ... poli ... como vocês sabem é
um número além daquele normal ... ou seja mais de duas ... (EF SSA - 49)
(apud Jubran, 1997:17)
O domínio do conhecimento sobre o tópico por parte do
interlocutor pode às vezes ser requerido pelo locutor através de perguntas
diretas ou indiretas, cedendo-lhe o turno;
- 70 -
iii)
testar
a compreensão do interlocutor. Essa função pode
aparecer sob forma de perguntas do tipo entendeu? está claro? Existem
porém, parênteses que expressam perguntas que incorporam o elemento do
tópico discursivo:
(50)
Inf. ele está se referindo exatamente a essa essência tradicional da
economia japonesa tá? Quer dizer uma situação ... eu vou repetir ... muito
diferente do início da economia americana ... tá dando pra situar a
diferença? Uma americana nascendo linearmente ... etc etc e a outra
BRIGANDO pra poder nascer ... (EF RJ-379) (apud Jubran, 1997:18)
iv) instaurar convivência com o interlocutor. Nessa função "o
locutor procura envolver o interlocutor em comentários, avaliações e opiniões
suas a respeito do assunto" (Jubran, 1997:18). O exemplo (51) ilustra
claramente o “envolvimento” do informante com o seu interlocutor.
(51)
Inf. mas eu acho que o teatro hoje em dia está : : está indo para um
caminho eh tão TANto palavrão tanta ... ((risos)) ... é um negócio né?
fala a verdade?((risos)) eu tenho assistido umas Peças (DID SP- 234)
(apud Jubran, 1997:18)
v) chamar a atenção do interlocutor para um elemento do tópico.
Assim destaca-se a necessidade de contato do locutor com o interlocutor para
que haja uma "devida apreensão de um dado que, provavelmente, é tido como
importante naquela situação comunicativa". (Jubran, 1997:18)
- 71 -
(52)
Inf. " a pessoas que ... prestem bem atenção ... a pessoa que no
restaurante ... tendo começado pela sopa ... termina pela sobremesa ... e
que não deixará em seguida de pedir a conta ... isso é o mais normal ...
(EF REC- 337) (apud Jubran,1997:18).
vi) atribuir qualificações ao interlocutor para a abordagem de um
tópico. Através dessa função o locutor qualifica o interlocutor para o
desempenho de seu papel discursivo:
(53)
L2 então porque ( ) ... você que é técnico nisso ... essas estradas são
bitoladas a sete metros?
L1 (é uma coisa ... veio) da convenção internacional que (dois) metros e
meio dá prá passar um carro ou caminhão ... (D2 SSA-98) (apud
Jubran, 1997: 19)
Neste exemplo, o locutor focaliza o interlocutor no seu papel
profissional, que o qualifica para o desempenho do seu papel discursivo. E o
envolve desejando convencê-lo, é claro, de suas idéias.
Concluindo, Jubran (1997:19) ressalta: a) que as classes com
foco no locutor e as com foco no interlocutor "provocam um desvio do tópico
para os agentes instanciadores da interação verbal, atuando sobre as
proposições tópicas", b) há parênteses que, uma vez interseccionados,
transparecem
"a perspectiva do locutor e a que este pressupõe ser a do
interlocutor." (...) São parênteses que criam uma polifonia enunciativa,
fazendo ecoarem duas vozes contrapostas em um mesmo enunciado". (Jubran,
1997:19).
- 72 -
2.4.1.4. Parênteses com foco no ato comunicativo em si
Esse tipo de parênteses provoca um desvio do tópico discursivo
em um grau máximo. Jubran alega que esse tipo de função parentética quebra
o fluxo temático para inserir parênteses que focalizam "contingências
necessárias para a própria existência do ato em si" (Jubran, 1997:20),
contingências tais como: presença de interlocutores, predisposição e
envolvimento dos mesmos na situação comunicativa, negociação de turnos,
afastamento de ruídos ou outro fator qualquer que venha perturbar o canal
físico ou o contato entre os locutores, na produção do texto falado.
Essa é mais uma das situações apontadas por Chafe (1985) que são
empregadas pelo locutor para convencer ao seu interlocutor “de que suas
idéias são merecedoras de crédito” (Cruz 1998:31).
E esse objetivo só é alcançado quando o locutor se envolve
consigo mesmo, com seu interlocutor, e, aqui no caso, com o assunto.
Os tipos de parênteses dessa classe podem registrar, segundo a
autora, as situações:
i) de quebra de condições enunciativas - que ocorre quando
existem, no texto, referências a ruídos ou fatos que interferem durante a
gravação de um texto falado. Nesse caso, suspende-se por momentos o
desenvolvimento do tópico, que é retomado após os acontecimentos – ruídos,
por exemplo - serem afastados.
Não houve ocorrência dessa função no corpus pesquisado. Veja-se
o exemplo (54), de Jubran, para ilustrar a quebra de condições enunciativas:
- 73 -
(54) Inf. naquela época ... o que existia eram os bisontes e os mamutes também
... alguns mamuetes ... mnuete ... vem a ser ... o bisavô ... do elefante ...
((risos)) ... B. ... ((vocês)) ... já resolveu tudo bem ... bom ... então
primeiro em nível de tema ... a seguir ... qual seRIA ... o motivo pelo
qual ... eles : : ... começaram ... a pintar ou esculpir ... estas formas ...
(EF SP-405) (apud Jubran, 1997:20)
ii) outra situação desse tipo de parênteses - com foco no ato
comunicativo - é o estabelecimento da modalidade do ato comunicativo que
constitui um tipo de inserção parentética em que se evidenciam condições
interativas
em
uma
situação
específica.
O
locutor
interrompe
o
desenvolvimento do tópico para "estabelecer a participação do interlocutor e
esclarecer
a
natureza
dialógica
que
quer
imprimir
à
interação"
(Jubran,1997:20). No exemplo dado pela autora, pode-se observar que o
locutor determina aos interlocutores o tipo de interação, e o tipo de ato de fala
permitido a eles. Eles deveriam fazer perguntas. Esses parênteses, segundo
Jubran, "evidenciam condições interativas em uma situação específica"
(Jubran, 1997:20):
(55) inf. o povo japonês ... e a populaçõ do Japão ... extremamente GRANde
pra sua área e extremamente laboriosa no sentido de que .. SABIA que
pra conseguir sobreviver ... tá? ... PREcisava AMPLIAR a sua área de
atuação ... tá claro isso? a aula é gravada mas as perguntas podem ser
feitas e devem ... senão fica parecendo monólogo]nenhuma dúvida então?
... quer dizer ... situando ... o Japão ... que a gente conhece e ouve falar de
unidade japonesa (EF RJ-379) (apud Jubran, 1997:21)
iii) uma terceira situação dos parênteses com foco no ato
comunicativo é o estabelecimento de condições para a realização ou
- 74 -
prosseguimento do ato comunicativo. Esse tipo de parênteses, provocando
intervalos na exposição tópica, funciona no sentido de "averiguação de
condições para o prosseguimento de explanações" ( Jubran,1997:21 ), enfim,
para o desenvolvimento temático do ato comunicativo:
(56)
Inf. oitavo ... nós temos os vasos ... e nervos ... nosso ... é as veias ...
quem ... copiaram? ... vou colocar aqui para lhes passar alguma coisa ...
bom ... então vamos ... já copiaram tudo? ... giz não tem giz... bom ...
vamos começar ... região mamária ... ora nós definimos como sendo
região mamária ... a região ocultada pela glândula mamária (EF SSA-49)
(apud Jubran, 1997:21)
iv) outra situação que pode ocorrer com os parênteses com o foco
no ato comunicativo
é a negociação de turnos. Esse processo de
parentetização evidencia o jogo da posse do turno conversacional. Esse jogo
constitui propriedade fundamental de um ato interativo:
(57) Inf. então vocês notam como o fenômeno jurídico ... é o mais importante
... é a própria organização ... o direito ... no seu caráter então
complementando gente Arnaldo pera aí Arnaldo eu sei que é sobre ... a
matéria mas eu tô querendo ... terminar tá certo?no seu caráter mais
estável e preciso ... (EF REC-337) (apud Jubran, 1997:22)
No trecho acima – de uma elocução formal – percebe-se que a
professora pretende manter seu domínio, inclusive verbal, numa aula
expositiva, procurando manter o seu turno na interação da sala de aula:
Arnaldo pera aí Arnaldo (...)
Com esse item encerra-se a classificação das funções parentéticas
segundo Jubran (1997). O processo de parentetização cristalizado na
- 75 -
materialidade lingüística do texto "leva à contextualização do que é dito na
situação de dizer circunscrevendo os sentidos do texto e orientando sua
compreensão" (Jubran,1997:22); portanto, esse processo não pode ser visto
como se fosse formado por segmentos isolados, uma vez que se presta à
compreensão textual.
A seguir, serão estudados os aspectos da teoria pontuada por Koch
et al (1990) os quais abordam o processamento do fluxo da informação no
discurso oral. Alguns desses processos aparecem na também língua escrita,
que, tanto quanto a oral, apresenta situações de descontinuidades na
progressão temática provocada por inserções de cláusulas apositivas.
2.4.2. A Cláusula apositiva como mecanismo de inserção
Koch et al (1990), em seus estudos sobre as descontinuidades
temáticas, levaram em consideração a atuação de fatores diversos associados
ao universo pragmático do discurso oral, os quais se manifestam tanto na
organização da informação quanto na apresentação formal da unidade
discursiva. A unidade discursiva pode constituir-se num fragmento textual
caracterizado por centrar-se em determinado tema, funcionando como um dos
subtópicos em que se sedimenta o tópico discursivo global. Quanto à extensão
dessas unidades discursivas, alegam os autores citados que elas podem variar,
indo desde o âmbito do enunciado, sintaticamente considerado período, até
atingir porções maiores do texto.
Sabe-se que o fluxo informacional pode se desenrolar de duas
formas nas unidades discursivas: i) naturalmente, contínuo, mais rápido, ou, ii)
obstaculizado, “originando as descontinuidades, provocando um ralentamento
na progressão temática" (Koch et al, 1990:152).
- 76 -
Essas rupturas, que demarcam as unidades discursivas, muitas
vezes modificam a
organização canônica dos constituintes frasais. Mas,
apesar dessa subversão, afirmam os autores, essas rupturas representadas por
diferentes recursos de rematização parafrástica - inserção e reconstrução desempenham funções pragmático-interativas relevantes e devem ser
estudadas dentro de um processo de interação. Constituem, na verdade,
recursos dos quais o locutor lança mão, a fim de atingir a coerência para seu
ato comunicativo pois,
A coerência é algo que se estabelece na interação, na interlocução, numa
situação comunicativa entre dois usuários. Ela é o que faz com que o texto faça
sentido para os usuários, devendo ser visto, pois, como um princípio de
interpretabilidade do texto. (Koch & Travaglia, 1999:11)
Koch et al (1990) não levaram em consideração, ao analisar a
progressão temática, as ocorrências de escoamento normal - rematização
frástica; consideraram apenas as de rematização parafrástica. Essas
ocorrências foram analisadas, como já se disse, nos diferentes recursos de
inserção e de reconstrução.
As inserções são constituídas por segmentos parentéticos auto
condicionados (esclarecimentos, ressalvas, etc); e por seqüências laterais
heterocondicionadas.
Já o processo de reconstrução é constituído pelas repetições auto
ou heterocondicionadas (reparos e paráfrases); e pelas adjunções (adendos ou
afterthought) que funcionam como realce, acréscimo ou explicação de um
segmento anterior.
- 77 -
A partir das pesquisas feitas em material coletado pelo projeto
NURC (elocuções formais e diálogos entre informante e documentador), Koch
et al (1990) confirmam uma grande ocorrência de rematização parafrástica,
decorrente de descontinuidades que levavam a um "ralentamento" do fluxo de
informação. Esse "ralentamento" era ocasionado pelos processos de inserção e
de reconstrução dentro da unidade discursiva.
Os processos de inserção no tema, como se disse,
podem ser
autocondicionados, quando feitos por iniciativa do próprio locutor, e,
heterocondicionados, quando o locutor é levado a fazer as inserções por
solicitação do interlocutor.
As inserções autocondicionadas de natureza parentética se
identificam com as cláusulas apositivas aqui estudadas. Koch et al (1990)
afirmam que essas inserções são feitas por meio de frases-hóspedes
(Schneider, apud Betten, 1984) de natureza nitidamente parentética. Esses
tipos de frases têm um objetivo comunicativo, provocam uma suspensão
temporária na linha discursiva sem contudo quebrar a coesão entre as partes,
pois se prestam a um objetivo de coerência numa estrutura macroestrutural.
Sua equivalência com cláusulas parentéticas não acontece somente no plano
semântico; no aspecto formal, "a descida do tom de voz e certo aceleramento
do ritmo elocucional ( ... ) são traços prosódicos coerentes com sua natureza
de predicação paralela inserida na comunicação básica" (Koch et al,
1990:153). Dentre as funções que os segmentos parentéticos podem exercer,
os autores citam: contato, eslcarecimento, citações, atenuações, ressalva,
indicações atitudinais e modais e avaliações. Arrolam-se algumas dessas
funções a seguir.
- 78 -
2.4.2.1. Inserção com função de explicação
Nos exemplos (58) e (59), retirados de Koch et al (1990) e do
corpus deste trabalho, respectivamente, fica clara a intenção dos locutores de
enunciarem explicações
(58)
porque é MUIto a gente vive de motorista o dia inTEIro mas o dia
inTEIRO ... uma corrida BÄRbara e leva na escola ( ) e vai buscar ... os
dois estão na escola de manhã porque eu trabalho de manhã ... então eu
os levo para a escola ... e vou trabalhar ... depois saio na hora de buscálos... ( D2/SP- 360:93-98) (apud Koch et al, 1990:153)
(59) ... alguns achavam que ... com a integração ... dessas disciplinas quer
dizer existia antes ... sociologia da educacão filosofia da educação
histórica da educação e que passariam a ser integradas em Fundamentos
da educação II ... né? ... (DO6F,05,166-170)
Na cláusula grifada do exemplo (58), o locutor elabora uma
informação paralela estão na escola de manhã porque eu trabalho de manhã
e através dessa informação paralela justifica o fato das crianças estudarem
pela manhã. Ele retoma o tópico inicial logo após fazer a inserção dessa
explicação. Também no exemplo (59) acontece o mesmo com a informação
paralela (em grifo); o locutor insere explicações paralelas, provocando uma
suspensão temporária na linha discursiva, objetivando garantir a compreensão
do seu interlocutor.
- 79 -
2.4.2.2. Inserção com função de esclarecimento
Esse tipo de inserção, de esclarecimento, que vem materializada
lingüisticamente numa frase hóspede, cumpre um propósito definido de
comunicação: esclarece um segmento anterior. Essa função é básica num
processo apositivo quer em forma de sintagma simples, quer em forma de
sintagma oracional. Tanto assim é, que como se verá no capítulo seguinte
deste trabalho, essa foi a função com maior número de ocorrência no corpus
pesquisado. Isto referenda o fato de a aposição ter basicamente uma função
esclarecedora. E essa função parece permear todas as outras, com nuances, é
claro, de outras funções. E essas diferenças são tão sutis, que somente o
contexto em que se encaixam é que pode delineá-las.
Observe-se:
(60) L1 então a minha de onze anos ... ela supervisiona o trabalho de cinco ...
então ela vê se as gavetas estão em orde/ ... em ordem se o :: material
escolar já foi re/arrumado para o dia seguinte ... se nenhum ::
L2
[é
L1 fez :: arte demais no banheiro ... porque as vezes ... estão tomando
banho e ficam jogando água pela janela quer dizer essa ... é supervisora
nata e assim ... ah ... toma conta ... precocemente não? das :: atividades
dos irmãos (D2/SP-360:192-200) (apud Koch et al, 1990:156).
(61) ... um tipo de versão no ensino ... (1) em que :: justamente começou a
predominar a linguagem e começou ... tambe'm a predominar
conteúdos... (2) que podiam ser avaliados objetivamente ... então eu acho
que muitos conteúdos que ... (DO1M,285-290).
- 80 -
No exemplo (60), a cláusula - porque às vezes ... estão tomando
banho e ficam jogando água pela janela - vem esclarecer o porquê de a
menina (de onze anos) ter que supervisionar os irmãos.
No exemplo (61), o esclarecimento de “versão no ensino” aparece
nas cláusulas destacadas 1 e 2. A cláusula destacada 2 - que podiam ser
avaliados objetivamente - que é uma outra apositiva relativa, vem reforçar o
esclarecimento dado na cláusula anterior.
2.4.2.3. Inserção com função de correção
Na função de correção, há, por parte do locutor, uma substituição
de um item lexical, por um outro que ele julga que é mais adequado.
Veja-se:
(62)
... tem que levantar que vestir os dois ...
L1 são pequeninos né?
[
L2
e tenho que me vestir ... porque ambos são pequenos ... então
eles não aceitam muito a pajem né para éh :: ... aliás não é pagem é
pagem e arrumadeira mas
L1 ( )
L2 quer dizer não é só não vive em função deles mas de manhã ... a
única função dela é me ajudar com eles ... mas eles não aceitam o menino
porque ... que fazer tudo sozinho ... no que eu procuro deixar ... e a
menina porque quer que seja a ( mamãe ) que faça né? então sou eu que
:: tenho que ir fazer et cetera et cetera ... (D2/SP-360:300-31) (apud
Koch et al,1990:156-157).
- 81 -
No exemplo (62) a cláusula aliás não é pagem é pagem e
arrumadeira, faz uma correção do sintagma pagem usado anteriormente,
acrescenta-lhe mais uma função que a pagem exerce, ou seja, ela é pagem e
arrumadeira.
(63) ... então o sujeito entrou ... tentou ... entrar pela sala ele não conseguiu e
arrancou a tela não conseguiu ... eh cortar o vidro ... e um vidro da ... da
do quarto o último era um vidro limpo não tinha treliça então ele subiu
num banco ... quer dizer ele tentou a Sarinha tava estudando no quarto ...
e eu já tava até deitada na cama estudando ... (NO8F,30,1128-11135).
Nesse exemplo (63), do corpus deste trabalho, o informante faz a
inserção da cláusula apositiva destacada suspendendo a linha discursiva.
Constitui, como a dos exemplos anteriores, uma inserção auto condicionada
tendo em vista corrigir o segmento "subiu" num banco para ele "tentou"
(subir).
Segundo Koch et al (1990), a importância da frase-hóspede, como
as dos exemplos acima, reside no fato de sua funcionalidade no âmbito
interacional. Ela possibilita ao locutor mostrar suas atitudes em relação ao que
fala.
As inserções heterocondicionadas constituem intervenções feitas
pelo interlocutor que, assaltando o turno, elabora perguntas para o locutor,
que, sentindo-se no dever de responder, cria as chamadas seqüências laterais.
(Koch et al, 1990:157). Veja-se um exemplo, o (63) dado por esses autores,
onde se pode observar que a seqüência ele é menor ele tem cinco anos
- 82 -
constitui uma seqüência lateral heterocondicionada com a função de
esclarecimento:
(64) L2 e agora o menino quer judô ...
L1 ele é menor?
L2 ele é menor ele tem cinco anos ... e além de natação ele quer judô
também agora ... (D2/SP - 360:110-113) (apud Koch et al 1990:158).
2.4.3. A cláusula apositiva e o processo de reconstrução
Um segundo processo de descontinuidade na progressão temática
previsto por Koch et al (1990) é o de reconstrução.
O processo de reconstrução, além de interferir na continuidade do
curso da progressão temática, provoca também, segundo Koch et al
(1990:159) "uma retenção do ritmo do escoamento da informação".
Esse processo envolve uma reelaboração na seqüência discursiva
e uma recorrência, em graus diferentes, da informação dada, "provocando
uma patinação na progressão temática" (Koch et al, 1990:158).
O processo de reconstrução pode acontecer através de dois
mecanismos: a repetição e a adjunção.
- 83 -
2.4.3.1. A repetição
A repetição pode ser tomada em um sentido amplo (repetição
sem variação, a exata), e aquela com variação
da forma: palavras,
construções, "padrões prosódicos", nos quais Koch et al (1990) incluem os
reparos e as paráfrases. Esses dois tipos de repetição podem ser auto ou
heterocondicionadas (como já se disse, dependendo do fato de o locutor
repetir suas próprias palavras ou as palavras do interlocutor).
Koch et al (1990) observaram que a repetição na linguagem oral
apresenta alterações na seleção de itens lexicais e na modulação de voz. São
pequenas alterações que permitem a inclusão dessa repetições no rol das
repetições que se caracterizam nos processos de reconstrução.
Obedecendo a uma escala gradativa do processo de reconstrução,
Koch et al partiram de um grau mínimo (o das repetições exatas) chegando a
um grau máximo da repetição, onde se situam as paráfrases. Os reparos,
devido às suas diferenças com relação à paráfrase, estariam entre as repetições
exatas.
Veja-se um exemplo de uma repetição stricto sensu (a repetição
exata ) extraído de Koch et al (1990 :161).
(65)
L2
é ... e outra coisa
eles estão na escola de manhã provocado por 370, alguma coisa porque
como eu trabalho de manhã
L1 certo você teve que adaptar o horário deles :: ...
L1 é ... aliás eles já é
- 84 -
[
L1
ao seu
L2 ele já ia à escola de manhã que eu comecei 375 quando eu comecei
trabalhar ... comecei trabalhar há dois anos ... só ... antes eu não
trabalhava ... e quer dizer que então ... ele já ia à escola de manhã porque
eles dormem sete e meia e acordam seis é meia ... é horário normal deles
(D2/SP-360:368-379) (apud Koch et al, 1990:160-161)
A primeira repetição - ele já ia à escola de manhã - demonstra
hesitação e manutenção do turno; o locutor sente necessidade de ganhar tempo
enquanto elabora o que vai falar. A segunda - ele já ia à escola de manhã tem, segundo Koch et al (1990), função articuladora do discurso; recupera
uma informação velha, para, a partir dela, prosseguir sua linha discursiva
acrescentando informações novas.
Esse tipo de repetição, que mantém a relação temática entre duas
unidades discursivas, constitui, segundo os autores citados, um ponto de
referência para articular-se novamente a direção que o locutor pretende dar à
sua fala. A diminuição do ritmo do fluxo temático é bastante reduzida e pode
ser observada também em repetições do tipo "exatas" heterocondicionadas.
Nessas repetições ocorrem sombreamentos (onde um locutor repete o que o
outro fala com uma pausa mínima de tempo e sem novos dados); seqüências
de perguntas e respostas (repetindo-se algumas ou todas as palavras de quem
indaga, mudando-se apenas a entonação); reiteração de palavras e expressões
do interlocutor ( evitando-se assim assalto de turnos).
As repetições do tipo de simples recorrências ou locuções
constituem um procedimento pouco significativo no que diz respeito ao fluir
- 85 -
temático. Esse motivo levou os autores citados a não aprofundarem o estudo
da repetição tanto da auto quanto da heterorrepetição stricto sensu.
2.4.3.2. O reparo
O reparo consiste num processo de reconstrução superior ao da
repetição stricto sensu, pois, ao reelaborar o segmento anterior, o falante
trunca o enunciado e
o substitui. Essa nova formulação exclui a escolha
anterior. O locutor está visando, com essa substituição - e conseqüente
exclusão da escolha anterior - atingir os seus objetivos comunicativos. Pode
ainda, o reparo, ser auto condicionado ou heterocondicionado, havendo nesses
dois casos, como em todo os anteriores aqui citados, e pertencentes à teoria de
Koch et al (1990), um processo de "envolvimento" descrito nas páginas
anteriores, onde se comentou a teoria de Jubran (1997). E é bom que se repita
que os processos de "envolvimento" foram postulados por Chafe (1985).
Nesses processos, como já se afirmou, o locutor, ao envolver-se com o
interlocutor, com o assunto, ou consigo mesmo (auto-envolvimento), "almeja
convencer o seu leitor de suas idéias" (Cruz,1998:31).
Observe-se o exemplo (66) onde o locutor faz um reparo:
(66)
eu não tenho nenhuma tarde para mim porque a gente acumula quem
trabalha fora
acumula as coisas da ca ::as ... e o trabalho feito fora ... né? (D2/SP:
360:113-116) (apud Koch et al, 1990:164)
- 86 -
A troca do segmento a gente para que trabalha fora visa
"melhorar a informação a ser transmitida (...), especificar, restringir o âmbito
de significação do tópico a gente"( Koch et al,1990:164).
Veja-se um exemplo de uma auto-correção heterocondicionada
provocada pela intervenção de L2:
(67) as coisas de casa que a gente aten/tem que atender normalmente com
criancás BRIgas que a gente tem que repartir
[
L1
apartar
L2 tem que apartar :: isso toda hora ... (D2/SP - 360:490-494) (apud
Koch et al, 1990:165)
L2 repara o sintagma repartir para apartar por julgar o segundo
semanticamente mais adequado à informação. Isto ocorreu
devido à
intervenção de L1 que "acompanhou" o discurso de L2.
O ralentamento provocado pelo reparo, na linha discursiva, vai
depender de sua extensão, "de sua confluência com outros mecanismos de
descontinuidade e de ser maior, ou menor o constituinte sobre o qual incide".
(Koch et al, 1990).
O reparo se diferencia da função de correção, vista no item
2.4.2.3., no sentido de que o grau de intensidade da correção é menor, é menos
abrupto. Tanto assim é, que a correção vem sempre introduzida por
expressões do tipo aliás, quer dizer, etc. No reparo a substituição do item
lexical anterior se dá, sem a presença desses articuladores.
- 87 -
2.4.3.3. A paráfrase
Também as paráfrases constituem mecanismos de reconstrução
por repetição e podem ser autocondicionadas ou heterocondicionadas. Elas
contêm o mais alto grau de reformulação no processo de recorrência de uma
informação . Segundo Fuchs (1982), apud Koch et al (1990:166), a paráfrase
"oscila entre a reprodução pura e simples do conteúdo e sua deformação".
Constitui, ela, uma atividade real de reelaboração, onde o locutor, segundo
Fuchs (1982), restaura total ou parcialmente o "conteúdo primitivo num texto
derivado".
O que diferencia a paráfrase da função de reparo é que a
paráfrase não possui o valor excludente do reparo. Ela constitui uma opção
alternativa e muitas vezes possui extensões maiores do que as do reparo. Por
ser um mecanismo reconstrutor por excelência, ela retoma, explicita, ilustra o
conteúdo anterior o que referenda o seu teor de metalinguagem discursiva.
Transcreve-se, abaixo, um exemplo, (68), de Koch et al
(1990:169). Nele, ocorre uma paráfrase que acarreta um processo de
patinação - que consiste num encadeamento de particularizações, em termos
concretos, do tema anunciado - o locutor explicita a tarefa de "supervisão
dentro da família", assunto já visto no exemplo (60). Como nesse exemplo a
unidade discursiva é longa, limita-se, aqui, a transcrever apenas a passagem
onde se encontra a paráfrase:
(68)
L1 então a minha de onze anos ... ela supervisiona o trabalho dos cinco
... então ela vê
se as 1 gavetas estão em orde/ ... em ordem se o ::
- 88 -
material escoalr já foi 195
nenhum ::
L2
re/arrumado para o dia seguinte ... se
[
L1 fez :: arte demais no banheiro ... porque às vezes .. estão tomando
banho e ficam
jogando água pela janela quer dizer essa ... é
supervisora nata é assim ... (D2/SP- 360:191-200) (apud Koch et al,
1990:167).
O tema anunciado - ela supervisiona - é reprisado. Ele se refere à
tarefa de supervisão dentro da família: é supervisora nata.
2.4.3.4. A adjunção (ou adendo)
Dentre os dois processos de reconstrução apontados por Koch et
al (1990), o processo de adjunção também provoca um ralentamento na
progressão temática. Ocorre a adjunção quando o locutor percebe que uma
informação importante relacionada ao tópico deve ser inserida. Às vezes esse
processo apresenta-se a posteriori. Isso ocorre quando o locutor
quer
enfatizar ou fazer com que o interlocutor se recorde de uma informação dada
anteriormente. Esse processo pode ocorrer também em formas de "adendos"
ou aposições. Os autores consideram o afterthoght (os adendos) "a categoria
prototífica desse tipo de reconstrução" (Koch et al, 1990:172). Os
afterthoughts, segundo esses autores, "constituem interposições tardias, na
linha discursiva, de uma informação antes elidida" ( Koch et al, 1990:173),
isto é, o locutor interrompe o fluxo informacional, replaneja-o, a fim de
introduzir o dado que já deveria ter sido enunciado.
- 89 -
Segundo esses mesmos autores, os afterthoughts não constituem
frases hóspedes. As informações que eles trazem são consideradas
imprescindíveis para a compreensão do discurso, enquanto que as informações
trazidas pelas frases hóspedes são apenas complementares ou paralelas.
Também quanto ao fluxo da progressão temática, a suspensão provisória
provocada pelos afterthoughts são mais bruscas e bem marcadas. Essa
interrupção brusca e bem marcada tem por finalidade alertar o interlocutor de
que a informação que está sendo introduzida não pode passar despercebida.
O exemplo (69), abaixo, mostra um processo de adjunção
representado "por um elemento isolado, fruto de um repensamento que vem
preencher uma espécie de vazio deixado na mensagem" (Berruto,1985, apud
Koch et al 1990:173)
(69)
L1
... é muito exigente comigo e com o meu marido ... essa
menina ... sabe ela não admite uma falha nossa ... no ... ponto de vista do
que seja ...
O :: o perfei/a perfeição (D2?sp-360:212-215)
Observe-se que o sintagma essa menina, colocado à direita, tem o
efeito de um acréscimo mais enfático do que explicativo; visa reavivar,
enfatizar, na mente do interlocutor o fato de ser ela, essa menina, a mesma do
segmento anterior, onde o locutor 1 falava da "função de supervisionar" que
sua filha de onze anos assumiu dentro de casa (contexto já visto nos exemplos
(60) e (68)).
Os afterthoughts, além da função informativa, exercem função
interativa - quando explicitam a informação, favorecendo à interação.
- 90 -
Exercem também a função argumentativa quando servem para reavivar na
mente do interlocutor informações consideradas importantes sobre o tópico
em curso, portanto facilitam a compreensão e garantem a interação.
Os autores deixaram pendentes, nesse estudo, algumas questões
"residuais" relativas às descontinuidades. Tais são elas: i) as rupturas
sintáticas (sem função discursiva) do tipo "perda de controle" do interlocutor
na organização de seu discurso; ii) as rupturas heterocondicionadas do fluxo
informacional
(acontece
quando
o
interlocutor,
assaltando
o
turno
conversacional, obriga o locutor a dar-lhe uma resposta, e, com essa
interrupçào o locutor costuma não retornar à seqüência interrompida,
ocasionando um "truncamento" da progressão temática); iii) as elipses não são
consideradas por Koch et al como provocadoras de descontinuidades ou
interrupções na progressão temática porque eles consideram que "na medida
em que a informação não é explicitada é naturalmente suprida pelo contexto
lingüístico ou por dados situacionais" ( Koch et al,1990:179).
Os autores consideram, ao final dos estudos, que a aparente
desestruturação do discurso oral constitui estratégia comunicativa que visa à
compreensão, e, por isso,deve ser considerada como mecanismo de interação
comunicativa. Importa colocar ainda que Koch et al (1990) em seus estudos
sobre as descontinuidades na progressão temática, concluíram que no
discurso oral, (e aqui se estende ao discurso escrito) as descontinuidades
constituem marcas efetivas de estratégias interacionais por parte do falante.
Dentro do quadro teórico apresentado, resta dizer que, com relação
às descontinuidades na progressão temática postuladas por Koch et al (1990) e
as construções parentéticas de Jubran (1997), as cláusulas apositivas
- 91 -
pesquisadas neste trabalho apresentam várias coincidências, coincidências
essas que serão melhor exemplificadas e comentadas no capítulo seguinte, de
análise dos dados do presente trabalho.
- 92 -
CAPÍTULO 3
Funções textuais da cláusula apositiva no português
3.1. Considerações iniciais
Considerando-se que a abordagem funcional de uma língua
reverencia a natureza discursiva da linguagem, e vê, dentro das estruturas
sentenciais, uma dependência funcional, quer nas estruturas de textos escritos
quer nas de textos falados; considerando-se, ainda, que essa perspectiva de
explicitar funções e relações semânticas é relevante para a interpretação das
cláusulas apositivas que servem para estruturar os discursos, busca-se, neste
capítulo, descrever os tipos de relações semânticas e as funções discursivotextuais das cláusulas apositivas nos discursos oral e escrito.
A classificação das cláusulas apositivas aqui adotada foi mesclada
com a terminologia tradicional e a moderna. Esse procedimento classificatório
dessas cláusulas apositivas objetiva descrever as diversas construções de
aposição encontradas no corpus pesquisado considerando-as como estruturas
que organizam e seqüenciam o discurso. Para empreender tal trabalho, partiuse da ótica tradicional para, em seguida, adotar-se, dentro dos estudos da
lingüística moderna, novas teorias que melhor explicitem o papel da cláusula
apositiva como estrutura articuladora do discurso, dentro de uma abordagem
funcional-discursiva. Ao se partir da ótica tradicional, fez-se um breve
apanhado pelo corpus desse trabalho, de uma mostra de apostos em forma de
sintagmas simples, a título de uma breve observação prévia, quanto à
recorrência dessa forma de aposição.
Veja-se o quadro II:
Quadro II
Tipos de Apostos
Funções:
1- Especificativo
2- Explicativo
3- Circunstancial de Lugar
4- Resumitivo
5- Atributivo
6- Recapitulativo
7- Circunstancial de causa
8- Circunstancial de tempo
9- Circunst. de afirmação
10- Distributivo
11- Circunst. de consequência
Total
L.O.
NO
55
42
07
45
14
04
09
05
---------182
DO
297
72
06
34
15
07
08
03
01
02
---445
Total
352
114
13
79
29
11
17
08
01
02
---627
DE
226
49
02
------------------22
04
303
L.E.
NE
23
19
01
---02
---03
02
---------50
Total
249
68
03
---02
---03
02
---22
04
353
Legenda: LO = língua oral
LE = língua escrita
DO = dissertativo oral
DE = dissertativo escrito
NO = narrativo oral
NE = narrativo escrito
Observe-se que houve uma incidência maior de apostos na
modalidade de língua dissertativa oral, com a função de especificação
atingindo o maior índice - duzentas e noventa e sete, entre quatrocentas e
quarenta e cinco ocorrências. Na Tabela 1, pode-se ver o resumo desses dados:
- 94 -
Tabela 1 – Ocorrências do aposto simples
LO
DO
445
45,41%
LE
NO
303
30,92%
DE
182
18,57%
NE
50
5,11%
Total
---980
100%
E é interessante ressaltar que ao se confrontarem os dados das
duas formas de aposição, observou-se que os índices apontam para um mesmo
resultado nas maiores ocorrências. O gênero de língua dissertativo oral
predominou. Veja-se a Tabela 2, resumo da incidência da aposição em forma
de sintagma simples ou clausular:
Tabela 2 – Ocorrências de aposto simples e clausular
LO
627
144
771
1- Aposição Simples
2- Aposição Clausular
Total Geral
LE
353
50
403
Subtotal
980
194
1.174
Essa evidência decorre, sem dúvida, do fato de o locutor, ao sentir
a necessidade de ser compreendido, principalmente no discurso oral, que é
considerado não planejado, "tenha de administrar passo-a-passo (locally
managed), o seu discurso", tendo ainda de se preocupar "com o que será dito,
a forma como será dito e a quem irá dizer" (Koch et al, 1990:148). E isso faz
com que ele, o interlocutor, use mais a aposição como uma opção
organizacional nos discursos, principalmente nos dissertativos orais.
Quer na modalidade de língua oral, quer na escrita, essa forma de
aposição possui várias funções para cada ato de fala: explicitação do valor de
- 95 -
uma palavra no contexto, busca de denominação, correção, reparo, (função
metalingüística) dentro do discurso; informação identificadora do referente:,
exemplificações, adendos (função referencial); avaliação pessoal: justificativa,
manifestação atitudinal do locutor em relação ao assunto, avaliações (função
emotiva).
Do corpus estudado, foram coligidas 217 (duzentas e dezessete)
ocorrências de cláusulas apositivas , cujas classificações foram fundamentadas
no conceito de construções parentéticas de Jubran (1997) e nos “mecanismos
de descontinuidade na progressão temática” de Koch et al (1990).
Conforme foi afirmado anteriormente, partiu-se de uma análise
baseada nas gramáticas tradicionais, porque, segundo assinala
Sant'Ana
(1998:14), " tanto a gramática tradicional quanto a funcional contribuem para
o ensino da língua, cada uma com seu objeto, sua perspectiva, seus
pressupostos, seus objetivos e sua metodologia, sendo ambas complementares
e necessárias”.
E é em razão desse procedimento que serão usados , no decorrer
deste trabalho, os termos substantiva, relativa explicativa, adotados pela
nomenclatura tradicional, para se referir à cláusula apositiva. O termo
“cláusula” será entendido como todo sintagma verbal junto a outro tipo de
sintagma nominal preposicional ou adverbial, cujas relações textuais e
discursivas contribuem para estabelecer a “tessitura” de um texto, fazendo
com que “um texto seja considerado um texto e não somente uma somatória
de frases” (Chafe: 1985 apud Koch: 1987:149).
- 96 -
3.2. As Cláusulas apositivas: tipos e funções
No corpus pesquisado, foram detectadas várias funções para as
cláusulas apositivas que são coincidentes com as funções textuais interativas
de Jubran (1997) e com os mecanismos que provocam as descontinuidades na
progressão temática, postulados por Koch et al (1990). Inicialmente serão
apresentados os casos coincidentes com a teoria de Jubran.
Como já se disse anteriormente, essas funções se concentram na
primeira das quatro classes de parênteses apresentadas por Jubran, ou seja,
nas funções relacionadas com a elaboração tópica do texto, quais sejam: i)
relacionadas com o conteúdo tópico: exemplificação, esclarecimento,
ressalva, retoque e justificativa; ii) relacionadas com a formulação
lingüística do tópico: busca de denominação, explicitação do valor de uma
palavra no contexto; iii) relacionadas com a construção textual: marcação
do estatuto discursivo de um fragmento no texto.
Das funções da classe de parenteses com foco no locutor, foi
detectada apenas uma função, a de manifestação atitudinal do locutor em
relação ao assunto.
Quanto aos mecanismos de descontinuidade na progressão textual
postulados por Koch et al (1990), foram encontradas as seguintes funções
para as cláusulas apositivas no corpus deste trabalho: i) mecanismos de
inserção
no
tema
(segmentos
parentéticos
auto-condicionados):
esclarecimento, ressalva, avaliação e correção; ocorreram também, as
chamadas seqüências laterais (heterocondicionadas); e, ii) mecanismos de
reconstrução por: a) repetição (com variação): reparos e paráfrases; b)
adjunções: acréscimo, explicitação e ilustração.
- 97 -
Dentro dessas funções houve a ocorrência dos tipos de cláusulas
apositivas delimitados no início desta pesquisa, a saber: i) apositivas do tipo
substantiva, e que tradicionalmente vêm após dois pontos; ii) apositivas do
tipo relativa explicativa, que tradicionalmente vêm introduzidas pelo pronome
relativo - as relativas explicativas; e, iii) apositivas introduzidas por
expressões parentéticas tais como: por exemplo, quer dizer, isto é, digamos
assim, a saber, em resumo, vamos dizer assim, etc.
A seguir, apresentam-se os casos de cláusulas apositivas e suas
funções discursivas encontradas no corpus, seguidos de alguns exemplos de
cada uma das funções citadas anteriormente. E como houve, no arcabouço
teórico adotado, casos de funções coincidentes (presentes nas postulações de
Jubran (1997) e Koch et al (1990), como, por exemplo, a função de
esclarecimento, esses serão agrupados e comentados em um mesmo item. A
questão do envolvimento, postulada por Chafe, e abordada no capítulo
anterior, permeia todas as funções detectadas nesta pesquisa. Não se referirá a
ela em todos os momentos da análise do corpus, por já ter sido colocado que
essa questão - do envolvimento – é característica do fenômeno da aposição,
por ser ela - a aposição - de caráter, como já se disse, eminentemente
explicativo, parafrástico, referencial, por excelência. E neste mister, o
envolvimento dos interlocutores é inerente à própria natureza dialógica.
3.2.1. Apositivas: construções parentéticas
3.2.1.1. Função de “exemplificação”
Com esse recurso, o locutor objetiva elucidar conteúdos tópicos
que julga importantes.
- 98 -
Veja-se o exemplo abaixo, que foi retirado do texto de uma
redação dissertativa do 3º grau, em que o aluno argumentava sobre a
importância da leitura:
(70) Fazemos uma leitura todos os dias em diferentes situações do nosso
cotidiano como por exemplo: lemos bula de remédio, receita de bolo,
embalagens , letreiros, jornais, revistas, bilhetes, ect., mas nem sempre
podemos interpretá-los adequadamente. (R.03,01,11-12).
Neste exemplo, o locutor elucida o conteúdo do tópico anterior
leituras em diferentes situações através dos itens dados após os dois pontos.
Destaque-se, também, a expressão por exemplo, que é típica das cláusulas
apositivas parentéticas com a função de elucidação do conteúdo de
proposições tópicas. Tem ela a clara função de exemplificar as situações
referidas anteriormente. Observe-se que essa cláusula constitui o modelo
tradicional da apositiva tipo substantiva, ou seja, após os dois pontos.
No exemplo que segue, vê-se que o informante, percebendo a
necessidade de explicitar melhor o sofrimento pelo qual passou na ocasião em
que teve de se submeter a uma fistolização, faz uso de um complexo apositivo
com a finalidade de exemplificar a série de circunstâncias inesperadas pelas
quais passou.
(71) não foi fácil nada fácil lidar com a recanalização das minhas trompas.
Fistolização, como dizem. Pior, ainda, administrar circunstâncias
inesperadas tais como: não é mioma; é embrião mas está morto, aguarde
dez dias para surpreender vitalidade fetal; está morto, não está vivo:
vamos fazer o aborto, é gravidez de altíssimo risco, você não pode ter
mais filho. Meu mundo tão arrumadinho, desmoronou.
(NE4F, 01,28-38)
- 99 -
No intuito de exemplificar o tópico circunstâncias inesperadas, o
locutor lança mão de sete cláusulas apositivas justapostas:
1- não é mioma
2-- é embrião mas está morto,
3- aguarde dez dias para surpreender vitalidade fetal,
4- está morto,
5- não está vivo: vamos fazer o aborto,
6- é gravidez de altíssimo risco,
7- você não pode mais ter filho.
Essa forma de reiteração de estruturas apositivas é uma estratégia
de formulação textual que vem contribuir com a organização discursiva, ou
seja, o locutor, na tentativa de fazer com que o interlocutor entenda melhor as
tais situações, introduz “dados factuais comprovadores do que está sendo
dito” (Jubran, 1997:104).
Segundo Marcuschi (1996), as repetições conduzem à produção de
segmentos inteiros duas ou mais vezes, motivadas pelos
mais diversos
fatores, sejam eles de ordem interacional, cognitiva, textual ou sintática.
Acrescenta, ainda, esse autor que não há uma descontinuidade textual na
repetição, e sim uma estratégia de composição textual, que conduz ao tópico
do discurso. No exemplo dado, a repetição de cláusulas apositivas objetiva
facilitar a compreensão do interlocutor para aquilo que o informante pretende
colocar. Tanto assim é que
na cláusula de número cinco, há uma
superposição de cláusulas apositivas – duas: a ) não está vivo: b) vamos fazer
o aborto; formando uma sub-unidade informativa dentro de um contexto
informativo maior, formado pelo conjunto de cláusulas apositivas.
- 100 -
No exemplo (72), o informante comenta com o documentador a
dificuldade e o trabalho que existem ao se corrigirem provas de questões
abertas em concursos com grande número de candidatos.
(72)
I:
questão aberta é um negócio ... de louco né?
quer dizer corrigir trinta mil provas então eu acho que esse sistema
de múltipla escolha ele pra :: ... né? pra um exame de massa
D:
[ pra uma primeira seleção né?
I:
[é :: para uma primeira seleção funciona né?
(DO1M, 9, 332-338)
Observe-se que a cláusula apositiva destacada tem a função de
exemplificar o porquê de ser difícil corrigir questões abertas em concursos de
trinta mil candidatos por exemplo. E o informante termina a unidade, com o
aval do documentador, sobre a necessidade de, nesses casos, se aplicarem
testes de múltipla escolha.
Examine-se, agora, o exemplo abaixo:
(73)
... tropecei e enfiei a :: o pulso num caco de vidro né? ... aí saiu aquela ...
quantidade de sangue e tal ... e eu lembro mais ou menos ... essas cenas
por exemplo era eu tinha uns cinco anos eram umas cenas que eu
lembro dessa época ... dessa idade assim né? ... de :: de :: cinco anos
... (NO1M, 12, 445-450).
Este exemplo (73) mostra a preocupação do informante em colocar
para o documentador, ao narrar um acontecimento que ele havia vivido e
sentira medo, a época em que o fato ocorrera, ou seja, a idade que ele possuía
e a importância da cena para ele. Estava numa tenra idade e aquela visão do
sangue provocada pelo ferimento fora marcante.
- 101 -
Sendo assim, o informante sentiu a necessidade de exemplificar o
fato com esses dados e introduz uma cláusula apositiva de natureza
parentética - por exemplo era eu tinha uns cinco anos eram umas cenas que
eu lembro dessa época ... dessa idade assim né?
Observe-se que ele reforça o dado da idade quando ele o repete ao
final - dessa idade assim né?
No exemplo abaixo (74), pode-se observar, novamente, mais uma
cláusula apositiva com a função de exemplificação.
É bom que se diga que esta função é uma das que são menos
desviantes do tópico, pois sua informação "pende mais para o conteúdo dos
enunciados de relevância tópica, esclarecendo-os, exemplificando-os".
(Jubran, 1997:03). As cláusulas que exercem essa função são, pois,
concernentes com os enunciados e mantêm conexão de conteúdo com os
mesmos. Aqui, neste exemplo, o informante argumenta sobre provas de
vestibular.
(74)
posso ... quer dizer a tese é o seguinte eu eu ... abordei várias questões
né? a questão ... eh central que me preocupa é a seguinte que ... eh :: eu
venho trabalhando com vestibular ... né? já há algum tempo e a gente às
vezes quando ia corrigir prova de vestibular ... a gente notava que muitas
vezes o aluno ... ele ... ao responder algumas questões do vestibular ... eh:
em questões por exemplo que pediam prá ele ... colocar uma evidência
duma reação química qualquer coisa relacionada a um fenômeno ... que
se passa na química ... o aluno ... (DO1M, 93,78-87).
Observe-se que a cláusula destacada exemplifica o tópico anterior
ao responder questões de vestibular.
- 102 -
3.2.1.2. Função de “esclarecimento”
A cláusula apositiva com função de esclarecimento foi a que teve
maior incidência no corpus pesquisado. É a mais comum, devido ao fato de
ser a função básica da aposição: esclarecer, explicitar, explicar, clarear o
fundamental, ou seja, o tópico anterior.
Embora semanticamente possa haver uma diferença de gradação de
um esclarecimento para uma explicação, por exemplo, a verdade é que
basicamente elas - essas funções - se prestam ao mesmo objetivo: clarear a
informação anterior. Talvez isso decorra do fato de o aposto, como se viu, ter
sua origem numa oração relativa explicativa, que é aquela que pretende
explicar, esclarecer um tópico que lhe vem anteposto, numa relação semântica
de equivalência, numa função metalingüística. Observe-se que a relativa só é
considerada explicativa se vier inserida como uma cláusula parentética,
marcada por pausas na língua oral e por vírgulas, travessões, reticências ou
parênteses, na língua escrita.
As cláusulas apositivas com a
função de esclarecimento
encontradas no corpus trabalhado são de natureza parentética ou nãoparentética, tradicionais ou não-tradicionais, mas todas são de natureza
autocondicionada, isto é, "a iniciativa de encaixamento da cláusula no tema é
feita por parte do falante" (Koch et al, 1990:152).
Quando parentéticas,
constituem as chamadas "frases-hóspedes", conforme os mesmos autores.
Seguem-se alguns exemplos dessas cláusulas, todas com função
de esclarecimento. Nos exemplos abaixo,
pode-se notar o propósito do
informante de “enunciar explicações complementares ao tópico principal”
(Koch 1990:153), quando ele insere a cláusula apositiva destacada, no
contexto de sua fala:
- 103 -
(75) ... tem hora que você descreve de uma forma tem hora que ocê descreve
de outra né? então cê tem ... sinônimos eh :: sintagmas sinônimos, né? ...
então que eu teria que trabalhar com ... isso também né? porque isso
também era uma possibilidade quer dizer ou era ZERO o sujeito elipse ou
era pronome ou era ... o o :: o coisa lexical ... e a Solange Lira ... que
trabalhou com a mesma coisa em língua oral ... pegando pessoal do Rio ...
a pesquisa os dados dela são do Rio ... fez exatamente isso ... né?
(DO1M, 15, 524-538)
Pode-se ver que a cláusula apositiva - que trabalhou com a mesma
coisa em língua oral ... pegando pessoal do Rio ... a pesquisa dos dados dela
são do Rio ...
explicativa
-
tradicionalmente é uma cláusula apositiva - relativa
parentética, que interrompe momentaneamente o segmento
textual – fazendo, assim, um esclarecimento que se julga importante dentro do
que está sendo dito. As pausas marcadas, na transcrição, pelas reticências
antes e depois da cláusula em destaque caracterizam a inserção parentética
após a qual o informante dá seqüência ao texto, interrompido no tópico a
Solange Lira, complementando-o com a cláusula - fez exatamente isso né?
(76) ... eu não tenho cabeça ... pra nesse momento tomar a decisão de
interromper uma vida ... (que tá aí) ... eu não tiro esse bebê ... (NO4F, 14,
519-521).
Esse exemplo (76), que foi retirado da mesma entrevista do
exemplo
(2), narra a dificuldade do informante em aceitar a decisão de
interromper a gravidez - que tá aí , como ele mesmo diz, através de uma
cláusula apositiva de natureza parentética, com a intenção de fornecer uma
informação relevante para o tópico anterior - uma vida.
- 104 -
O exemplo (77) foi extraído de um texto dissertativo escrito, nível
3º grau, cujo tema era a "importância da leitura".
(77)
... importância dada à leitura, (que é essencial em qualquer profissão),
até mesmo nas do campo das ciências exatas ... (R.48, 01,07-08).
Observe-se nele a presença das vírgulas, caracterizando a cláusula
em destaque como uma apositiva parentética com a função de esclarecimento,
isto é, esclarecer o fato de a leitura ser essencial, fundamental, em qualquer
profissão, até mesmo para os profissionais das ciências exatas.
Vejam-se os exemplos (78 e 79):
(78) I: .. eu também tento mostrar como é que se poderia superar essas
limitações que eu aponto através de uma abordagem que NÃO É
integradora por simplificar ... mas ela é ... ela integra aprofundando ...
e eu mostro então o real sentido do que eu entendo como integração
... que é uma integração de base epistemológica ... e eu uso aí ... eh e
faço uma análise mais aprofundada da da : : ... da contribuição que o
Lukacs
D:
[ é
Eu também às vezes tenho dúvida como é que eu devo falar
I: ( ) mas/eu tenho mais mais hábito de falar Lukacs embora a o
pessoal (que é ... especializado na área como o Chazin e a : : Esther
Chazin ... né? e o José Chazin) ... (que são lá da Filosofia) eles
falam LUKASH mas são os únicos que eu vejo aqui falando assim ...
sabe?
D: uhn uhn (DO6F, 12- 13, 459-481).
(79)
... eu vou ter que ... que ... que pesquisar ... eh :: mais ou menos a
concepção :: de corpo que ... (que influenciou todo o pensamento
ocidental ... ) (que nasceu lá na na Grécia ... Antiga) né? civilização
grega né? então ... eh :: essa dicotomia corpo e alma que :: ( ) (que foi
muito ... trabalhada naquela época) e ( que influenciou todo ( ) o
pensamento ocidental) ... e a educação física incorporou ... essa
influência ...” (DO3M, 03, 93-101).
- 105 -
No exemplo (78) o informante insere uma
cláusula apositiva
parentética - que é uma integração de base epistemológica - com função de
retoque do segmento anterior - do que eu entendo como integração - mais
exatamente do sintagma integração, que é repetido e explicitado na referida
cláusula. Mas o informante, no decorrer da sua fala, sente que é preciso
esclarecer outros segmentos; ele constrói mais duas cláusulas apositivas
parentéticas com a função de esclarecimento - 1- que é ... especializado na
área como Chazin e a :: Esther Chazin ... né? - que se refere ao sintagma
pessoal; 2- ... que são lá da Filosofia. Esta última constitui uma cláusula
parentética apositiva que tem a função de esclarecer a cláusula apositiva
anterior atendendo à necessidade de clareza, conforme apontado por Jubran
(1997).
Também no exemplo (79), o informante, falando de sua dissertação
de mestrado, suspende momentaneamente a sua linha discursiva e insere
quatro cláusulas apositivas parentéticas, "que tecem o tópico do discurso”
(Koch et al, 1990:310). A concepção de corpo constitui o segmento sobre o
qual incidem os esclarecimentos dados pelas cláusulas dessa “rede” de
apostos formada por cláusulas consideradas frases-hóspede que, pode-se
dizer, “constituem um procedimento com o qual o locutor dá ao ouvinte
mostras de suas atitudes em relação ao que fala e de sua preocupação com os
efeitos que podem ocasionar” (Koch et al, 1990:310). Esse exemplo bem
ilustra essa situação, quando o locutor inteligentemente cria essa estrutura de
apostos: 1- que influenciou todo o pensamento ocidental, 2- que nasceu lá na
Grécia ... Antiga, né? (...), 3- que foi muito trabalhado naquela época, 4que influenciou todo o pensamento ocidental.
- 106 -
Nos exemplos (80) e (81) abaixo, pode-se observar um
esclarecimento mais específico: nota-se que são explicitadas circunstâncias
de tempo, no exemplo
(80), e circunstância de lugar, no exemplo (81):
(80) ... depende da época ... eu falo isso ... porque estive em dois momentos ...
né? ... a propósito do meu doutorado eu estive em dois momentos vivendo
nesta cidade ... num primeiro ... que foi de oitenta e dois ao final de
oitenta e três ... quando eu fiz meus cursos né? desenvolvi a a fiz o o
exame geral ... né? que a gente faz ... eh apresentei meu projeto depois eu
vim fiquei um ano aqui no Brasil até oitenta e quatro... né? foi quando eu
fiz minha pesquisa de tese mesmo ... ( NO8F, 24, 9111-923 ).
A cláusula em destaque é uma apositiva, de natureza parentética, do
tipo relativa explicativa tradicional, que foi inserida com a função de
esclarecer o segmento dois momentos em que o informante, falando de sua
tese de doutorado, quer esclarecer o documentador quanto à época em que os
fatos se deram.
No exemplo (81), o informante narra uma situação difícil, de
pânico, provocada por um assalto que ele viveu durante sua estada em um
país estrangeiro. Ele insere, então, a cláusula apositiva parentética - onde eu
morava – esclarecendo o sintagma anterior – nesse lugar, esclarecendo a
circunstância de lugar, que era onde ele morava.
(81)
... nesse caso ne/nesse lugar ... onde eu morava ... a janela ainda tinha
uma como que treliça de ... de ... de arame ... dentro do vidro ... que
dificultava cortar o vidro ... tá ... (NO8F, 29,1.081-1.084).
Observe a presença, nesse exemplo (81), de outra cláusula apositiva
que dificultava cortar o vidro que constitui, também, uma cláusula apositiva
- 107 -
do tipo relativa explicativa, com a função de esclarecimento do sintagma
anterior – treliça de arame.
Veja-se ainda no exemplo (82), abaixo, como está se
demonstrando nesta seção, a preocupação do locutor em esclarecer
informações anteriores. O contexto é idêntico ao do exemplo (74) visto
anteriormente.
(82) ... o vestibular da UFMG por exemplo eu participei ... e ele :: há muito
tempo que ele ... eh vem mudando a postura dele né? ... quer dizer tem
muito tempo que as provas de química não têm mais esse tipo de ênfase
... no entanto assim ... eh ainda hoje muitos cursinhos eles ... (DO1M,8,
297-304 ).
Pode-se ver, pelo exemplo (82), que o locutor, falando de Química,
quebra sua seqüência discursiva e insere uma cláusula apositiva com o intuito
de esclarecer que o tipo de ênfase dado à prova de Química vem sendo
mudado nos vestibulares, atualmente.
Observe-se o próximo exemplo:
(83)
... e eu ... peguei essas análises e e transpus pra análise da política
educacional quer dizer ... por quê que a nossa educação ... ela ... ela
serve ao desenvolvimento ali muito ... muito localizado, muito daqui e
agora ... e ela não desenvolve ela não se enRAíza nos países ... e a minha
conclusão é que ela não se enraizou porque ela não ... ela não tinha raízes
dela eram todas fora ... e ... no momento elas serviam a determinados
interesses momentâneos aqueles interesses momentâneos se desinteressa
da questão educacional assim por eh :: dessa profissionalização ela não é
NÃO resolvida ... né? quer dizer foi feitas :: foram feitas em vários
países da América Latina na mesma época ... eu estudei outros países pra
ver :: todos tinham adotado esse tipo de política ... Mas nenhum ...
(DO2F,7,220-241).
- 108 -
Em (83), as cláusulas apositivas destacadas: quer dizer ... porquê
que a nossa educação ... ela ... ela serve ao desenvolvimento ali muito ...
muito localizado, muito daqui e agora ... e ela não desenvolve ela não se
enRaíza nos países ... e a segunda quer dizer foi feitas : : foram feitas em
vários países da América Latina na mesma época ... constituem inserções
parentéticas com a função de esclarecer que a política educacional não é
resolvida. Ela é muito localizada, muito daqui e agora.
No exemplo (84) abaixo, o informante fala de sua tese e do papel do
examinador; então, o documentador insere uma cláusula apositiva no texto,
visando esclarecer que tal procedimento desmerece o examinador num
momento de uma defesa. A cláusula apositiva inserida
é de natureza
heterocondicionada, nesse caso.
(84)
D:
I:
... ocê passa um tempão trabalhando na tese ... né? ... esperando às
vezes aquelas perGUNtas ... né? aquele massacre.
não mas isso foi pouco ... foi pouco ... sabe?
D: não mas isso ... quer dizer ... desmerece ... né? ... o o o o :: o
examinador ... né ... às vezes um examinador de peso mas que
chega lá com ... perguntas sobre bobagem né? ... dá impressão de
que não leu ... (DO6F,18, 651-660)
.
Há um intercâmbio de informações entre os interlocutores. Esse
intercâmbio ocorre quando o documentador insere a informação esclarecedora
- quer dizer ... desmerece ... né? ... o o o o :: o examinador ... né . Por ter sido
uma intervenção do interlocutor.
Ainda com a função de esclarecimento, foram encontradas várias
cláusulas apositivas do tipo relativas explicativas que não eram parentéticas.
Essas foram, como se disse, analisadas sob os postulados de Koch et al
- 109 -
(1990). Observem-se os exemplos listados a seguir ,onde se podem notar as
pausas, indicadas na transcrição, pelas reticências, e a presença dos pronomes
relativos que as introduzem. A referência que se faz, nesta seção, sobre
cláusulas apositivas não parentéticas objetiva esclarecer que elas podem
exercer funções textuais interativas, embora, às vezes, não sejam parentéticas.
(85)
... porque o ... o o sujeito tá lá tantas orações antes ... ou a distância que
ele lá não sei o que quer dizer ... eu fui percebendo que o negócio er/ que
o buraco era um pouco mais embaixo quer dizer ... devia haver alguma
generalização melhor do que isso alguma coisa ... possível ... que ela não
tenha ... eh colocado sabe? (DO9M, 16, 655-664 )
A cláusula destacada - que ela não tinha ... eh colocado - é um
esclarecimento para o segmento anterior alguma coisa. O informante fala
sobre sujeito e acerca da teoria de determinado autor sobre o tema. Salientese que há duas cláusulas apositivas, expressas anteriormente, introduzidas
pela expressão quer dizer, que também constituem cláusulas apositivas
(parentéticas) com função explicitação .
A mesma situação - de esclarecimento - acontece no exemplo (86) a
seguir:
(86)
... num põe continuidade de sujeito não põe continuidade tópica porque
na verdade é o tópico ... que é o discurso e tal ... né? (DO9M, 18, 688692))
.
A cláusula que é o discurso e tal se refere ao segmento anterior
tópico.
- 110 -
O exemplo (87), abaixo,é um excerto de uma entrevista em que o
informante narra uma situação de medo, que viveu quando estudava no
exterior.
Também nesse trecho tem-se mais uma ocorrência da cláusula
apositiva com função de esclarecimento.
(87)
... mas ele tinha aparência assim de ser um :: ele era um árabe a gente
via ... na U.F.R.I. a gente ... trabalhava com árabe ... cê vê que ele era de
nível baixo né? ... devia ser ... operário ... e era uma pessoa que :: ... não
regulava bem da cabeça... (NO2F,19,713-719).
A seguir, listam-se mais alguns exemplos de cláusulas apositivas
com função de esclarecimento, sem comentá-los, objetivando-se, apenas,
enriquecer a ilustração desse tipo de função da apositiva. Observem-se as
cláusulas destacadas.
(88)
I:
... bom ... mas também nessas horas aparece a solidariedade quer
dizer um amigomeu ... eh foi
D: é
I: muito ... muito ... amigo MESmo né? Ele ... ele ... recebeu uma oferta
de um colégio ...
e me telefonou - - ele precisava desse trabalho - mas ele me telefonou dizendo que :: que eu poderia assumir no lugar
dele – são essas coisas que : : só amigo é que faz mesmo né? (NO3M,
11, 413-423).
(89)
... então era muito fácil pra mim trabalhar num material ... que : : tinha
em abund6ancia e que eles tavam preocupados em em fazer um estudo ...
(DO7M, 18, 664-667).
(90) ... Minha mãe pediu ajuda a um vizinho que possuía um automóvel e me
levaram ao pronto socorro, onde levei sete dolorosos pontos. (NE1M, 1719).
- 111 -
(91) . algumas escolas se encontram sacudidas com suas potestades cultas,
onde o ensinar era simplesmente transmitir conhecimentos prontos e
acabados. (R.59,02, 33-34).
Os exemplos acima ilustram ocorrências orais e escritas tanto do
discurso narrativo quanto do dissertativo, mas todos com a função de
esclarecimento.
3.2.1.3. Função de "retoque"
O retoque é uma função que visa reformular a unidade informativa
anterior, repetindo-se um item lexical nela contido, possibilitando ao locutor
construir um melhor conceito para o item destacado.
Na função de retoque foram encontrados três tipos de cláusulas
apositivas: a) apositivas relativas parentéticas; b) apositivas relativas não
parentéticas; e c) as apositivas parentéticas (não relativas).
A) Apositivas relativas parentéticas
Veja-se:
(92)
I: Foi num ... Pronto Socorro mesmo foi Pronto Socorro era Domingo ...
eu lembro que era
Domingo ... e :: ... ( ) falou assim ah tá bom
vamos te dar um enema ... – que é o nome do ... cê aprende ... se ocê
tiver
D: enema?
I: enema ... enema é a lavagem ) né
D: uhn uhn ... (NO7M, 9, 308-316).
Em (92), o informante narra uma crise de cólica renal que sofreu,
quando se encontrava em outro país fazendo um curso.
A função de retoque ocorre quando ele, na tentativa de explicitar o
sintagma enema, insere a cláusula apositiva - que é o nome do ... cê aprende
- 112 -
se ocê tiver enema ... enema é a lavagem. Ele faz interrupções, representadas
pelas reticências, modulando a voz e repetindo o item lexical enema, por duas
vezes, retocando-o.
No exemplo (93), abaixo, o informante fala de sua tese ao
documentador; faz uma interrupção, insere uma cláusula apositiva relativa
fazendo o retoque do item lexical integração, que aparece na unidade
anterior:
(93) I: ...eu também tento mostrar como é que se poderia superar essas
limitações que eu aponto através de uma abordagem que NÃO é
integradora por simplificar ... mas ela integra aprofundando ... e eu
mostro então o real sentido do que eu entendo como integração ... que
é uma integração de base epistemológica ... e eu uso aí ... eh e faço
uma análise mais aprofundada da da :: ... contribuição que o Lukacs
...(DO6F,13,459-470)
B) Apositivas relativas, não parentéticas
No exemplo (94) abaixo, temos um caso de cláusula apositiva de
natureza não parentética também com função de retoque :
(94)
Sempre gostei muito da Língua Portuguesa, e aqui na Faculdade estou
ampliando, adquirindo mais conhecimento de modo geral
(conhecimentos, que me estão sendo valiosíssimos na minha vida pessoal
e profissional). (R.27,01,26-27).
A cláusula destacada - conhecimentos que me estão sendo
valiosíssimos na minha vida pessoal e profissional - vem retocar, ou seja,
complementar o sentido do sintagma conhecimentos que vem, como é de
praxe nesse tipo de apositiva, repetido na cláusula em estudo.
C) Apositivas parentéticas (não relativas)
- 113 -
No corpus pesquisado houve grande incidência desse tipo de cláusula
apositiva, exercendo função de retoque. Observem-se alguns exemplos:
(95)
... prá romper co/com essa :: domesticação né? então até tô com um
titulozinho que ainda tá ... mais ou menos na minha cabeça é assim ... eh
o “o corpo e a Educação Física na escola ... domesticação e autonomia”
(ou seja reconhecendo que a escola realmente dá um tratamento
domesticador ao corpo ... na escola ... e que a Educação Física pode ser
a maior alternativa ... a essa domesticação ...) (quer dizer Educação
Física num dá prá ela :: ir contra essa situação toda na escola porque
esse é um processo que eh ... inde/eh que ultrapassa a Educação Física )
né? (DO3M, 03, 75-88).
O informante fala da domesticação da Educação Física que é dada
nas escolas. E ele reitera a sua opinião, quando insere a primeira cláusula
apositiva em grifo – ou seja reconhecendo que a escola realmente dá um
tratamento domesticador ao corpo (...)_ essa domesticação - e repete a carga
semântica dada no item lexical domesticação sob a forma de um sintagma
adjetival domesticador. Veja-se que na segunda cláusula apositiva grifada quer dizer Educação Física num dá pra ela : : ir contra essa situação (...) que
ultrapassa a Educação Física - ele faz um novo retoque com relação à
Educação Física, que vem logo após a expressão parentética quer dizer ; o
informante a retoca dizendo que esse processo domesticador ultrapassa a
própria Educação Física.
Em (96), observe-se a estrutura de aposição clausular construída
pelo informante.
- 114 -
(96) I:
D:
I:
... em coisas DA linguagem entendeu? 1 (quer dizer em aspectos ...
detalhes da linguagem
entendeu?) (quer dizer em aspectos ...
detalhes da linguagem...
uhn ...
química ) então ... na verdade eh :: ... coisa que a gente percebe um
ensino distorcido 2 (quer dizer em vez d'ocê ensinar ... uma relação
entre eh teorias ... e modelos e os experimentos cê tá ensinando
uma linguagem) 3 (que o aluno inclusive fica perdido ali naquele
meio ) né? ele não sabe pra quê que ele faz aquilo ... (DO1M, 6,
198-508).
Nesta estrutura, há um complexo de apostos; através da primeira
cláusula em grifo - quer dizer em aspectos ... detalhes da linguagem - o
locutor retoca o sintagma coisas DA linguagem expresso na unidade anterior.
O item lexical coisa também é retocado pelas expressões ... aspectos ...
detalhes (da linguagem).
Na segunda cláusula apositiva grifada - quer dizer em vez d’ocê
ensinar ... uma relação entre eh teorias ... e modelos e os experimentos cê tá
ensinando uma linguagem - o informante retoca ensino distorcido
acrescentando que ao invés de se ensinar uma relação entre teorias, modelos
e experimentos, fica-se ensinando uma linguagem na qual o aluno se perde.
(97) ... eu pra começar eu eh eh achava a mesma coisa (então) elipse de modo
geral e acho que qualquer um pensava ... ali eu perceber né? Lembrar
digamos assim, que negócio de sujeito de pela situação né? Primeira e
segunda pessoa é o falante e o e o interlocutor dele ... ao passo que
terceira pessoa é que é uma coisa muito mais ampla né? Quer dizer ... em
princípio ce tem um ... num discurso qualquer ... toda a referência de
terceira pessoa. EM princípio não que seja assim mas EM princípio ...
qualquer referência ... de terceira pessoa que tiver no texto pode ser
retomada depois ... né? ... quer dizer é uma coisa muito mais ampla muito
mais rica no sentido de de de trabalho e depois ... demandaria também
estudos diferentes ... (DO9M, 13,454-474).
- 115 -
Observe-se que o informante, já logo no início desse exemplo
(97), ao dissertar sobre o tema de sua tese - o sujeito - introduz uma cláusula
apositiva parentética - lembrar digamos assim - com a função de busca de
denominação (essa modalidade será melhor exemplificada em uma seção
mais à frente), iniciando assim, dentro dessa unidade discursiva, uma cadeia
de cláusulas apositivas.
Na segunda clausula destacada, temos: - quer dizer ... em
princípio ce tem ... num discurso qualquer ... toda a referência de terceira
pessoa - que é uma cláusula apositiva parentética, com função de retoque da
expressão anterior. O informante arremata sua informação, inserindo uma
outra cláusula apositiva de natureza parentética com função de retoque - quer
dizer é uma coisa muito mais ampla muito mais rica no sentido de trabalho
retornando à informação dada no início. O retoque está no fato de que ele
acrescenta o sintagma muito mais rica, além de repetir o sintagma mais
ampla.
No exemplo (98), o informante insere uma cláusula parentética,
com nítida intenção de elaborar um retoque. Observe-se:
(98) ... e esse movimetno então teria :: ... duas peculiaridades ele seria ao
mesmo tempo FONTE de aprendizagem ... porque através dele a criança
aprenderia eh :: ela estava em contato com outras crianças ... ou seja ...
através do movimento ela vivenciaria junto com outras crianças um uma
enorme quantidade de sentimentos de vivência sociais que seriam
importantes para ela ... (DO3M,052,164-174).
O locutor retoca a informação de que a criança estava em contato
com outras crianças para ela vivenciaria junto com outras crianças. Veja-se a
preocupação do locutor em explicitar melhor uma informação anterior,
- 116 -
através de um retoque, ele julga o item lexical vivenciar mais adequado para
expressar suas idéias sobre aprendizagem.
3.2.1.4. Função de "ressalva"
Na função de ressalva, a cláusula apositiva, como já se apontou,
“insere uma observação sobre a extensão do significado de uma proposição
“ampliada ou reduzida” (Jubran, 1997: 04). Veja-se:
(99) ... a inadequação da grade curricular da instituição universitária, que não
é
exclusiva desta, mas é generalizada e atinge a maioria das
universidades brasileiras – viram o resultado do Provão? ... (R.69, 01, 0809).
A cláusula grifada - que não é exclusividade desta - é uma cláusula
apositiva do tipo relativa explicativa que possui a nítida função de fazer uma
ressalva quanto à inadequação da grade curricular, da maioria das
universidades.
Veja-se um outro exemplo:
(100) ... ninguém me receitou Buscopan nenhum ... quer dizer eu tava
tomando mas eu devia ter tomado o injetável porque pelo menos da vez
que eu passei mal no Brasil foi injetável ... aí o cara falou ...
(NO7M,10, 352-356).
Aqui, o informante, que sofreu uma cólica de rins, fala sobre os
medicamentos que tomou na ocasião da crise. Observe-se que na cláusula
apositiva - quer dizer eu tava tomando - ele faz uma ressalva do que afirmou
antes - ninguém; me receitou nada Buscopan nenhum, então, se não foi
- 117 -
receitado, ele não deveria estar tomando. Ele faz uma ressalva - quer dizer eu
tava tomando.
A função de ressalva está correlacionada ao conteúdo tópico.
Objetiva, como já se disse anteriormente, elucidar tópicos relevantes, como se
pôde comprovar pelo exemplo acima.
3.2.1.5. Função de "justificativa"
Veja-se no exemplo (101) como é clara a justificativa dada pela
cláusula apositiva destacada.
(101) ... eh existe a idéia básica né? ... que eu acabo colocando como título da
tese ... que eu acho que sintetiza tudo ... e é uma idéia funcional prá
manutenção ... de um determinado contexto-sócios-econômicopolítico...que eu identifico ... que é a idéia da neutralidade científica ...
né? ... ( ) a idéia da ne--utralidade pedagógica ... então se a educação
...né? ... é alguma coisa neutra ... né? e se ciência é alguma coisa neutra eu
posso ... né? desvincular o produto do produtor eu posso importar por
exemplo uma parafernália ... né? eh eh dos Estados Unidos por exemplo
... né? em termos de de ... de ... de métodos técnicas ... né? de ensino né?
(DO8F, 612-626).
O informante, ao relatar para o documentador um dos aspectos de
sua dissertação de mestrado, que versava sobre a Educação, envida um grande
esforço para “justificar” o título de seu trabalho e, nesse título, assenta-se a
idéia básica da neutralidade científica; e é aí que o informante insere a
primeira cláusula apositiva com a natureza de justificativa - ... que eu acho
que sintetiza tudo -
com a função de justificar o título dado. Possui, a
cláusula em grifo, um caráter elucidativo; funciona como um mecanismo que
justifica a informação dada. Observe-se, também, que o locutor continua
justificando a idéia funcional quando adiciona uma segunda cláusula
- 118 -
apositiva - e é uma idéia funcional prá manutenção ... de um determinado
contexto sócio-econônico-político - e continua quando insere uma terceira
cláusula apositiva - que eu identifico - que por sua vez é complementada por
uma quarta cláusula apositiva: que é a idéia da neutralidade científica a idéia
da neutralidade pedagógica. Tanto o locutor justifica sua idéia expressa no
título de sua tese, que após todas essas quatro cláusulas apositivas, conclui,
introduzindo uma quinta cláusula, com o marcador conversacional "então" se a educação é alguma coisa neutra e se a ciência é alguma coisa neutra, eu
posso desvincular o produto do produtor eu posso importar por exemplo uma
parafernália tecnológica dos Estados Unidos, por exemplo, em termos de
métodos e técnicas de ensino né? - É como se ele comprovasse a sua
justificativa e ainda pedisse a anuência do interlocutor através do marcador
discursivo “né”.
As funções vistas até o momento estão embasadas tanto nas funções
textuais-interativas dos parênteses segundo Jubran (1997) quanto em algumas
funções dos mecanismos de desaceleração (descontinuidade na progressão
temática, de Koch et al (1990). As próximas funções – busca de denominação
e explicitação do valor de uma palavra no contexto – se referem apenas à
formulação lingüística do tópico da teoria de Jubran (1997).
3.2.1.6. Função de "busca de denominação"
A partir daqui, como se disse, as cláusulas apositivas se referirão
apenas à “formulação lingüística do tópico” que é uma das subdivisões das
classes de parênteses relacionados com a elaboração tópica do texto. Como
foi colocado no capítulo anterior, os parênteses relacionados com a
elaboração
tópica do texto são aqueles correlacionados com o conteúdo
- 119 -
tópico,os relacionados com a formulação lingüística do tópico e os
relacionados com a construção textual.
Nas funções das cláusulas apositivas a seguir, notar-se-á que as
mesmas terão a característica parentética ou não, e colocarão em foco o
sistema verbal que estará sendo utilizado pelos interlocutores. Isto porque elas
se referirão à formulação lingüística do tópico. Essa é uma função
metalingüística, uma vez que reflexivamente focaliza a própria linguagem.
Serão examinados três exemplos, a saber: o (103), com cláusula apositiva do
tipo não relativa e de natureza parentética; o (104),com uma cláusula
apositiva também não relativa mas de natureza não parentética; e o exemplo
(105) que trará uma cláusula apositiva relativa de natureza também não
parentética. O que ocorre de comum é que em todas se vê claramente a
função, denominada por Jubran (1997), de busca de denominação, para o
item (ou itens) lexicais anteriores. No exemplo (102), o informante narra um
acontecimento no qual ele viveu uma situação de medo ou pânico:
Veja-se:
(102) D:
I:
D:
I:
D:
cê num bebeu muita água não?
Não não porque eu respirei nadar eu sei né quer dizer eu num
num :: faço essas coisas de engolir água esses trem ...
não mas naquela de ir ao fundo (es)tar no
[ não :: não não
meio do redemoinho e tal cê num bebe? ( NO9M, 6, 211-217 )
A cláusula apositiva grifada é não relativa ,de natureza parentética
- quer dizer eu num num :: faço essas coisas de engolir água esses trem - e
refere-se à informação nadar eu sei. Mantém com ela uma correferencialidade
a partir do momento em
que o interlocutor utiliza a cláusula em grifo,
transmitindo o significado desejado do sintagma nadar, clareando-o.
- 120 -
A cláusula apositiva do exemplo (103) abaixo não é relativa e nem
parentética e tem a função de busca de denominação, como se pode ver:
(103) ... temos que estudar por fora, isto é , temos que ter outras fontes de
estudo fora da faculdade. (R89,01,14-15 ).
Esse exemplo foi extraído de um texto dissertativo escrito, onde o
locutor explana sobre a importância do estudo. Observe-se que ele utiliza a
cláusula apositiva em grifo - isto é, temos que ter outras fontes de estudo fora
da faculdade - que não é de natureza parentética, nem é do tipo relativa
explicativa, para denominar melhor a informação anterior estudar por fora,
para garantir a clareza do que diz.
No exemplo (103) ocorre uma cláusula apositiva do tipo relativa
explicativa, como a do exemplo (103), que não é parentética. Vê-se nela,
também, a intenção de busca de denominação:
(104)
... quando eu vou analisar no discurso do professor ... tá? eu encontro
um discurso eh um quando eu pergunto pro professor qual é, quais
são os temas que ele acha que representam a didática ... qual qual é
a quais são as obras representativas desse conteúdo ... eu encontro
um uma :: aquilo que eu chamo de um samba do crioulo doido
quando dá samba ... tá? ... pelo menos aparentemente (...)
(DO8F, 14, 496-506).
O locutor, ao dissertar oralmente sobre seu trabalho de pesquisa,
fala da didática no discurso do professor. E nesse discurso do professor
sobre didática encontram-se os itens que ele traduz, ou seja,
formula,
através de uma construção metalingüística, representada pela cláusula
apositiva em grifo - que eu chamo de um samba do crioulo doido quando dá
samba -
ou seja, os conceitos encontrados para didática, entre os
- 121 -
professores, são tão caóticos que se assemelham a um samba do crioulo
doido. Há toda uma situação de metalinguagem com a finalidade de se
promover uma intercomunicação.
Essa função de busca de denominação pode, ainda, vir marcada por
vários recursos, segundo Jubran (1997), recursos esses que podem vir
materializados numa justaposição ou alternância de sinônimos, comentários
parentéticos do locutor a respeito de uma opção lexical, expressões
parentéticas como isto é, quer dizer, sobretudo, mais precisamente,
acompanhadas de uma opção lexical; ou por expressões como digamos
assim, podemos dizer assim, por assim dizer, vamos dizer assim que vêm
antepostas ou pospostas a uma determinada opção lexical; e, finalmente, por
frases
que
registram
procedimentos
metalingüísticos
(comentários
matalingüísticos).
O presente trabalho limitou-se ao estudo da função parentética de
busca de denominação apenas aquelas que são indicadas pelas expressões
parentéticas, que são introdutoras de cláusulas apositivas, as quais
constituem objeto desta pesquisa. Encerrando esta seção, observem-se mais
dois exemplos dessa função de busca de denominação:
(105)
procurei analisar a evolução dos fundamentos na educação e em cada
momento eu identifiquei a presença desses fundamentos de uma
determinada forma ... ora por exemplo na no no princípio na educação
na na no período colonial eu chamei a achei nesse período que a educa/
ah os fundamentos se apresentavam de forma implícita ... porque o o ...
vamos dizer assim a a a prática eh era uma complementação uma
funcionalidade dos princípios ... elas se fazeim em função elas elas se
estruturavam em função de princípios eh eh estabelecidos a priori ... né?
segundo seguindo muito a concepção que nós chamamos de tomista ou
seja uma concepção mais essencialista ... depois já na por exemplo lá
na década de vinte nós vemos surgir a a :: instrumentalização das
ciências a psicologia a sociologia ... né? (DO6F,9-10,344-363).
- 122 -
O informante introduz, nesse excerto, duas cláusulas apositivas com
a função de busca de denominação. Com a primeira - vamos dizer assim a a a
prática eh era era era uma complementação uma funcionalidade dos
princípios - ele procura elucidar o sentido do sintagma princípios da
educação. Na segunda cláusula - ou seja uma concepção mais essencialista o informante estabelece o significado de concepção tomista e retifica a opção
lexical anterior, elucidando-a e, conseqüentemente, tentando atingir seu
objetivo interacional. Observe-se o comportamento metalingüístico entre as
unidades. Tal procedimento visa uma substituição mais adequada ao contexto.
O mesmo ocorre com o exemplo (106):
(106) ... eu era do tipo assim de querer tudo certinho no dia na data marcada e
tal e ... ficava louca ... né? ... como se diz consertar o MUNdo e tal agora
também eu falei não posso fazer é isso ... se servir bem ... se num servir
... (NO4F, 21,812-816).
O locutor, tentando elucidar o sintagma querer tudo certinho (...) e
tal, busca uma denominação que julgou mais acertada -
como se diz
consertar o MUNdo e tal.
3.2.1.7. Função de "explicitação do valor de uma palavra no contexto
Também essa função se refere à formulação lingüística do tópico,
como pode ilustrar o exemplo (107), abaixo, de língua escrita, em que o
informante narra uma situação de medo pela qual já havia passado:
(107)
Não sei se falo daquele “medinho” pela razão, ou medo enorme no
peito. Medo de avião: frase cantada por Vinícius de Morais que ecoa
ainda no meu nos nossos ouvidos ... (NE10F, 01,06-09).
- 123 -
Veja-se que o item lexical medinho, que já se encontra entre aspas
no texto original, é, através de um procedimento metalingüístico, “objeto de
um comentário sobre o seu significado e/ou referência” (Jubran, 1997: 06 ),
quando o informante utiliza uma cláusula apositiva substantiva
para
estabelecer um significado do que ele quer comunicar, o que é o medo dentro
de um processo de explicitação dada pela cláusula apositiva - frase cantada
por Vinícius de Morais que ecoa ainda no meu nos nossos ouvidos.
3.2.1.8. Função de "marcação do estatuto discursivo de um fragmento no
texto"
Nessa função, a cláusula apositiva se presta à “construção textual”
ou “montagem textual”, conforme aponta Jubran (1997). Esse tipo de
parentetização já não se refere ao conteúdo tópico, nem à formulação
lingüística do texto. Ele focaliza a construção
textual ( progressão,
estruturação, etc). No exemplo (108), o informante narra o "episódio das
pedras" , por escrito. Trata-se de uma situação de "aperto" que ele viveu em
outra cidade, que não a de sua residência, quando teve uma cólica renal:
(108)
A F. ficou apavorada e, embora nós estivéssemos de carro, preferiu
pedir ajuda de um vizinho para me levar ao pronto-socorro local.
As meninas ficaram em casa com a mulher do tal vizinho tomando
conta. A propósito, eu me lembro de algo que não havia falado antes:
as meninas se trancaram na casa e não deixaram a moça entrar. No
pronto-socorro eu fui logo atendido e o médico, embora parecesse
inexperiente dada a “qualidade” do hospital acertou em cheio no
diagnóstico: era uma pedra nos rins. (NE7M, 01, 09-21).
Observe-se, nesse exemplo, que o locutor, ao inserir no seu texto o
segmento a propósito, eu me lembro de algo que não havia falado antes: as
meninas se trancaram na casa e não deixaram a moça entrar, que traz uma
- 124 -
cláusula apositiva do tipo substantiva (vejam-se os dois pontos), constrói
uma estrutura parentética, traz uma informação paralela quebrando a
seqüência textual.
Essa montagem traz uma quebra da seqüencialidade, sem contudo
quebrar a coesão e a coerência textuais, uma vez que essa inserção parentética
tem como objetivo demonstrar "movimentos de raciocínio na produção do
texto: objeções, suposições, ilustrações, informações paralelas, etc" (Jubran,
1997:10). A informação dada pela cláusula em destaque confere a ela "estatuto
de parênteses, de segmento encartado em outro" (Jubran, 1997:12).
3.2.1.9. Função de "manifestação atitudinal do locutor em relação ao
assunto"
Nessa função, que tem como foco o locutor, as cláusulas
apositivas apresentam uma manifestação da atitude do locutor em relação ao
assunto, isto é, constituem elas inserções parentéticas através das quais
o falante se introjeta no texto que produz, focalizando representações suas a
respeito de seu papel discursivo de locutor-instanciador do discurso, bem
como caracterizando o foco enunciativo a partir do qual são perspectivados os
tópicos abordados no texto. (Jubran, 1997:13).
A participação do locutor no texto é vista, lingüísticamente,
através de recursos como os postulados por Chafe (1985) e já referidos neste
trabalho, aproveitando-se, inclusive, estudos feitos por Cruz (1998) sobre as
situações de ego-envolvimento, também fundamentadas em Chafe.
- 125 -
Principalmente nesse caso, como se pode ver pelo exemplo (109),
ocorre o ego-envolvimento do locutor, no momento em que faz uso do
pronome de primeira pessoa: eu.
(109) aí o trabalho fica sendo realmente o de escreVER :: de tornar aquilo
legível pra ... pra outras pessoas e tal ... bem a orientação da F. foi
muito seGUra :: no sentido assim de que ela não tinha nenhum tipo de
de :: insegurança de de de problema com relação à orientação ... quer
dizer o que ela falava ... eu então me sentia seguro também ... apesar de
ter sido um negócio muito esporádico ... ao todo eu devo ter encontrado
com ela :: umas cinco ou seis vezes ... (DO9M,10, 354-369).
A cláusula apositiva grifada - quer dizer o que ela falava ... eu me
sentia seguro também - mostra um envolvimento, uma manifestação do
locutor em relação ao assunto, ou seja, ele assevera que se sente seguro com a
orientação da tese que fazia. (Vale lembrar que se considerou como cláusula
apositiva toda a unidade informacional que foi grifada).
3.2.2. Apositivas: Mecanismos de inserção e reconstrução
Nas próximas seções serão discutidos exemplos de cláusulas
apositivas cujas funções foram fundamentadas nos estudos de Koch et al
(1990); são os "mecanismos de desaceleração", ou seja, as "descontinuidades
na progressão temática". Esses casos constituem um grupo cujas funções
discursivas não coincidiram com as funções "textuais - interativas dos
parênteses" postulados por Jubran (1997), que foram vistas até agora.
Como já foi dito, em seus estudos, Koch et al (1990) observaram
que as rupturas provocadas no processamento da informação por processos de
inserções no tema (segmentos parentéticos autocondicionados e "seqüências
laterais" heterocondicionadas) ou por reconstrução (repetição sem variação e
- 126 -
com variação: reparos e paráfrases; e as adjunções), não provocam
desestruturação no discurso oral. São, na verdade, estratégias que o locutor
usa com vistas a facilitar a interação comunicativa. Esse fato observado no
discurso oral pode ser estendido ao discurso escrito, como poderá ser
observado nos próximos exemplos.
Assim, dentro desses mecanismos, serão vistas as funções
concernentes: i) aos mecanismos de inserção parentética, (autocondicionados
- as chamadas “frases-hóspedes”); ii) aos mecanismos de reconstrução por
repetição, com variação, ou de reconstrução em forma de adendos
afterthoughts), todos eles postulados por Koch et al (1990).
3.2.2.1. Função de "avaliação"
Observe-se o exemplo abaixo:
(110) ... A F. telefonou para o GP(General Practicioner) nosso_ que por sinal
era uma droga_ e ele felizmente atendeu prontamente EM CASA me
indicou um analgésico forte e isto piorou a situação ainda mais já que o
analgésico produz contrações do ureter...( NE7M, 3, 65-73)
Na cláusula apositiva que por sinal era uma droga, o informante
expressa uma avaliação negativa acerca do General Practicioner . Ele o
considera uma droga. Nesse tipo de função, a cláusula apositiva, que é uma
frase-hóspede, cumpre um propósito de comunicação, quando, ao quebrar o
fluxo informacional nuclear, presta-se a dar uma outra informação, sem
contudo afetar a coesão entre a informação primária e a informação dada por
ela.
- 127 -
3.2.2.2. Função de "correção"
Nessa função, a cláusula apositiva de natureza parentética vem
inserida no tema trazendo uma informação subsidiária . É auto-condicionada,
uma vez que o próprio falante tem a iniciativa de encaixá-la. Observe-se o
exemplo (111), onde o falante corrige o segmento período de oitenta e três
para oitenta e um a oitenta e três.
(111)
... O :: a população qu eu trabalhei foram ... os egressos formador no
período de oitenta três ... ou seja ... de oitenta e um a oitenta e três teve
uma avaliação interna ... né? ... esses indivíduos que formaram em
oitenta e três ou a partir de oitenta e três ... ( DO5M,15,547-552).
3.2.2.3. Função de "reparo"
Essa função de reparo, junto com as funções parafrásticas,
constituem, segundo Koch et al (1990), mecanismo de reconstrução textual.
São repetições auto-condicionadas com variações e objetivam uma
reelaboração na seqüência discursiva. No exemplo (112), que ilustra essa
função, o documentador dialoga com seu informante sobre o "gosto por textos
antigos".
(112) D:
... mas eu achei muito interessante viu? Eu gosto de mexer ... com
com textos ... passados sabe? ... acho mais :: se lá eu tenho ... eh
I:
[ é ... é muito interessante ]
D: eu tenho um gosto assim ... pelo mistério pelo :: essa coisa que nem
é d'agora que eu tô vendo com esses olhos digamos assim ouvindo
... né? pra você tentar descobrir o que que aconteceu é bem
interessante né? (DO10F, 08, 295-303)
- 128 -
A cláusula apositiva em grifo marca uma interrupção para que o
locutor faça um reparo da expressão tô vendo, substituída por ouvindo .
Observe-se a expressão digamos assim, que é própria dessa função.
É interessante observar, também, que essa função, como aliás toda
a aposição, se caracteriza por ser parafrástica, uma vez que apresenta um teor
de metalinguagem discursiva. Segundo Koch et al (1990), essa função
reformula a expressão anterior, fazendo do reparo uma forma de repetição
com variação.
O reparo, como já foi colocado antes, é um processo de
reconstrução. Apresenta uma repetição na qual o locutor retoca o enunciado,
substituindo a formulação que lhe vem anteposta por uma outra que atenda
mais aos seus intentos comunicativos e interacionais.
Essa função difere da função de retoque, tirada dos postulados de
Jubran (1997), no sentido em que no reparo há uma substituição de uma
primeira formulação por outra, e, na função de retoque da teoria de Koch et al
(1990 não se substitui a primeira formulação, apenas a retoca, repetindo-se
inclusive o item lexical da primeira . Veja-se:
(113)
o grande veículo né/ ... de uma transformação mais ... ou seja uma
formulação mais significativa mais ... no sentido mais social mais
democrático ... né? são as instituições que a gente tá diretamente
trabalhando ... né? ( DO5M, 10,351-356).
O informante faz um reparo de sintagma tranformação para uma
formulação. Há uma substituição de um item lexical que melhor atenda a
clareza da comunicação.
- 129 -
3.2.2.4 Função de "paráfrase explicativa"
Essa função se caracteriza por ser auto-condicionada ou heterocondicionada. Isto é, pode ser efetuada por iniciativa do locutor ou por
interrupções do interlocutor. Constitui um processo visivelmente ralentador da
progressão temática, segundo Koch et al (1990). Possui um caráter
reconstrutor aliado a um teor de metalinguagem discursiva. Através dela, "o
falante retoma, explicita, ilustra o conteúdo do que já disse" (Koch et al
1990:167).
De uma certa forma ela permeia todo o processo de aposição que,
na verdade, constitui um processo de referenciação. Exemplificando:
(114) ... que o professor abra novos caminhos e se mostre mais atuante, ou
seja abandone suas normas padronizadas de ensino e se prepare ...
(R10,01,07-08).
Esse exemplo foi retirado de uma redação dissertativa sobre o
papel do professor. Observe-se que o locutor usa a expressão também
parafrástica ou seja quando explicita o que significa dizer que o professor se
mostre mais atuante.
Como já foi afirmado, essa função está presente em todas as
outras, uma vez que a característica básica da aposição é a de explicitar,
precisar o conteúdo já dito.
Veja-se um segundo exemplo, tirado de uma narrativa escrita, na
qual o locutor descreve uma situação de perigo pela qual passou:
(115) ... um passeio arriscado, pois, a pretensão de fazê-lo em velocidade num
carro com insuficiência mecânica ou seja no qual a suspensão estava
- 130 -
quase solta e a roda dianteira estava na iminência de se desprender, era
mesmo muito arriscado ... (NE5M, 11, 362-366).
Observe-se que a cláusula em destaque parafraseia a expressão
insuficiência mecânica,
explicitando-a, precisando-a melhor: no qual a
suspensão estava quase solta e a roda dianteira estava na iminência de se
desprender.
3.2.2.5. Função de "adendo"
Esse é um outro processo de reconstrução que envolve uma
reelaboração na seqüência discursiva. Constitui ele uma informação
complementar importante ao assunto em pauta. Vem acrescentado a
posteriori. Pode ser considerado, num conceito mais amplo, como um
afterthought, que, como já se disse, segundo Koch et al (1990:173) - "se
caracteriza como uma interposição tardia, na linha discursiva, de uma
informação antes elidida".
Essas cláusulas apositivas se apresentam isoladas, por uma
pontuação, do que normalmente é chamado de fundamental - termo que
antecede. Conforme foi colocado anteriormente, a noção de unidade
informacional (idea unit), postulada por Chafe (1985), foi de suma
importância para a análise de Decat (1999) sobre a dependência ou não das
cláusulas, dentre elas as apositivas, também chamadas desgarradas "cláusulas subordinadas sem a matriz" (Decat, 1999:26).
As cláusulas analisadas, nesta seção, funcionam como adjuntos, e
constituem opções organizacionais do discurso, constituindo, por isso,
unidades de informação à parte.
- 131 -
As cláusulas apositivas desse tipo, como já se afirmou,
constituem, segundo Koch et al (1990), um mecanismo de reconstrução que
ocorre quando:
No desenvolvimento de uma unidade discursiva, o falante se dá conta da falta
de uma informação importante relativa ao assunto em pauta, ou sente a
necessidade de enfatizar ou, ainda, reavivar na mente do interlocutor uma
informação já presente no universo do discurso, o que leva a acrescentar a
posteriori ou a reapresentar tais informações sob forma de adendos ou
adjunções (Koch et al, 1990:172).
A colocação desse tipo de cláusula a posteriori é de cunho
enfático e se presta, como também já foi colocado, a objetivos interacionais
uma vez que o locutor reitera a unidade anterior visando explicitar a
informação.
Logo abaixo, apresentam-se as funções exercidas pelas cláusulas
apositivas dos gêneros dissertativo e narrativo do corpus aqui usado tanto na
modalidade oral quanto na escrita.
O adendo ou afterthought, pode ter as funções de i) acréscimo, ii)
explicitação e iii) ilustração. Atualmente é
um recurso muito usado na
linguagem jornalística.
3.2.2.5.1. O adendo como "acréscimo"
Veja-se:
(116)
De posse do formulário, devidamente preenchido (detalhe muito
importante), dirija-se ao Departamento da Polícia Federal portando
todos os documentos exigidos. Que não são poucos: carteira de
identidade ou certidão de nascimento, prova de quitação Que não com
- 132 -
as [ ... ] " (Jornal de Casa. BH-MG, 9 a 15/05/93 - apud, Decat,
1997:30)
A cláusula grifada constitui uma relativa explicativa, desgarrada conforme postula Decat (1999) - que acrescenta uma informação considerada
necessária para a compreensão da unidade anterior. Observe-se que tal
cláusula apositiva se situa após um ponto final ( correspondendo a uma pausa
máxima da voz na língua oral) e quebra momentaneamente o fluxo da
seqüenciação temática, buscando a interação comunicativa.
No exemplo (117) a extensa cláusula apositiva (em destaque)
também apresenta-se desgarrada de uma "principal"; e, apesar de iniciada por
um pronome relativo que, acha-se separada de seu "fundamental" puxa-sacos
de plantão, por um ponto final. Constitui, ela, também, um adendo com a
função de acréscimo:
(117) O ideal seria que a imprensa não se tivesse movido para cobrir e dar
repercursão a este rol de tolices que andam dizendo alguns militares
puxa-sacos de plantão. Que não podem nunca ser representados nem pelo
brigadeiro Ivan Frota, exatamente aquele que teve, nas eleições de 1998,
como candidato a presidente, 251.000 votos, e que pela enésima vez,
acaba de pedir o impechment de FHC, nem muito menos pelo deputado
Jair Bolsanaro, ex-oficial do Exército que a todo instante propõe, como
solução para o País, o fuzilamento do presidente da repíblica. (Acílio
Lara - Estado de Minas, 03/01/2000).
3.2.2.5.2. O adendo como "explicitação"
Nessa função a cláusula que constitui o adendo visa explicitar melhor
o tópico anterior. É uma demonstração de que o falante se deu conta de que
faltava uma informação importante "relativa ao assunto em pauta" (Koch et al,
1990), como pode ser visto em (118) a seguir:
- 133 -
(118)
Melhor seria admitir que o que se pretende é revogar o passado e
fundar um outro país - que por mais que desejem, terá admirável
vizinho do norte, os Estados Unidos. Que se fez poderoso justamente
por preservar sua história, seus mitos e tradições, e trabalhava para,
a partir daí garantir a evolução dos direitos. Esses sim, o exemplo
para as autoridades do Brasil. (Alfeu Silva Mendes - Estado de Minas,
19/01/2000).
Observe-se que há uma superposição de apostos, pois, o tópico
Estados Unidos já constitui um aposto simples de admirável vizinho do norte.
O locutor usa uma aposição clausular para explicitar uma aposição anterior
sob a forma de sintagma simples: Estados Unidos. Assim, a cláusula apositiva
em grifo constitui um adendo que vem explicitar melhor a informação a ser
dada.
3.2.2.5.3. O adendo como "ilustração"
Também nesse caso a ilustração constitui um mecanismo de
acréscimo cuja função é não só interativa, como argumentativa, isto é, de
"trazer para o centro de atenção do ouvinte, ou reavivar em sua mente
informações importantes relativas ao tópico em desenvolvimento". Koch et al
(1990:176).
Essa foi uma função que apareceu em menor escala no corpus
pesquisado. Veja-se o exemplo a seguir:
(119) I: tudo :: ... eh ... eh ... eu sou profundamente apaixonada por Fernando
Pessoa ... e ... eu curto muito em ... um trecho do ... dum poema dele
Álvaro de Campos né? porque meu heterônimo predileto é o Álvaro
Campos ... que ele diz que eu quero :: ... tudo ... e um pouco mais se
puder ser ... e até ... se não puder ser né? então assim ...
D:
[ uhn
uhn
I:
eh foi tudo muito junto sabe? assim ... eh filho casa trabalho ...
(NO4F, 8, 285-295).
- 134 -
A cláusula apositiva em destaque vem ilustrar o trecho dum
poema dele, Álvaro de Campos. Tem-se aí, uma aposição sob forma de
cláusula a ilustrar uma outra aposição sob forma de sintagma simples: Álvaro
de Campos.
Como se pode ver nos exemplos que ilustram a função de adendo,
as cláusulas sob análise aparecem desgarradas da cláusula chamada de
"principal", constituindo, às vezes, como que períodos à parte que trazem
informações que abrangem um discurso maior do que a sentença. Seu
fundamental, na verdade, é constituído por um contexto, representado por uma
unidade de informação anterior. As cláusulas, assim, passam a pertencer ao
conjunto organizacional do discurso. Cooperam, ao contrário do que parece,
para a unidade temática que tem a ver com a coerência macroestrutural que,
segundo Val (1999:13)
é sinalizada microestruturalmente (processo que os outros autores chamam de
coesão) pelas retomadas pronominais, pelo uso de artigos definidos e
pronomes demonstrativos, pelas repetições ... pelas indicações de recuperação
de informações pressupostas ou consideradas inferíveis pelos interlocutores (
... ) recursos fundamentais para o traçado da trama textual com funções
importantes como: . sinalizar a manutenção do tema; . deixar mais claro do
que se fala a cada passagem; . tornar tentar mais inteligível para os
interlocutores alguma idéia reapresentando-a em outros termos. (Val,
1999:13).
Esse tipo de estrutura, onde a cláusula se apresenta desgarrada,
costuma ser encontrada em textos de linguagem escrita jornalística do gênero
dissertativo.
- 135 -
3.3.
Incidência
da
cláusula
apositiva
no
corpus
pesquisado
Pelo que foi demonstrado até o momento no presente capítulo,
urge que se faça uma demonstração quantitativa das funções da aposição, num
âmbito abrangente, para que se possa visualizar quantitativamente quais as
funções de maior incidência no corpus pesquisado e qual a relação que há
entre os índices obtidos e as funções ocorrentes.
Quadro III – Orações apositivas: incidência das funções
Classificação
1-Exemplificação
2- Esclarecimento
3- Ressalva
4- Retoque
5- Justificativa
6- Busca de denominação
7- Explicitação do valor de
uma palavra no contexto
8- Marcação do Estatuto
discursivo
de
um
fragmento no texto
9- Manifestação atitudinal
do locutor em relação ao
assunto
10- Avaliação
11- Correção
12-Reparo
13- Paráfrase explicativa
14- Adendo por acréscimo
15- Adendo explicitativo
16- Adendo ilustração
Total
DO
L.O
NO
Subotal
DE
L.E
NE
02
40
02
13
04
05
----
01
29
02
01
--09
---
03
69
04
17
04
14
---
--06
01
02
--04
---
---
---
---
01
---
--01
15
07
------90
--01
--07
----01
54
- 136 -
TOTAL
02
03
01
------01
Subtotal
02
I09
02
02
--04
01
---
01
01
01
01
---
---
01
02
--02
15
14
----01
144
01
----08
09
05
--36
------05
01
----14
01
----13
10
05
--50
01
02
15
27
10
05
01
194
05
78
06
19
04
18
01
Como se pode ver no Quadro III, ocorreu um total geral de 194
cláusulas apositivas. A função de maior incidência foi a de esclarecimento. E,
as funções ocorreram na seguinte escala decrescente: primeiramente, a função
de esclarecimento, seguida pelas funções de retoque, reparo, paráfrase
explicativa, e, depois, a de busca de denominação.
As demais funções encontradas perfizeram um pequeno índice,
veja-se:
ü função de exemplificação apresentou 03 (três) unidades, 02 (duas) no
dissertativo oral e 01 (uma) no narrativo oral;
ü a função de ressalva - 04 (quatro) unidades; 02 (duas) no discurso oral e
02 (duas) no narrativo oral;
ü a função de justificativa - 04 (quatro) unidades, todas no dissertativo oral;
ü a função de manifestação atitudinal do locutor em relação ao assunto - 01
(uma) unidade no dissertivo oral;
ü a função de correção - 02 (duas) unidades, uma no discurso oral, outra no
narrativo oral;
ü a função de adendo ilustração - 01 (uma) unidade no narrativo oral.
A Tabela 3, abaixo, demonstra resumidamente o resultado em
índices da incidência das cláusulas apositivas no corpus pesquisado:
Tabela 3 – Resumo das ocorrências das cláusulas apositivas
LO
Ocorrências
unitário
%
DO
90
46,39
NO
54
27,22
Subtotal
144
74,22
DE
36
18,56
- 137 -
LE
NE
14
7,22
Subtotal
50
25,78
TOTAL
---194
100%
Pela Tabela 3, pode-se notar que há entre a linguagem escrita e a
linguagem oral uma certa diferença no índice de uso da aposição. A língua
oral apresenta um índice de uso mais elevado.
Do total de 194 (cento e noventa e quatro) ocorrências, a língua oral
perfaz um índice de 74,22% , ao passo que a língua escrita apresenta o índice
de apenas 25,78%.
Pode-se ver que a aposição clausular predomina na modalidade de
língua oral - 74,22% - mais especificamente no gênero dissertativo oral 46,39%; ao narrativo oral couberam os outros 27,22%. Esse fato parece
demonstrar que a aposição, em forma clausular, se presta à interação verbal,
uma vez que é justamente nessa modalidade argumentativa que o locutor
carece de mecanismos persuasivos a fim de expandir uma informação dada
anteriormente.
A atividade verbal, tanto oral quanto escrita, se desenvolve
justamente nesse dinamismo do envolvimento interacional. E, nesse mister,
... pode-se avaliar com nitidez a capacidade ativa do locutor de planejar
momentaneamente sua comunicação, procedendo, de forma estratégica, a
inserções, reconstruções e quebras na seqüências de seu discurso. (Koch et al,
1990:149).
Assim, a parentetização, as inserções e as reconstruções são nada
mais, nada menos, do que estratégias que visam à interação comunicativa.
- 138 -
Capítulo 4
CONCLUSÃO
No presente estudo, focalizou-se a aposição, principalmente em
forma de sintagma oracional, devido à complexidade da mesma e à variedade
de aspectos que apresenta.
Contudo, para se chegar a esse estudo, passou-se de um modo
breve pela aposição em forma de sintagma simples, numa incursão pelas
Gramáticas Tradicionais, até se chegar às cláusulas apositivas que
constituíram o objeto deste trabalho.
Procurou-se demonstrar que a cláusula apositiva constituindo, ou
não, construções parentéticas e representando mecanismos de inserção ou de
reconstrução,
possui
objetivos
interacionais,
organizando,
assim,
macroestruturalmente o texto.
A análise dos dados baseou-se no pressuposto funcionalista,
abarcando os aspectos sintático, semântico e pragmático, exercendo, o
pragmático, papel preponderante na interpretação dos aspectos relativos ao
sintático e o semântico.
O uso das construções apositivas é bastante recorrente na língua
escrita, e principalmente, na língua oral; e serve ao propósito do falante de
aumentar o efeito da clareza, visando a
interação através da busca de
aquiescência do interlocutor. E para tanto, o locutor lança mão desse recurso
discursivo, através do processo de referenciação, que focaliza aquela
informação dada, ou faz uso de múltiplas reformulações parafrásticas.
Esse fato comprova que o aposto em forma de sintagma simples
ou clausular é um elemento discursivo importante, apresentando-se com mais
- 139 -
freqüência no discurso oral, marcando a ênfase, o reforço, atendendo às
intenções dos falantes, esclarecendo, explicando, definindo a informação,
vinculando informações essenciais para a decodificação do referente.
Viu-se que a modalidade apositiva que melhor exemplifica a
função discursiva da aposição é sem dúvida, quando ela se apresenta sob a
forma de cláusulas. Nessa configuração, vê-se que a aposição extrapola a sua
função tradicional de se referir a um simples fundamental. Ela vai mais longe
e se refere a algo dito anteriormente, uma informação que vai além do que é
chamado de fundamental. E por isso ela apresenta uma grande diversidade
formal e uma não menos grande multiplicidade funcional, percebida nas
gramáticas tradicionais, quando elas se divergiam em dar ao termo "aposto"
um estatuto sintático. A aposição sintagmática, como se viu, permeia quase
que todos os termos oracionais. Isto se dá, pelo fato de que a aposição, na
verdade, não possui uma função sintática; possui sim, como foi demonstrado
neste trabalho, uma função discursiva. Constitui ela um elemento articulador
discursivo.
A variedade de funções que ela exerce torna bastante difícil
estabelecer uma tipologia que possa permitir uma análise completa da
freqüência de utilização das mesmas nos textos orais ou escritos.
Ao lado dessa variedade de funções, junte-se o fato de algumas
serem tão semelhantes, que só mesmo o contexto discursivo permite perceber
nuances diferenciadoras.
A cláusula apositiva, funcionando como um elemento de
interação, leva em consideração o conhecimento partilhado, participado,
refletido do locutor, em se dar a entender, em procurar ser explícito para
sustentar a interação e lograr êxito na comunicação.
- 140 -
A maior incidência da aposição ocorreu na língua oral, pelo fato
de o texto falado surgir no exato momento da interação. E essa interação face
a face constitui, como afirma Marcuschi (1996), uma atividade de coprodução discursiva, na qual os interlocutores, interagindo, promovem
pressões de ordem pragmática, e, como afirma Koch (1995),
Acabam por sobrepor-se às exigências da sintaxe. Isto significa que o locutor,
freqüentemente, vê-se obrigado a "sacrificar" a sintaxe em favor das
necessidades da interação, fato que se traduz pela presença, no texto falado, de
falsos começos, anacolutos, orações truncadas, etc, bem como a recorrer com
freqüência a inserções de vários tipos, a repetições e a paráfrases, com o
intuito, entre outros, de garantir a compreensão de seus enunciados pelo
parceiro.( Koch, 1995:69-70).
E, para tanto, a aposição em forma de cláusula apositiva se
apresenta sob a forma de inserções, de repetições parafrásticas e tantas outras.
E dentro dos parâmetros da interação, poder-se-ia enquadrar a
aposição nas normas de Grice (1967), que dizem respeito ao princípio de
cooperação, ou seja, às categorias: i) da quantidade, ii) de relação, iii) de
modo.
Quanto à máxima de quantidade a cláusula apositiva contribui
para o "propósito corrente da conversação". Pela sua natureza parafrástica ela
contribui com informações adicionais que o ato de comunicação requer para
que seja claro e preciso. Quanto à máxima de relação: "seja relevante", a
cláusula apositiva também se encaixa, uma vez que veicula informações
relevantes para o conteúdo proposicional. Com a máxima de modo, que se
refere à importância do "como o que é dito deve ser dito", isto é, que "seja
claro", também a cláusula apositiva se identifica a partir do momento em que
contribui, como se viu, para a clareza da comunicação; tanto assim é que a
- 141 -
função em que houve maior incidência de cláusula apositiva foi justamente, a
de esclarecimento. E assim sendo, ainda dentro dessa última categoria de
Grice, a apositiva atende, ainda, as máximas de evitar-se a "obscuridade de
expressão" e a de "evitar ambigüidades". Como já se disse, no decorrer deste
trabalho, a cláusula apositiva em nome do esclarecimento, ela evita
ambiguidades e torna a informação mais clara.
Pelos estudos apresentados, verificou-se que a cláusula apositiva
exerce um importante papel no campo semântico-discursivo e que essas
propriedades se encontram atreladas a características típicas dos gêneros
textuais em que se encontram.
Em suma, adotando-se uma visão funcionalista do processo
discursivo, procurou-se mostrar que a aposição clausular tem um papel
importante na representação de estratégias discursivas, e nesse mister, não
pode ser considerada como um "termo acessório" no complexo discursivo. É
antes, um termo essencial à interação comunicativa.
Por fim, é bom que se acrescente, como já foi dito, que a própria
diversidade formal e a multiplicidade de funções da cláusula apositiva
determinam que muitos aspectos que aqui foram apresentados e comentados
permitam uma investigação mais aprofundada, pois, os resultados obtidos não
devem ser vistos, como "normas para padrões de funcionamento e sim como
procedimentos analíticos" . Marcuschi (1991:85).
- 142 -
ABSTRACT
This is a study of the appositional clause in Portuguese, from a functionalist
viewpoint, both in oral and in written texts. Initially, a survey was made of
some traditional grammarians as to the different concepts and syntactisemantic roles attributed to apposition, in the form of a simple constituent and
of a clause constrution. Then a general analysis of clauses in apposition in a
pragmatic-discursive approach was developed, focusing mainly on their
textual-interactive function of a parenthetic nature, as well as on their role in
the thematic progression, when they are characterised as discourse ariculators.
The corpus of the research was a set of narrative and argumentative oral and
written texts from Decat collection (1993), argumentative texts produced by
university students and some texts taken from newspapers.
Key words: Appositional clause
Textual functions
Discourse articulation.
- 143 -
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