Degustação
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Degustação
Paulo Cesar Domingues da Silva Histórias de um pescador Rio de Janeiro Outras Letras Editora Intr o d u ç ã o Este livro descreve várias passagens da minha longa vida de pescador amador, que começou com pescarias de acarás e bagres na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, foi até a pesca de camurupins, em Islamorada, na Flórida, e de bonefishes em Christmas Island, no Oceano Pacífico. Nessas histórias, incluo pescas realizadas com todos os tipos de equipamento, desde simples varinhas de bambu, que custavam poucos cruzeiros na quitanda da esquina, a varas sofisticadas de grafite de lançar mosca (que muitos chamam fly) de algumas centenas de dólares, passando por pesca de praia, tanto com longos caniços de bambu feitos em casa, usando carretilhas ou molinetes de tambor fixo, até equipamento sofisticado de corrico1 para peixes de bico. É natural que a maioria dos contos verse sobre a pesca com mosca, modalidade que me fascinou desde o primeiro dia que tomei conhecimento de sua existência, nos idos anos de 1940, superando mesmo a pesca de peixes de bico em alto mar, o meu primeiro amor. Para os leigos no esporte, a pesca com mosca foi inventada para pescar a truta, peixe de água fria que come, principalmente, insetos que vivem em forma larval embaixo d’água (chamados de ninfas e moscas molhadas) e também na superfície, quando eclodem ou se acasalam (chamadas de moscas secas), em determinadas épocas do ano. Na impossibilidade de se colocar moscas verdadeiras, diminutas e frágeis, num anzol, inventou-se a mosca artificial, feita de penas, plumas, pelos e fios. Para lançá-la, usa-se uma linha pesada que flutua e leva, através do ar, a mosca artificial, praticamente sem peso, atada na ponta de um líder2 de náilon _________________ 1. Corrico: técnica de pesca que consiste em rebocar na ponta da linha, atrás de um barco em movimento, uma isca verdadeira ou artificial. 2. Líder: comprimento variável de fio de náilon monofilamento atado na ponta da linha de mosca. Ele fornece uma ligação quase invisível entre a linha e a mosca. monofilamento. Assim, quanto menor e mais leve a mosca, mais simples fica o seu arremesso, pois ela corta o ar com mais facilidade. Na verdade, a mosquinha pega apenas uma carona no arremesso da linha. Com o passar do tempo, a técnica de lançar uma mosca foi ampliada para a pesca de peixes de água quente e do mar. As varas e linhas ficaram mais pesadas e as moscas mudaram de forma, passando a representar, ao invés de insetos, peixinhos, camarões, siris etc. Esta é, certamente, uma das formas mais artísticas da pesca esportiva, e o seu aprendizado em si já é uma diversão. Imagine, então, ver uma truta, tucunaré ou robalo atacar uma mosca flutuante. É indescritível! Além de pescar em lugares lindos e distantes do nosso Brasil, tive a felicidade também de, ao longo dos anos, na perseguição do meu esporte, conhecer várias regiões exóticas na Argentina, Chile, Equador, México, Belize, Costa Rica, Venezuela (Los Roques), Flórida (Islamorada), Bahamas e Christmas Island, na República do Kiribati, algumas das quais descrevo nos contos a seguir. Ao escrevê-los, me vêm à cabeça não só lembranças de companheiros de pescarias passadas, muitos dos quais não estão mais entre nós, mas também de peixes e de lugares belos e diferentes. É curioso como alguns detalhes, aparentemente insignificantes, ficam gravados permanentemente em nossas mentes e como nós nos lembramos muito mais dos peixes perdidos do que daqueles que foram apanhados. Lembro-me, como se fosse hoje, da minha primeira truta pescada no Brasil, em uma mosca artificial. Ela sucumbiu a uma mosca molhada inglesa, chamada March Brown, no Rio Macaé de Cima, no trecho próximo à Fazenda São João, no Estado do Rio de Janeiro. Essa mosca tinha sido importada da Inglaterra, juntamente com várias outras, numa caixinha de papelão, que comprei mais pela beleza do que utilidade. Já as tinha comigo há vários anos, não sei em que loja foram adquiridas e tampouco como foram parar lá. Naquela época, ninguém ainda havia ouvido falar em pesca com mosca no Brasil. Apesar de ter várias outras moscas feitas por mim, eu não acreditava na minha eficácia como atador de moscas e, por isso, não as amarrava na ponta do meu líder. Assim, foi um acontecimento fortuito que terminou se transformando em uma homenagem involuntária, mas merecida, aos introdutores da pesca com mosca no mundo, os ingleses Izaak Walton e Charles Cotton. A trutinha dificilmente alcançaria vinte e cinco centímetros de comprimento, mas, para mim, foi a confirmação de que eu era capaz de pescar uma truta com uma mosca artificial. Ela foi apanhada com a técnica simplista e eficiente, preconizada por Jason Lucas, um dos meus mestres americanos, durante muitos anos editor da seção de Pesca em água doce da revista Sports Afield. Ele a recomendava para principiantes ansiosos por pegar sua primeira truta numa mosca. Já a primeira truta pescada com uma mosca seca pegou uma Iron Blue Dun com asas cinzas de penas de pato no Rio Caunahue, no Chile. A cena dela saltando nas águas cristalinas do rio está indelevelmente gravada na minha memória. Gostaria de aproveitar a oportunidade para pedir a você, pescador brasileiro, qualquer que seja a modalidade de pesca esportiva que você pratique, que experimente lançar uma mosca. Lembre-se de que nunca é tarde e se você não o fizer estará desperdiçando uma oportunidade fantástica de aprender uma das facetas mais interessantes, desafiantes e, muitas vezes, mais produtivas desse esporte. Garanto que, após pegar seu primeiro peixe com uma mosca, você deixará aos poucos os outros equipamentos e poderá dizer com orgulho: “Eu sou um mosqueiro”. Se, porém, não quiser abandonálos, você estará dominando uma técnica imprescindível para pescar uma truta em água doce ou um ubarana-rato (bonefish), em água salgada. A exemplo do meu livro anterior Pescando com Mosca, eminentemente técnico, este livro é também resultado do incentivo de parentes e amigos que insistiram para que eu escrevesse depois de ouvirem algumas das minhas histórias de pescador. Entre eles, lembro-me dos meus sobrinhos, Sadi França e Elizita Picot, e dos meus amigos mosqueiros, pioneiros no Brasil na pesca com mosca, Marcelo Rozas, de Presidente Prudente (SP), Alex Koike e Rogério Dipold, de São Paulo (SP), Hiran Noronha, de Catalão (GO) e, mais recentemente, Mario Cardin, de Cornélio Procópio (PR). Assim, resolvi juntar esses contos, alguns de pescarias bem sucedidas, outras fracassadas, algumas muito antigas, outras recentes, algumas engraçadas, outras tristes, tudo num só livro. Essas histórias são, na verdade, lembranças de minhas pescarias. S u m á r i o A maldição .................................................. 15 Memórias do Arpoador ............................. 24 Os pampos de São Conrado ..................... 30 Batismo de fogo ........................................... 37 A vingança dos paneleiros ....................... 44 O marlin branco do Jack Spot ................. 51 A morte de um rio ..................................... 62 La Boca ........................................................ 70 Um dia inesquecível .................................. 82 Uma aventura no Alasca ........................... 91 Camurupins de Islamorada ...................... 102 O primeiro bonefish ................................... 119 A saga do dourado .................................... 126 O fantasma cinzento dos baixios ........... 137 Pescando no escuro .................................. 146 O mapinguari ............................................. 156 Os gafanhotos do Ñirihuao ........................ 165 Ao sul de Cancún ....................................... 170 As marrons do Misterioso ......................... 181 Dois mosqueiros no Iriri ............................ 186 As trutas da Laguna Cea ............................ 194