Connections with Leading Thinkers

Transcrição

Connections with Leading Thinkers
Instituto de
Alta Performance
Connections with Leading Thinkers
O acadêmico Carlos Arruda discute os problemas que
precisam ser superados para aumentar os níveis de
inovação na economia brasileira.
Connections with Leading Thinkers
Carlos Arruda é professor de Inovação e
Competitividade, gerente do Núcleo de Inovação
e Empreendedorismo e diretor executivo adjunto
de Parcerias Empresariais da escola de negócios
Fundação Dom Cabral (FDC). Eduardo Plastino,
do Instituto de Alta Performance da Accenture,
o entrevistou como parte de uma pesquisa sobre
inovação na economia brasileira.
2 | Instituto de Alta Performance da Accenture | Copyright © 2015 Accenture. Todos os direitos reservados.
Connections with Leading Thinkers
IAPA: O que explica o fraco
desempenho em inovação do Brasil,
quando comparado ao de outros
países?
ARRUDA: Um ponto importante é que o
ambiente de negócios aqui não é propício
à inovação. Compare, por exemplo, os sete
a dez anos que você pode levar para obter
uma patente no Brasil com os poucos meses
necessários na Suíça ou nos EUA. Há, também,
outras questões que afetam toda a economia,
como nossa pesada carga tributária e baixos
níveis educacionais.
IAPA: Mesmo assim, existem algumas
empresas muito inovadoras no Brasil.
ARRUDA: Sim, mas muitas importam
inovação e fazem um mínimo de
customização. Na verdade, as empresas
multinacionais, mesmo as que têm centros
de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) aqui,
muitas vezes não contam o Brasil entre suas
principais fontes mundiais de inovação.
IAPA: Qual o papel desempenhado
pela universidade nos ecossistemas de
inovação brasileiros?
ARRUDA: As universidades brasileiras,
especialmente as públicas, geram uma
boa quantidade de pesquisa relevante. No
entanto, essa pesquisa raramente se traduz
em tecnologia e inovação. Isto se deve a
uma percepção de que, uma vez que o
conhecimento gerado pela universidade
depende de recursos públicos, ele não deve
ser transferido para o setor privado sem uma
compensação financeira adequada. Assim,
quando se trata de transferir para o setor
privado tecnologia gerada pela universidade,
algo que de toda forma só acontece de vez
em quando, a transferência tende a ser para
grandes empresas.
“Você precisa de start-ups que atuem
como as pequenas engrenagens
tomadoras de riscos que giram entre
a universidade e as grandes
corporações para fazer o motor da
inovação funcionar”
IAPA: Isso é um problema?
ARRUDA: Em lugares como os EUA e Israel,
as licenças para utilizar o conhecimento
gerado pela universidade vão, principalmente,
para start-ups. E as start-ups constroem
pontes para as grandes empresas. No
Brasil, temos uma situação diferente: as
universidades não procuram gerar empresas;
elas querem educar as pessoas e produzir
pesquisa para publicação. Felizmente, isso
parece estar mudando. Além disso, há um
momento favorável ao empreendedorismo no
país. Porém, historicamente, temos um quadro
em que o governo investe em universidades
e centros de pesquisa e transfere recursos
para as grandes empresas por meio do BNDES
e de algumas leis específicas. O problema é
que nos falta esse elemento intermediário
que são as start-ups. Esse problema do nosso
ecossistema precisa ser resolvido para que a
nossa economia se torne mais inovadora.
3 | Instituto de Alta Performance da Accenture | Copyright © 2015 Accenture. Todos os direitos reservados.
IAPA: Por que grandes empresas
dependem de start-ups para
transformar o conhecimento gerado
pela academia em inovação?
ARRUDA: A colaboração entre grande
empresa e academia não é natural em lugar
algum. Em última análise, grandes empresas
buscam conhecimento que elas possam
escalonar. Universidades geram conhecimento
que pode ter esse potencial, mas você precisa
de start-ups que atuem como as pequenas
engrenagens tomadoras de riscos que giram
entre a academia e as grandes corporações
para fazer o motor da inovação funcionar.
Connections with Leading Thinkers
“A maioria das grandes corporações
no Brasil não percebe que uma
pequena empresa pode usar seu
conhecimento e chegar a uma
solução inovadora. Isso não faz
parte de sua mentalidade”
IAPA: Como a ponte entre startups e grandes empresas pode ser
construída?
ARRUDA: Existem alternativas. O venture
capital (capital de risco) corporativo muitas
vezes é um caminho de sucesso. A Intel, por
exemplo, investe em empresas pequenas
no Brasil, e em outros países, em vez de
adquiri-las. Infelizmente, temos poucos outros
exemplos como esse aqui.
IAPA: Como seria possível estimular o
venture capital corporativo no Brasil?
ARRUDA: Provavelmente seria necessário
mudar alguns aspectos fundamentais da
nossa economia. A realidade é que, apesar
do aumento do interesse pela inovação,
as empresas brasileiras continuam tímidas
na hora de investir. A maior parte do
investimento em inovação vem do governo.
No entanto, não podemos culpar as empresas
quando há tanta incerteza no curto prazo.
Além disso, as taxas de juros são altas, de
forma que o investimento em renda fixa
oferece um retorno de cerca de 6% ao ano
acima da inflação. Quando você considera
ainda a carga tributária elevada e os altos
custos operacionais enfrentados pelas
empresas no Brasil, você entende por que as
empresas são tímidas em seus investimentos
em inovação. Resultado: a pouca inovação
que produzimos tende a ser incremental, e
não de ruptura.
IAPA: Por que grandes e pequenas
empresas não colaboram mais na
busca da inovação no Brasil?
ARRUDA: Parte do problema é a falta
de conhecimento por parte das grandes
empresas. Eles veem as pequenas apenas
como fornecedoras, e não como parceiras
potenciais de inovação. A maioria das
grandes corporações no Brasil não percebe
que uma pequena empresa pode usar seu
conhecimento e chegar a uma solução
inovadora. Isso simplesmente não faz parte de
sua mentalidade.
IAPA: O que podemos dizer sobre o
papel das pequenas empresas? Elas
tentam trabalhar em conjunto com
grandes empresas para inovar?
ARRUDA: Na verdade, não. No Brasil, as
pequenas empresas, especialmente (mas não
exclusivamente) nas cadeias de suprimento
industriais, dedicam-se apenas a produzir
4 | Instituto de Alta Performance da Accenture | Copyright © 2015 Accenture. Todos os direitos reservados.
aquilo que seus clientes pedem. Elas recebem
pedidos específicos e trabalham para entregálos.
IAPA: Preocupações referentes à
proteção da propriedade intelectual
também dificultam a colaboração
entre pequenas e grandes empresas?
ARRUDA: Para as grandes empresas, trata-se
quase que de uma consideração secundária
-- até porque, como eu disse, eles veem
as pequenas como fornecedoras baratas.
Entretanto, para os pequenos empresários,
proteção de propriedade intelectual é uma
questão muito importante. Eles sabem que o
sistema de proteção no Brasil é relativamente
fraco. Por isso, quando mostram algo a
grandes empresas, temem que sua ideia
seja roubada. Isso prejudica o ecossistema
de inovação, uma vez que desencoraja
os pequenos empresários a aproveitar as
oportunidades para apresentar soluções
interessantes a potenciais clientes.
IAPA: Quais são as principais
características de uma empresa
inovadora?
ARRUDA: A inovação é um processo
dinâmico. Empresa inovadora é aquela
que consegue maximizar e alavancar o
conhecimento que gera e, ao mesmo tempo,
busca continuamente conhecimento e
oportunidades no “mundo lá fora”. A Embraer
é referência em termos de gestão desses dois
imperativos.
Connections with Leading Thinkers
IAPA: Quais são as competências
que uma força de trabalho inovadora
tem?
ARRUDA: Não existe um indivíduo que seja
capaz de fazer tudo, mas pode haver uma
equipe que tenha todas as competências
importantes. Você precisa ter pessoas
capazes de implementar rotinas de pesquisa
e fazer testes e análises laboratoriais. Você
também precisa de pessoas que entendam
o mercado e suas tendências; pessoas que
sintam o pulso do mercado, que falem com
os clientes regularmente. Às vezes, pode ser
útil para as pessoas se aventurarem fora de
suas zonas de conforto. Por exemplo, você
pode ter pesquisadores que dediquem um
dia por semana a conversas com clientes.
Esses pesquisadores trarão para a empresa
novos problemas para resolver e ideias para
considerar. Assim, eles também podem chegar
a soluções. Você também precisa de gente
disposta a falar com diferentes interlocutores,
que visite universidades, pequenas empresas e
até mesmo outros países.
IAPA: Como é a liderança de uma
empresa inovadora?
ARRUDA: Normalmente, associamos inovação
a pessoas criativas. Porém, no caso dos
líderes de uma empresa, acho que estamos
falando de indivíduos obsessivos. Eles não têm
respostas; ao contrário, fazem perguntas o
tempo todo. Constantemente, eles procuram
mais perguntas, para que seja preciso
encontrar mais respostas. Eles não arrumam
as coisas; ao contrário, eles desorganizam para
os outros organizarem com novas soluções.
“Líderes de empresas inovadoras
não têm respostas; ao contrário,
fazem perguntas o tempo todo.
Constantemente, eles procuram mais
perguntas, para que seja preciso
encontrar mais respostas”
IAPA: Mas, certamente, empresas
não podem ser desorganizadas o
tempo todo...
IAPA: Costuma-se dizer que a
aceitação de erros também é
fundamental para inovar.
ARRUDA: As empresas precisam ter seus
momentos de desorganização durante a fase
criativa do processo de inovação, mas também
necessitam de organização durante a fase de
implementação. Equilibrar essa dinâmica “yin
e yang” não é fácil. Se as empresas forem
excessivamente organizadas, com todos
seguindo os mesmos padrões, dificilmente
serão criativas. Porém, se forem muito
desorganizadas, não ganharão dinheiro. A
liderança tem de resolver o desafio de deixar a
empresa fazer os dois ao mesmo tempo.
ARRUDA: O atual modelo “weberiano”
da organização é baseado em repetição,
aprendizado, padronização e minimização
de erros. É muito eficiente nisto. No entanto,
inovação requer experimentação, bem como
tentativa e erro. É por isso que as empresas
precisam criar oportunidades para que as
pessoas cometam erros. Mas aceitar erros é
perigoso.
5 | Instituto de Alta Performance da Accenture | Copyright © 2015 Accenture. Todos os direitos reservados.
Connections with Leading Thinkers
IAPA: Como, então, encontrar o
equilíbrio?
ARRUDA: Para inovar, você precisa gerir
riscos. Você tem de permitir que os erros
aconteçam, mas não pode criar uma cultura
do erro em nome da inovação. Você precisa
permitir erros e criar uma cultura de controle
da incerteza e análise de risco para que
os inevitáveis erros não prejudiquem a
organização.
IAPA: Em que áreas as empresas
brasileiras teriam vantagem
competitiva para inovar?
ARRUDA: Temos claramente, ou deveríamos
ter, uma vantagem competitiva em algumas
áreas, mas essa vantagem potencial muitas
vezes é mal utilizada. Por exemplo, pense na
gama de tecnologias inovadoras, produtos
e serviços relacionados ao meio ambiente.
Dadas as preocupações da nossa sociedade
com a sustentabilidade, bem como o fato
de o país abrigar a maior parte da floresta
amazônica, deveríamos estar na vanguarda
em áreas como a tecnologia limpa. Em
vez disso, estamos importando tecnologia
na maioria das áreas relacionadas a meio
ambiente e sustentabilidade de países
como Coreia do Sul, Alemanha e Suécia.
Infelizmente, ainda sofremos do mal do curtoprazismo, que nos impede de progredir em
muitas áreas.
IAPA: O que podemos aprender com
os países que você citou e outras
economias inovadoras?
ARRUDA: No que tange à relação entre
universidades, start-ups e grandes empresas,
Israel é uma referência para nós. Os EUA
também poderiam ser, mas essas relações,
por lá, são muito mais complexas do que
em outros lugares, pois se trata de um
ecossistema muito mais sofisticado. Assim,
lições dos EUA nessa área podem ser difíceis
de se aplicar. Quanto ao papel do Estado na
indução da inovação, poderíamos olhar para
Israel ou Alemanha. Também há lições nos
EUA, inclusive nos estados individuais, como
Massachusetts e Califórnia. Nesses e outros
lugares, o Estado induz a inovação por meio
do processo de compras governamentais.
Ao olharmos para o nível federal nos EUA,
veremos que o Departamento de Defesa é um
grande catalisador de inovação em diversos
setores. Temos de aprender com isso. No
Brasil, costumamos ver o governo federal
apenas como uma fonte de financiamento
para a inovação, mas precisamos ir muito
além disso.
6 | Instituto de Alta Performance da Accenture | Copyright © 2015 Accenture. Todos os direitos reservados.
IAPA: Professor Arruda, muito
obrigado. Gostaríamos de deixar a
porta aberta para termos um diálogo
permanente sobre tópicos ligados à
inovação.
ARRUDA: Será um prazer.
Como parte da missão do Instituto de Alta
Performance da Accenture de desenvolver
ideias e insights de ponta, seus
pesquisadores conversam com frequência
com líderes acadêmicos, executivos de
empresas e analistas setoriais. A série
Connections with Leading Thinkers inclui
algumas dessas entrevistas, mostrando os
bastidores das interações entre os
pesquisadores e alguns dos experts mais
renomados do mundo.
www.accenture.com/institute
Para mais informações,
favor entrar em contato com:
[email protected]
[email protected]
Sobre a Accenture
A Accenture é uma empresa líder global em
serviços profissionais, com ampla atuação e
oferta de soluções em estratégia de
negócios, consultoria, digital, tecnologia e
operações. Combinando experiência ímpar e
competências especializadas em mais de 40
indústrias e todas as funções corporativas
- e fortalecida pela maior rede de prestação
de serviços no mundo -, a Accenture
trabalha na interseção de negócio e
tecnologia para ajudar companhias a
melhorar seu desempenho e criar valor
sustentável para seus stakeholders. Com
mais de 358.000 profissionais atendendo a
clientes em mais de 120 países, a Accenture
impulsiona a inovação para aprimorar a
maneira como o mundo vive e trabalha.
Visite www.accenture.com.br.
Sobre o Instituto de Alta
Performance da Accenture
O Instituto de Alta Performance da
Accenture desenvolve insights estratégicos
acerca de questões essenciais de gestão e
tendências macroeconômicas e políticas por
meio de pesquisa e análise originais. Seus
pesquisadores conjugam reputação global
com a vasta experiência da Accenture em
consultoria, tecnologia e outsourcing para
produzir pesquisas e análises inovadoras
sobre como as empresas alcançam e
mantêm o alto desempenho. Visite-nos em
www.accenture.com/institute
Copyright © 2015 Accenture
Todos os direitos reservados.
Accenture, seu logotipo e
High Performance Delivered são
marcas registradas da Accenture.

Documentos relacionados

Connections with Leading Thinkers

Connections with Leading Thinkers Performance da Accenture de desenvolver ideias e insights de ponta, seus pesquisadores conversam com frequência com líderes acadêmicos, executivos de empresas e analistas setoriais. A série Connect...

Leia mais

Connections with Leading Thinkers

Connections with Leading Thinkers Performance da Accenture de desenvolver ideias e insights de ponta, seus pesquisadores conversam com frequência com líderes acadêmicos, executivos de empresas e analistas setoriais. A série Connect...

Leia mais