o blog como ferramenta tecnológica e suporte textual - SIMELP

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o blog como ferramenta tecnológica e suporte textual - SIMELP
Língua portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas
(Eds.) Mª João Marçalo & Mª Célia Lima-Hernandes, Elisa Esteves, Mª do Céu Fonseca, Olga Gonçalves, Ana
LuísaVilela, Ana Alexandra Silva
© Copyright 2010 by Universidade de Évora ISBN: 978-972-99292-4-3
SLG 15 – Géneros discursivos e/ou textuais e ensino de Língua Portuguesa no Brasil
LEITURA E PRODUÇÃO DE TEXTO ACADÊMICO:
O BLOG COMO FERRAMENTA TECNOLÓGICA E SUPORTE TEXTUAL
Márcia de Souza LUZ-FREITAS1
RESUMO
Os problemas relatados nas atividades de leitura e produção de textos na
Educação Básica geralmente persistem na Educação Superior. A dificuldade de leitura e
produção dos gêneros textuais que circulam no ambiente acadêmico afeta seriamente o
processo de ensino e aprendizagem. Objetiva-se, neste trabalho, relatar uma experiência
didática cujo ponto de partida é essa constatação. Na formação do estudante de Letras,
futuro professor de língua materna, dadas as competências que este deve desenvolver ao
longo de sua graduação, torna-se imprescindível a superação de tal dificuldade. Dessa
maneira, dentro de uma disciplina do curso de Licenciatura em Letras, propôs-se a
criação de blogs que seriam alimentados por textos acadêmicos produzidos pelos
próprios alunos, aos quais competiam também a leitura e a inserção de comentários que
fomentassem a discussão. Ao fim do período letivo, era necessária ainda a entrega de
um trabalho em que se relatasse, nos moldes acadêmicos, todo o desenvolvimento da
atividade e em que se discutissem os resultados alcançados. O uso do blog como
ferramenta tecnológica e como suporte textual foi fator preponderante na adesão dos
estudantes à proposta. Observou-se o amplo uso de estratégias metacognitivas de leitura
e produção textual e, particularmente, o desenvolvimento de estratégias específicas não
só para esse gênero discursivo (o texto acadêmico), mas também para o gênero blog. A
interação gerada bem como os mecanismos que a geraram tornaram-se merecedores de
análise. Perceberam-se três instâncias interlocutivas distintas: i) a interlocução entre os
alunos, organizados em equipes, para a produção dos textos acadêmicos que
alimentariam os blogs; ii) a interlocução mediada pela leitura do texto publicado,
resultando em comentários apensos a esse texto; iii) a interlocução final para análise de
todo o processo, que resultou no trabalho final da disciplina. Os resultados obtidos
revelaram-se animadores, pois demonstraram, nos estudantes de Letras envolvidos,
nítido crescimento das competências de leitura e escrita exigidas pelo gênero texto
acadêmico.
PALAVRAS-CHAVE: Gêneros textuais; Leitura e produção de textos; Formação de
professores.
1
Centro Universitário de Itajubá – Universitas; Curso de Letras
Universidade Federal de Itajubá – UNIFEI; Núcleo de Educação a Distância
37500-090 Itajubá – MG – Brasil
[email protected]
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SLG 15 – Géneros discursivos e/ou textuais e ensino de Língua Portuguesa no Brasil
Introdução
Este artigo é resultante de nossas primeiras incursões na educação a distância,
em que buscávamos aliar ferramentas tecnológicas e ambientes virtuais de
aprendizagem à formação de professores de língua materna, sobretudo na área de leitura
e produção textual.
Três grandes preocupações nortearam a experiência didática aqui relatada:
a) Os problemas observados nas atividades de leitura e produção de textos na
Educação Básica geralmente persistem na Educação Superior.
b) A dificuldade de leitura e produção dos gêneros textuais que circulam no
ambiente acadêmico afeta seriamente o processo de ensino e aprendizagem.
c) É mister que o estudante de Letras, futuro professor de língua materna, supere tal
dificuldade, dadas as competências que lhe são necessárias em sua atuação
profissional.
Consideramos competências necessárias ao licenciado em Letras aquelas
preconizadas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em
Letras (MEC, 2001, p. 50) dentre as quais, destacamos:
 domínio do uso da língua portuguesa ou de uma língua estrangeira, nas suas
manifestações oral e escrita, em termos de recepção e produção de textos;
 reflexão analítica e crítica sobre a linguagem como fenômeno psicológico,
educacional, social, histórico, cultural, político e ideológico;
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 visão crítica das perspectivas teóricas adotadas nas investigações linguísticas e
literárias, que fundamentam sua formação profissional;
 percepção de diferentes contextos interculturais;
 utilização dos recursos da informática.
Visando ao desenvolvimento dessas competências, propusemos em uma
disciplina do curso de Licenciatura em Letras a criação de blogs que seriam alimentados
por textos acadêmicos produzidos pelos próprios alunos, com o objetivo de incentivar a
leitura e a produção textual bem como desenvolver estratégias discursivas peculiares ao
gênero textual determinado e à pressuposta interação exigida para sua efetividade.
Escolhemos o blog principalmente pela grande interação proporcionada, o que ampliaria
a motivação de todos os discentes envolvidos e a colaboração para o êxito da atividade.
Os discentes, divididos em equipes, cada uma com um tema previamente
distribuído, deveriam, numa primeira etapa, produzir material a ser disponibilizado no
blog criado e editado pela própria equipe. Em uma segunda etapa, deveriam divulgar a
publicação e incentivar os demais membros da turma e outros alunos do curso de Letras
a ler e a redigir comentários que fomentassem a discussão. Ao fim do período letivo, era
necessária ainda a entrega de um trabalho em que cada equipe relatasse, nos moldes
acadêmicos, todo o desenvolvimento da atividade e em que se discutissem os resultados
alcançados.
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Fundamentação teórica
Escrita e a leitura são formas privilegiadas de comunicação em um contexto de
aprendizagem. O sistema lingüístico de comunicação pressupõe relativismo e
intersubjetividade, mediados pela prática cultural. O sujeito, em sua vivência no e com o
mundo, necessita de conhecimento, que é a apreensão dos sentidos, dos significados.
Essa apreensão não se faz somente pela percepção físico-fisiológica, mas, sobretudo,
pela linguagem, que lhe permite o acesso aos sentidos tanto individual como
socialmente. A oralidade, aos poucos, passa a não responder por si só a esse processo de
conhecimento, dada a sua fragilidade diante do crescimento social. A escrita representa
um grande avanço na construção do acervo cultural da humanidade. Assim, na educação
superior, em que o processo de ensino-aprendizagem se realiza por meio de produção,
sistematização e divulgação do conhecimento, a leitura e a escrita são fundamentais
(SEVERINO, 2001).
A atual concepção de linguagem, descrita nos Parâmetros Curriculares
Nacionais – PCN como “atividade discursiva e cognitiva” (BRASIL, 1998), vem, aos
poucos, alterando o ensino de Língua Portuguesa. Assim,
interagir pela linguagem significa realizar uma atividade discursiva:
dizer alguma coisa a alguém, de uma determinada forma, num
determinado contexto histórico e em determinadas circunstâncias de
interlocução (BRASIL, 1998, p.20-21).
“O discurso, quando produzido, manifesta-se linguisticamente por meio de
textos” e
todo texto se organiza dentro de determinado gênero em função das
intenções comunicativas, como parte das condições de produção dos
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discursos, as quais geram usos sociais que os determinam (BRASIL,
1998, p.21).
Vários gêneros textuais têm surgido a partir dos recursos tecnológicos e da
diversidade de mídias da atualidade. Blog é palavra que se origina da abreviação de
weblog, composto cujo primeiro elemento, web (tecido, teia), designa o ambiente de
Internet e cujo segundo elemento, log, significa diário de bordo. A palavra denomina
uma ferramenta do mundo virtual que permite a seus usuários inserir conteúdos na
internet e interagir com outros internautas. Sua principal forma de interação está na
inserção de comentários que geram um ir e vir de turnos de interlocução, gerenciados
pelo proprietário do blog (COSTA, 2009).
Surgido em agosto de 1999, com a utilização do software Blogger, o blog foi
concebido como uma alternativa popular para a publicação de textos online e tornou-se
uma ferramenta de grande sucesso, em virtude de dispensar conhecimento especializado
em computação, além de facilitar as atividades de edição, atualização, divulgação e
organização dos textos e permitir a convivência, num mesmo ambiente, de textos
escritos, imagens e som (Figura 1).
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Figura 1 – Página inicial de Blog
Destacamos, apesar dessa multiplicidade semiótica, que, para Marcuschi (2004,
p.15), “a Internet e todos os gêneros a ela ligados são eventos textuais
fundamentalmente baseados na escrita”. Ora, sendo o blog um gênero textual
específico da internet, podemos considerá-lo, sob esse prisma, fundamentalmente
baseado na escrita. A interação pressuposta garante a possibilidade de uma autoria
coletiva dessa escrita, que reconfigura a interlocução e redesenha as relações entre
locutor e alocutário. O blog, assim como vários gêneros produzidos em ambientes de
internet, apresenta, assim, uma peculiaridade específica no tocante a autor e leitor, cujos
papéis se entrelaçam e se confundem.
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Ao concebermos o texto como uma unidade maior fundamentada na interação,
podemos afirmar que seu sentido é construído dentro dessa interação, em que locutor e
interlocutor têm papel ativo na produção de sentidos. Assim, confirmamos que
a linguagem é considerada como capacidade humana de articular
significados coletivos em sistemas arbitrários de representação, que
são compartilhados e que variam de acordo com as necessidades e
experiências da vida em sociedade. A principal razão de qualquer ato
de linguagem é a produção de sentido. (BRASIL, 1999, p. 125)
Ao inserir seu comentário (Figura 2), o leitor do texto publicado é visto como
um construtor de significados ativo, que reorganiza e reescreve o texto, produzindo um
novo texto, ou seja, tornando-se também autor. Compartilhamos o dizer de Barthes
(1995, p.48) de que o leitor ideal não é mais um consumidor, mas um produtor de texto.
Figura 2 – Link Comentários (ao fim do texto)
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O link Comentários é, portanto, mais que um convite ao leitor-autor, um elemento
estruturador desse texto eletrônico, um entretecer de textos, resultante de contextos
situacionais distintos que se unem de forma não linear e que proporcionam uma
interação bem maior que aquela existente na tradicional relação autor-leitor (Figura 3).
O texto está sempre aberto por meio da dinâmica que permite, a cada interlocução, ao
alocutário (leitor) tornar-se locutor (autor).
Figura 3 – Página de Comentários
É perceptível que, ao falarmos de links e de percursos não lineares, falamos
obrigatoriamente de hipertexto (HEINE, 2005). Os estudos sobre hipertexto têm
ganhado espaço dentre os vários campos dos estudos linguísticos, principalmente em
decorrência da popularidade do acesso à internet, grande fenômeno da era cibernética. A
significação do termo está presa à metáfora da rede, já delineada por Foucault, em sua
obra Arqueologia do saber, publicada em 1969.
Para Wandelli, (2003, p.35)
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o formato hipertextual possibilita a concretização do que parecia ficar
mais no plano da metáfora ou da sugestão, quando Barthes e Eco
falavam em texto ilimitado, que se expande para incluir as
interpretações do leitor. Recursos paratextuais e links (sinais, marcas,
palavras que explicitam a ligação entre pontos distantes) encorajam o
leitor a se mover de um intertítulo a outro de forma não-sequencial, a
fazer suas próprias conexões, incorporar seus próprios links e a
produzir seus próprios percursos.2
O blog, como ferramenta tecnológica digital e suporte para o texto escrito, dentre a
multiplicidade semiótica de que falamos anteriormente, é ambiente perfeito para a
hipertextualidade (Figura 4).
2
Entende-se por recursos paratextuais aqueles relacionados por Genette: a) peritextos: título, prefácio,
ilustrações etc.; b) epitextos: entrevistas, resenhas etc.
GENETTE, Gérard. Paratexts: Threshold of Interpretation. Cambridge University Press, 1997. Edição
digitalizada disponível em: <http://books.google.com>.
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Figura 4 – Evidências de hipertextualidade em página de blog.
A experiência didática: análise
Uma vez que o texto não pode mais ser entendido como um objeto com
existência própria, independente do sujeito e da enunciação, numa visão
estruturalista, o primeiro aspecto a destacar neste relato é o prazer do aluno ao se
perceber autor de textos que, até então, lhe serviam como material de leitura,
advindos de quem tinha, para eles, autoridade de escrever sobre tais temas.
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Essa ”passagem” de consumidor a produtor de textos acadêmicos exigiu, além
do alto grau de desempenho lingüístico, uma postura de compromisso e de
responsabilidade sobre a própria aprendizagem.
De forma esquemática, dividimos as competências linguísticas em dois grandes
grupos:
Grupo 1 – Competência Léxico-Gramatical (Planos de expressão e de conteúdo)
Habilidades
a) articular e reconhecer as sequências de sons da língua;
b) realizar as associações adequadas entre os segmentos sonoros e os respectivos
significados, bem como estabelecer relações de sentido entre esses significados;
c) combinar as unidades da língua segundo as regras de seu sistema e identificar
construções mal-formadas em relação a essas regras.
Grupo 2 – Competência Pragmático-Textual (Situações concretas de comunicação)
Habilidades
a) manejar os recursos do componente expressivo da linguagem, como produtor ou
como intérprete dos enunciados;
b) discriminar convenientemente sentidos literais, sentidos figurados e sentidos
contextuais atribuíveis aos enunciados;
c) escolher, usar e interpretar palavras, expressões e construções da língua de
acordo com as convenções de cada situação de comunicação;
d) estruturar e interpretar textos coesos e formalmente adequados aos respectivos
propósitos comunicativos e às diferentes situações discursivas.
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No acompanhamento semanal das atividades (Cada equipe devia postar no
mínimo um texto por semana.), observamos o desenvolvimento de determinadas
competências linguísticas apontadas pelos próprios alunos como dificuldades ou
deficiências (Figura 5). Foram relatados, dentre outros:
a) ampliação do léxico específico da área e consequente melhor elaboração de
definições;
b) maior preocupação com a coesão textual, revelada na escolha de conectivos,
elementos fóricos e processos de referenciação;
c) maior atenção no emprego de perífrases verbais e no paralelismo sintático;
d) maior cuidado às formas de apresentação do dizer alheio e às remissões a outros
textos;
e) necessidade de explicitar a autoria dos textos e de incentivar a interação.
Considerando o contexto de produção do blog, cabe ressaltar que, em oposição
ao texto postado, de caráter acadêmico, que exigiu maior preparo na escrita e reescrita,
os comentários se aproximam da oralidade, revelando muito mais o aspecto
interacional. Isso se tornou evidente em virtude das próprias exigências da atividade,
pois, para cada texto postado, deveria haver uma sequência de comentários e as equipes
precisavam estimular essa participação (Figura 6). Nesse momento de maior interação,
observamos o papel ativo do leitor do texto acadêmico, que ali se faz editor, colaborador
e coautor do blog (Figura 7). É talvez, nesse instante, que o blog deixe de ser ferramenta
de suporte para o texto e passe a se constituir em gênero textual.
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Figura 5 – Alguns aspectos linguísticos observados nas produções textuais
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Figura 6 – Destaque para autoria e número de comentários postados.
Figura 6 – Exemplo de leitor-editor-colaborador.
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Conclusão
A atividade descrita permite afirmar que os mecanismos criados para favorecer a
produção de texto acadêmico e o consequente desenvolvimento de competências e
habilidades necessárias para essa produção acabaram por gerar outras situações de
atividades discursivas que contribuíram ainda mais para o sucesso do empreendimento.
Podemos observar a existência de três instâncias interlocutivas distintas:
a) a interlocução entre os alunos, organizados em equipes, para a produção dos
textos acadêmicos que alimentariam os blogs – interlocução essa geradora do
aprimoramento das competências lingüísticas que almejávamos ao apresentar a
proposta aos discentes;
b) a interlocução mediada pela leitura do texto publicado, cujo resultado vemos nos
comentários apensos a esse texto – interlocução essa característica do uso do
blog como ferramenta tecnológica que deu suporte aos textos produzidos e que,
acreditamos, é o que faz de um blog um gênero textual no espaço da
comunicação mediada por computador;
c) a interlocução final para análise de todo o processo, que resultou no trabalho
final da disciplina – interlocução essa que permitiu a intervenção do docente na
discussão sobre os resultados da atividade, gerando, mais que um momento de
construção de saber, um momento de construção reflexiva da prática
pedagógica.
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Consideramos, assim, que os resultados obtidos revelaram-se animadores, pois
demonstraram que é possível aprimorar, com grande sucesso, as competências de leitura
e escrita, por meio do uso de ferramentas tecnológicas e de ambientes virtuais.
Referências Bibliográficas
BARTHES, R. O prazer do texto. 4.ed. São Paulo: Perspectiva, 1995.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília:
MEC/SEF, 1998.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: Ensino Médio. v. 3. Brasília: MEC,
1999.
COSTA, S. R. Dicionário de gêneros textuais. 2. ed. rev. ampl. Belo Horizonte:
Autêntica, 2009.
MEC. Parecer nº CNE/CES 492/2001. Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de
Filosofia, História, Geografia, Serviço Social, Comunicação Social, Ciências Sociais,
Letras, Biblioteconomia, Arquivologia e Museologia. DOU – Diário Oficial da União.
Seção 1, p. 50, 9 jul. 2001. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/
CES0492.pdf. Acessado em: 22/05/2009.
HEINE, P. Considerações sobre o hipertexto e os gêneros virtuais emergentes no seio da
tecnologia digital. In: Revista Inventário. 4. ed., jul/2005. Disponível no web world
wide em: http://www.inventario.ufba.br/04/04pheine.htm.
MARCUSCHI, L. A.; XAVIER, A. C. Hipertexto e gêneros digitais. Rio de Janeiro:
Lucerna, 2004
SEVERINO, A. J. A importância do ler e do escrever no ensino superior. In:
CASTANHO, S.; CASTANHO, M. E. L. M. Temas e textos em Metodologia do
Ensino Superior. Campinas: Papirus, 2001. p.71-79.
WANDELLI, R. Leituras do hipertexto: viagem ao dicionário Kazar. Florianópolis:
UFSC; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2003.
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