O livro da vida - Loja Comunicação

Transcrição

O livro da vida - Loja Comunicação
O livro
da vida
The book of life
O livro
da vida
The book of life
em memória a Keith Haring
in memory of Keith Haring
4 de Maio de 1958 † 16 de Fevereiro de 1990
May 4th 1958 † Feburary 16th 1990
4
O LIVRO DA VIDA
Em homenagem a Keith Haring, era importante para
mim que encontrássemos uma maneira interessante
e eficaz de criar consciência em relação à prevenção
da AIDS e contra o estigma que vem junto com o fato
de ser soropositivo. Agradeço ao Antonio por ter
a coragem de contar a uma pessoa desconhecida
a sua história e inspirar este livro. Encontramos várias
pessoas com histórias diferentes para contar, e todos
eles esperam que suas experiências possam salvar
outros do mesmo destino. Este livro é dedicado a
Keith Haring e todos aqueles que lutam contra a AIDS.
In honor of Keith Haring it was important to me that we find an interesting and effective way
to create awareness regarding AIDS prevention and address the stigma that comes along
with being HIV positive. I thank Antonio for having the courage to tell a complete stranger
his story and inspiring this book. We found many people with diverse stories to tell, all of
whom have the hopes that their experiences will save someone else from the same fate.
This book is dedicated to Keith Haring and all those fighting against AIDS.
Sharon Battat
Curadora da Exposição Keith Haring Selected Works
Diretora Litmedia Productions
PREVENÇÃO DA AIDS / HIV
Este livreto surgiu de escutar uma conversa em
uma mesa ao lado da minha. Eu tinha uma história
para contar, mas nenhuma plataforma; a mulher
que eu estava ouvindo tinha uma plataforma, mas
estava sem inspiração. Nós percebemos que se
usássemos sua plataforma para contar minha história
poderíamos alcançar um objetivo comum. Encontramos
mais pessoas com histórias e as colocamos neste
livreto, que outros irão pegar, ler e esperançosamente
pensar duas vezes antes de tomar más decisões sobre
sexo seguro. Nós também esperamos que este livreto
ande um longo caminho realizando objetivos de muitos
ao redor do mundo que gostariam de contar suas
histórias para que outros possam evitar sofrimento,
mas que não possuem plataforma. Que forma
maravilhosa de aprender sobre sinergia.
This book came about from eavesdropping on a conversation at a table next to mine in a
café. I had a story to tell, but no platform; the woman I overheard had a platform, but lacked
inspiration. We realized that by using her platform to tell my story we could both accomplish
our common goal. We found more people with stories and put them together in this book,
which others will pick up, read and hopefully will make them think twice before making the
wrong decision about safer sex. We also hope this book goes some way to fulfill the aims of
many around the world who would like to tell their story so that others may avoid suffering,
who don’t have a platform, but who would like to tell their story so that others may avoid
suffering. What a wonderful way to learn about synergy.
Antonio
5
6
O LIVRO DA VIDA
O Keith Haring que conheci, quando comecei a trabalhar
para ele em 1984, era uma pessoa transbordando
otimismo, luz, humor e alegria. Extraordinariamente
disciplinado e aplicado em seu trabalho, tanto na esfera
pública (com seus desenhos no metrô, murais, projetos
com crianças e ações de caridade) como na área
comercial (exposições em galerias e Pop Shop), ele,
porém, arrumou tempo para incentivar e apoiar outros
artistas e amigos. Seu estúdio era energizado por sua
própria presença, mas também pelo fluxo de visitantes:
amigos, família, fãs, artistas, marchands, colecionadores,
crianças, era um lugar de acolhimento e comunidade.
Keith era uma criatura gregária e intensamente generosa.
Ele era uma parte essencial e um talento condutor da
arte, música, dança e moda na comunidade de downtown.
Após seu diagnóstico de HIV em 1988, parte de sua
energia e muito de seu tempo foram dedicados a
The Keith Haring I met when I first began working for him in 1984 was a person
overflowing with optimism, light, humor and joy. Extraordinarily disciplined and diligent
about his work, whether in the public realm (with his subway drawings, murals, projects
with children, charitable efforts) or commercial arena (gallery exhibitions, Pop Shop),
he nonetheless made time to encourage and support fellow artists and friends. His studio
was energized by is own presence but also by the stream of visitors: friends, family, fans,
artists, art dealers, collectors, kids - it was a place of welcome and community. Keith
was a gregarious and intensely generous creature. He was an essential part and driving
spirit of the downtown art, music, dance and fashion community.
After his HIV diagnosis in 1988, some of his energy and a lot of his time was diverted into
learning more about the disease and seeking treatment. His imagery became somewhat
darker. He had always explored dark subjects in his work, but certain of these surfaced
PREVENÇÃO DA AIDS / HIV
aprender mais sobre a doença e procurar tratamento.
Suas imagens tornaram-se um pouco mais sombrias.
Ele sempre havia explorado temas sombrios em seu
trabalho, mas alguns apareceram com mais frequência
nas obras criadas durante os dois últimos anos de sua
vida. Colocou ainda mais ênfase em usar sua arte para
inspirar esperança e sensibilização. Em 1988, ele perdeu
muitos e muitos amigos e amantes para a AIDS. Ele
perdeu também duas outras figuras muito importantes
em sua vida: Jean-Michel Basquiat (overdose de
drogas) e Andy Warhol (complicações decorrentes de
uma pequena cirurgia). Outro amigo íntimo morreria
em um acidente de carro em 1989.
Assim, a morte estava ao seu redor (e do resto de
nós) de uma maneira nunca antes experimentada. Não
surpreendentemente, apesar de enérgico como sempre,
sua visão tornou-se um pouco menos otimista - não em
more often in the works created during the last two years of his life. He also placed even
more emphasis on using his art to inspire hope and raise awareness. By 1988, he had lost
many, many friends and lovers to AIDS. He also lost two other very important figures in his
life: Jean-Michel Basquiat (to a drug overdose) and Andy Warhol (to complications following
minor surgery). Another intimate friend would die in a car accident in 1989. So death was
around him (and the rest of us) in ways never experienced before. Not surprisingly, although
as energetic as ever, his outlook became somewhat less optimistic - not due to any self-pity
as much as due to the poisonous, fearful attitude towards HIV/AIDS in the 1980s, the
terrible prejudices and demonization of the gay community in particular, and the futility of
all available treatments. As a person, he became a bit more guarded and a bit less “available”. He worked harder than ever, traveled more than ever, gave more generously than ever,
and, when he went public with his diagnosis (in an August 1989 interview in Rolling Stone
magazine), he experienced first-hand the mixed reactions that such an admission brings.
7
O LIVRO
DA VIDA
8 O LIVRO
DA VIDA
razão de alguma auto-piedade, nem a atitude
envenenada e temerosa em relação ao HIV/AIDS nos
anos 80, os preconceitos terríveis e a demonização
da comunidade gay em particular e a inutilidade de
todos os tratamentos disponíveis. Como pessoa, ele
se tornou um pouco mais reservado e um pouco menos
“disponível”. Trabalhou mais do que nunca, viajou mais
do que nunca, doou mais generosamente do que nunca
e quando veio a público com o seu diagnóstico (em
uma entrevista para a revista Rolling Stone, em agosto
de 1989), experimentou em primeira mão as reações
mistas que essa confissão traz.
Em 2010, vinte anos após a morte de Keith, acho
que todos nós nos sentimos tristes porque, embora
os atuais tratamentos contra o HIV/AIDS possam
melhorar enormemente a vida dos infectados, ainda
não há cura. A Keith Haring Foundation sente-se
orgulhosa e privilegiada em continuar o legado de
Keith na filantropia e acredita que Keith teria sido
PREVENÇÃO DA AIDS / HIV
tão envolvido quanto nós estamos na luta contínua
para sensibilizar e angariar fundos para tratamento,
educação e pesquisa.
Como ele disse em sua entrevista à revista Rolling
Stone, “Não importa quanto tempo você trabalhe,
sempre vai terminar em algum momento. E há sempre
coisas deixadas inacabadas. E não importa se você
viveu até setenta e cinco. Ainda haveria novas ideias.
Ainda haveria coisas que desejou ter concluído. Você
pode trabalhar por várias vidas. Se eu pudesse me
clonar, ainda haveria muito trabalho a fazer – mesmo
se houvesse cinco de mim. E não há arrependimentos.
Parte da razão de eu não estar tendo dificuldade em
enfrentar a realidade da morte é que ela não é uma
limitação, de certa forma. Poderia ter acontecido a
qualquer momento, e isso vai acontecer algum dia.
Se você vive sua vida de acordo com isso, a morte
é irrelevante. Tudo o que estou fazendo agora
é exatamente o que eu quero fazer.”
In 2010, twenty years after Keith’s death, I think we all feel saddened that while current
AIDS/HIV treatments can now dramatically improve the lives of PWAs, there is still no
cure. The Keith Haring Foundation is proud and privileged to continue Keith’s legacy
of philanthropy and I believe that Keith would have been as involved as we are in the
continuing fight to raise awareness and provide funding for treatment, education and
research.
do - even if there were five of me. And there are no regrets. Part of the reason that I’m not
having trouble facing the reality of death is that it’s not a limitation, in a way. It could have
happened any time, and it is going to happen sometime. If you live your life according to
that, death is irrelevant. Everything I’m doing right now is exactly what I want to do.”
As he said in his interview with Rolling Stone, “ No matter how long you work, it’s
always going to end sometime. And there’s always going to be things left undone. And
it wouldn’t matter if you lived until you were seventy-five. There would still be new ideas.
There would still be things that you wished you would have accomplished. You could
work for several lifetimes. If I could clone myself, there would still be too much work to
Julia Gruen
Diretora executiva
Keith Haring Foundation
9
10
O LIVRO DA VIDA
PREVENÇÃO DA AIDS / HIV
Quem foi Keith Haring?
Biografia de Keith Haring / Tradução: Alda Lima
Keith Haring nasceu em 4 de maio de 1958, em
Reading, Pensilvânia, e cresceu na cidade próxima
de Kutztown, Pensilvânia. Ele desenvolveu uma
paixão por desenhar ainda muito jovem, aprendendo
as técnicas básicas de caricaturas e desenhos
animados com seu pai, e com a cultura popular à
sua volta na época, como Dr. Seuss e Walt Disney.
Ao se formar no ensino médio em 1976, Haring entrou na Ivy School of Professional
Art em Pittsburgh, uma escola de artes comerciais. Logo ele percebeu que tinha
pouco interesse em virar um artista gráfico comercial e, após dois semestres, largou
a faculdade. Ainda em Pittsburgh, Haring continuou a estudar e trabalhar por conta
própria, e em 1978 teve uma exibição solo de seu trabalho no Pittsburgh Arts and
Crafts Center. Mais tarde, naquele mesmo ano, Haring se mudou para Nova York
e se matriculou na School of Visual Arts (SVA). Em Nova York, Haring encontrou uma
comunidade artística alternativa, que estava se desenvolvendo fora do eixo de galerias
e museus, e sim nas ruas do centro, nos metrôs e espaços em clubes noturnos
e antigos salões de dança. Lá, ele ficou amigo de outros artistas como Kenny Scharf
e Jean-Michel Basquiat, assim como músicos, artistas performáticos e grafiteiros que
Keith Haring Biography
Keith Haring was born on May 4, 1958 in
Reading, Pennsylvania, and was raised in
nearby Kutztown, Pennsylvania. He developed a love for drawing at a very early age,
learning basic cartooning skills from his
father and from the popular culture around
him, such as Dr. Seuss and Walt Disney.
Upon graduation from high school in 1976,
Haring enrolled in the Ivy School of Professional Art in Pittsburgh, a commercial arts
school. He soon realized that he had little
interest in becoming a commercial graphic
artist and, after two semesters, dropped
out. While in Pittsburgh, Haring continued
to study and work on his own and in 1978
had a solo exhibition of his work at the Pittsburgh Arts and Crafts Center.
Later that same year, Haring moved to
New York City and enrolled in the School of
Visual Arts (SVA). In New York, Haring found
a thriving alternative art community that
was developing outside the gallery and
museum system, in the downtown streets,
the subways and spaces in clubs and
former dance halls. Here he became friends
with fellow artists Kenny Scharf and JeanMichel Basquiat, as well as the musicians,
11
DA VIDA
12 O LIVRO
O LIVRO
DA VIDA
PREVENÇÃO DA AIDS / HIV
compunham essa florescente comunidade artística. Haring foi tomado pela
energia e espírito dessa cena e começou a organizar e a participar de exibições
e performances no Club 57 e outros locais alternativos.
Além de ter ficado impressionado pela inovação e energia desses artistas de sua
época, Haring também obteve inspiração com o trabalho de Jean Dubuffet, Pierre
Alechinsky, William Burroughs, Brion Gysin e com o manifesto The Art Spirit, de
Robert Henri, que afirmava a independência fundamental do artista. Com essas
influências, Haring pôde direcionar seus próprios impulsos da juventude para um
tipo de expressão gráfica excepcional baseada na supremacia da linha. Também
atraído pela natureza pública e participativa do trabalho de Christo, em particular
por Running Fence, e pela fusão única de arte e vida de Andy Warhol, Haring estava
determinado a dedicar sua carreira à criação de uma arte verdadeiramente coletiva.
Enquanto estudava na SVA, Haring fez experimentos com performances, vídeos,
instalações e colagens, enquanto continuava mantendo seu forte compromisso
com o desenho. Em 1980, Haring encontrou uma mídia altamente eficaz que permitia
que ele se comunicasse com o público mais amplo que desejava, quando notou
os painéis de publicidade vazios cobertos por papel preto fosco numa estação de
metrô. Ele começou a criar ilustrações em giz branco nesses painéis de papel vazios
ao longo dos trajetos do metrô. Entre 1980 e 1985, Haring produziu centenas desses
performance artists and graffiti writers that
comprised the burgeoning art community.
Haring was swept up in the energy and spirit
of this scene and began to organize and
participate in exhibitions and performances
at Club 57 and other alternative venues.
In addition to being impressed by the
innovation and energy of his contemporaries, Haring was also inspired by the work
of Jean Dubuffet, Pierre Alechinsky, William
Burroughs, Brion Gysin and Robert Henri’s
manifesto The Art Spirit, which asserted
the fundamental independence of the artist. With these influences Haring was able
to push his own youthful impulses toward
a singular kind of graphic expression based
on the primacy of the line. Also drawn to the
public and participatory nature of Christo’s
work, in particular Running Fence, and by
Andy Warhol’s unique fusion of art and life,
Haring was determined to devote his career
to creating a truly public art.
As a student at SVA, Haring experimented with performance, video, installation
and collage, while always maintaining a
strong commitment to drawing. In 1980,
Haring found a highly effective medium that
allowed him to communicate with the wider
audience he desired, when he noticed the
unused advertising panels covered with
matte black paper in a subway station.
He began to create drawings in white chalk
upon these blank paper panels throughout the subway system. Between 1980
and 1985, Haring produced hundreds of
these public drawings in rapid rhythmic
lines, sometimes creating as many as forty
“subway drawings” in one day. This seamless flow of images became familiar to New
York commuters, who often would stop
desenhos públicos em rápidas linhas rítmicas, às vezes chegando a quarenta
“desenhos de metrô” em um só dia. Esse fluxo ininterrupto de imagens se tornou
familiar para os usuários de metrô nova-iorquinos, que muitas vezes paravam para
observar o artista quando o encontravam trabalhando. O metrô se tornou, como
disse Haring, um “laboratório” para executar suas ideias e experimentações com
suas linhas simples.
Entre 1980 e 1989, Haring atingiu reconhecimento internacional e participou de
numerosas exposições solo e coletivas. Sua primeira exposição individual em Nova
York foi feita no Westbeth Painters Space em 1981. Em 1982, ele fez sua estreia
numa galeria do Soho, com uma exposição imensamente popular e aclamada na
Tony Shafrazi Gallery. Durante essa época, ele também participou de renomadas
exposições internacionais como a Documenta 7 em Kassel; a Bienal de São Paulo;
e a Bienal do Whitney. Haring também completou numerosos projetos públicos
na primeira metade dos anos 1980, abrangendo, de uma animação para o letreiro
Spectacolor em Times Square, a desenhos de cenários e panos de fundo para teatros
e boates, desenvolvimento de estampas para relógios da Swatch, e uma campanha
publicitária para a vodca Absolut; e também pintando murais no mundo todo.
Em abril de 1986, Haring inaugurou a Pop Shop, uma loja no Soho que vendia
camisetas, brinquedos, pôsteres, bottons e imãs de geladeira ilustrados com suas
imagens. Haring considerou a loja como uma extensão do seu trabalho e pintou
to engage the artist when they encountered him at work. The subway became, as
Haring said, a “laboratory” for working
out his ideas and experimenting with
his simple lines.
Between 1980 and 1989, Haring achieved
international recognition and participated in numerous group and solo exhibitions. His first solo exhibition in New York.
was held at the Westbeth Painters Space
in 1981. In 1982, he made his Soho gallery debut with an immensely popular
and highly acclaimed one-man exhibition
at the Tony Shafrazi Gallery. During this period, he also participated in renowned international survey exhibitions such as Documenta 7 in Kassel; the São Paulo Biennial;
and the Whitney Biennial.
Haring completed numerous public projects
in the first half of the 80’s as well, ranging
from an animation for the Spectacolor billboard in Times Square, designing sets and
backdrops for theaters and clubs, developing watch designs for Swatch and an advertising campaign for Absolut vodka; and
creating murals worldwide.
In April 1986, Haring opened the Pop Shop,
a retail store in Soho selling T-shirts, toys,
posters, buttons and magnets bearing his
images. Haring considered the shop to be
an extension of his work and painted the
entire interior of the store in an abstract
black on white mural, creating a striking
and unique retail environment. The shop
was intended to allow people greater access
to his work, which was now readily available
on products at a low cost. The shop received
criticism from many in the art world, however
Haring remained committed to his desire to
13
14
O LIVRO DA VIDA
PREVENÇÃO DA AIDS / HIV
todo o interior dela com um mural abstrato em preto e branco, criando um ambiente comercial impactante e único. A loja visava permitir que as pessoas tivessem
mais acesso ao seu trabalho, que agora estava pronto para consumo em produtos
de baixo preço. A loja foi criticada por muitos do meio artístico, no entanto, Haring
permaneceu comprometido com seu desejo de tornar obras de arte acessíveis para
o maior número de pessoas possível, e recebeu grande apoio nesse projeto de
amigos, fãs e mentores, incluindo Andy Warhol.
Ao longo de sua carreira, Haring dedicou muito de seu tempo a obras públicas,
que frequentemente continham mensagens sociais. Ele produziu mais de 50 obras
públicas entre 1982 e 1989, em dúzias de cidades ao redor do mundo, muitas delas
direcionadas para caridades, hospitais, creches e orfanatos. O agora famoso mural
de 1986, Crack is Wack, tornou-se um ponto de referência na New York’s FDR Drive.
Outros projetos incluem: um mural criado pelo centésimo aniversário da Estátua
da Liberdade em 1986, no qual Haring trabalhou com 900 crianças; um mural no
exterior do Necker Children’s Hospital em Paris, em 1987; e um mural pintado do
lado ocidental do Muro de Berlim três anos antes de sua queda. Haring também
realizava workshops de desenho para crianças em escolas e museus nas cidades de
Nova York, Amsterdã, Londres, Tókio e Bordeaux, e produziu ilustrações para muitos
programas de alfabetização e outras campanhas de serviço público.
Haring foi diagnosticado com AIDS em 1988. Em 1989, ele criou a Keith Haring
Foundation, com o encargo de fornecer fundos e imagens para organizações em prol
make his artwork available to as wide an
audience as possible, and received strong
support for his project from friends, fans and
mentors including Andy Warhol.
Throughout his career, Haring devoted
much of his time to public works, which
often carried social messages. He produced
more than 50 public artworks between
1982 and 1989, in dozens of cities around
the world, many of which were created for
charities, hospitals, children’s day care
centers and orphanages. The now famous
Crack is Wack mural of 1986 has become
a landmark along New York’s FDR Drive.
Other projects include; a mural created
for the 100th anniversary of the Statue of
Liberty in 1986, on which Haring worked
with 900 children; a mural on the exterior
of Necker Children’s Hospital in Paris,
France in 1987; and a mural painted on
the western side of the Berlin Wall three
years before its fall. Haring also held
drawing workshops for children in schools
and museums in New York, Amsterdam,
London, Tokyo and Bordeaux, and produced
imagery for many literacy programs and
other public service campaigns.
Haring was diagnosed with AIDS in 1988.
In 1989, he established the Keith Haring
Foundation, its mandate being to provide
funding and imagery to AIDS organizations
and children’s programs, and to expand
the audience for Haring’s work through exhibitions, publications and the licensing
of his images. Haring enlisted his imagery
during the last years of his life to speak
da AIDS e programas para crianças, e de expandir o público dos trabalhos de Haring
através de exposições, publicações e licenciamento de suas imagens. Haring
recrutou suas figuras durante os últimos anos de sua vida, para falar sobre sua
própria doença e para aumentar o ativismo e consciência a respeito da AIDS.
Durante uma breve, mas intensa, carreira que estimulou os anos 1980, o trabalho
de Haring foi exibido em mais de 100 exposições individuais ou coletivas. Só em
1986, ele foi destaque de mais de 40 artigos de jornais e revistas. Ele era bastante
procurado para participar de projetos colaborativos, e trabalhou com os mais
diversos artistas como Madonna, Grace Jones, Bill T. Jones, William Burroughs,
Timothy Leary, Jenny Holzer, Yoko Ono e Andy Warhol. Ao expressar os conceitos
universais de nascimento, morte, amor, sexo e guerra, usando um contorno
predominante e mensagens diretas, Haring conseguiu atrair um público amplo
e assegurar o alcance e poder de permanência de suas imagens, que se tornaram
uma linguagem visual do século 20 universalmente reconhecida.
Keith Haring morreu de complicações decorridas da AIDS aos 31 anos de idade,
em 16 de fevereiro de 1990. Um memorial comemorativo foi realizado em 4 de maio
de 1990, na Catedral de St. John the Divine em Nova York, no qual mais de 1.000
pessoas compareceram.
Desde sua morte, Haring tem sido o tema de diversas retrospectivas internacionais.
O trabalho de Keith Haring atualmente pode ser visto em exposições e acervos de
grandes museus em todo o mundo.
about his own illness and generate activism
and awareness about AIDS.
has become a universally recognized visual
language of the 20th century.
During a brief but intense career that
spanned the 1980s, Haring’s work was
featured in over 100 solo and group exhibitions. In 1986 alone, he was the subject of
more than 40 newspaper and magazine articles. He was highly sought after to participate in collaborative projects ,and worked
with artists and performers as diverse as
Madonna, Grace Jones, Bill T. Jones, William
Burroughs, Timothy Leary, Jenny Holzer,
Yoko Ono and Andy Warhol. By expressing
universal concepts of birth, death, love, sex
and war, using a primacy of line and directness of message, Haring was able to attract
a wide audience and assure the accessibility and staying power of his imagery, which
Keith Haring died of AIDS related complications at the age of 31 on February 16, 1990.
A memorial service was held on May 4,
1990 at the Cathedral of St. John the Divine
in New York City, with over 1,000 people in
attendance.
Since his death, Haring has been the subject of several international retrospectives.
The work of Keith Haring can be seen today
in the exhibitions and collections of major
museums around the world.
15
16
O LIVRO DA VIDA
PREVENÇÃO DA AIDS / HIV
“Ao longo dos anos oitenta, eu sempre soube
que poderia facilmente ser um candidato à AIDS.
Sabia disso, porque havia todo tipo de promiscuidade
em cada canto da cidade de Nova York, e eu fazia
muito parte disso tudo.”
“Throughout the eighties , I always knew I could easily be a candidate for AIDS. I knew this
because there was every kind of promiscuity in every corner of New York City-and I was very
much s part of all that.”
“Vivo todos os dias como se
fosse o último. Eu amo a vida.”
“Viver com uma doença mortal lhe
dá toda uma nova perspectiva sobre a
vida. Não que eu precisasse de alguma
ameaça de morte para apreciar a vida,
porque sempre apreciei a vida. Sempre
acreditei que a vida tem que ser vivida
tão plenamente e tão intensamente
como tem que ser - e lidar com
o futuro como ele se apresenta.”
Trechos tirados dos livros:
John Gruen
Keith Haring: A Biografia Autorizada
Keith Haring: The Authorized Biography
Prentice Hall Press - New York - 1991
Diário de Keith Haring
Keith Haring Journals
Penguin Books - New York - 2010
“To live with a fatal disease gives you a whole new perspective
on life. Not that I needed any threat of death to appreciate life,
because I’ve always appreciated life. I’ve always believed that
you live life as fully and as completely as you can - and you deal
with the future as it comes to you.”
“I live everyday as if it were my last. I love life.”
“No início, você fica completamente
arrasado. Você passa por uma enorme,
enorme tristeza. Quer dizer, mesmo que
de alguma forma eu esperava que isso
acontecesse, quando realmente acontece,
você não está preparado. Então a
primeira coisa que você faz é entrar
em colapso. Fui até o East River
no Lower East Side e apenas chorei,
chorei e chorei.”
“At first, you’re completely wrecked. You go through a major, major upset. I mean,
even though I sort of expected this to happen, when it actually does happen, you’re
not prepared. So the first thing you do, is break down. I went over to the East River
on the Lower East Side and just cried and cried and cried.”
“Realmente não estou com medo da AIDS.
Não por mim. Estou com medo de ter que
ver as pessoas morrerem na minha frente.”
“I’m not really scared of AIDS. Not for myself. I’m scared of having to watch
more people die in front of me.”
“Muitas pessoas em muitas épocas viveram somente
até os 30 ou 40. Se tivesse nascido em outro lugar ou
tempo, talvez teria morrido em uma guerra ou num outro
desastre. A AIDS é a nova praga. Porque eu acho que
deveria estar fora disso? Justo eu?”
“Many people at many times only lived to 30 and 40. If I was born in another
place or time, maybe I would have died at war or in another disaster. AIDS is
the new plague. Why do I think I should be exempt? Why not me?”
17
18
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Angelita,
sexo feminino, repórter, mãe de gêmeas soropositivas adotadas.
female, reporter, mother of adopted HIV+ twins
Em abril de 1997, na minha cidade, acontecia
um fato inédito na região. Duas criança gêmeas
são desprezadas em via pública. Eu, como
jornalista/radialista e com faro de noticias, estava passando naquele momento, e vi muita
gente aglomerada, me aproximei, e vi que se
tratava de dois bebês, aparentemente gêmeos,
e com um ano de idade.
As pessoas comentavam e diziam: como pode
uma mãe fazer isto? Olhei para as meninas,
fiquei muito emocionada, ninguém fazia nada.
Peguei-as, chamei três pessoas para servirem
de testemunhas, coloquei no carro e levei-as
para o Juizado de Menores, que ficava muito
próximo dali, chegando lá, pedi para falar
com o Juiz, ele veio me atender e quando
me viu disse:
– Você de novo!
– Vai fazer uma creche na sua casa?
Eu já era conhecida no juizado por ter adotado uma criança. Contei para ele o que tinha
acontecido e me convidou para entrar em seu
gabinete, e disse:
– Você vai levá-las para sua casa, até que eu
decida o que fazer.
In April 1997 something that had never happened before in my region, happened in my
city. Two twin children were abandoned in the
street. As a newspaper and radio reporter and
with a nose for news, I was passing at that very
moment and saw a group of people crowded
together, I went up to them and from nearby
I saw that there were two babies, apparently
twins, and about one year old.
Repeti a mesma história.
I repeated the same story to them.
Ficaram felizes, mas os bebês não paravam
de chorar, achei que seria fome, então mandei
comprar leite para elas, fiz as mamadeiras, tomaram e dormiram, pela madrugada acordaram
sentindo falta da mãe.
They were happy, but the babies didn’t stop
crying. I thought they were hungry so I sent for
some milk, made up some bottles which they
drank and then went to sleep but in the middle
of the night they woke up missing their mother.
Coloquei as duas no meu colo e dormiram de
novo.
I placed them both in my lap and they went back
to sleep again.
The people made comments and said: how
could a mother do this? I looked at the girls and
became very emotional; nobody was doing
anything. I picked them up, asked three people
to be witnesses, put them in the car and took
them to the Judge for Minors who was very near
to there. When I got there I asked to speak to the
Judge and when he came to speak to me and saw
me, he said:
Pela manhã logo cedo, fui para o comércio
e comprei roupas, fraldas e remédios, pois
descobri que elas tinham os ouvidos estourados. Aproximavam-se os trintas dias dados
pelo juiz, mas eu e meus filhos já estávamos
sentindo amor por elas.
Early in the morning I went to the shops and
bought clothes, diapers and medicine because I
had found out that their ear drums were burst.
The thirty days granted by the judge were
coming to an end but my children and I were
just starting to love them.
Chegou o dia de levá-las ao juizado, peguei
tudo delas e coloquei numa bolsa, minha
filha já ficou chorando. Chegando lá, o Juiz me
chamou e disse;
The day arrived to take them back to the judge,
so I collected all their things and put them in a
bag. My daughter was already crying. When
we got there the Judge called me and said:
– Não tenho boas noticias! Mandei apurar,
e descobrimos que os pais destas meninas
são portadores de HIV/AIDS, a mãe desprezou
as crianças e foi para outro estado e o pai
está muito doente.
– I don’t have very good news. I have made
enquiries as to where they came from and have
found out that the girls’ parents have HIV/AIDS,
the mother abandoned the children and went
to another state and the father is very sick.
Eu - Então o que vou fazer doutor?
Me - So what should I do, sir?
Juiz - Vou lhe dar mais trinta dias de Guarda
Provisória, enquanto isto mande fazer exames
nelas para sabermos se também são soropositivas.
Judge - I am going to give you thirty more days
of temporary custody and during this time
I’m going to ask for tests to be carried out to
determine their HIV status.
Mandei realizar os exames particulares, quando recebi o resultado, foi muito doloroso para
mim, lá estava escrito: reagente.
I had the blood tests carried out privately and
when I got the result it was very painful for me:
“positive” was written.
– You again!
– Are you turning your house into a crèche?
I was already known by the judge for having
adopted a child. I told him what had happened
and he invited me into his office and said:
– Take them home with you until I decide
what to do with them.
Mandou então, o escrivão bater um Termo de
Guarda Provisória, por trinta dias. Levei as
meninas e quando cheguei, os outros filhos
acharam estranho aquelas duas criaturinhas
comigo, e perguntaram:
He ordered the clerk of the court to issue
Temporary Custody Order for thirty days. I took
the girls home and when I arrived the other
children thought it strange that I had two babies
with me and they asked:
– Mainha, quem são essas?
– Mum, who are they?
20
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Chorei demais, fui para casa e contei para
meus filhos o acontecido, ficaram muito tristes.
Fui ao Juiz com o resultado, ele também ficou
atordoado.
Juiz - E agora, o que vamos fazer?
Eu - Não sei.
Juiz - Vou mandá-las para o abrigo até que eu
converse com o pai delas.
Eu - Não doutor, por favor, não faça isso! Elas
vão ficar comigo.
Juiz - Você vai querê-las assim mesmo com a
doença?
Eu - Doutor, vou amá-las da mesma forma que
amo os outros filhos.
Naquele dia mesmo, dei entrada ao processo
de Adoção.
O juiz foi procurar os familiares, o pai já havia
falecido, a mãe ninguém sabia do seu paradeiro, os membros da família não tinham interesse em ficar com as meninas.
Num dia muito feliz da minha vida saiu a adoção.
Já passamos por muitos momentos difíceis,
mas com a graça de Deus, estamos superando,
enfrentamos muitos preconceitos, principalmente na escola, mas vencemos todos.
Hoje minhas filhas gêmeas têm 13 anos, são
lindas, inteligentes e sadias, elas sempre
dizem: “não sei o que seria da minha vida sem
você mamãe”, em resposta eu digo “Vocês são
os melhores presentes que o Senhor Jesus me
deu”. Somos uma família abençoada. Tenho
cinco filhos, quatro são adotivos incluindo
minhas gêmeas. Na minha cidade, fui escolhida a primeira mãe a adotar crianças com AIDS.
Creio que a criança e o adolescente, soropositivo ou não, tem direitos a uma vida digna.
Sei também que é garantida pela Constituição
I cried a lot, went home and told my children
what had happened. They were very sad.
I went back to the judge with the result and
he didn’t know what to do either.
Judge – So now what are we going to do?
Me – I don’t know.
Judge – I’m going to send them to a shelter until
I can speak with their parents.
Me – No, sir, please don’t do that. They can stay
with me.
Judge – You still want the babies even though
they are sick?
Me – Sir, I will love them in the same way I love
my own children.
On that very day I started the adoption process.
The judge looked for the family: the father
had died, the mother nobody knew of her whereabouts, and the other members of their family
weren’t interested in keeping the girls.
One very happy day in my life, the adoption
was approved.
We have passed through many difficult times,
but with the grace of God we are overcoming
them, we have faced a lot of prejudice, especially
at school, but we have come through.
Today my twin daughters are 13 years old, beautiful, intelligent and healthy and they always
says: “I don’t know what would have become
of my life without you, mother”, and in reply
I say “You are the best presents that the Lord
Jesus has given me”. Our family is blessed. I have
five children, four adopted including my twins.
I was the first mother to adopt children with AIDS
in my city.
I believe that children and teenagers, whether
HIV positive or not, have a right to live with
dignity. I also know that this is guaranteed by
the Federal Constitution and reinforced by the
Federal e amparada pelo Estatuto da Criança e
do adolescente.
Na maioria das vezes as crianças são impedidas de serem adotadas, devido às exigências
dos adotantes, exigindo o exame de HIV. Será
que eles não sabem que esta prática não é
permitida, só em casos quando está em jogo
a saúde da criança? Caso contrário, o exame
pode ser usado para segregar e discriminar o
menor?
Uma criança com AIDS, ou qualquer outra patologia, deve ser tratada igual a outras crianças,
com amor, carinho e respeito. Que deus nos
abençoe.
Statute for Children and Adolescents.
In the majority of cases children like these are
prevented from being adopted, due to the demands of the adoptive parents who ask for an
HIV test. Do they not know that this practice is
forbidden, and only permitted in cases where
the health of the child is at stake? If this is not the
case then can an HIV test be used to segregate
and discriminate against the minor?
A child with AIDS, or any other disease, must
be treated the same as other children, with love,
tenderness and respect. God bless us.
22
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Antônio,
Londres, Reino Unido, 41, homosexual, Engenheiro
London, the United Kingdom, 41, Homosexual, Engineer
Há um tempo atrás, meu pai me disse: percebo que você deve ter sido cuidadoso durante
muito tempo, pois só tornou-se soro-positivo
quando tinha 36 anos. Ele tinha razão, mas
o que havia mudado em meus pensamentos,
sentimentos e decisões, que me fizeram parar
de ter cuidado e começar a entrar num comportamento de risco, o que me levou a contrair
o HIV? Há provavelmente diversos motivos: a
culpa por ter sobrevivido após a morte de meu
único irmão; ter suposto que o meu namorado
fosse HIV negativo; decidir sobre sexo seguro
sob efeito de drogas; a irres-ponsabilidade de
pensar que se eu contraisse HIV, só teria que
tomar pílulas.
Ser soropositivo é como se alguém tivesse lhe
dado um trabalho em meio período (sem necessidade de uma carta de intenções, CV ou
entrevista). Porém não é um tipo de trabalho
pelo qual você seja pago. Torna-se caro para
você em tempo, preocupação e dinheiro, e isso
se você tiver sorte. Minha única sorte foi que
os sintomas que pareciam de uma longa gripe,
quando fui infectado, abriram dúvidas em
minha mente e me levaram a fazer o teste de
HIV. Eu não poderia ter descoberto mais cedo,
um teste de maior precisão que confirmou o
primeiro resultado, mostrou que eu havia sido
infectado recentemente. Fui então convidado a
participar de um estudo experimental clínico
para ver se com o uso de drogas contra o HIV,
no intuito de reduzir o nível de virus no sangue
de curto período após a infecção (quando a
quantidade de virus no sangue é normalmente
alta e descontrolada) poderia melhorar a longo prazo a condição do sistema imunológico.
My father said to me a while ago: I realise that
you must have been careful for a long time since
you only got HIV when you were 36 years old.
He was right, but what had changed about my
thoughts, feelings and decisions to make me
stop being careful and start engaging in the risky
behaviour that led to me contracting HIV? There
are probably a number of reasons: survivor guilt
after my only sibling died; making an assumption about my boyfriend’s HIV status; making
decisions about safer sex when intoxicated; irresponsibly thinking that if I got HIV I would just
take the pills.
Having HIV is like somebody just gave you a parttime job (no application letter, CV or interview required). Not the kind of part time job where you
get paid, however. The type that is expensive to
you in time, worry and money, and that’s if you’re
lucky. My only luck was having extended flu-like
symptoms when I got infected, which put question marks in my head and led me to take an HIV
test. I couldn’t have found out any sooner, the
sensitive test to confirm the initial result showed
that I had only recently seroconverted. I was
therefore invited to join a clinical trial study to
see if using anti-HIV drugs to reduce the level of
the virus in the blood for a period of time shortly
after infection (when the amount of virus in the
blood is usually high and uncontrolled) can improve the long term condition of the immune
system. This meant that I was closely monitored
by doctors right from the start. My immune system depleted quickly, however, and I started to
get lesions on my skin, so I soon had to start
taking medicine to stop getting seriously ill. But
two days after starting the medicine, I began to
O que significa que estive monitorado de
perto pelos médicos desde o início. Contudo,
o meu sistema imunológico havia se esgotado
rapidamente e começaram a aparecer lesões
em minha pele, logo em seguida, tive que
iniciar um tratamento com medicamentos
para evitar ficar seriamente doente. Mas dois
dias depois do início deste tratamento, comecei a sentir-me muito indisposto e febril. Me
fizeram consecutivos testes sanguíneos mas
não conseguiam descobrir o que havia de
errado comigo. Os medicamentos antirretrovirais tinham efeitos colaterais desagradáveis:
me tornei muito emotivo, tinha pesadelos e
me sentia atordoado. O mal-estar continuava,
às vezes com febre alta e outras baixa, mas
me forçava a trabalhar sempre que podia pois
precisava de dinheiro para viver. Finalmente,
quatro meses depois, fui tomado por erupções
cutâneas terríveis que provaram ao doutor a minha alergia ao medicamento, que foi
imediatamente trocado. Me senti uma nova
pessoa, estava enormemente aliviado e apesar de ter passado quatro meses doente, eu
acreditei que seria o final dos problemas e
olhava adiante para o futuro com otimismo…
Porém alguns meses depois a febre voltou,
foi dificil acreditar. De início eram baixas e
às vezes sumiam, mas culminou em uma febre de 41 graus que durou cerca de um mês.
Fui internado em um hospital onde fizeram
várias séries de testes. Colocaram blocos de
gelo em mim para tentar baixar minha temperatura e me lembro de uma vez que me colocaram numa ducha fria. Sentia como se minha
cabeça fosse explodir com a pressão e eles
feel extremely unwell and feverish. I was sent for
blood test after blood test, but they couldn’t find
out what was wrong with me. The HIV medicine
had unpleasant side effects, too: I was very emotional, had nightmares and felt dizzy. The malaise continued, sometimes with low grade and
sometimes high grade fevers, but I forced myself to work whenever I could because I needed
money to live. Finally, after four months, I came
out in a terrible rash which proved to the doctors
that I was allergic to the medicine and it was immediately changed. I felt like a new person, was
enormously relieved and despite having spent
four months being ill, I believed that was an end
to my problems and I looked forward to the future
with optimism…
A few months later, however, the fevers came
back; I could hardly believe it. They started
mildly and sometimes went away, but they culminated in a 41 degree fever that lasted about
a month. I was put in hospital where they did a
whole series of tests. They put ice packs on me to
try to keep my temperature down and I remember
once they put me under the cold shower. My head
felt like it was going to explode with the pressure
and they had to change the bed sheets four or
five times a night because they were drenched in
sweat. Finally the fever subsided and I left hospital but I was anaemic, had a swollen spleen
and lymph nodes and had to go for further tests
to try to find out what was wrong with me. The
worst test was a bone marrow biopsy which was
extremely painful, but after all the tests were
completed they still couldn’t establish what was
wrong with me.I slowly began to recover and
started to go back to work. I was fine for about
24
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
tinham que trocar os lençois quatro ou cinco
vezes por noite porque estavam ensopados de
suor. Finalmente a febre baixou e eu saí do
hospital, mas estava anêmico, tinha o baço e
os gânglios linfáticos inchados e tive que fazer
testes adicionais para tentar descobrir o que
estava errado comigo. O pior teste foi a biópsia de medula óssea que foi muito doloroso,
mas após o final dos testes eles ainda não podiam estabelecer o que havia de errado.
three months and it felt like everything that had
happened was just a bad dream. Then, one day,
I started to feel ill again and the fever gradually
came back. I was put back in hospital and they repeated the bone marrow biopsy and did a biopsy
of a lymph node from my groin, but there was still
no diagnosis and when the fever subsided I went
home. It was around this time that I started to get
extremely depressed and I had to start taking
anti-depressants.
Comecei lentamente a me recuperar e voltar
ao trabalho. Estava bem durante três meses
e sentia como se tudo que havia acontecido
fosse somente um sonho ruim. Então um dia
comecei a passar mal novamente e a febre
gradualmente voltou. Retornei ao hospital e
repetiram a biópsia da medula e fizeram outra
de um gânglio linfático em minha virília, mas
não havia diagnóstico e quando a febre baixou
fui para casa. Nesse momento fiquei extremamente deprimido e tive que começar a tomar
antidepressivos.
I recovered once more and eventually I was able
to get back to work, but a few months later I was
in hospital again with a third fever. This time I
had to have several blood transfusions because
I was severely anaemic. I remember a friend of
mine joked with me that my feet were the same
colour as a corpse’s. A third bone marrow biopsy: still no diagnosis. I recovered enough to
leave hospital and it was around this time that
it was suggested I might have a rare cancer-like
disease of the lymphatic system that can affect
people with HIV. I went to see an oncologist who
wanted to biopsy a lymph node in my abdomen
and remove my spleen, but I decided to seek
further medical advice and I found a doctor who
thought he could diagnose my sickness by taking
a biopsy of a lymph node from under my arm: he
succeeded.
Me recuperei novamente e afinal podia voltar
ao trabalho, mas após alguns meses me encontrava mais uma vez no hospital com uma terceira febre. Desta vez precisei passar por várias
transfusões de sangue porque estava gravemente anêmico. Me lembro de um amigo que
brincou comigo que meus pés tinham a mesma
cor de um cadáver. Fiz uma terceira biópsia da
medula: sem diagnóstico. Me recuperei o suficiente para deixar o hospital e foi quando me
sugeriram que eu poderia ter um raro tipo de
câncer do sistema linfático, que pode aparecer
em pessoas soropositivas. Fui ver um oncologista que queria a biópsia de um gânglio linfático do meu abdomen e remover meu baço,
mas decidi procurar outra opinião e encontrei
um médico que pensou em diagnosticar minha
doença fazendo uma biópsiade um gânglio
linfático em minha axila: ele conseguiu.
Tive o diagnóstico afinal e, para minha sorte,
havia um recém descoberto tratamento de
quimioterapia disponível com mínimos efeitos
At last I had a diagnosis and, luckily for me, there
was a recently discovered chemotherapy treatment available with minimal side effects which
I then took for about a month. I have now been
well for almost a year and a half, and can live my
life, but I have to go for regular oncology blood
tests. Before the chemotherapy treatment became available the condition would have killed
me.
What did I lose? A couple of years’ income. What
did I gain? A lot of suffering and worry but also
some experience and maturity. Oh, and I learned
that even if you find out you are HIV positive as
soon as you become infected and you have good
medical health care available, HIV can be a lot
more than just taking some pills.
colaterais, que eu tomei por cerca de um mês. Tenho me sentido bem durante um ano e meio,
e consigo viver minha vida, mas tenho que ir regularmente fazer testes sanguíneos oncológicos.
Antes do tratamento de quimioterapia estar disponível, aquela condição teria me matado.
O que eu perdi? Uns dois anos de trabalho. O que ganhei? Muito sofrimento e preocupação,
mas também experiência e maturidade. Ah, e aprendi que mesmo ao se descobrir soropositivo
ainda no início e tendo um bom plano de saúde, o HIV pode ser bem mais que apenas tomar
umas pílulas..
26
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Ash,
Londres, Reino Unido, Homosexual, 40, Consultor em recursos humanos.
London, the UK, Homosexual, 40, Human Resources Consultant
Quinta-feira, 6 de junho de 2006. O dia que
minha vida mudou para sempre.
Thursday June 6th, 2006. The day my life
changed forever.
Esperava ansiosamente o telefone tocar,
sem saber o que viria. Lembrando da mesma
situação, dez anos antes, quando recebi a boa
notícia: eu estava bem. Que alívio! Meu estilo
de vida era bem diferente antes daquele teste,
do que agora, antes deste aqui. Eu brincava
com a sorte. Estava para se tornar realidade.
I waited anxiously by the phone, not knowing
what news to expect. I remembered a similar situation ten years earlier when I got the good news:
I was fine. The relief! But my lifestyle before that
test had been very different from my lifestyle before this current test. I had been tempting fate. It
was about to become a reality.
O telefone tocou. A notícia não era boa.
Finalmente enfrentei a realidade dos meus temores. Já sabia antes de me dizerem. Eu era
soropositivo. Voltei à clínica onde havia feito
o teste. Me perguntaram como me sentia e me
disseram que o nível do vírus no sangue estava altíssimo. Não entendia vários dos termos
usados, estava em choque e a mente cheia de
questões. Falamos sobre alguns dos problemas de saúde que me levaram a fazer o teste,
úlceras estomacais, perda de peso, lesões na
lingua, mão e pés. Por quê ninguém pensou
nisso antes? Por quê eu não escutei minhas
irmãs e amigos que disseram que eu deveria
fazer o teste?
The phone rang. Not good news. Finally, I faced
the reality of my fears. I knew it before it was
said. I was HIV+. I went back to the clinic where
I had had the test. I was asked questions about
how I felt and was told that the level of the HIV
virus in my blood was extremely high. I didn’t
understand lots of the terms and I was in shock,
my mind full of questions. We talked about some
of my health issues that led me to take the test,
stomach ulcers, loss of weight, lesions on my
tongue, hand and feet. Why had nobody thought
of it earlier? Why hadn’t I listened to my sisters
and friends who thought I should have a test?
Me perguntava quem teria me passado o vírus.
Poderia ter sido em qualquer um dos meus
encontros sexuais. Desde 2000, eu saía, tomava drogas e fazia sexo de 3 a 4 vezes por noite,
porque me sentia sozinho. Várias vezes nem
me preocupava em usar camisinha porque estava muito louco. Gostava do sentimento cru
do sexo bareback. Pensava que estaria tudo
bem, se não, teria somente que tomar as pílulas. Deve ter sido por volta de 2002 quando fui
infectado. Transava regularmente com um cara
I wondered about who had given me the virus.
It could have been any one of many sexual encounters. Since 2000 I had been going out, taking drugs and having sex 3 or 4 times a night because I was feeling lonely. Sometimes I couldn`t
be bothered to use a condom because I was too
high. I liked the raw feeling of bare back sex. I
told myself that it would be OK, or if it wasn`t I
would just take the pills. It was probably around
2002 that I got infected. I was having regular sex
then with a guy who told me he was HIV+, but
he was really sexy and had a great body, so he
would give me drugs and we would have sex with
que me disse que era HIV+, mas ele era muito
sexy e tinha um corpo lindo, então me dava
drogas e faziamos sexo sem limites. Ou também um outro cara da academia que conheci
na Parada Gay, num momento em que estava
chateado. Passamos toda a noite transando na
sauna, se drogando para aumentar a sensação.
Usamos muito gel mas sem camisinha. Poderia
ser algum desses caras ou algum outro que eu
teria até esquecido.
Tive que contar a várias pessoas logo em seguida ao diagnóstico. Minhas irmãs ficaram muito
aflitas. Lembro que conversando pelo telefone
com um amigo, que mudou para o Brasil, ele
me disse: “Eu também sou”. No início era difícil
dormir à noite. Um amigo me ligou dos EUA e
ficou bravo comigo, mas percebi que reagiu assim porque se peocupava e estava triste. Meu
primo me disse que eu não era a única pessoa
afetada pelo meu diagnóstico. Tive que tranquilizar minhas irmãs sobre o prognóstico de
longo prazo da doença. Tive longas conversas
com meu amigo no Brasil e trocamos experiências sobre os sistemas de saúde de nossos
respectivos países.
A primeira coisa que precisava era fazer um
check-up sexual completo e a contagem de
CD4. O check-up não deu nada além, mas
o CD4 estava extremamente baixo, só 45.
Quando recebi o resultado, estava indo fazer
um workshop para um cliente. Fiquei chocado
demais para ir trabalhar, então um colega assumiu o trabalho e eu me dirigi para a clínica,
no caminho contatei um grupo de apoio para
me tranquilizar. Um grande amigo meu veio
me encontrar e um enfermeiro lá me acalmou
no boundaries. Or there was another guy from
the gym who I met after Gay Pride when I was
feeling upset. We spent all night having sex in a
sauna, taking drugs to heighten the sensation.
We used lots of lube but no condoms. It could
have been one of these guys or somebody else
who I`ve even forgotten about.
I had to tell lots of people shortly after the diagnosis. My sisters were mortified. I remember
telling a friend on the phone who had moved to
Brazil and he said “So am I”. It was very difficult
to sleep at night initially. A friend of mine called
me from the US and he was angry with me but
I realized he only reacted like this because he
cared and he was upset. My cousin told me that I
wasn’t the only person affected by the diagnosis.
I had to reassure my sisters about the long term
prognosis of the disease. I had long conversations with my friend in Brazil and we exchanged
experiences of health care systems in our respective countries.
The first thing I had to do was to have a full sexual
health screen including a CD4 count. The screen
was clear but the CD4 result was extremely low,
only 45. When I got the result, I was about to
start running a workshop for a client. I was too
shocked to work, so my colleague took over and I
drove to my clinic and contacted a support group
for reassurance on the way. A good friend of mine
met me there and the nurse was very reassuring.
I was desperate to start taking medicine but he
explained that I would have to have a resistance
profile carried out first. If I had known this, maybe I would have thought differently about having
unsafe sex when I had been high on drugs. I had
to drink bottled water, keep away from crowded
28
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
muito. Estava desesperado para começar o
tratamento mas ele me explicou que antes eu
teria que fazer um exame de resistência aos
medicamentos. Se eu soubesse, talvez eu teria pensado de outra maneira sobre fazer sexo
sem proteção quando estava sob o efeito de
drogas. Tinha que beber água mineral, evitar
locais com muita gente, tomar antibióticos
para prevenir pneumonia e fazer testes oculares para ter certeza que não tinha retinite
por cytomegalovirus que poderia causar a
cegueira.
Apenas quase um mês após meu diagnóstico,
eu comecei o tratamento. Os primeiros efeitos
colaterais foram sonolência e sonhos estranhos. Não estava muito ocupado no trabalho
então passei muito tempo em casa para me
acostumar ao tratamento. Em uma semana,
como por mágica minha lingua estava melhor
e fui para uma viagem curta com minha família
aos Estados Unidos, mas estava apavorado
em ser pego na alfândega com os remédios,
porque havia naquela época uma restrição às
pessoas soropositivas para entrar no país.
Voltei dos Estados Unidos para receber a boa
notícia que minha carga viral havia baixado
imensamente e a contagem de CD4 aumentou
substancialmente. Quando repeti o teste minha carga viral havia se tornado indetectável
mas meu CD4 baixou novamente. Fiquei muito desapontado porque ainda não sabia que
resultados isolados não são tão importantes,
as tendências é que são. Pensei que estava
respondendo bem ao tratamento mas descobri
que havia me tornado resistente a ele, o que
pode acontecer mesmo se você tem adesão a
100%. Após mais testes de resistência e troca
de médico, meu tratamento foi mudado.
Hoje meu CD4 está em 883, o que é ótimo
e minha carga viral está indetectável desde
2007. Todas as minhas lesões desapareceram e vivo minha vida, estou muito ocupado
em meu trabalho e às vezes esqueço que
sou soropositivo, mas me pergunto se isso é
places, take antibiotics to prevent pneumonia
and have my eyes tested to make sure I didn’t
have CMV which can cause blindness.
Just under a month after my diagnosis I started
treatment. The initial side effects were drowsiness and strange dreams. I wasn’t very busy at
work so I spent lots of time at home getting used
to the medicine. Within a week my tongue magically got better and I soon went on a short trip to
the US with my family but I was terrified of being
caught at customs with the medicine because
at the time there was a ban on people with HIV
entering the country. I got back from the US to
the good news that my viral load had reduced
tremendously and my CD4 count had increased
substantially. When I repeated the test my viral
load had become undetectable but my CD4 count
had decreased again. I was very disappointed
because I didn’t know at the time that single results are not so important, trends are important.
I thought I was responding well to treatment, but
then I learned that I had become resistant to my
treatment regime which can sometimes happen
even if you are 100% adherent. After more resistance tests and a change of doctor my medicines
were changed.
Today my CD4 count is 883, which is very good
and my viral load has been undetectable since
2007. All my lesions have disappeared and I am
living my life, I am very busy at work and I sometimes even forget about being HIV+ but I wonder
if this is a good or a bad thing. I work out at the
gym hard and I am psychologically moving on. I
go out to clubs and meet guys. I’m honest about
my HIV status but I don’t tell everyone I meet. I
don’t engage in risky activity. I’m adherent to my
medicine, I have missed 3 or 4 doses in total. My
medicine goes with me wherever I go. If the price
for health is to be adherent to my medicines then
that is a price I am happy to pay. I see my doctor
every 3 to 4 months and have a great relationship
with him. I can talk about medicine, sex, men and
drugs. This has been key to my progress.
uma coisa boa ou ruim. Eu malho bastante e
psicologicamente vou seguindo em frente. Saio
à noite e encontro outros caras. Sou honesto
sobre minha condição sorológica mas não conto para todos que encontro. Não tenho mais
comportamentos de risco. Sou aderente ao
tratamento, perdi 3 ou 4 doses ao todo. Meus
remédios vão comigo onde eu for. Se o preço
para ter saúde é aderir ao meu tratamento,
então este é um preço que estou feliz em
pagar. Vejo meu médico a cada 3 a 4 meses e
tenho uma relação ótima com ele. Posso falar
sobre os remédios, sexo, homens e drogas.
Essa tem sido a chave de meu progresso.
Decidi não deixar que o HIV leve o melhor
de mim, mas de algum modo já levou. Nunca
mais serei capaz de chegar às aspirações das
pessoas queridas a mim. O fato de que um dos
meus melhores amigos é soropositivo também,
me fez tratar mais facilmente com isso por
não me sentir tão sozinho. Aprendi muito nos
últimos 4 anos, sobre mim mesmo e sobre a
importância de ter confiança. Se voltássemos
quinze anos no tempo, com o diagnóstico de
uma contagem tão baixa de CD4, eu provavelmente estaria hoje morto. Porém, com os
avanços no tratamento, uma vida saudável, um
estado de espírito positivo, um médico excelente, minha família, alguns amigos sensacionais, um ótimo trabalho e a benção de Deus,
eu posso agora viver uma vida completamente
normal. Estou muito grato por estar vivo hoje.
Quatro anos atrás, eu me detestava pela minha situação. Talvez um tal ódio ou homofobia
interiorizada, me levou a ter sexo inseguro.
Mas estou aprendendo lentamente a me amar
porque se eu posso, os outros poderão me
amar também. O que eu mais quero? Encontrar
alguém e estabelecer uma relação longa para
o resto de minha vida. Não sabemos a quantidade, mas podemos mudar a qualidade.
Se pudesse mudar algo em minha vida, seria
minha sorologia. Gostaria de ser soronegativo.
I am determined not to let HIV get the better of
me but in a way it already has. I will never be able
to meet the aspirations of those dear to me. The
fact that one of my closest friends is HIV+ makes
it a lot easier to deal with because I don’t feel so
alone. I have learnt a lot over the last 4 years, a
lot about myself and the importance of hope. If
we were to go back in time fifteen years and with
such a low CD4 count on diagnosis, I would probably now be dead. However, with the advances in
treatment, a healthy lifestyle, a positive state of
mind, an excellent doctor, my family, some fantastic friends, a great job and the blessing of the
Lord, I can now live a completely normal life. I am
so grateful to be alive today.
Four years ago I loathed myself for my situation.
Perhaps such hatred, or internalized homophobia drove me to having unsafe sex in the first
place. But I am slowly learning to love myself because if I can do this then others can love me, too.
What do I want most? To meet someone and settle down in a long term relationship for the rest
of my life. No one knows the quantity but we have
the ability to change the quality.
If I could change one part of my life it would be
my HIV status. I wish I was negative. There have
been advances in medicine but it is no walk in the
park. People are dying of HIV today. Prevention
is better than treatment. While I and many others
are living with HIV, there is an alternative. If you
value life, always have safe sex.
30
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Houveram avanços na medicina, mas HIV não é como um passeio no parque. Pessoas morrem de
HIV ainda hoje. Prevenção é melhor que tratamento. Enquanto eu e várias pessoas vivem com o
vírus, há uma alternativa. Se você dá valor a vida, sempre faça sexo seguro.
Bhatupe,
feminino, 30 anos, Genebra, Suiça, heterosexual, coordenadora global
das Nações Unidas (defensora de pessoas soropositivas)
female, 30 years old, Geneva, Switzerland, heterosexual ,
United Nations Global Coordinator (advocate for people living with HIV)
Já vivo há oito anos com o HIV. Foi durante
uma tarde qualquer na cidade de Blantyre,
no Malawi, quando descobri minha soropositividade. Estava sozinha e fiquei completamente arrasada com o resultado. Fui fazer
o que pensava ser um exame de rotina, confirmando que tudo estava ok, visto que eu passei por diversas infecções ao mesmo tempo,
incluindo verrugas genitais. Já havia estado
oito meses antes neste Centro de Testagem
e Aconselhamento Voluntário e havia sido
confirmado HIV negativo passados os três
meses do primeiro teste. Então voltei super
confiante, esperava o melhor e nem imaginava a hipótese do pior. Foi com isso que
tive que me confrontar naquele dia e nos anos
seguintes.
Me tornei sexualmente ativa com 19 anos,
o que é um tanto atrasado como início
sexual entre os jovens em meu país, o Malawi.
Acho que eu não era suficientemente curiosa em descobrir o que existia para proteger
minha saúde sexual. Na minha faculdade, algumas vezes palestrantes vinham falar sobre
os perigos não apenas do sexo sem proteção
mas sobre o sexo em geral. Ocasionalmente
recebíamos preservativos nos banheiros.
Mas não imaginei que vinham acompanhados
de campanhas de conscientização ou mensagens para ajudar a proteger a nós, meninas
jovens. Eu me lembro de ver alguns cartazes
contundentes com pessoas magérrimas que
supostamente viviam com HIV no hospital. Ao
mesmo tempo em que aprendi sobre os preservativos e que eu e meu namorado poderíamos usar para nos proteger, acho que devería-
I have been living with HIV for eight years now.
It was on one random afternoon in the town of
Blantyre in Malawi when I discovered my HIVpositive status. I was all alone and was completely shattered by the results. I had gone for what I
thought was a routine examination to check that
I was okay, as I had been experiencing a number
of infections at the time, including genital warts.
I had been for a test at the same Voluntary Counseling and Testing (VCT) site eight months prior
and been confirmed HIV negative the standard 3
months after the first test. So I went in cockily,
expecting the best and not for once thinking the
worst. It was this that I had to confront that day
and in the years to follow.
I became sexually active at the age of 19, which is
a rather delayed sexual debut for young people
in my country, Malawi. I do not think that I was
curious enough to find out what was out there to
protect my sexual health. In my college we occasionally got speakers who would come to talk of
the dangers of not just unsafe sex, but of sex in
general. We would occasionally receive condoms
in the bathrooms. But I do not think they were
accompanied with major awareness campaigns
or messages to help us to protect ourselves as
young girls. I do remember seeing some rather
stigmatizing posters with skinny people who
were supposedly living with HIV in the clinic. At
the same time that I learnt about condoms that
my boyfriend and I could use to protect ourselves, I think I should also have been taught
about how to negotiate their use. I did not have
adequate negotiating skills to get my boyfriend
to use the condoms and whilst this is a lesson
learned, at the time it did not seem like such
32
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
mos ter sido ensinados também sobre como
negociar o seu uso. Eu não tinha a habilidade
adequada para convencer meu namorado a
usar o preservativo e, embora isso tenha sido
uma lição aprendida, não parecia ser um negócio tão sério. Lembro-me de uma vez deitada
na cama, olhando para uma caixa cheia de
preservativos na mesa de cabeceira, que nós
não usamos. Olhando para trás… me magoo
em pensar que poderia ter sido neste dia que
eu fui infectada. Seria talvez?
Precisei de uma semana inteira para juntar
a coragem e contar sobre o HIV para meu
namorado, como o conselheiro do centro me
havia sugerido. Eu consegui, mas encontrei
nele uma enorme negação. Foram meses até
que nós superássemos os sentimentos árduos
que um diagnóstico HIV conspira. Após ter contado a ele, eu me fechei novamente em minha
carapaça e durante três meses não contei a
mais ninguém. Nesses três meses eu estive
em muitos consultórios e sentava-me continuamente para prolongados exames e conversas. Também fiquei junto a diversas caixas em
farmácias no Malawi para coletar meus remédios anti-HIV, pois tive que começar meu tratamento duas semanas após descobrir minha
soropositividade. Tinha que iniciá-lo logo, pois
o primeiro médico com quem fui fazer o teste
de CD4 me disse que a contagem estava em
288 e que com 200 minha condição se tornaria
difícil de administrar. Foi um processo longo e
complicado, pois estava sozinha. No campus
da faculdade, onde estava de volta, não tinha um dispensário médico para os remédios,
nem no hospital local, então tinha que fazer
viagens mensais à cidade vizinha, Blantyre,
para abastecer meu suprimento de remédios.
Nunca vou esquecer uma experiência que
eu tive uma vez naquela cidade. Um homem
que eu não conhecia veio a meu encontro no
meio da rua e me disse que se lembrava de
mim da enorme fila do QUENNS, o hospital
local. Imagine! Eu não sei porque, mas eu me
lembro de sentir-me incomodada e constran-
a big deal. I remember once lying in bed and
seeing a whole box of condoms on the bedside
table that we had failed to use. Looking back…
it hurts to think that that may have been the day
when I contracted HIV. Was it, perhaps?
It took me a whole week to gain the courage to tell
my boyfriend about the HIV, as the counselor at
the VCT site had suggested. I managed, but I was
met with huge denial. It took us months to work
through the difficult emotions that an HIV positive diagnosis conjures up. Having shared with
him, I again withdrew into my own little shell and
did not talk to anybody about my status for another three months. In these three months I went
to many doctors’ offices and sat through many
lengthy examinations and talks. I also stood
at many tills in local Malawian pharmacies to
collect my anti-HIV medication, as I had to start
treatment within two weeks of learning of my
HIV-positive status. I had to start treatment as
the first doctor I saw asked for a CD4 count test
and which told me I had only 288 CD4 cells and
that at 200 cells my condition would be difficult
to manage. It was a long and hard process as I
was alone. The college campus that I had now returned to did not have a medical dispensary for
the drugs nor did the local hospital, so I had to
make monthly trips by bus to the nearest town,
Blantyre to fill my supply of medication. I will
never forget one experience I had once in town.
A man I did not know came up to me in the middle of Blantyre town and said he remembered me
from the long queue at QUENNS, the local hospital. Imagine that! I do not know why, but I remember feeling awkward and embarrassed! That is
the day when the advocate in me on AIDS was
born. I was angry that something so private as
what drugs I take were now everybody`s interest.
I was angry that because of my condition I was
being forced to give up my rights to privacy and
dignity by being forced to stand in an open line
in a very public hospital when everyone knew
what drugs were given out in that line. I was outraged and I told myself I would speak out until
everybody heard this from the rooftops! I next
gida! Foi neste dia que a defensora de pessoas com AIDS nasceu em mim. Fiquei brava
porque algo tão privado como os remédios que
eu tomo se tornou o assunto de qualquer um.
Fiquei brava porque a minha condição estava
me forçando a abrir mão do meu direito de
privacidade e dignidade, sendo forçada a ficar
em pé numa fila do lado de fora de um hospital
público, quando todos sabiam quais os remédios que ali eram distribuidos. Me senti ultrajada e disse a mim mesma que iria gritar de
cima dos telhados para que todos escutassem.
Em seguida contei a minha família sobre minha
condição e eles aceitaram muito bem. Minha
irmã mais velha me disse: “Você foi muito
boba de não nos ter dito antes. Ninguém deve
passar por isso sozinha”. Chorei quando ouvi
isso, pois não esperava tanta compaixão e
compreensão. Desde então tenho o amor e
apoio de minha família em tudo e acredito que
estou mais forte por isso.
Desde que disse à minha família há sete anos,
me tornei gradualmente cada vez mais aberta
sobre a minha condição. Conversei em grupos
locais de mulheres do campo, necessitadas de
cuidados médicos, falei com meninas jovens
com a minha idade, para dar a elas o poder de
se proteger sexualmente e afinal tive a oportunidade de compartilhar o assunto na igreja
local, uma igreja batista que faz muitas coisas,
proporcionando cuidados e apoio para pessoas
com o HIV. Um dia falei a todos sobre a difculdade e isolamento da infecção com HIV, sobre
as lutas dentro de uma relação e desafios que
o tratamento anti-HIV traz às pessoas infectadas. Embora tenha estado em tratamento por
todos esses anos, não é como uma brisa. Sou
informada todos os dias de que, às vezes,
são os efeitos colaterais dos remédios que
matam e não o virus. Também sei que várias
pessoas tem sido forçadas a viver muito sozinhas, caladas perante a família e seus amados porque eles tinham o HIV. Alguns desses
pre-ferem cometer o suicídio do que enfrentar
uma vida tão difícil. Outros se retiram de uma vida
told my family about my status, and they took it
very well. My older sister said to me: ``You are so
stupid for not having told us earlier. No-one has
to go through this alone``. I cried when I heard
this as I had not expected so much compassion
and empathy. Since then I have had my family`s
love and support throughout and I believe am
stronger because of this.
Since telling my family seven years ago I became
gradually more and more open about my status.
I spoke to groups of local rural women in need of
health services, I spoke with young girls my own
age to empower them to protect themselves in
their sexual health and I eventually got an opportunity also to share with my local church. It is a
Baptist church that is doing a lot to provide care
and support for people living with HIV. I spoke
up one day about the difficulty and loneliness of
HIV infection, about struggles in one’s relationship and the challenges that anti-HIV medication brings to people living with HIV. Although I
have been on treatment all these years, it is not
smooth sailing. I am aware everyday that it is at
times the side effects of the medication that kills
people, and not the virus. I am also aware that
many have been forced to live very lonely lives,
shut out from their families and loved ones because they were living with HIV. Some of these
committed suicide rather than chose to face such
a difficult life. Others opt out of a healthy social
life as it is just too hard to deal with all the blows
society gives them while also fighting for their
life with an incurable infection. And I can say
that during the last eight years, my own rights,
dignity, and even welfare at times have been
challenged. I have had to speak out for women
who could not speak for themselves. I have had
to fight abusive men, some of whom insisted in
using two condoms in sexual acts with me. It all
amounts to stigma when people are hyper sensitive or too ignorant to treat you like a normal
human being.
Today I am privileged to work with the UN and
with groups of others living with HIV. It is our
34
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
social saudável, por ser muito difícil lidar com
os golpes que a sociedade lhes dá, ainda que
lutando pelas suas vidas, frente a uma infecção
incurável. Posso dizer isso porque durante os
últimos oito anos, meus direitos, dignidade e
às vezes meu bem-estar foram desafiados. Fui
a porta-voz de mulheres que não podiam falar
por elas mesmas. Tive que lutar contra homens
abusivos, alguns chegaram a insistir em usar
dois preservativos para atos sexuais comigo.
Isso tudo mostra uma estigmatização quando
pessoas são demasiadamente suscetíveis ou
muito ignorantes para tratar você como um ser
humano normal.
Hoje sou uma privilegiada por trabalhar com
uma entidade de apoio e com grupos de pessoas vivendo com o HIV. São nossas vidas,
histórias, idéias e energias que juntas com
outras, podem fazer a diferença. Sim, hoje
muita gente tem acesso a tratamentos que
salvam vidas, mas muitos outros sofrem por
aí com acesso limitado a tratamentos e apoio.
Estou atenta que há muitos ainda, da minha
região, na Ásia e mesmo em lugares na Europa,
que não tem acesso às drogas antirretrovirais.
Sim, hoje o tratamento é uma enorme resposta
aos problemas para pessoas que vivem com
o HIV, mas é apenas uma parte da solução.
O maior problema continua sendo o estigma
e a discriminação. Trabalho todos os dias para
ter certeza que você, eu e outras pessoas,
poderemos todos passar as pequenas etapas
para eliminar os temores, mitos e fobias que
existem e que são completamente infundados
sobre o HIV e AIDS. Faça sua parte aceitando
a todos, não julgue ninguém e tome medidas
concretas para se proteger. Você sabe se tem
o HIV ou não? Porque não começa por aí? Faça
o teste!
lives, our stories, our ideas, and our energy together with others that can make a difference.
Yes, today, many have access to life saving treatment, but many more are suffering out there with
limited access to treatment and support. I am
mindful that there are many out there from my
part of the world and in Asia and even in parts
of Europe that do not have access to anti-retroviral drugs. Yes, today, treatment is a huge answer to the problems for people living with HIV
but it is only part of the solution. The biggest
problem remains stigma and discrimination. I
work everyday to make sure that you and I and
others can all take small steps to eliminate the
fears, myths and phobias that exist out there that
are hugely unfounded about HIV and AIDS. Play
your part by embracing all, judging none and
taking concrete steps to protect yourself. Do you
know your HIV status? Why not start there? Get
yourself tested!
Brigitte,
Toronto, Canadá, sexo feminino, heterosexual, avó de 8
Toronto, Canada, female, heterosexual, grandmother of eight.
Ser soropositiva mudou minha vida drasticamente, em vários aspectos. Já não aceito mais
as coisas sem questionar. Me foi diagnosticado o resultado positivo no dia 22 de setembro de 1994. Peguei o vírus do meu ex-marido,
estávamos casados havia apenas oito meses
no momento de meu diagnóstico.
Voltemos alguns anos atrás. Me divorciei do
pai de meus filhos em 1983 e estava vivendo
uma boa vida saudável. Tinha dois empregos como cabeleireira e comecei um namoro
quando meus filhos tornaram-se adolescentes.
Era o final dos anos 80 e eu ouvia falar de
AIDS mas acreditava-se que era uma doença
somente de homens gays, então não me preocupei realmente com isso. Tinha vários amigos
gays e por eu estar me encontrando com homens diferentes, eles me aconselharam a fazer
o teste a cada três meses, e comecei a fazê-lo.
Então meu médico erroneamente me disse que
eu não deveria me preocupar com isso, porque
eu havia feito uma histerectomia (retirada do
útero) em 1985 e que pelo fato de não ter mais
menstruações, eu nunca teria isso.
Em 1993, conheci meu segundo marido e ele
era soropositivo, o que não me impediu de
casar-me com ele no dia 7 de janeiro de 1994.
Fizemos sexo sem proteção, mas ele escondeu
de mim que sabia que eu poderia ser infectada, pois ele antes de se casar comigo, usava
proteção com sua ex-mulher por ela ser a mãe
de seus filhos...
Me separei dele alguns meses depois, porque
ele tornou-se muito ofensivo e começou a
me seguir em meu trabalho, ligava para meu
Being HIV+ has changed my life drastically, and
in lots of ways. I no longer take things for granted. I tested positive on September 22, 1994. I got
HIV from my ex-husband, we had only been married for eight months at the time of my diagnosis.
Let’s go back a few years. I divorced the father
of my children in 1983 and was living a healthy
good life. I had two jobs as a hairdresser and
started dating when my children became teenagers. It was the late 1980’s and I had heard about
AIDS but was under the impression that it was
just a gay man’s disease, so I didn’t worry too
much about it. I had a lot of gay friends and because I was dating different men they advised me
to get tested every three months, which I started
to do. Then my doctor incorrectly told me that I
had nothing to worry about because I had had a
hysterectomy in 1985 and because I didn’t have
periods I could never get it.
In 1993 I met my second husband and he was
HIV+, but that didn’t stop me from marrying him
on January 7th, 1994. We had unprotected sex,
but unbeknownst to me he knew that I could get
infected, because he used protection with his
ex-wife before marrying me because she was the
mother of his children...
I left the marriage a few months later as he became very abusive and started following me to
work, calling my boss and telling them I was taking drugs (I was only taking my HIV drugs), so
that I would get fired. I did lose my job in 1995
because they found out that I was HIV+. This put
an unbelievable strain on me as I had never, ever
been fired from a job since I started to work at
the age of 15.
36
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
chefe e dizia que eu estava usando drogas (eu
apenas tomava as drogas contra o HIV), para
que eu fosse demitida. Perdi meu trabalho em
1995 porque eles descobriram que eu era soropositiva. Eu fiquei incrivelmente tensa porque
eu nunca havia sido demitida de um trabalho,
desde quando comecei a trabalhar com 15
anos.
I asked my children for help and was refused. I
asked my sisters and brother for help and was
turned down. My mother’s doctor told her to
stay away from me. I was left with nowhere to
go. I was afraid to apply for a job anywhere as I
did not know what my old boss would say in my
reference so I went on to receive welfare benefit
for the first time in my life.
Pedi ajuda a meus filhos e eles recusaram.
Pedi a minhas irmãs e irmão e fui negada.
O médico da minha mãe disse para ela ficar
longe de mim. Fui deixada sem ter aonde ir.
Tinha medo de procurar trabalho porque não
sabia o que meu antigo chefe poderia dizer
como referências, então fui receber auxílio
doença pela primeira vez em minha vida.
I now knew what stigma and discrimination felt
like. Wow, what an eye opener I got! I had never
been afraid of my friends that were HIV+ or had
AIDS, so why were people afraid of me?
Naquele momento soube como o estigma
e a discriminação nos faz sentir. Uau, que
maneira de abrir-me os olhos! Nunca havia
sentido medo dos meus amigos com HIV ou
AIDS, então porque as pessoas tinham medo
de mim?
Eu me juntei a uma agência em Ottawa no
Canadá, em 1996 (Comitê AIDS de Ottawa) e
não me arrependi. Me liguei à diretoria, voluntariamente cortando cabelos e trabalhando no
refeitório.
Em 1997, conheci meu namorado atual que
não tinha o vírus, ainda estamos juntos e ele
continua negativo.
Em 1999, me tornei a Diretora voluntária de
uma organização para mulheres em Toronto,
a cinco horas de trem de Ottawa. Trabalhei lá
durante 18 meses, lutando pelos direitos de
mulheres com HIV. Tenho trabalhado voluntariamente por 14 anos e nunca vou parar de lutar
pelo fim do estigma e discriminação de todos.
Minha família finalmente aceitou minha condição, mas não completamente, porém já está
bom para mim. O que me importa é que estou
feliz comigo mesma e com minha vida.
I hooked up with an Agency in Ottawa, Canada in
1996 (AIDS Committee of Ottawa) and have not
turned back. I got involved with their board, volunteered to cut people’s hair and worked in the
food bank.
In 1997 I met my current HIV- Partner and we are
still together and he is still HIV-.
In 1999 I became the volunteer CEO of a Women’s
Organization in Toronto which is five hours by
train from Ottawa. I worked there for 18 months
fighting for HIV+ women’s rights. I have been
volunteering for 14 years now and will not stop
fighting to end the stigma and discrimination
of all.
My family has finally accepted my status, but not
completely, and that is ok with me. What matters
to me today is that I am happy with myself and
my life.
In 1994 I was given five years to live but I fooled
them all: I’m still here and not going anywhere
soon. I have my good days and I have lots of bad
days, but my partner is here when I need him.
What is sad is the kids, teenagers and young
adults who all think that it can never happen to
them.
Being on medication is no way to live. The side
effects can play havoc with your day to day activities. There are days when I cannot leave the
Em 1994, deram-me cinco anos de vida mas
enganei a todos: ainda estou aqui e não irei a
lugar nenhum tão cedo. Tenho meus dias bons
e vários dias ruins, mas meu namorado está
comigo quando preciso dele. O mais triste são
as crianças, adolescentes e jovens que pensam
que isto nunca poderá acontecer com eles.
house because I have to be near a bathroom,
sometimes for two or three days at a time.
Depender de remédios não é um jeito bom de
viver. Os efeitos colaterais podem estragar
suas atividades diárias. Há dias em que não
consigo sair de casa porque tenho que ficar
perto do banheiro, às vezes de 2 a 3 dias
seguidos.
Thank you for letting me share myself.
Eu poderia continuar sobre o assunto mas isso
daria um livro...
Para terminar: Por favor se proteja; Faça o
exame e mantenha-se seguro.
Obrigado por me deixar compartilhar minha
história.
I could go and on but that could turn into a
book...
Last of all: Please protect yourself; Get tested
and stay safe.
38
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Denison,
não questionamento sobre a gravidade de sua
doença que eu desconhecia.
33 anos, masculino, Rio de Janeiro, Brasil, profissional de audiovisual
33 years old, male, Rio de Janeiro, Brazil, audio-visual professional
Maria Diva,
Mãe de Denison, morreu aos 46 anos, feminino, heterossexual, empregada doméstica,
Rio de Janeiro, Brasil
Denison mother, 46 years old when died, female, heterosexual, housemaid, Rio de Janeiro, Brazil
Descobri que minha mãe era portadora de
HIV em 1993, dois dias antes de sua morte.
Há algum tempo ela já estava doente, num
processo de ida e vinda aos hospitais da rede
pública, sem que tivesse uma cura efetiva. Eu
tinha 17 anos e com todo o esclarecimento sobre a AIDS, não desconfiava que minha mãe
tivesse contraído o vírus. Desde a morte de
meu pai, ocorrida 6 anos antes, vitimado por
complicações diabéticas, minha mãe tentava
outros relacionamentos. Conheceu seu último
namorado, sete anos mais novo do que ela,
e consolidaram união estável que durou quatro anos. Acredito que os dois descobriram
o contágio quando um vizinho precisou de
doação de sangue e meu padrasto se ofereceu
para ajudá-lo. Concluo que devem ter descoberto o vírus no impedimento da doação, após
os exames.
Minha mãe e seu namorado encararam juntos
o fardo de saberem-se portadores de HIV por
cerca de dois anos, sem viverem os problemas
decorrentes do vírus. O meu padrasto, que era
forte e saudável, de repente adoeceu. Nos seu
últimos dias, lembro de seu corpo fraco, da
dificuldade que tinha em se alimentar e digerir
os alimentos, e o mais impressionante, ele
que era negro, tinha o corpo amarelado. Novamente lembro que mesmo com estes indícios,
nem sequer imaginava que ele fosse soropositivo. Não consigo entender o porquê do meu
I discovered that my mother was HIV+ in 1993,
two days before her death. She had already
been sick for some time, being in and out of
public hospital, and never effectively having
been cured. I was 17 and with all the information
about AIDS, I didn’t suspect that my mother had
contracted the virus. Since my father’s death,
which had occurred six years before, a victim of
diabetic complications, my mother tried having
other relationships. She met her last boyfriend,
seven years younger than her, and formed a stable union that lasted for four years. I believe that
they both discovered their HIV infection when a
neighbor needed a blood donation and my stepfather offered to help him. I conclude they must
have found out about the virus when they were
prevented from donating their blood following
blood tests.
My mother and her boyfriend faced the burden of
knowing that they had AIDS together for nearly
two years, living without any problems resulting
from the virus. My stepfather, who was strong
and healthy, suddenly fell ill. In his last days, I
remember his body was weak, he had difficulty
in feeding himself and in digesting food, but the
most impressive thing was that, although he
was black, his body was yellowish. I remember
again that even with all these clues, I had no idea
he was HIV positive. I cannot understand why I
did not question the gravity of his sickness that
I had ignored.
Minha mãe, ainda não afetada pelas doenças
oportunistas, apresentava uma aparência
saudável. Penso como deve ter sido difícil o
triplo desdobramento, onde fazia forças para
medicá-lo, esconder de mim o seu contágio
(numa tentativa de me poupar de sofrimentos)
e encontrar ânimo e esperanças para seguir
adiante como se também não estivesse doente.
Depois de inúmeras internações e agravos constantes da doença, a morte dele não tardou.
Ela seguiu trabalhando, enquanto eu vivia o
auge de minha adolescência e estudava. O seu
estado de saúde só piorou depois de cerca de
um ano, quando ela apresentava uma febre
que nunca cessava e os mesmos problemas
de fraqueza, ingestão e digestão de alimentos.
Ingenuamente, eu acreditava que bastaria uma
boa alimentação ou cuidado médico que logo
ela estaria curada.Eu sequer desconfiava que
as constantes idas aos hospitais da rede pública e o descaso que conferem aos pacientes,
pudessem trazer alguma gravidade.
No dia 06 de novembro eu tinha programado
de ir no 1° show que a Madonna faria no Rio de
Janeiro e não me preocupei, por displicência,
ingenuidade e egoísmo típicos da adolescência, em largá-la doente e sob os cuidados de
sua afilhada. Ao voltar para casa descobri que
seu estado de saúde tinha piorado e que ela
teve que ser internada. Fui visitá-la no dia
seguinte no hospital, e ainda não tinha caído
a ficha de que a coisa era séria. Em casa fui
procurado pela vizinha que tinha cuidado de
sua internação e que, afinal, me contou sobre
o seu estado soropositivo.
Finalmente entendi tudo: as suas constantes
febres que não cessavam, o corpo amarelado
e fraco de meu padrasto nos seus últimos dias
de vida...
Lembro de ter chorado muito neste domingo,
My mother, who was still not affected by any
opportunistic infections, had a healthy appearance. I imagine how difficult it must have been
for her to deal with the situations that were unfolding, like making the effort to medicate him,
hiding her own infection from me (in an attempt
to save me from suffering) and finding courage
and hope to move forward as if she herself were
not sick too.
After many hospitalizations and with his health
continuing to deteriorate, his death came quickly. She continued working while I was at the peak
of my adolescence and studying. Her health only
began to get worse after about a year, when she
had a fever that never ceased and the same problems of weakness, eating and digestion. Naively,
I believed that good food and medical care would
be enough for her and she would soon be cured. I
never suspected that the constant visits to public
hospitals and their lack of care for the patients
would bring about anything serious.
On November 6, I had arranged to go to the first
show that Madonna was going to give in Rio de
Janeiro and I was not worried, either due to carelessness, selfishness or typical teenage naivety,
about leaving her ill and under her goddaughter’s care. When I got back home, I discovered
that her health had deteriorated and she had had
to be put back in hospital. The next day I went to
visit her in hospital and I was not yet aware about
how serious it was. At home a neighbor who had
taken care of her hospitalization visited me and
in the end she told me about my mother’s HIV
status.
Finally I understood everything: her constant fevers that never ceased, the yellowish and weak
body of my stepfather in the last days of his life...
I remember crying a lot on that Sunday, thinking
about the seriousness of her hospitalization and
her struggle in knowing that she herself was sick
and in finding the strength to hide her condition
from me. I wondered how and why I could have
40
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
ao considerar a gravidade de sua internação e
sua luta de saber-se doente e criar forças para
esconder de mim seu estado. Me perguntava
como, e por que, tinha sido tão cego. No choro
misturava o sentimento de tristeza, medo,
desamparo e culpa.
O dia seguinte a esta descoberta foi o último
dia em que pude vê-la. Fui visitá-la, mas não
consigo lembrar do que conversamos. Lembro
dela deitada e muito doente.
Até hoje me culpo (e piora, à medida que envelheço) por ter desperdiçado a oportunidade de
declarar o meu amor a ela, nesta última visita.
No dia seguinte ela faleceu, vitimada pelo
agravamento do estado de pneumonia não
tratado de forma adequada.
Nos início dos anos 90 o Brasil ainda não apresentava avanços significativos no tratamento
aos portadores da AIDS e desconheço se havia
política pública de distribuição de medicamentos e coquetéis.
Repensando o fato, é difícil avaliar de que
maneira fui afetado nas mudanças relacionadas à prevenção, por conta de histórico tão
próximo em minha vida. Recentemente vivi a
preocupação de contágio, por conta de uma
transa sem preservativo e não tenho certeza
se a morte de minha mãe, vitimada pelo HIV,
aumentou meu medo e minha culpa.
Lembro também, que durante muito tempo, eu
procurava uma maneira de livrar minha mãe
da culpa pelo contágio na sua relação com o
meu padrasto, declarando que ele tinha sido o
primeiro a falecer. Hoje, sei que este fato não
tem comprovação lógica e nem tem importância. O vírus já é encarado com tanta culpa, e
não servirá para nada o apontamento de quem
foi o primeiro infectado na relação.
Concluo também, que criei um mecanismo de
defesa ao isolar a pouquíssimos conhecidos
esta significativa parte de minha história.
been so blind. Feelings of sadness, fear, helplessness and guilt mingled with my tears.
The day after this discovery was the last day
that I could see her. I went to visit her but I can’t
remember what we talked about. I remember
her being laid down and very sick. Until today I
blame myself (and it gets worse as I get older)
for having missed the opportunity tell her that I
loved her on this last visit.
She died the next day, a victim of a worsening
pneumonia which was not treated adequately.
In the early 90s Brazil had not made significant
advances in the treatment of people with AIDS
and I do not know whether there was a policy for
the distribution of medicine and drug cocktails.
Thinking again about this, it is difficult to assess how I have been affected with the changes
related to prevention because this story is so
close to my life. I was recently worried about
having become infected, because I had sex once
without a condom and I’m not sure if my mother’s
death and her being a victim of HIV increased my
fear and guilt.
I remember also that for a long time I was searching for a way to free my mother from the guilt
about the infection in her relationship with my
stepfather by emphasizing the fact that he was
the first one to die. Today, I know this has no logical evidence and doesn’t matter. The virus is already associated with so much guilt and nothing
is served by saying who was the first one to be
infected in a relationship.
I also conclude that I have created a defense
mechanism by only telling very few people that I
know about this significant part of my story.
I hope that in sharing my story publicly, I might
be able to live better with what has happened.
And if I can increase the understanding that the
HIV virus does not choose between creed, age or
sex, then I think that part of the mission will have
been accomplished.
Espero que dividindo este depoimento de
forma pública, eu consiga viver melhor o acontecido. E, se tiver aumentado a atenção para o
fato de que o vírus do HIV não escolhe credo,
idade ou sexo, acho que parte da missão terá
sido cumprida.
42
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Derek,
educado sobre o HIV pela primeira vez na
minha vida. Recentemente voltei ao trabalho.
Agora eu tenho que colocar em ação, esse conhecimento e experiência vivida, como coordenador do projeto Legacy na “Committee for
Accessible AIDS Treatment – CAAT” (Comissão
para o tratamento de AIDS acessível).
masculino, Toronto, Canadá, gay, artista
male, Toronto, Canada, gay, artist
O HIV roubou minha vida, minha infância e
tudo o que estimo em meu coração: minha
família, amigos e amantes. Eu tinha 39 anos,
meus rins falhavam e havia perdido completamente a vontade de viver. Estava exausto.
Vivia em isolamento e sofri por muito tempo.
Afinal de contas, eu estava morrendo desde
1993. Me encontrei sozinho e abandonado
por meus amigos e família, após o resultado
positivo para AIDS e estar desenvolvendo
Sarcoma de Kaposi.
Agora quero recuperar a minha vida. Me recuso
a deixar o HIV decidir quem eu sou. Eu não conheço mais a vida sem o vírus e sou muito mais
do que isso. Quando profissionais pagos ficam
dizendo que você está morrendo, a tendência
é acreditar. Após 17 anos de existência com
uma depressão clínica, combatendo inúmeras
infecções e complicações relacionadas ao HIV,
encontrei um refúgio em um estúdio de arte
chamado Creative Works, aqui em Toronto,
Canadá, que me foi indicado pelo meu fisiatra.
Descobri que eu estava cheio de emoção e
precisava de uma maneira para me expressar.
Através da arte, eu finalmente encontrei algo
em que eu era bom naturalmente e eu podia
expressar minhas lutas internas.
Agora, olhando para trás sobre todos aqueles
anos perdidos, percebo que posso contribuir
para a sociedade e para minha comunidade.
Após aprender sobre “Greater Involvement of
People with AIDS – (GIPA)” (Maior participação
das pessoas com AIDS) e fazer vários cursos de capacitação oferecidos para “pessoas
vivendo com HIV e AIDS” (PHAs), nesta nova
era de capacitação, me descobri ao ser
HIV has stolen my life, my childhood and
everything that I hold dear to my heart: my
family, friends and lovers. I was 39 years old,
my kidneys were failing and I had completely
lost the will to live. I was exhausted. I had lived
in isolation and suffered for far too long. After
all, I’d been dying since 1993. I found myself
alone and abandoned by my friends and family
after testing positive for AIDS and developing
Kaposi’s sarcoma.
Now I want to reclaim my life. I refuse to let HIV
define who I am. I do not know life without the
virus and there is so much more to me than this.
When paid professionals keep telling you that
you are dying you tend to believe them. After 17
years of existing in a clinical depression fighting
off numerous infections and HIV related complications, I found solitude in an Art Studio called
Creative Works here in Toronto, Canada, which
was referred to me by my physiatrist. I discovered that I was full of emotion and needed a way
to express myself. Through art I finally found
something that I was good at naturally and I was
able to express my inner struggles.
Now, looking back at all those wasted year,
I realize that I can contribute to society and
my community. After learning about “Greater
Involvement of People with AIDS” (GIPA) and
taking various capacity building courses offered to people living with HIV and AIDS (PHAs)
in this new era of empowerment I found myself
being educated about HIV for the first time in my
life. I have recently returned to work. Now I have
put this knowledge and lived experience into
action as the Legacy project coordinator for the
Committee for Accessible AIDS Treatment (CAAT).
A realidade é que sou soropositivo, infectado em 1988. Estive esperando minha morte
durante a maior parte de minha vida. Por
razões desconhecidas, me encontro aqui ainda,
lutando para ajudar a educar a sociedade sobre
esta doença que está mudando e que continua
tão perigosa quanto antes. Ciente que as pessoas continuam facilmente enganadas por esta
doença e que o HIV não discrimina por cultura,
origem racial ou econômica, sendo muito mais
difícil educar o público. Educar PHAs sobre
os determinantes sociais da saúde, no que se
refere ao HIV, em um ambiente pró-sexo e de
prevenção pós, é bastante difícil. Ensinar PHAs
sobre reinfecção, infecção cruzada e os danos
que o sexo desprotegido ainda pode causar em
uma vida, é fundamental para trazer mudanças
em nossa comunidade.
Tendo mutado em mim, o vírus HIV no meu
corpo tem resistência e eu levo esta resistência
em mim. Nos primeiros anos, eu nunca soube
a diferença entre ser o sujeito de uma experiência clínica e o paciente de um médico. No
passado, fui submetido a diversas experiências de remédios sem êxito e ninguém me
explicava sobre a importância da adesão.
Isto causou a mutação do meu vírus. Isto é
mortal. Se faço sexo hoje com alguém, é um
crime para eu não divulgar minha condição. Eu
sou culpado por ter HIV?
Estou cansado de ficar bravo. Se eu pudesse
conversar com o cara que me infectou há tanto
tempo atrás, eu o perdoaria.
The reality is I am HIV+, infected in 1988. I have
been waiting to die for most of my life. For unknown reasons I find myself still here, fighting to help educate society that this disease is
changing and it is still as dangerous as before.
Knowing that people are still easily fooled by this
disease and that HIV does not discriminate by
culture, racial or economic background makes
educating the public that much harder. Educating PHAs on the social determinants of health as
it pertains to HIV in a pro-sex and post prevention environment is difficult enough. Teaching
PHAs about re-infection and cross infection and
the damage that unprotected sex can still have
on one’s life is instrumental to affecting change
in our community.
Having mutated in me, the HIV virus in my body
has resistance and I carry this resistance in me. I
never knew in the early years what the difference
was between being a subject in a clinical trial
and a doctor’s patient. I was a subject in many
unsuccessful drug trials in the past with no-one
explaining to me the importance of adherence.
This caused my virus to mutate. It is deadly. If I
have sex with someone, it is a criminal offence
for me not to disclose my status. Am I guilty for
having HIV?
I am tired of being angry. If I could have a conversation with the man who infected me so long ago,
I would forgive him.
44
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
Kyle,
testes de medicamentos, que hoje os soropositivos só precisam tomar algumas pílulas.
37 anos, sexo masculino, Toronto, Canadá, gerente e empresário, pai de dois meninos.
37 years old, male, Toronto, Canada, manager and business owner, father of two boys
Seria falso dizer que ser soropositivo é a
pior coisa que já me aconteceu: não é o fim.
Começou uma jornada em minha vida que me
fez aprender que sabedoria é poder. Tem sido
uma lição bem difícil, viver com o estigma e
ser discriminado praticamente todos os dias
por familiares, amigos, companheiros de escola ou de trabalho. Me preocupava em como
minha ex-mulher e crianças iriam reagir sobre
eu ser soropositivo. Isso gerou cansaço mental, físico e emocional e o estresse financeiro,
que acompanham a soropositividade. Depois
existem problemas para os quais você não
pode se preparar, como as leis e as restrições
de viagem. Eu queria ter pensado duas vezes
antes de ter feito uma tatuagem em um salão
sem licença, mas às vezes fazemos coisas sem
pensar nas consequências futuras de nossas
ações, e então já é tarde demais.
É verdade que os remédios de tratamento do
HIV mudaram, sei disso escutando as histórias
de sobreviventes de longo prazo, que tiveram
a sorte de obter os medicamentos, de como
conseguiram atravessar a época mais sombria
do HIV.
Quando o GRID (deficiência imunitária relativa
aos gays), depois AIDS e agora HIV, como é
comumente referido, começou a aparecer nas
manchetes, o sistema de saúde estava completamente despreparado para lidar com essa
doença nova e misteriosa. Eles receitaram e
testaram coquetéis de remédios, um após o
outro, até que algum finalmente funcionou.
Naquela época, sobreviventes de longo prazo
recebiam frequentemente 40 pílulas ou mais
por dia. Foi por causa do sacrifício deles nestes
It would be untrue to say having HIV is the worst
thing that has happened to me: it is not the end.
It started a journey in my life where I learned that
knowledge is power. It has been a really hard
lesson in living with stigma and being discriminated against on a daily basis by family, friends,
school or work mates. I had to worry about how
my ex-wife and children were going to react
about me being HIV+. This only compounded
the mental, physical and emotional fatigue and
the financial stress that comes with being HIV+.
Then there are the issues that you can’t prepare
for, like the law and travel restrictions. I wish that
I had thought twice before getting a tattoo done
in a non-licensed parlor, but sometimes we do
things without thinking about the future consequences of our actions, and then it’s too late.
True, the medicines to treat HIV have changed
and this I know from hearing the stories of long
term survivors, who were lucky enough to get
access to the drugs, of how they made it through
HIV’s darkest days. When GRID, then AIDS and
now HIV, as it is commonly referred to, first
started making headlines, the medical system
was totally unprepared to deal with this new and
mysterious disease. They prescribed and tested
one medical cocktail after another until something finally worked. Back then, long term survivors were often given 40 or more pills per day.
It is because of their sacrifice during those drug
trials that today those who are HIV+ may only
have to take one or more pills.
The advances in medicine are truly remarkable
but as I said before there are other factors that
one does not think of until it’s too late. How am
I going to pay for this medication? Will it affect
Os progressos na medicina são realmente
notáveis, mas como eu disse antes, existem
fatores que não pensamos até ser tarde demais. Como eu vou pagar por esses remédios? Isso irá afetar minha habilidade para o
traba-lho? Quais leis sobre o HIV afetam minha
vida agora? Como minha família irá reagir?
Mesmo que você tenha que tomar somente
uma pílula por dia para tratar o vírus, existem
efeitos colaterais que devem ser administrados.
Pergunte a um diabético sobre injetar insulina
em si mesmo, ou a uma pessoa que recebe
quimioterapia ou radioterapia para tratar o
câncer. De toda maneira, é muito melhor evitar
ser diagnosticado com alguma doença,do que
enfrentar uma parte da vida tomando remédios. Ao contrário de outras doenças, ainda há
um enorme estigma ligado ao HIV e isto pode
ser a maior pílula que se tenha que engolir!
Junto com os efeitos colaterais, há uma dura
consciência ao saber que a partir do momento
que começar a tomar os remédios, você deve se
lembrar de tomá-los diariamente pelo resto de
sua vida. Estes medicamentos antirretrovirais
não são baratos e você vive constantemente
lembrando que ao perder doses, você pode
deixar os remédios ineficazes no combate do
vírus em seu corpo. Você deve então começar
um outro tratamento, e com esse novo tratamento veem novos efeitos colaterais ou a
chance de que eles não funcionem. Alguns
desses remédios causam estragos em seu corpo, levando a outros problemas como diabetes,
colesterol alto, câncer, problemas cardíacos e
uma maior chance de ter um acidente vascular
cerebral. Houve também ligações com problemas mentais como depressão e ansiedade. Isso
geralmente leva à prescrição de mais remédios
e ainda mais complicações em sua vida.
Comecei com apenas cinco pílulas por dia, que
depois aumentou para 35, felizmente agora,
diminuí para somente 16 pílulas por dia. Além
my ability to work? What HIV laws now affect my
life? How is my family going to react? Even if you
only have to take one pill a day to treat this virus,
there are side effects that have to be dealt with.
Ask a diabetic about injecting themselves with
insulin, or a person who is receiving chemotherapy or radiotherapy to treat cancer. It is far better
to avoid getting diagnosed with any disease than
to face a life time of taking medication of one kind
or another. Unlike other diseases, there is still a
huge stigma attached to HIV and this can be the
biggest pill one has to swallow!
Along with the side effects, there is the harsh realization that goes along with knowing that once
you start taking these medications, you have to
remember to take them daily for the rest of your
life. These antiretroviral medications are not
cheap and you constantly live with the reminder
that missing doses could make the pills powerless to fight the virus in your body. Then you
have to start another treatment and with this new
treatment come new side effects or the chance
they may not work. Some of the medication
wreaks havoc on one’s body causing other issues
like diabetes, high cholesterol, cancer, and heart
problems and the increased possibility of stroke.
There have also been links to mental issues such
as depression and anxiety. This usually leads to
more pills being prescribed and yet more complications in your life.
I started with only five pills a day which then
increased to 35 and now, thankfully, I am
back down to only 16 pills a day. In addition to
having had a massive heart attack, I also have to
deal with having diabetes and high cholesterol
amongst other health complications and effects
that have stemmed from the treatments of this
disease.
I could write a book just on what living with the
stigma and discrimination that comes with being HIV+ is like. How does one ever get used to
being labeled as “dirty”, “having it”, or “polluted”. There is no “Guide to being HIV+” that
explains the laws and rules one inherits just by
46
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
de ter tido um ataque cardíaco fulminante,
tenho também que lidar com diabetes e ter o
colesterol elevado, entre outras complicações
de saúde e efeitos resultantes do tratamento
dessa doença.
Eu poderia escrever um livro apenas sobre o
que é viver com o estigma e a discriminação
que acompanham o soropositivo. Como alguém
se acostuma em ser rotulado de “sujo”, “que
tem aquilo” ou “poluído”. Não há um “Guia
sobre ser soropositivo” que explique as leis e
regras a que deve se submeter, apenas por ser
portador do vírus. Sobre viagens, por exemplo: a quantidade de países onde uma pessoa
soropositiva tem entrada restrita é espantosa.
A menos que você resolva viajar sem seus
remédios, estará arriscado a ter sua entrada
recusada. Viajar sem remédios significa correr
o risco de mutação do vírus e, neste caso, o
médico deverá lhe prescrever outro tratamento
antirretroviral, que não há garantia de que irá
funcionar. Tenho família nos Estados Unidos
e por causa dessa restrição, eu não poderia
visitá-los sem fazer algo ilegal. Faça uma
pesquisa: Seja voluntário em sua organização local de atendimento a AIDS e escute as
pessoas que vivem com o HIV, você logo verá
a importância em proteger a si mesmo de uma
mudança de vida causada pelo vírus.
Como eu já disse, seria falso dizer que o HIV
foi a pior coisa que aconteceu em minha vida.
Aprendi muito e tive sorte em ter recebido
o apoio e os cuidados necessários para me
ajudar, não somente em lidar com os efeitos
da doença, mas também alguns dos outros
problemas que normalmente se enfrenta. Estou agora rodeado de outros sobreviventes
de longo prazo e de recém-diagnosticados.
Tornamo-nos uma família, uma família dos
que vivem com o mesmo vírus. Se você receber o resultado positivo para o vírus, existem
programas e serviços disponíveis para você.Por
favor, não deixe o estigma te matar. Sabedoria
é a chave para sobreviver com tudo que esse
mundo tem para jogar em você.
having this virus. Take travel, for instance. The
number of countries that someone who is HIV+ is
restricted from travelling to is astounding.
Unless you plan on travelling without your
medications you face the risk of being denied
entry. Traveling without your medication means
running the risk that the virus will mutate and
if it does the doctors will have to prescribe yet
another antiretroviral that you have no guarantee will work. I had family in the US and because of the ban on HIV+ people from entering,
I could not visit without doing something illegal.
Do your own research: volunteer at your local
AIDS service organization and listen to those living with this disease and you will soon see the
importance of protecting yourself from getting
this life changing virus.
But like I already said, it would be untrue to say
that HIV has been the worst thing to happen to
me in my life. I have learnt a lot and have been
lucky to have received the support and care
needed to help me not only deal with the effects
of living with this disease but any other problems
that one normally faces. I am now surrounded
by other long term survivors and those newly
diagnosed and we have become a family: a
family living with the same virus. If you do test
positive for this virus, there are programs and
services available to you.
Please don’t let stigma kill you. Knowledge is the
key to surviving anything this world has to throw
at you!
Paulo,
39 anos, masculino, São Paulo, administrador de empresas, homosexual.
39 years old, male, São Paulo, Brazil, business man, homosexual.
Aos 36, após algumas semanas me sentindo
indisposto, fui internado e tive diagnóstico de
tuberculose. Logo o exame de sangue mostrou
que eu estava com a imunidade baixíssima,
e era portador do vírus HIV. Não tenho como
descrever o choque e pânico que a notícia me
causou. Choque por sempre ter sido prudente
nas relações sexuais, e usado preservativos.
Ficou evidente para mim que o vírus havia sido
contraído em uma noite de loucura, em que
certamente estava bêbado e permiti algumas
“brincadeiras”. Conclusão : só é necessário
uma vez para contrair. Pânico porque sou de
uma geração em que ser HIV positivo era uma
sentença de morte, em que assistíamos ídolos
como Cazuza, Fred Mercury e Renato Russo
agonizarem na nossa frente.
Poucos dias depois de ser internado, entrei
em coma. Os médicos avisaram aos meus
familiares e amigos que eu não resistiria.
Foram mais de 20 dias de CTI, mas de uma
forma milagrosa, acordei e consegui sair do
hospital e iniciar a recuperação em casa. Essa
recuperação foi lenta, difícil e dolorosa. Fiquei
com sequelas do coma, estava muito fraco e
17 quilos mais magro. Foi necessário ainda
muita fisioterapia, alimentação balanceada, e
uma dose cavalar de remédios que me deixava
completamente zonzo. Somente um ano depois
voltei a uma vida normal, trabalhando e aos
poucos tendo uma vida social novamente.
Hoje posso dizer que estou muito bem de
saúde e peso exatamente a mesma coisa que
antes da doença. Meu organismo aceitou bem
os remédios do coquetel, e tenho uma carga
viral indetectável e uma taxa de imunidade
When I was 36 years old, after feeling unwell for a
few weeks, I was put into hospital and diagnosed
with tuberculosis. A blood test soon revealed
that my immunity was extremely low and that
I had the HIV virus. I don’t know how to describe
the shock and the panic that the news caused.
I was shocked because I had always been careful in sexual encounters and used condoms. It
became clear to me that I had contracted the virus
on a crazy night when I had certainly been drunk
and had let some “games” happen. Conclusion:
you can get HIV after just one mistake. I panicked because I am of the generation when being HIV positive was a death sentence, which we
saw with idols like Cazuza, Freddy Mercury and
Renato Russo who agonized in front of us.
A few days after being put into hospital, I went
into a coma. The doctors told my family and
friends that I would not make it. I spent a further twenty days in the Intensive Care Unit, but
like a miracle, I woke up and managed to leave
hospital and start my recovery at home. My recovery was slow, difficult and painful. The coma
left me with after effects, I was very weak and I
had lost 17 kilograms in weight. I had to do physiotherapy, eat a balanced diet and take a huge
number of pills that made me extremely groggy. Only a year later I returned to a normal life,
working and slowly regaining a social life again.
I can say today that I am very healthy and weigh
exactly the same as before the disease. My body
has accepted the cocktail of medicines well, my
viral load is undetectable and my immunity is
at a very satisfactory level. I lead a normal life,
working and going to the gym and enjoying
myself with my friends during leisure time.
48
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
bastante satisfatória. Levo uma vida normal,
trabalhando, indo à academia e me divertindo
com os amigos nas horas de lazer.
Mas não é tão simples assim. Ainda não consegui voltar a ter um relacionamento sério,
pois tenho muito medo de ser rejeitado por
ser soropositivo. E por mais que os remédios
e recursos hoje em dia sejam vários, não é
fácil carregar o peso desse vírus. Fico com a
sensação de que algo repentinamente possa
acontecer, e que um simples resfriado vá me
derrubar.
Me assusta muito ver essa geração mais nova
ser tão displicente em relação à AIDS. Muitos nem exigem preservativos nas relações
sexuais. Temos que alertá-los que ser portador
do HIV pode não ser mais uma sentença de
morte, mais que pode causar muitas sequelas
(físicas ou psicológicas), e que não são todos
que tem a sorte que eu tive.
But it’s not that straightforward. I still haven’t
managed to have a serious relationship again
because I’m frightened that I’ll be rejected because of my HIV status. And even though the
medicines and treatments nowadays are numerous, it’s not easy to carry the weight of this virus.
I have the feeling that something could suddenly
happen or that a simple cold could knock me
down.
It shocks me to see this younger generation so
careless in relation to AIDS. Many don’t demand
the use of condoms in sexualencounters. We have
to let them know that being HIV positive may not
be a death sentence any more but it can still have
a lot of after effects (physical and psychological)
and that not everybody is as lucky as me.
Valéria,
39 anos, escritora e jornalista, São Paulo, Brasil, heterossexual
39 years old, writer and journalist, São Paulo, Brazil, heterosexual
Meu nome é Valéria Piassa Polizzi e aos
15 anos comecei a namorar um rapaz, que
conheci numa viagem de navio. Eu ainda era
virgem e depois de seis meses de namoro
transei pela primeira vez. Infelizmente não
usamos preservativo. Aos 18 anos, o namoro
já havia terminado e eu concluído o colegial.
Como ia para Nova York visitar uma tia, achei
melhor checar a leve dor de estômago que
vinha sentindo. O médico descobriu sapinho
no esôfago. Ficou desconfiado e pediu exame
de imunidade, que resultou baixa. Pediu então,
o exame de HIV, que deu positivo.
Na época, 1989, a AIDS era tratada como
sinônimo de morte e muitos médicos se assustavam com o fato de uma mulher estar
infectada, pois ainda acreditavam que era
uma doença exclusiva de homossexuais masculinos. O preconceito era muito grande por
parte da mídia e da população em geral.
Tínhamos pouca informação ou informação
errada. O médico deu a notícia a meus pais,
que depois me contaram. Ainda não era hora
de iniciar um tratamento pra a AIDS e ele disse
para eu fazer a viagem e tentar levar uma vida
normal, mas que evitasse contar aos outros
que tinha o HIV.
Durante anos vivi em ostracismo. Só meus pais
e tios mais chegados sabiam. Em 1993, com 22
anos fui para a Califórnia estudar inglês numa
universidade por seis meses. Foi essa viagem
que acabou mudando minha vida. Na época,
enquanto no Brasil a AIDS ainda era associada
à morte, lá já se falava em “pessoas vivendo
com HIV e AIDS”. Foi em São Francisco que
conheci, pela primeira vez, grupos de apoio
My name is Valeria Piassa Polizzi and when
I was 15 years old I started dating a guy that I
met on a sea cruise. I was still a virgin and after
six months of dating I had sex for the first time.
Unfortunately, we didn’t use condom. At 18, our
relationship was already over and I had finished
high school. As I was going to New York to visit
an aunt, I thought it was better to check about
a light stomach ache that I had been feeling.
The doctor discovered thrush in my esophagus.
He became suspicious and asked me to take
an immunity test, the result of which was low.
He therefore asked for an HIV test, the result of
which was positive.
At that time, in 1989, AIDS was treated like a synonym for death and many doctors were shocked
that a woman had been infected, because they
still believed that it was a disease exclusive
to homosexual men. The prejudice was huge
among the media and among the population in
general. There was little information and it was
usually wrong. The doctor gave the news to my
parents who then told me. It wasn’t yet time to
start treatment and he told me to go on my trip
and to try to lead a normal life, but to avoid
telling others that I was HIV+.
For years I lived in solitude. Only my parents and
closest relatives knew. In 1993, when I was 22
years old, I went to California to study English at
a University for six months. This was the trip that
ended up changing my life. At that time, while
in Brazil AIDS was still associated with death,
there was already talk about “people living with
HIV and AIDS”. That was in San Francisco where
I met, for the first time, support groups for HIV
positive people and activists who fought for their
50
O LIVRO DA VIDA - DEPOIMENTOS VERDADEIROS
a soropositivos e ativistas que lutavam pelos
seus direitos. Isso me fez crer que a questão
era cultural e se lá havia mudado, aqui poderia
mudar também.
Voltei ao Brasil querendo fazer alguma coisa
para ajudar, mas eu tinha voltado doente.
Estava com Tuberculose Renal, uma infecção
oportunista, pois até então me recusava a
tomar medicamento, o AZT. “Para que ficar
prolongando se vou morrer de qualquer jeito?”,
pensava. Mas com o que havia aprendido nos
EUA resolvi me tratar. Passei um mês internada, um ano fazendo tratamento para TB e
comecei a tomar o AZT, embora todos acreditassem que uma pessoa com AIDS vivesse no
máximo 10 anos e eu já tinha o vírus há seis.
Durante esse longo tratamento surgiu a idéia
de escrever um livro. Eu era de uma família
de classe média alta, com muito acesso à
informação e queria dividir minha experiência.
Passei três anos escrevendo e em 1998 quando
resolvi publicá-lo, o medo de minha família era
que portas se fechassem ao assumir que tinha
o vírus. Vivíamos numa época em que pessoas
perdiam seus empregos e crianças eram expulsas da escola por terem o HIV. Mas resolvi
publicá-lo assim mesmo e a resposta foi muito
boa. A mídia também entendeu minha proposta, que era mostrar como vive uma pessoa com
a AIDS, que isso pode acontecer com qualquer
um, e não me colocar como vítima.
A entrada do meu livro nas escolas foi outra
coisa maravilhosa que aconteceu. Os professores não tinham material para trabalhar o
assunto, e o “Depois daquela viagem - diário
de bordo de uma jovem que aprendeu a viver
com AIDS”, com sua linguagem acessível, veio
preencher esse espaço. Com isso passei a ser
chamada para dar palestras por todo o país.
O livro foi traduzido em outras línguas, como
espanhol, alemão e italiano. E eu já estive
por duas vezes no México, dando palestras
em escolas que adotam o livro por lá. Nessa
oportunidade pude comparar e ver o quanto
rights. It made me believe that the issue was cultural, so if it had changed there, it could change
here too.
I came back to Brazil wanting to do something
to help, but I was sick. I got renal tuberculosis,
an opportunistic infection, because until that
time I had refused to take the medicine AZT.
“Why should I prolong it, if I will die anyway?”
I thought. But with all I had learned in the USA,
I decided to start treatment. I spent a month in
hospital, a year taking the treatment for tuberculosis and I started to take AZT, although everybody believed that someone with AIDS couldn’t
live any longer than 10 years, and I had already
had the virus for six.
During this long treatment, the idea of writing a
book came about. I came from an upper middle
class family, with a lot of access to information
and I wanted to share my experiences. I spent
three years writing it and in 1998, when I decided to publish it, my family’s fear was that doors
might close for me if I was open about having
the virus. We were living at a time when people
used to lose their jobs and children were kicked
out of school because they had HIV. But I decided
to publish it anyway and the response was very
good. The media also understood my purpose,
which was to show how someone with HIV lives
and that it can happen to anyone, and not to
make myself a victim.
The use of my book in schools was another wonderful thing that happened. The teachers didn’t
have any material to develop the subject, and
so “After that trip – the travel diary of a girl who
learned to live with AIDS”, with its accessible language, came to fill that space. After this I started
being invited give lectures all over the country.
The book was translated into other languages,
like Spanish, German and Italian. I’ve been to
Mexico twice, giving lectures in schools that decided to have the book. With that opportunity I
could compare and see how much we have advanced in Brazil with relation to AIDS. Currently
we have one of the best treatment programs for
avançamos no Brasil em relação à AIDS.
Atualmente temos um dos melhores programas de tratamento da doença no mundo. Pois
o governo brasileiro distribui o coquetel de
graça a qualquer um que precise. E isso ainda
não ocorre na maioria dos países.
Quanto a minha vida pessoal, cresci ouvindo que ia morrer logo, o que tornava quase
impossível fazer planos para longo prazo. Mas
a história mudou com a chegada do coquetel
em 1997 e acabei realizando muita coisa. Só
para citar um exemplo, eu que havia abandonado uma faculdade aos 20 anos por achar que
não daria tempo de terminar, voltei a estudar
aos 33 anos e aos 37 concluí a faculdade de
jornalismo. Trabalhei como repórter para a
Agência de Notícias da AIDS e fiz free-lance
para diversas revistas. Atualmente curso pósgraduação em Criação Literária e faço o Blog:
http://valeriapiassapolizzi.blogspot.com/.
Nesses anos tive ainda uma coluna numa
revista de adolescentes e publiquei mais dois
livros de crônicas, “Papo de Garota” e “Enquanto estamos crescendo”. Casei com um
austríaco soronegativo, morei por três anos na
Áustria, aprendi alemão, e viajei pelo mundo.
Nos separamos, mas continuamos amigos e
ele sem o HIV. E meu livro, o “Depois daquela
viagem...” até hoje é adotado em diversas
escolas e já vendeu, no Brasil, mais de 300
mil exemplares e agora segue informando a
América Latina traduzido com o título “¿Por
qué a mi?.
the disease in the world. Because the Brazilian
government provides the drug cocktail for free
to anyone who needs it, which doesn’t happen in
most countries.
Regarding my personal life, I grew up hearing
that I was going to die soon, which made it almost impossible for me to make any long term
plans. But this changed with arrival of the drug
cocktail in 1997 and I ended up achieving many
things. Just one example: I had left college at 20
because I thought there wasn’t enough time to
finish but I went back to study when I was 33 and
I finished journalism college at 37. I have worked
as a reporter for the AIDS News Agency and as
a freelance journalist for many magazines. I’m
currently studying for a post-graduate degree in
creative writing and I have a blog: http://valeriapiassapolizzi.blogspot.com/.
Over the years I also had a column in a teen magazine and I published two more books of chronicles: “Girl’s Chat” and “While we are growing
up”. I married an Austrian who is HIV-, I lived
for three years in Austria, learned German, and
traveled the world. We broke up but we’re still
friends and he doesn’t have HIV. My book, “After
that trip...” is still used in many schools and in
Brazil it has sold more than 300 thousand copies. It now keeps Latin America informed with the
title translated into Spanish as “¿Por qué a mi?”.
52
O LIVRO DA VIDA - PREVENÇÃO
HIV no
Brasil
Estima-se que 600 mil pessoas
no Brasil vivam com o HIV
ou já tenham desenvolvido a
aids. O HIV entra no organismo
humano e pode ficar incubado
por muitos anos sem que o
indivíduo apresente nenhum
sintoma ou sinal de doença.
Esse período é variável para
cada indivíduo e pode ser de
3 anos ou até por mais de 10.
O que é AIDS?
A aids é a sigla em inglês da síndrome da imunodeficiência adquirida. É causada pelo
HIV, vírus que ataca as células de defesa do nosso corpo. Com o sistema imunológico
comprometido, o organismo fica mais vulnerável a diversas doenças, como um simples
resfriado ou infecções mais graves como tuberculose e câncer. O próprio tratamento
dessas doenças, chamadas oportunistas, fica prejudicado.
Mas, atenção! A aids é o estágio mais avançado da infecção pelo HIV. Uma pessoa pode
passar muitos anos com o vírus sem apresentar sintomas. A duração desse período
depende da saúde e dos cuidados do soropositivo com o corpo e alimentação.
Quanto mais cedo a infecção for descoberta, melhor. Portanto, faça o teste sempre que se
expor ao HIV. Saiba onde fazer. Há alguns anos, receber o diagnóstico de aids era quase
uma sentença de morte. Atualmente, porém, a aids pode ser considerada uma doença de
perfil crônico. Isto significa que é uma doença que não tem cura, mas tem tratamento
e uma pessoa infectada pelo HIV pode viver com o vírus por um longo período.
Isso tem sido possível graças aos avanços tecnológicos e às pesquisas, que propiciam o
desenvolvimento de medicamentos cada vez mais eficazes. Deve-se, também, à experiência
obtida ao longo dos anos por profissionais de saúde. Todos estes fatores possibilitam aos
portadores do vírus ter uma sobrevida cada vez maior e de melhor qualidade.
É muito importante que as pessoas que passaram por uma situação de risco façam
o teste. Entre essas situações, estão: relação sexual com parceiros eventuais sem
o uso de preservativos; compartilhamento de seringas e agulhas, principalmente
no uso de drogas injetáveis; transfusão de sangue; acidentes ocupacionais com
objetos perfuro-cortantes que contenham material biológico de origem humana
e presença de sangue ou fluidos contaminados pelo HIV; filho nascido de mãe
portadora do HIV - quando não foi feita a prevenção de transmissão para
o bebê - ou que tenha sido amamentado.
No caso das gestantes, recomenda-se a realização do teste anti-HIV durante
o pré-natal. Caso o resultado seja positivo, o atendimento pelo serviço de saúde
é imprescindível para evitar a transmissão do HIV para o bebê durante a gestação
ou a amamentação.
O comparecimento periódico de uma pessoa portadora do HIV ao serviço de saúde,
para os exames de rotina solicitados pelo médico, possibilita precisar sobre o início
do tratamento com os antirretrovirais ou sua eventual modificação.
Qual é o tempo de sobrevida
de um indivíduo portador de HIV?
Até o começo da década de 90, a aids era considerada uma doença que levava à morte
em um prazo relativamente curto. Porém, com o surgimento do coquetel (combinação
de medicamentos responsáveis pelo atual tratamento de pacientes com HIV) as pessoas
infectadas passaram a viver mais. Esse coquetel é capaz de manter a carga viral do sangue
baixa, o que diminui os danos causados pelo HIV no organismo e aumenta o tempo de
vida da pessoa infectada.
O tempo de sobrevida (ou seja, os anos de vida pós-infecção) é indefinido e varia de indivíduo
para indivíduo. Por exemplo, algumas pessoas começaram a usar o coquetel em meados dos
anos noventa e ainda hoje gozam de boa saúde. Outras apresentam complicações mais cedo
e têm reações adversas aos medicamentos. Há, ainda, casos de pessoas que, mesmo com
os remédios, têm infecções oportunistas (infecções que se instalam, aproveitando-se de
um momento de fragilidade do sistema de defesa do corpo, o sistema imunológico).
54
O LIVRO DA VIDA - PREVENÇÃO
Quanto tempo o HIV
sobrevive em ambiente
externo?
O vírus da aids é bastante sensível ao meio externo. Estima-se que ele possa
viver em torno de uma hora fora do organismo humano. Graças a uma variedade
de agentes físicos (calor, por exemplo) e químicos (água sanitária, glutaraldeído,
álcool, água oxigenada) pode tornar-se inativo rapidamente.
Atualmente,
ainda há a
distinção entre
grupo de risco
e grupo de não
risco?
Essa distinção não existe mais. No começo
da epidemia, pelo fato da aids atingir,
principalmente, os homens homossexuais, os
usuários de drogas injetáveis e os hemofílicos,
eles eram, à época, considerados grupos de
risco. Atualmente, fala-se em comportamento
de risco e não mais em grupo de risco, pois
o vírus passou a se espalhar de forma geral,
não mais se concentrando apenas nesses
grupos específicos. Por exemplo, o número
de heterossexuais infectados por HIV tem
aumentado proporcionalmente com a
epidemia nos últimos anos, principalmente
entre mulheres.
O que se considera um
comportamento de risco,
que possa vir a ocasionar
uma infecção pelo vírus
da AIDS (HIV)?
Relação sexual (homo ou heterossexual) com pessoa infectada, sem o uso
de preservativos; compartilhamento de seringas e agulhas, principalmente,
no uso de drogas injetáveis; transfusão de sangue contaminado pelo HIV;
reutilização de objetos perfuro-cortantes com presença de sangue ou
fluidos contaminados pelo HIV.
56
O LIVRO DA VIDA - PREVENÇÃO
Numa relação sexual
desprotegida com um indivíduo
soropositivo é possível que o
parceiro não seja infectado?
Qual o risco de contágio
com aparelhos cortantes
como aparelhos de barbear,
brincos, alicates e piercings?
Em uma relação sexual com parceiro soropositivo sem proteção, nem sempre há
transmissão do vírus. Entretanto, como essa possibilidade é alta, recomenda-se
o uso do preservativo em todas as relações sexuais, para se evitar a probabilidade
de contrair o vírus ou outras doenças sexualmente transmissíveis. Em caso de
exposição à situação de risco, após três meses, deve-se fazer o teste anti-HIV
para a dúvida ser esclarecida. Toda relação sem preservativo é arriscada, mas
os riscos aumentam com relação anal receptiva, durante o período menstrual
ou com a presença de outra doença sexualmente transmissível.
Atualmente, a maioria dos aparelhos perfuro-cortantes fabricados, como seringas,
máquinas de tatuar, aparelhos para colocar brincos ou piercings, são feitos com
materiais descartáveis, que não podem ser usados mais de uma vez. Em caso
de dúvida, sugerimos perguntar no local sobre os materiais utilizados. O risco
de contaminação no contato do sangue com a pele e mucosa oral é menor do
que a exposição percutânea (injeção), porque há maior quantidade de células-alvo
suscetíveis à infecção pelo HIV na corrente sanguínea. Além disso, na pele e na
mucosa oral existem barreiras imunológicas e não-imunológicas que conferem um
determinado grau de proteção, uma vez que estes lugares estão em permanente
contato com o meio externo e com microorganismos.
O vírus parece penetrar mais facilmente através da pele do ânus e do reto do
que pela pele genital. Esse fato pode ser explicado por uma maior fragilidade do
tecido, que, por esse motivo, está mais sujeito a traumas que facilitam a infecção.
Em relações vaginais, as mulheres são mais susceptíveis do que os homens, pois
a concentração do vírus é maior no esperma do que na secreção vaginal.
Mesmo com a ausência
de ejaculação durante o
ato sexual é possível ser
infectado pelo HIV?
Apesar do vírus estar mais presente no esperma, essa não é a única forma do vírus
ser transmitido em uma relação sexual. Há, também, a possibilidade de infecção
pela secreção expelida antes da ejaculação ou pela secreção da vagina, por
exemplo. Os fatores que aumentam o risco de transmissão do HIV, nesses casos,
são: imunodeficiência avançada, relação anal receptiva, relação sexual durante
a menstruação e presença de outras doenças sexualmente transmissíveis como
cancro mole, sífilis e herpes genital.
O beijo, no caso de um
dos parceiros ter feridas
ou fissuras na boca, é
uma via de contágio?
Segundo estudos, não há evidências de transmissão do HIV
pelo beijo. Para que houvesse possibilidade de transmissão,
seria necessário que houvesse uma lesão grave de gengiva
e sangramento na boca. O HIV pode ser encontrado na saliva,
porém as substâncias encontradas na saliva são capazes de
neutralizá-lo. Práticas como beijar na boca, fumar o mesmo
cigarro, tomar água no mesmo copo, não oferecem riscos.
58
O LIVRO DA VIDA - PREVENÇÃO
A prática do sexo oral
sem proteção implica risco
de infecção pelo HIV?
A prática da
masturbação
com parceiro
eventual implica
risco de contágio
pelo HIV?
Se comparado a outras formas de contágio (sexo vaginal, sexo anal e compartilhamento de seringas, por exemplo), o risco relacionado ao sexo oral é baixo. Contudo,
oferece riscos maiores para quem pratica (ou seja, o parceiro ativo), dependendo
fundamentalmente da carga viral (quantidade do vírus no sangue) do indivíduo
infectado e se há presença de ferimentos na boca de quem pratica (gengivites,
aftas, machucados causados pela escova de dente). Caso não haja nenhum
ferimento na boca, o risco de contágio é menor. Isto se explica, talvez, pela acidez
do estômago, que pode tornar o vírus inativo, quando deglutido. No entanto,
na prática de sexo oral desprotegido, há o risco de se contrair herpes, uretrite,
hepatite B, ou HPV, independente da sorologia do parceiro.
A existência
de ferimentos
e machucados
nos genitais
aumenta o risco
de contágio?
Sim. Feridas nos órgãos genitais aumentam o risco
de transmissão do HIV, pois facilitam o contato do
sangue com secreções, que têm risco muito alto
de infecção. Geralmente essas feridas, assim como
corrimentos, bolhas e verrugas, são resultado de
alguma DST. O uso de preservativos em todas as
relações sexuais é o método mais eficaz para
reduzir o risco de transmissão tanto das DST
quanto do vírus da aids.
Não havendo troca de sangue, sêmen ou
secreção, a prática da masturbação a dois não
implica qualquer risco de infecção pelo HIV.
Uso da camisinha
Diversos estudos confirmam a eficiência do
preservativo na prevenção da aids e de outras
doenças sexualmente transmissíveis. Em um
estudo realizado recentemente na Universidade
de Wisconsin (EUA), demonstrou-se que o correto
e sistemático uso de preservativos em todas as
relações sexuais apresenta uma eficácia estimada
em 90-95% na prevenção da transmissão do HIV.
Os autores desse estudo sugerem uma relação
linear entre a freqüência do uso de preservativos
e a redução do risco de transmissão, ou seja,
quanto mais se usa a camisinha menor
é o risco de contrair o HIV.
60
O LIVRO DA VIDA - PREVENÇÃO
A camisinha é mesmo
impermeável?
A impermeabilidade é um dos fatores que mais preocupam as pessoas. Em um
estudo feito nos National Institutes of Health dos Estados Unidos, ampliou-se
o látex do preservativo (utilizando-se de microscópio eletrônico), esticando-o em 2
mil vezes e não foi encontrado nenhum poro. Outro estudo examinou as 40 marcas
de preservativos mais utilizadas em todo o mundo, ampliando 30 mil vezes (nível
de ampliação que possibilita a visão do HIV) e nenhum exemplar apresentou poros.
Em outro estudo mais antigo de 1992, que usou microesferas semelhantes ao HIV
em concentração 100 vezes maior que a quantidade encontrada no sêmen, os
resultados demonstraram que, mesmo nos casos em que a resistência dos
preservativos mostrou-se menor, os vazamentos foram inferiores a 0,01% do volume
total. O estudo concluiu que, mesmo nos piores casos, os preservativos oferecem
10 mil vezes mais proteção contra o vírus da aids do que a sua não utilização.
E por que
às vezes estoura?
Quanto à possibilidade do preservativo estourar durante o ato sexual, as pesquisas
sustentam que os rompimentos se devem muito mais ao uso incorreto do preservativo, do que a uma falha estrutural do produto. Nos Estados Unidos, um estudo
realizado em 1989 indicou que a taxa de rompimento da camisinha era inferior a
1%. Porém, em 1994, foi conduzido um importante estudo multicêntrico sobre essa
possibilidade em 8 países (República Dominicana, México, Estados Unidos, Gana,
Quênia, Malawi, Nepal e Sri Lanka), encontrando-se, então, uma taxa de rompimento
que variou entre 0,6% (no Sri Lanka) a 13,3% (em Gana).
O dado mais convincente sobre a eficiência do preservativo na prevenção contra
o HIV foi demonstrado por um estudo realizado entre casais, onde um dos parceiros
estava infectado pelo HIV e o outro não. O estudo mostrou que, com o uso consistente dos preservativos, a taxa de infecção pelo HIV nos parceiros não infectados
foi menor que 1% ao ano.
Diante dos resultados desses estudos, realizados por instituições renomadas
e de credibilidade, pode-se dizer que o correto e freqüente uso do preservativo
contribui de forma eficaz tanto para a prevenção de enfermidades quanto para
evitar a ocorrência de gravidez não planejada.
Que cuidados devem
ser tomados para garantir
que a camisinha masculina
seja usada corretamente?
Abrir a embalagem com cuidado - nunca com os dentes ou outros objetos que
possam danificá-la. Colocar a camisinha somente quando o pênis estiver ereto.
Apertar a ponta da camisinha para retirar todo o ar e depois desenrolar a camisinha
até a base do pênis. Se for preciso usar lubrificantes, usar somente os à base de
água, evitando vaselina e outros lubrificantes à base de óleo. Após a ejaculação,
retirar a camisinha com o pênis ainda ereto, fechando com a mão a abertura para
evitar que o esperma vaze de dentro da camisinha, e dar um nó no meio da
camisinha para depois jogá-la no lixo. Nunca usar a camisinha mais de uma vez.
Além desses cuidados, também é preciso certificar-se de que o produto contenha
a identificação completa do fabricante ou do importador. Observe as informações
sobre o número do lote, a data de validade e verifique se a embalagem do
preservativo traz o símbolo de certificação do INMETRO - Instituto Nacional
de Metrologia, cuja finalidade é atestar a qualidade do produto. Não utilize
preservativos que estão há muito tempo guardados em locais abafados, como
bolsos de calça, carteiras ou porta-luvas de carro, pois ficam mais sujeitos
ao rompimento. Utilize somente um preservativo por vez, já que preservativos
sobrepostos podem se romper com o atrito.
62
O LIVRO DA VIDA - PREVENÇÃO
Quando a camisinha estoura,
que atitude deve ser tomada?
Sabe-se que a transmissão sexual do HIV está relacionada ao contato da mucosa
do pênis com as secreções sexuais e o risco varia de acordo com diversos fatores,
incluindo o tempo de exposição, a quantidade de secreção, a carga viral do(a)
parceiro(a) infectado(a), a presença de outra doença sexualmente transmissível,
entre outros. Sabendo disso, se a camisinha se rompe durante o ato sexual e há
alguma possibilidade de infecção, ainda que pequena (como, por exemplo, parceiro
de sorologia desconhecida), deve-se fazer o teste após 90 dias para que a dúvida
seja esclarecida.
A ruptura da camisinha implica risco real de contágio do virus HIV. Independente
do sexo do parceiro, o certo é interromper a relação, realizar uma higienização
e iniciar o ato sexual novamente com um novo preservativo. A higiene dos genitais
deve ser feita da forma habitual (água e sabão), sendo desnecessário o uso
de substâncias químicas, que podem inclusive ferir pele e mucosas, aumentando
o risco de contágio pela quebra de barreiras naturais de proteção ao vírus. A lesão
de mucosas genitais pode implicar um risco adicional, pois, caso signifique presença
de uma doença sexualmente transmissível, como a gonorréia, o risco de transmissão
da aids aumenta. Na relação anal, mesmo quando heterossexual, o risco é maior,
pois a mucosa anal é mais frágil do que a vaginal.
Qual o procedimento
adequado para uma
grávida HIV positivo?
Iniciar o pré-natal tão logo se perceba gestante; usar terapia
antirretroviral segundo as orientações de seu médico, do
serviço de referência para pessoas que convivem com o HIV/
aids; realizar os exames para avaliação de sua imunidade
(exame de CD4) e da quantidade de vírus (carga viral) em
circulação em seu organismo; ser submetida ao tipo de parto
segundo as recomendações do Ministério da Saúde; receber
o inibidor de lactação e receber a fórmula infantil para sua
criança (para mais informações ver item Pré-Natal).
Testes para o diagnóstico
da infecção pelo HIV
O diagnóstico da infecção pelo HIV é feito por
meio de testes, realizados a partir da coleta de
uma amostra de sangue.
Esses testes podem ser realizados nos laboratórios
de saúde pública, por meio do atendimento do
usuário nas unidades básicas de saúde, em
Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA)
e em laboratórios particulares. Nos CTA, o teste
anti-HIV pode ser feito de forma anônima e gratuita.
Nesses Centros, além da coleta e da execução dos
testes, há um processo de aconselhamento, antes
e depois do teste, feito de forma cuidadosa, a fim
de facilitar a correta interpretação do resultado
pelo paciente.
Todos os testes devem ser realizados de acordo
com a norma definida pelo Ministério da Saúde
e com produtos registrados na Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (ANVISA/MS) e por ela
controlados.
64
O LIVRO DA VIDA - PREVENÇÃO
Onde fazer?
RIO DE JANEIRO
CTA - Rocha Maia no Rio de Janeiro
Hospital Municipal Rocha Maia
Rua General Severiano, 91
CEP 22.290-901 - Botafogo
Rio de Janeiro - RJ
tel: (21) 2295 2095 fax: (21) 2295 2295
CTA - Gaffre Guinle do Rio de Janeiro
Hospital Universitário Gaffrée Guinle
Rua Maris e Barros, 775
CEP 20.270-004 - Tijuca
Rio de Janeiro - RJ
tel: (21) 2568 4244 fax: (21) 2264 4118
CTA - Madureira / Unidade Integrada
de Saúde Herculano Pinheiro
Av Ministro Edgar Romero, 276 B
CEP 21360-200 - Madureira
Rio de Janeiro - RJ
tel: (21) 3390 0180 ramal 235
fax: (21) 3350 9211
SÃO PAULO
CTA/SAE Herbert de Souza “Betinho”
Av. Arquiteto Vilanova Artigas, 515 cj.
Teotônio Vilela - CEP 03928-240 Sapopemba - São Paulo - SP
tel: (11) 6704 3341 fax: (11) 6704 0833
CTA/SAE Dr. Alexandre Kalil Yazbeck
Av. Cecí, 2235 - CEP 04065-004
Planalto Paulista - São Paulo - SP
tel: (11) 5581 2828 fax: (11) 2577 9143
CTA/SAE Paulo César Bonfim (Lapa)
R. Tomé de Souza; 30 - CEP 05079-000
Lapa - São Paulo - SP
tel: (11) 3832 8618 fax: (11) 3832 2386
SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
CTA de São José do Rio Preto
Centro Municipal de Controle
e Prevenção às DST/HIV/Aids
Rua Ipiranga , 291
CEP 15025-520 - Vila Esplanada
São José do Rio Preto - SP
tel: (17) 3231 9939
SANTO ANDRÉ
CTA - Parque Andreense em Santo André /
Unidade de Saúde Parque Andreense
Avenida Ibertioga s/n - CEP 09160-210
Parque Andreense - Santo André - SP
tel: (11) 4439 6572 fax: (11) 4439 9022
SANTOS
CTA de Santos Seção de Prev. e Controle
de Aids - SEAIDS / Coord. Mun. de DST/
Aids/Hepatites Virais
Av. Senador Pinheiro Machado, 580
1º andar - CEP 011075-000 - Marapé Santos - SP
tel: (13) 3251 4411 fax: (13) 3251 6030
SÃO BERNARDO DO CAMPO
CTA/COAS Volante Alvarenga
UBS Alvarenga
Estrada dos Alvarengas 1199
CEP 09850-550 - Assunção
São Bernardo do Campo - SP
tel: (11) 4109 3928
OSASCO
CTA de Osasco Policlínica da Zona Norte
Avenida Getúlio Vargas, 889
CEP 06.230-970 - Jardim Piratininga
Osasco - SP
tel: (11) 2183 8600 R.149
fax: (11) 3686 4000
BELO HORIZONTE
CTA - Hospital Eduardo de Menezes /
FHEMIG
Avenida Dr. Cristiano Rezende, 2213
CEP 30622-020 - Belo Horizonte - MG
tel: (31) 3383 8000 r. 160 e 154
CTA - Belo Horizonte PAM
Sagrada Família
Rua Joaquim Felício, 141
CEP 31030-160 - Sagrada Família
Belo Horizonte - MG
tel: (31) 3277 5757 fax: (31) 3277 5742
Assessoria Jurídica do Ministério
da Saúde: O Departamento de DST,
Aids e Hepatites Virais tem apoiado
organizações da sociedade civil para
atuar na defesa dos direitos das
pessoas que vivem com HIV/aids e
das populações vulneráveis no país,
destinando para isso recursos financeiros específicos. Essas instituições
recebem denúncias, assessoram
vítimas de discriminação e preconceito, fornecem informações sobre
legislação e aids, além de garantirem
o devido acompanhamento das ações
judiciais, quando necessário.
PROGRAMA NACIONAL DE DST E AIDS
www.aids.gov.br
O atendimento nas assessorias jurídicas, apoiadas pelo Departamento de
DST, Aids e Hepatites Virais, é gratuito. Para se informar melhor sobre seus
direitos, você também pode procurar
os Núcleos de Prática Jurídica das
Faculdades de Direito, OAB, Defensoria Pública, serviços como Balcões
de Direito e Centros de Referência em
Direitos Humanos, dentre outros.
SISTEMA DE MONITORAMENTO
E AVALIAÇÃO DE VIOLAÇÕES DE DIREITOS
HUMANOS EM HIV/AIDS
http://sistemas.aids.gov.br/denuncia/
Em caso de denúncia, é importante
ter testemunhas e/ou documentos que
comprovem a situação. O quanto mais
cedo você denunciar, mais condições
os órgãos terão de apurar o caso.
VOCÊ PODE PROCURAR POR UMA CTA NO
SEU MUNICÍPIONO LINK DO MINISTÉRIO
DA SAÚDE: www.aids.gov.br , OU MESMO
PROCURAR UM POSTO DE SAÚDE.
ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVÍL
www.abcdaids.com.br
www.aegis.com
www.atdn.org
www.aids.org
www.forumaidssp.org.br
www.apta.org.br
www.gada.org.br
www.grupososvida.org.br
www.giv.org.br
www.imediata.com
www.projetoreviver.org.br
www.gapabahia.org.br
www.ufpa.br
www.gaparp.org.br
www.pelavidda.org.br
www.ecos.org.br
Idealização e Edição
Sharon Battat
Conteudo e Edição
Adrian Pimblott
Keith Haring Foundation
Sharon Battat
Iuri Frigoletto
Tradução
Alex Bonini e Adrian Pimblott
Revisão de Textos
Mariana Reis
Agradecimentos
Julia Gruen, Annelise Ream, Julie Joseph, Elen Woods,
Teresinha Pinto (APTA), Veriano Terto Jr. (ABIA),
Ricardo Salles Mölnar (ABIA), Roseli Tardelli (Agência
AIDS), Adriano Ferreira, Pharrá Buarque, Sarah Fidler,
Bryan Andrew Deresti, Pedro Meyer, Kate Thomson,
Polly Clayden, Michael Brady, Thiago Lucas, Garry
Brough, Mateus Furlanetto, Patricia Santanna, João Luis
Freitas de Almeida, Erika Martins, Rafael Todeschini,
Zmira Battat, Stan Battat, e a todos os amigos que
contribuíram e acreditaram na realização desta
primeira edição do “Livro da Vida”.
Produção Gráfica
Sidnei Balbino
Impressão
Makrocolor
Direção de Comunicação
Robson Bento Outeiro
Projeto Gráfico e Editoração
Oblíquo / desenho & linguagem
REALIZAÇÃO:
Toda a obra de Haring e fotografias em Polaroid
©Keith Haring Foundation. Utilização sob permissão.
All Haring artwork and Polaroid photographs
©Keith Haring Foundation. Used by permission.
Qualquer reprodução deste livro está proibida sem
o consentimento prévio por escrito da Litmedia
Productions e Keith Haring Foundation. Este livro
não pode ser comercializado.
© Any reproduction in whole or in part of this book
is prohibited without prior written consent from
Litmedia Productions and The Keith Haring
Foundation. This book is not to be sold.
A tiragem é de 30.000 exemplares.
Edition of 30.000.
PATROCÍNIO
APOIO

Documentos relacionados

Keith Haring para maiores e menores À Nina (e a todas as crianças)

Keith Haring para maiores e menores À Nina (e a todas as crianças) oficinas de arte específicas para crianças (com a participação de artistas amigos de Haring), além de palestras, vídeos e animações

Leia mais

Cinema Mostra Aids

Cinema Mostra Aids Neil Halloran, estudante de mídia digital na Universidade da Pensilvânia, dedicou-se ao documentário entre 2002 e 2004, depois de uma viagem de cinco meses à África. Seus heróis na batalha contra a...

Leia mais