edição de centenário do COL

Transcrição

edição de centenário do COL
[CardosOnline - 999 - Porto Alegre, domingo, 5 de outubro de 2008]
EDITORIAL
Mastigando gomas, relembrando velhas formigas e observando felinos
dormindo à distância, estalo a carcaça na sala ardendo silente na
madrugada quente que vive meu cotovelo este finalzito de setembro.
Uns quase vinte graus lá fora, a dobradiça do braço sofrendo no
esfregaço do abrigo: comprei na C&A. Um feixe muscular que se faísca
inteiro do peito à barriga do pé me dá a dica. Vario a posição dos
tornozelos descruzando as canetas. Faço assim troça e
(principalmente) muxoxo do universo. Driblo a gangrena com graça e
destemor. Pisco forte, lavo as orbes com vontade. A língua repousando
seca na bocarra; um odor de bunda emanando firme da cavidade (bucal).
Estou sentado há muito tempo na mesma posição.
Imerso no que ausculto no momento, vou cozinhando meus gametas pouco
abaixo do teclado: agora uso notebook. A transição, confesso, foi um
tanto quanto incômoda; aporrinhante, até. É bem mais difícil mudar
aos vinte-e-nove do que aos vinte-e-cinco ou quatro ou três. Por
outro lado, se aceita melhor o golpe. Por exemplo: eu, agora, como
saladas e as faço. Adquiri, atesto, alguma habilidade em ornamentar
as folhas todas com óleos, amêndoas e multi-molhos. Foi-se abaixo o
plano magno de cortar o lixo atômico da dieta só depois dos trinta.
Na metadinha do vintém, me vi num pife. Troquei o bife pela alface:
alegria. Uganda governando o intestinight.
Sem motivo, razão ou circunstância plausível, a este ponto da jornada
proponho-lhes a todos um exercício: polichinelos embaixo d'água. Me
basta um baço seco que me emburre, um adversário qualquer que eu
surre, uma prestação que me empurre até o final do mês. Não preciso
de mais muito depois que vim morar no trinta y três. Um dia bem frio
de céu azul no outono, velocidade e constância na conexão, os aromas
inesperados das segundas-feiras de manhã. O zumbido manso da TV
ligada e sem sinal me atrai. Pingo uma gota de leite para o amanhã
enquanto o lacrimejar dos canos se esvai. Banzai, wabi-sabi, adonai;
Costacurta, Valenzuela, Poucas Trancas, Czarnobai.
No braço de couro, uma cumbuca arcaica e papéis para variados usos
coexistem com a tecnologia e a vegetação local. As muitas promessas
ali contidas me prendem emudecido num macio moleza típico dos
píncaros de maio por bons momentos. Morosamente seleciono os itens,
os disponho sobre o peito e então estalo os dedos. A madrugada, já
muito acesa, ganha novo flamejar. Odor e nuvens de tempestade. O
prêambulo do lero de Jah-Jah. Ao longe, muito ao fundo, um alarme de
carro conspira contra a tranquilidade que desejo experimentar. Futuco
de leve a bigodeira sofrendo de estranhas saudades das rajadas
perturbando as noites da Medianeira. Faz tanto tempo que não me sinto
mais inseguro.
No espaço que sobra, me rio, bobo y contente. Sou bem feliz aqui e
agora, com os quadros todos nas paredes, as roupas apertadas nos
armários e a louça que não lavei molhada na pia. Logo ao lado ela
dorme pesado, os pés quentes na beirada da cama, meu coração sempre
em disparada. Cocejo a barba antevendo o próximo movimento: fricção
de dentifrício, um longo lastro de mijo e uma ou duas mãos em concha
cheias d'água estourando na cara. De cueca-e-meia no escuro do quarto
aplico, cheio de groove & malandramente, seis passinhos de dança.
Charleston-do-Norte reverse, um-dois-três: pára, junta os pés e gira,
já tombando sobre a cama. Engatinhante, tateio meu caminho até o
abraço fenomenal de fim-de-dia; boa noite, conterrâneos.
Boa noite.
(...)
Encaminhando-se para o fim deste começo, eis aqui um BILHETE com ares
de disclaimer, atenção e ACHTUNG. Pedimo-lhes a gentileza de o
conservarem consigo até o final da viagem, tendo sempre em mente do
que se trata.
A ele, portanto:
"Esta é a ÚLTIMA edição do CardosOnline. Para todo o sempre. Não
existe a MENOR possibilidade de cometermos uma barbaridade destas de
novo, por motivo algum, nunca mais. Portanto, não insista. Não nos
peça nada: saboreie este acepipe. Extravase esta pomada. Navegueie
nesta pipa. Contemple, amigo leitor, o juvenil garbo desta trupe. É
um belo dia, esta segunda-feira. E isso que ainda estamos no
domingo".
Obrigado.
--Cardoso
ALCE VENENOSO - O CANTOR DOS CORNO
--Cardoso
No cardápio de hoje: MASTIGANDO O COSMOS
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WELCOME TO BONAFIDE
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Madrugada de terça pra quarta, começo de setembro em Porto Alegre.
Adianto violentamente a redação dessa COLuna por saber que em breve
minha vida complicar-se-á AFU. Mas não por maus eflúvios, Silas:
bonança é o que vem depois da bonanza, depois da tempestade o mumu, o
néctar, o carinho da baunilha. Je vais bien. Ik ben fijn. Numa boa. A
onda boa do trabalho urgente do segundo semestre, uma tendência
costumeira no calendário estimado do JOHN SABLE (freelancer - essa
referência é só pra quem curtia Grim Jack e Badger) que sempre parece
que demora mais pra chegar a cada ano, mas sempre vem lambendo firme
a finaleira, engrossando o caldo na betoneira, salvando o jeans da
molecada.
Se adolescer parecia dureza, adultecer é ainda mais encarnado - mas
nem por isso menos divertido.
Aliás, HOLY FUCK I AM GONNA TURN THIRTY.
Mas só no ano que vem.
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Falando em ERAS, no fim do ano passado cumpri meu destino e
finalmente me mudei pro Bom Fim. Depois de uma década inteira de
devoção (nem sempre) silenciosa, passei a habitar o terceiro andar de
uma quase esquina numa ponta misteriosa do bairro, delicadamente
equilibrada entre o Centro e a Cidade Baixa. Não possuimos vista
senão das costas velhas de um outro prédio, mas ao menos conjugamos
os verbos na primeira pessoa do plural. Petite é meu primeiro amor
adulto: sou devoto desde a primeira vez que a vi, mas só fui roubarlhe o primeiro beijo - e emendar romance - dez anos depois.
Por ela já passei muito apuro, vivi muito desespero.
Hoje RESTO, sossegado: na minha vida tudo acontece na hora certa.
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Sobre o BAIRRO, em si: vendi o carro e passei a caminhar e usufruir
do sistema de transporte coletivo de Porto Alegre, que funciona
espantosamente melhor do que me lembrava; sorvo recorrentes cafés nos
estabelecimentos apropriados espalhados pelas muitas ruelas;
reencontro de dois a seis amigos de diferentes fases da vida toda vez
que saio de casa; nunca mais senti medo de ser assaltado ou
vilipendiado de qualquer forma, a contrário do mal que se abate sobre
as cabeças de 9 em cada 10 conterrâneos; o Xis-coração da Lancheria
não é mais o melhor da cidade (mas ainda assim como umas duas vezes
por mês); mercados e supermercados, feiras e padarias artesanais ao
alcance das pernas; uma dúzia de bons e meia de excelentes
restaurantes no mesmo raio; um parque inteiro para os dias de calor.
Sem falar que pelo menos uma vez por semana alguém me aborda na rua
falando HEBRAICO.
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I give chumps cranium lumps just like Louisville
I stand tall, just like the Catskill Mountains
Preyin' like a cougar ready to pounce and
denouncin', all the unrealistic fake gangsters
fake mystics; so let me make this specific
You're nowhere near as the original gifted
Rhymes get twisted, brain cells dissolve
As the world revolves, wack crews lick my balls
-Guru from Gangstarr
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twitter.com/vitorfasano: on
BUENOS AIRES: Manhã de compras na Calle Florida e Galerias Pacífico
após um saboroso desjejum de medialunas no rústico Hotel Avenida. O
charme do metrô antigo até Palermo Hollywood e depois cruzar a linha
do trem para se infiltrar nas vielas cosmopolitas de Palermo Soho
sorvendo um Freddo dulce de leche tentación. Lomo con papas premium
no Calden acompanhado por um saboroso vinho local. Fim de tarde
cultural no Malba e menu internacional no jantar com amigos em Puerto
Madero. Pra encerrar, churros con chocolate e tábua de frios no Café
Tortoni. Sobremesa? Un merengazo.
twitter.com/vitorfasano: off
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EMAIL DA SEMANA
---------- Forwarded message ---------From: 1894152 <[email protected]>
Date: Wed, Aug 27, 2008 at 10:32 PM
Subject: MARI BUCK
To: afpc <[email protected]>
POR QUE FAZEM ISSO
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MEMENTO MORI [para Daniel Pellizzari]
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Nos meus anos mais remotos, na Porto Alegre colonial que era a casa
da minha Vó Frida na década de 80, lembro de ser doutrinado para não
beber PONCHE na MATINÊ porque era muito comum que nele os rapazes
mais velhos pusessem maconha - o que, diga-se de passagem, não vem
exatamente ao caso neste FÓRUM.
Mas o que vem ao caso é que a mesma Vó Frida era quem rezava, de pés
juntos, que na época da guerra tinha de se esconder embaixo das
tábuas do piso de casa, junto com as irmãs, mãe e tias, toda vez que
por lá batia o exército brasileiro dos anos 30. Vieram, os Rozumek,
fugidos da GERMÃNIA e aqui o bicho pegava contra os imigrantes. Back
then sprachen deutsch era totally uncool, de modo que apenas o pai e
os tios recebiam os milicos, falando um português tosco mas pelo
menos funcional o suficiente para evitar prisão, surra e possível
morte.
Infelizmente, isso também não vem ao caso - ou pelo menos não neste
momento.
Fato é que era, ainda, a mesma Vó Frida quem defendia a teoria de que
grande parte do café solúvel comercializado no Brasil era então
composto por GALHO, FOLHA e BATATA DOCE. Ainda havia café na mistura,
é claro, mas apenas o suficiente para conferir o aroma e o gosto à
bebida.
No grosso MESMO, BATATA DOCE.
Nunca soube se isso era verdade.
Ou até soube, mas já esqueci.
Não sei.
Esqueci.
Nos gloriosos dias de aujourd'hui, quem passa por apuro semelhante é
a CERVEJA DE BRIGA.
Aquela que a gente compra no mercado.
São os próprios rótulos que decretam: a maior parcela da cerveja
consumida no país leva CEREAIS NÃO MALTADOS em sua composição - um
termo genérico que muitas vezes se refere ao GRÃO COMUM, como o arroz
e o milho, mas frequentemente também se aplica a manifestações
tuberculares menos sensatas, como o CHUCHU e (adivinha?) a BATATA
DOCE.
INTERLÚDIO/FACA DE DOIS GUMES: se por um lado pode ser bastante
reconfortante imaginar que, numa hora de aperto dá pra fazer cerveja
com praticamente QUALQUER vegetal que estiver disponível, por outro,
puta que pariu: é suco de BATATA. Nota mental [1]: tecnicamente, não
é um "suco". Nota mental [2]: se faz vodka de milho. E também de
batata.
Mas enfim, até aí, nada de mais.
Quer dizer, quem foi que disse que pra ser cerveja, não pode ter
arroz, milho, AÇAFRÃO, BACALHAU ou BAUXITA na receita?
Sério, alguém disse isso?
Aparentemente: SIM.
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Questão de uns dois anos atrás fiquei sabendo da existência de uma
tal Lei de Pureza da Cerveja, mais conhecida entre os punheteiros de
plantão como REINHEITSGEBOT.
Enquanto o texto original reza que
>
"Como a cerveja deve ser elaborada e vendida neste país, no verão e
no inverno: Decretamos, firmamos e estabelecemos, baseados no
Conselho Regional, que daqui em diante, no principado da Baviera,
tanto nos campos como nas cidades e feiras, de São Miguel até São
Jorge, uma caneca de 1 litro (1) ou uma cabeça (2) de cerveja sejam
vendidos por não mais que 1 Pfennig da moeda de Munique, e de São
Jorge até São Miguel a caneca de 1 litro por não mais que 2 Pfennig
da mesma moeda, e a cabeça por não mais que 3 Heller (3), sob as
penas da lei. Se alguém fabricar ou tiver cerveja diferente da
Märzen, não pode de forma alguma vende-la por preço superior a 1
Pfennig por caneca de 1 litro . Em especial, desejamos que daqui em
diante, em todas as nossas cidades, nas feiras, no campo, nenhuma
cerveja contenha outra coisa além de cevada, lúpulo e água. Quem,
conhecendo esta ordem, a transgredir e não respeitar, terá seu barril
de cerveja confiscado pela autoridade judicial competente, por
castigo e sem apelo, tantas vezes quantas acontecer. No entanto, se
um taberneiro comprar de um fabricante um, dois ou três baldes (4) de
cerveja para servir ao povo comum, a ele somente, e a mais ninguém,
será permitido e não proibido vender e servir a caneca de 1 litro ou
a cabeça de cerveja por 1 Heller a mais que o estabelecido
anteriormente.
Guilherme IV, duque da Baviera, no dia de São Jorge (23 de abril), no
ano de 1516, em Ingolstadt"
(Extraído do livro "O catecismo da Cerveja", de Conrad Seidl Editora Senac)
(1) A caneca da Baviera tinha na época 1,069 litros.
(2) Tigela em forma semicircular para líquidos, com pouco menos de
uma caneca de 1 litro.
(3) O Heller geralmente equivale a meio Pfennig
(4) Equivalente a 60 canecas de 1 litro.
<
é mais fácil dizer apenas que cerveja, pra ser chamada de cerveja,
deveria ser feita com:
(1) água;
(2) lúpulo;
(3) malte de cevada;
O (4) fermento entrou mais tarde na jogada, já que à época ainda não
se conheciam suas propriedades.
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Nos meus anos mais recentes, na Porto Alegre metropolar - ou
metropólica - que se tornou o meu círculo de amigos no século XXI,
eclodiu oportunamente uma cena inteira de cerveja artesanal. Feitas
em menor escala e com maior cuidado, utilizando apenas os quatro
mágicos elementos em sua fórmula, estes benditos ELIXIRES podem ser
facilmente encontrados nas prateleiras dos supermercados e nos
cardápios de boa parte dos bares da cidade.
E o melhor: há diversos representantes LOCAIS.
Eis algumas das BEBERAGENS nativas cujos CREMES já provei:
CORUJA - É uma das pioneiras do movimento. Tomei pela primeira vez
numa longíqua madrugada no Zelig, onde provavelmente começou a ser
vendida. Hoje existe em duas manifestações: Coruja Viva e Coruja
EXTRA Viva, e pode ser ordenada em praticamente tudo que é biboca de
nível universitário pra cima. Sabor assobiante, tendência à
peidorreira baixa, borbulhância moderada. Apesar de um pouco menos
FATAIS no contexto geral, por terem sido desde sempre muito decentes
pra caralho merecem quatro estrelinhas no overall: ****
ABADESSA - Garrafa mais bonita da história da cerveja, sabor
transtornável e configuração maestra [ns]. Pode ser tranquilamente
denominada de o ÁPICE da estética do ponto de vista do ENVASE, mas
isso não é tudo. A Abadessa detém qualidade suficiente para encantar
também o paladar. Disposta em muitas versões, embebi-me até então
apenas em Helles (logotipo azur) e Export (bordôzito). Graças ao
perfume de pão incomparável, é garantia completa de transportar o
bebedor a um FIORDE MENTAL IMEDIATO. Cinco SHURIKEN na testa; estrela
NINJA: *****
SCHMITT - Ainda que um tanto oscilante, esta cerveja é por demais
saborosa, sobretudo enquanto Ale. Na modalidade Barley Wine a
irregularidade é um pouco mais acentuada: volta-e-meia o cara tem a
impressão de que alguém virou um golão de PINGA na garrafa. Pudera:
são 8,5 graus de Gay-Lussac. Opípara flatulência e eructação
prolongada fazem parte do programa, que inclui também o mais
autêntico despertar de papilas gustativas que você vai experimentar
por algum tempo. Seis impossíveis estrelas estalando no firmamento:
******
ANNER - Mais ROOTS de todas, a Anner começou a ser feita em BANHEIRAS
e tem o histórico de batches mais inacreditável da história. Já teve
gosto de banana, mais de 20% de álcool e até andou EXPLODINDO, mas no
último ano encontrou seu FUTEBOL e desde então só vem dando alegria
pra torcida. Blonde e Bitter Ale profissas, Tripel COENTRO sublime e
MARIA DEGOLADA SPECIAL arrebentando a vala. Ainda não é
comercializada em praticamente NENHUM lugar, o que conserva um toque
de romantismo e (vamos admitir) AMADORISMO que deixam o quitute ainda
mais temperadito, levando pra conta nada menos que sete estrelas uma pra cada dia da semana - e um quarto de lua MINGUANTE: ******* )
GIBIER - Encontrada apenas no Gibi Bar e Bruschetteria, é uma das
mais novas opções do mercado. Encorpada e sabujenta, ferve firme na
glote cozinhando os temperos que adornam a especialidade da casa. Em
outras palavras, excelente acompanhamento para o frango ao curry com
berinjela da Ranxerox ou do shimeji com alho poró da Matiolli. Diz-se
que é uma versão mais robusta da igualmente novata Rock Bier, que por
sinal ainda não degustei. Somando rango e trago, o show vale cinco
estrelas - sendo uma delas cadente: ****/
Atenção: não confundir com "decadente":\
Melhor seria dizer "ascendente", mas acho que não existe estrela que
SAIA da Terra em direção ao COSMOS.
Pelo menos AINDA.
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Entre as cervejas locais que NÃO experimentei merece destaque supremo
a CANJIBRINA da Desiréé e do Heitor, uma verdadeira escola da
cervejaria gaúcha recente, responsável pela formação da Polla (que
hoje produz a Alice, Cerveja de Panela) e dos próprios Irmãos Caon,
os cozinheiros da Anner.
(...)
Finalizando a contenda, em caráter HORS CONCOURS vale ainda citar a
cremosidade morena da ERDINGER PIKANTUS, um genuíno JESUS NEGÃO DE
CRISTO liquefeito e temperado; e a BADEN BADEN RED ALE, caramelinho
venenoso de 9 graus e meio de estupefasciência que desce instaurando
a festa irrestrita nos CHAKRAS.
(...)
Tudo isso pra dizer: ABAIXO A BATATA-DOCE.
CERVEJA ARTESANAL OR DIE.
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FUMÂNTICOS - bom nome para um clube underground de degustadores de
cigarrilhas.
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DAILY MUGSHOT - Mantenha a sua webcam plugada e, todos os dias,
obtenha um instantâneo de suas fuças utilizando uma prática
ferramenta online. Ao longo do tempo, a coleção de fotos será
transformada em uma seqüência animada que pode ser facilmente
integrada a blogs e social networks ou aplicada diretamente no código
html, como é possível observar no exemplo a seguir:
http://www.qualquer.org/wat.
BÔNUS: esperta que só ela, a ferramenta fotográfica do site oferece
um utilíssimo sistema de marcadores, que operam milagres genitais,
facilitando HORRORES a continuidade do processo.
Por sinal, quase esqueci do endereço: http://www.dailymugshot.com/
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BREU BREU BREU
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RECIFE: O boi das crianças e os carangüeijos pescados na hora em
Itamaracá; o breakbeat comendo solto nas ladeiras, o amendoimafeijoado e o PAU DO ÍNDIO DO CARDOSO em Olinda; melhor coxinha do
mundo na Boa Viagem, o carnaval de rua do centro antigo, o Instituto
Brennand com aquela coleção absurda de armas brancas e medievalismos;
caldinho de sururu e agulha frita em Porto de Galinhas; Sinfonia
Marítima no castelinho secreto no coração da lendária favela Brasília
Teimosa.
<...>
BELÉM: Peixe com açaí e farinha de mandioca no Ver-o-Peso; Tacacá
debaixo da chuva das cinco horas no centrão quente; Pizza de jambu e
show de jazz no calor mais úmido do mundo na madrugada quente do Café
Imaginário; Unha de carangüeijo e os maiores camarões do mundo à
thermidor ou à paulista no Hotel Regente; pajelança em Ananindeua;
chopps de cupuaçu, café e cacau da Amazon Beer na Estação das Docas;
trago leve no Ver-o-Rio; techno-brega bombando 24/7 na RAYULAND.
<...>
Nas próximas edições: lembranças domésticas, geográficas, afetivas e
gastronômicas de Florianópolis, Curitiba, Rio de Janeiro, São Paulo,
Trancoso, Itacaré, Maceió, Aracaju, Ilhéus, Salvador, Arraial
D'ajuda, Garopaba, Pelotas, Paraty, Petrópolis, Belo Horizonte, Paris
e Amsterdam.
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PIRATÃO LOUCURA - bom título para fantasia de carnaval de rua (apud
Jackson Araújo)
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NINTENDO IS BACK - Depois de um longo período completamente rendido
aos encantos sonyferos, finalmente me vi liberto do vírus
estacionário no final de 2005 - ou começo de 2006 - quando adquiri um
Nintendo DS. Foi bem na época que estourou a crise dos aeroportos, e
como eu andava viajando com uma freqüência espantosa, acabava
perdendo grande parte do dia em salas de embarque e aeronaves
variadas. Pra piorar, toda a companhia digital de que eu dispunha
resumia-se a um mp3 player de 128 mega - uma das piores compras que
já fiz na vida.
Junto com o portátil, adquiri também um KIT PIRATEICHON que me
permite rechear um cartão microSD com cerca de 20 jogos diferentes.
Entre os preferidos estão sintetizadores musicais
("Electroplancton"), simuladores de cozinha ("Cooking Mama"),
bizarrice japonesa ("Rub Rabits"), simuladores de estratégia ("Age of
Empires" e "Advanced Wars"), treinadores mentais ("Brain Age" e "Big
Brain Academy") e mais bizarrice japonesa ("The World Ends With
You").
Em suma: NUNCA MAIS senti tédio num AEROPLANO e/ou pista de pouso,
quiçá sala de embarque.
BÔNUS: em abril desse ano, vendi meu lendário Escort Champagne e com
parte do dinheiro arrecadado comprei um Wii. Ainda torrei uns bons
dobrões no comércio local ao adquirir "Resident Evil: Umbrella
Chronicles" e "Pro Evolution Soccer 2008" pelo equivalente a 50% do
que paguei no console, mas em seguida aprendi o caminho das pedras no
eBay e arrendei "The Godfather", "Endless Ocean" e um controle extra
por uma quantia correspondente a 10% do que paguei na máquina. Outros
10% investi em "Sin and Punishment" (um shooter japa do N64
unreleased no ocidente), "Lost Winds" e num Opera (aka "Internet
Channel").
Veredito: Very bom; Great success.
Aproveito.
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DOGOMIN PAKULSKI - bom nome para um dos freqüentadores do clube
underground de degustadores de cigarrilhas, esloveno, de costeletas e
suspensórios.
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GAME ONLINE DA SEMANA: CUNT
http://www.komix-games.com/game.php?game=cunt
Combater as doenças venéreas espalhadas pela VULVA mais infecta da
história da BUCETOLOGIA já parece uma premissa revolucionária o
suficiente, mas se além disso ainda nos deparamos com uma
jogabilidade intuitiva e fluida e uma apresentação gráfica que dá de
RELHO em grande parte daquilo que se chama de ARTE hoje em dia, não
se pode fazer mais nada além de DESFRUTAR do paraíso.
REGOZIJE.
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MUITO MEDO:
http://hasthelargehadroncolliderdestroyedtheworldyet.com/
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AS ÚLTIMAS 10 COISAS QUE COMPREI
ou
"parafraseando o Vitrine"
1. duas baden baden red ale
2. mochila de surfista/skatista
3. HD externo de 250 GB
4. entrada no Gruta Azul
5. terno e gravata
6. víveres, mantimentos e vitualhas diversas no supermercado
7. bilhete de trem (só de ida)
8. passagem de avião (uma de ida; uma de volta)
9. um SMS de amor (celestial)
10. um centograma de maranguape destemido
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ADEO$: Para mais demência incontrolável em forma de texto, música,
desenho, vídeo, foto e etc. acesse www.qualquer.org e explore. Entre
outras coisas, você vai encontrar os arquivos do COL e da IRD, todas
as faixas dos Organizers e Evillips, camisetas do Josnel, agenda e
informações sobre a Pecha Kucha e mais de 1,5 mil textos selecionados
deste que vos fala.
Atualizações diárias (ou pelo menos semanais) em
www.qualquer.org/bugio.
Diversão pictórica? Volte para a home (www.qualquer.org), pressione
F5 pelo menos cinco vezes e tente resistir à tentação de perder mais
de HORA E MEIA na brincadeira.
Esteja avisado.
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TRILHA SONORA
Incidental:
Dois episódios quaisquer dos Simpsons
CARMEN: MTV'S HIP HOPERA (possivelmente o PIOR filme da história do
cinema)
TVCOM Esportes e Jornal da TVCOM
"Simplesmente Amor"
Musiquinha do Wii Menu
Proposital:
The Cardigans - Life
Cornelius - Fantasma
The Rub - Hip Hop History 1993
Radiohead - Ok Computer
The Chemical Brothers - Brother's Gonna Work it Out
Breakbeat Era - Ultraobscene
The Rub - Hip Hop History 1994
Elomar - Árias Sertânicas
Funkmaster Flex - 60 minutes of funk Vol. 01
Brian G - The Sound of Movement
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EXPERIMENTE
ETERNAMENTE O
EMPIRISMO
/\/\
o o
(oo)
KIDIDS!
--Cardoso
SEPULTURERO CHA CHA CHA
--Daniel Galera
[coluna anteriormente conhecida como
FARRAPOS, SEGUNDA À ESQUERDA]
[e também conhecida posteriormente como
EM MEMÓRIA DOS ORANGOTANGOS]
***
"Dónde está el sepulturero?
Muerto.
Quién está encargado del cementerio?
Dios.
Dónde está el sacerdote?
Se fué."
--Cormac McCarthy, 'A Travessia'
***
Pois é. O COL fez dez anos. Eu poderia escrever 300kb sobre o que
aconteceu na minha vida nesses dez anos, mas nah. Saí de Porto Alegre
e fui pra São Paulo, saí de São Paulo e agora escuto as ondas
quebrando nas pedras a cinco metros das janelas da minha casa. Livros
foram lançados e relançados. Livro novo chegando no fim de outubro:
"Cordilheira", romance, Companhia das Letras. Tenho sido feliz como
sempre, não vejo muita alternativa. De qualquer modo, tudo foi
obliterado quando conheci o Velho Branco. Silêncio, água, mulheres,
narrativas. Me avisem quando algo mais aparecer.
***
BIVÉR:
SELF-AWARENESS
+ SEPULTURERO
- NOOKIE
____________________
= SIGNIFICANT BULLET
***
O VELHO BRANCO
"Una cosa, hasta no ser toda, es ruido, y toda, es silencio"
-- Antonio Porchia, 'Voces'
Quero ser como o Velho Branco. Não sei quase nada sobre o Velho
Branco, mas o pouco que sei é tudo que é necessário saber para ter
certeza de que quero ser como ele. O Velho Branco não é muito velho.
Tem cinqüenta e dois ou cinqüenta e quatro anos. Sua barba e bigode
ainda volumosos e os cabelos parcialmente ceifados pela calvície são
brancos e lhe fazem aparentar uma idade maior do que a verdadeira.
Sei o nome dele, mas não vou contar. Ele tem origem alemã. Para mim
ele foi desde o primeiro momento o Velho Branco. É complicado
descrever o pouco que sei sobre o Velho Branco e por que esse pouco
me dá vontade de ser como ele. O Velho Branco nada na mesma academia
de natação em que nadei durante dois dos três anos que acabei de
passar em São Paulo. Na verdade, passei a interagir com o Velho
Branco só nos últimos seis ou sete meses de vida paulistana, até que
minha mudança voluntária para uma praia de Santa Catarina me afastou
da academia em questão. E acho que foi apenas no último ou nos dois
últimos desses seis ou sete meses que percebi com clareza tudo que o
Velho Branco significava e que é tão complicado de descrever.
Não sei o que o Velho Branco faz da vida, mas ele não é atleta
profissional. Como eu, ele apenas nada. Seu desempenho nas raias é
extraordinário para uma pessoa de cinqüenta e dois ou cinqüenta e
quatro anos que não é atleta profissional. O Velho Branco faz parte
de uma equipe que treina todos os dias ao meio-dia e meio na
supracitada academia. Essa equipe tem cerca de uma dúzia de pessoas e
é formada em sua maior parte por triatletas e pessoas com cerca de
trinta anos. Há um homem integrante da equipe que é ainda mais velho
que o Velho Branco - tem cinqüenta e seis anos - e atinge marcas
superiores nas séries de velocidade e também nas de resistência. Ou
seja, não estou querendo insinuar que admiro o Velho Branco por ele
ser um super-atleta ou algo do tipo - embora haja um quesito em que o
Velho Branco é simplesmente insuperável, o braço sem palmar. Ninguém
da equipe nada mais rápido que ele fazendo braço sem palmar,
modalidade de treino que consiste em colocar uma bóia entre as pernas
para imobilizá-las e ao mesmo tempo fornecer flutuação extra na parte
inferior do corpo, deixando toda a propulsão a encargo dos braços.
Mais do que força, o bom rendimento no braço sem palmar depende de
uma braçada bem desenhada e um bom "giro", ou seja, uma freqüência
elevada de movimentos. Fazer força é importante, mas não desperdiçar
força é o que realmente faz diferença no braço sem palmar. O Velho
Branco não desperdiça força.
Foi dividindo uma raia com o Velho Branco numa série de braço sem
palmar que senti pela primeira vez o império de sua presença. Essa
sensação teve início como uma banal manifestação de inveja e
admiração motivada pelo fato de que eu, cerca de vinte e cinco anos
mais jovem que o Velho Branco e praticante da natação desde os
catorze anos, descobri-me incapaz de ultrapassá-lo ou sequer
acompanhar seu ritmo numa série qualquer de braço sem palmar, por
mais que me esgoelasse e me peidasse em explosões de esforço tamanhas
que me acarretavam ânsia de vômito. Naquele dia passei a prestar
atenção no Velho Branco e ao longo das semanas recolhi evidências
diversas de sua esmagadora superioridade diante de todos os seres
humanos que já existiram, existem e virão a existir.
A primeira dessas evidências, talvez a mais importante de todas, foi
a descoberta do segredo por trás do milgaroso desempenho do Velho
Branco na técnica do braço sem palmar. Quando lhe perguntei como ele
conseguia ser tão bom no braço sem palmar, a resposta foi: "Porque eu
gosto de fazer braço sem palmar". Dificilmente vou conseguir explicar
a grandeza metafísica dessa resposta para quem não a identificou de
cara. Além disso, nesse texto não há como reproduzir a voz do Velho
Branco - o som de algo sólido tornado quebradiço em condições
inesperadas, como o estalo final do tronco de uma sequóia centenária
que está começando a tombar depois de ter sido absurdamente
seccionada na base por uma motosserra idiota -, tampouco a expressão
facial que ostentava ao me responder - a mesma expressão de
absolutamente todos os momentos em que o flagrei, olhos arregalados
numa face relaxada e quase inerte, a expressão de um ser totalmente à
vontade numa vida que sabe que jamais vai dominar - ou sua postura
geral naquele momento - aprumada e velha, parecendo conter o
potencial infinito dos gestos letais de uma arte marcial particular.
Posso dizer apenas que naquele instante me vieram à mente todas as
coisas de que gosto justamente porque sou bom nelas, e não o
contrário. Me senti pequeno e ignorante, mas um ser pequeno e
ignorante para o qual a salvação estava ao alcance.
Depois foram os banhos frios. Nas várias dezenas de ocasiões em que
tive oportunidade de testemunhar os procedimentos do Velho Branco no
vestiário masculino antes de iniciar um treino ou após o treino ele
tomou um banho gelado de vários minutos. O leitor deve resistir à
tentação de abrandar o que está sendo dito com uma interpretação
eufemística. Quero dizer com "banho gelado" que o Velho Branco gira
apenas o registro da água fria, até a potência máxima, e entra
embaixo da água fria ou gelada ou congelante - depende da estação do
ano - e fica ali embaixo por vários minutos. O Velho Branco não bufa.
Ele não geme. Ele fica em silêncio mesmo nos dias mais frios, sob a
água mais mortalmente congelante. Em algumas ocasiões, em pleno
inverno, eu o escutei cantarolar enquanto se esfregava sob a ducha
glacial, um canto capaz de vaporizar a alma de eventuais banhistas
presentes no vestiário. Saliente-se que o Velho Branco jamais chamou
a atenção de ninguém para esses banhos brutais, assim como nunca se
vangloriou de sua supremacia no braço sem palmar. Ele fica na dele,
mas é claro que outros freqüentadores do vestiário acabam notando.
Nos dias mais frios, o boxe do Velho Branco - os boxes da academia
não tinham porta e davam todos para um único corredor - irradiava uma
mortalha de frio paralisante que não tinha como passar despercebida.
Questionado, ele alegava que "gostava" dos banhos frios e que eles
"faziam bem". Todos sabiam que o Velho Branco tinha razão, mas poucos
se atreviam a tentar imitá-lo. Eu tentei uma vez. Tolero e até
aprecio banhos gelados no verão, mas no inverno eles são violentos
demais para mim. Testemunhei um dos maiores nadadores da equipe, um
sujeito jovem, alto e musculoso, experimentando a ducha fria do Velho
Branco no outono. Ele suportou mais ou menos um milionésimo de
segundo e recuou quase em prantos, completamente aniquilado.
Há diversos outros aspectos do comportamento do Velho Branco que
contribuem para sedimentar a força de sua presença. Ele quase não
fala. Quando fala, é sempre perfeitamente breve, direto e cordial.
Todo dia ele nada no mínimo três mil metros, invariavelmente. Se o
treino do dia não alcança essa distância total, ele permanece na
piscina sozinho e completa os três mil nadando braço sem palmar, não
importa quão destruidor tenha sido o treino. Várias vezes olhei para
trás antes de entrar no vestiário após um treino forte, me sentindo
desossado e desprovido de qualquer traço de energia vital, e vi o
Velho Branco deslizando numa raia da piscina vazia, bóia entre as
pernas, braços furando e empurrando a água para cumprir seus três mil
metros de praxe.
Tenho saudade do Velho Branco. Lembro dele com freqüência quando nado
no mar, quando sinto medo do mar apesar de ter optado por nadar nele
de novo, dia após dia. Ele é a encarnação de uma verdade muito
escorregadia. Seu silêncio, disciplina, elegância, humildade e total
ausência de vaidade são facetas de um tipo grandioso e muito raro de
resignação diante do destino. O Velho Branco lembra de tudo e antevê
tudo. Ele sabe que vai morrer e sabe que nem o entendimento mais
profundo da vida nos poupa de experimentá-la. Ele sabe que podemos
contemplar infinitos caminhos e escolhas alternativas para a vida que
nos acontece, mas que no fundo há apenas um caminho e que nossas
escolhas são inevitáveis e que essa visão permanente, latente, de
tudo que poderia ter sido ou poderá ser é nada mais do que uma
história que contamos para nós mesmos. Sabe que é possível
compreender a trama do tecido da vida, decifrar seus padrões até um
certo ponto, e sabe também que nossas reações ao desenrolar da trama
independem dessa compreensão. Sabe que podemos ser compassivos mesmo
sem agir. Sabe que ser virtuoso é fácil, difícil é lidar com as
conseqüências da virtude. Num mundo onde o Velho Branco existe não
pode haver vítimas. Suas braçadas de bóia e sem palmar nos dizem que
a probabilidade do que acontece é absoluta. Ao vê-lo nadando, você
saberá que ele sabe disso tudo e saberá que ele sabe de outras
coisas, coisas impossíveis de compartilhar, pois falta linguagem.
***
um oferecimento
PORCO SODOMITA
(
/u\ /u\
| 0 \/ o |
(OO)
)
____
TAIST DA BAY-CON
***
[A bandana jamais morrerá
ou
Compaixão é tudo, crianças]
"It was weird and irrational but all of a sudden I felt really
strongly as though the bus driver were really me. I really felt that
way. So I felt just like he must have felt, and it was awful. I
wasn't just sorry for him, I was sorry as him, or something like
that."
-- David Foster Wallace, 'The Planet Trillaphon As It Stands In
Relation to the Bad Thing'
***
Trilha sonora: Mogwai e gaivotas em chamas
Site deste que vos fala: ranchocarne.org
--Galera
A VERDADEIRA MAIONESE
--Marcelo Träsel
Consultado a respeito de sua COLaboração nesta edição de centenário
do Cardosonline, o COLunista Marcelo Träsel expressou a preferência
por se manter em silêncio na varanda de casa, esperando as hordas que
vêm destruir a cultura e a civilização com a espingarda calibre 12
herdada do avô e preparada para "proteger minha família, a tradição e
a propriedade". O antigo co-fundador da publicação acrescentou que
"teria mais prazer se vermes comessem as minhas bolas ainda em vida"
do que tendo um texto seu publicado novamente junto aos "daqueles
pederastas drogados filhinhos de papai". Assim, optamos por convidar
o eminente crítico prof. dr. Buarque para realizar uma análise de um
texto da obra de Marcelo Träsel no Cardosonline.
-- Os editores
AGORA ERA FATAL
Uma coisa é você andar por aí procurando nada e achar ouro. Antes de
voltar, eu sei, precisamos provar para nós mesmos o sentido de tudo.
E andar. O Cardosonline foi um veículo de suma importância no caldo
de cultura primordial da Internet brasileira e, quiçá, mundial. O
veículo de fato inaugurava em outubro de 1998 um novo formato, o ezine, mailzine ou fanzine em suporte eletrônico. Era um
caleidoscópio, um espelho quebrado de egotrips e opiniões motorizadas
pela testosterona juvenil - sim, temos conhecimento da presença de
uma colunista, ou como prefeririam os autores do dito periódico,
COLunistas, a hoje escritora e mãe Clarah Averbuck, que naquelas
priscas eras apresentava, outrossim, níveis muito mais altos de
masculinidade do que seus COLegas - que, no entanto, ganha foco sob o
prisma pós-moderno.
O COL engendrou imitadores na esteira de seus enfoques e desfoques,
uma miríade de e-zines ou mailzines que colonizaram as mentes dos
nerds pioneiros. Foi o blog avant la lettre. Foi o pai, a mãe e o
filho do umbiguismo cultural rampante uma década depois. Destarte o
interesse ora perseguido de analisar a escrita destes formadores de
opinião pubescentes. Selecionamos o primeiro texto do COLunista
Marcelo Träsel, tendo em conta a indiscutível importância histórica
do mesmo.
>DR. ZAPATA - O Nosso Bolchevique
No título escolhido para sua coluna o autor já apresenta o leitmotif
que balizará sua obra na maior parte dos três anos de duração do
Cardosonline. A vida se encaminha muitas vezes diluída nas questões
da modernidade. Os parâmetros se desfazem, é difícil encontrar um
norte. Questões antigas - democracia, soberania, liberdade, a
afirmação dos valores de um povo - ressurgem diante das nações como o
fizeram em outros tempos. A globalização a tudo confunde e exige
respostas a novos e a antigos desafios. Talvez nem tão novos. Talvez
os mesmos de sempre. A diferença fundamental é que a luta pela
liberdade já não ocorre de dorso nu e tanguinha. Nesse contexto
excruciante, um jovem universitário volta seus olhos famintos de
verdade e transcendência para o comunismo. Lênin. Trótski. Emiliano
Zapata. Subcomandante Marcos. Apela aos bolcheviques e aos
revolucionários mexicanos.
>Dis Uêi Uálcs de Iumeniti
Transformar-se ou transmutar-se? Mais que reles semântica, a
indagação está no cerne da nossa experiência mesma. No caso, o autor
cita o Angeli do magazine "Chiclete com Banana" para transmutar a
língua inglesa em seus mínimos múltiplos comuns fonéticos,
(re)significando e assim problematizando a questão do imperialismo
ianque.
>Domingo passado, como todo bom brasileiro, você também foi exercer sua
>cidadania, utilizando-se do sagrado direito ao voto que a constituição lhe
>garante. Até porque, se não aproveitasse tal direito, seria simplesmente banido
>de qualquer concurso público e impossibilitado de candidatar-se a qualquer
>cargo. Ou então, foi selecionado para colaborar com o processo democrático,
>chegando na zona (eleitoral, pessoal, eleitoral) às 8hs da matina e saindo só
>às 5hs da tarde, depois de passar o dia suando em bicas e dando à sua bunda um
>certo formato cúbico, característico de traseiros que ficam muito tempo
>sentados em cadeiras duras. Ou então, teve que agüentar a reclamação da galera
>por causa daquele velho que levou 5 minutos para votar na urna eletrônica. E,
>pior, esqueceu que o estado não fornece rango para os mesários e o babaca do
>presidente de mesa, que certamente vota no PRONA, não te deixou sair nem para
>comprar um lanchinho Dizzioli. Mas, tudo bem, nada como ser um cidadão que
>colabora com a democracia.
No microcosmo das relações familiares ou no macrocosmo das intrigas
políticas, o que se dá é o enfrentamento encarniçado da célula com o
organismo. A premissa original (e se eu me tornasse um mesário?) é
grávida de gêmeas múltiplas. E se o funcionário se tornasse patrão? O
lúmpen se tornasse aristocracia? E se o Outro se tornasse o Igual?
Não surpreende que Porto Alegre, palco de tantas revoluções
fracassadas, seja cenário desta fábula em que um filho da Fabico
manipula uma narrativa para atingir liberdade, igualdade e
fraternidade. Sem embargo, a imagem da cena eleitoral é a história de
todos que buscam. Logo, de todos que sonham. Logo, de todos nós.
>Mas, afinal, que tipo de direito é esse, que o cara é obrigado a exercer? Votar
>é direito ou dever? A julgar pelas penas impostas a quem não aproveita a chance
>de escolher seu candidato, certamente um dever. Em qualquer país decente,
>inclusive nos EUA, que nossos governantes tanto gostam de copiar, o voto é
>facultativo. Quem se interessa por política, sente-se um cidadão responsável,
>deposita seu voto na urna e ajuda a definir o futuro do país. Quem tá cagando e
>andando pra isso pode ficar em casa tomando cerveja ou aproveitar o feriado na
>praia, mas sabe que vai ser governado pelos que gostam de participar. Por quê
>no meu Brasil varonil, salve! salve! não é assim? Simples: se assim não fosse,
>as pessoas mais pobres, as mais ignorantes e as que moram longe das zonas
>eleitorais não iriam votar. Ou vocês acham que um agricultor que mora no sertão
>nordestino, não sabe ler nem escrever, ganha menos de 50 pilas por mês e passa
>fome ia se interessar por eleger presidente? Geralmente eles nem fazem idéia de
>quem está ocupando o trono no palácio do planalto, e certamente não gostariam
>de sair de seu santo sossego e viajar quilômetros em caçamba de caminhão por
>estradas esburacadas só pra votar num cara cujo nome vai esquecer assim que
>deixar a urna, não fossem as sanções legais que acometem os não-votantes.
>Acontece que os coronéis e a direita precisam desses votos para se
>(re)elegerem. Portanto, acharam por bem colocar na constituição escrita na
>abertura da era Figueiredo que o voto é um direito obrigatório, só para
>garantir a transição "democrática". Afinal, depois de 20 anos de ditadura,
>podia ser que o brasileiro tivesse perdido a vontade de votar.
Se é real o sonho, não me assanho. Se o agora é utopia, não topo.
Lutar pelas causas políticas é dissolver-se novamente em sua
sacralidade totalizante, uma transubstanciação tão sedutora que a
própria sobrevivência, ainda que acidental, é que torna-se desonrosa.
Enquanto a fragilidade do humano se revela na inconformidade com as
mazelas sociais e na escritura de panfletos que nunca serão
fundamentais, a tenacidade sobre-humana ganha contornos palpáveis no
enfrentamento dos moinhos de vento da política brasileira.
=================
>Vocês viram? A RBS finalmente aprendeu. Naquela eleição para prefeito em que
>Olívio, que estava dezenas de pontos abaixo de Britto até o dia D, acabou
>tornando-se nosso alcaide e o barbudo dentuço ficou em terceiro, foi difícil
>para o Sirotski e o Ibope explicarem a mudança na cabeça do eleitor.
A mídia, ávida mídia, primeiro colocou Britto sobre um palco, depois
no banco dos réus e agora no leprosário. Nas rodas intelectualóides,
ao menos, a suposta intelligentsia galhofa do fenômeno político,
considerado o mais recente capítulo da Grande História do
Charlatanismo. Mas será mesmo?
>Provavelmente, a maioria dos portoalegrenses errou ao marcar o voto na cédula,
>ou todos ouviram uma voz lhes mandando mudar de candidato na hora em que
>entraram na urna.
E a comédia, onde há de estar? Na superfície da estética bovinoperiodística. Mas por detrás das ironias, hipérboles e metáforas, sob
a fartura material advinda do newsbusiness, corre o arroio seco e
árido do rancor das feras feridas.
>Dessa vez, Sirotski
>estava 15 pontos na
>Nos últimos 7 dias,
>Britto na liderança
>conta 51% dos votos
foi mais esperto: uma semana antes da eleição, Britto
frente de Olívio, e tudo seria decidido no primeiro turno.
a diferença foi diminuindo ponto a ponto, até parar em
por 5 pontos. Hoje, domingo, às 10:30hs da noite, Olívio
e Britto 41%. Como é que vão explicar dessa vez?
Para fazer frente a tanta espetacularização hiper-real, nosso autor,
epítome de uma Porto Alegre pós-eleitoral polarizada e grenalizada,
precisa resgatar primeiramente a sua própria ferocidade, num processo
pungente de desconstrução do sujeito e de seus referenciais, em pleno
Hades cloacal. A partir daí, e com o resgate de um sentimento de uma
tribalidade até então sublimada, tão bem representada pelo uso da
adaga e garrucha autóctones, é que se inicia a reação.
=================
>Domingo, 9hs da noite. O brique acabou faz tempo, você já tomou aquela ceva na
>Oswaldo e acha que sua noite vai se resumir a assistir a finaleira do
>Fantástico e o Sai de Baixo. Esquece. Dirija-se até a Protásio Alves, 1333, e
>aproveite uma noitada de domingo no Subjazz, regada a cerveja barata (Skol,
>infelizmente, mas tb tem Budweiser), som eclético e sinuca, tudo isso na
>agradável companhia da galera da cena clubber alternativete de Porto Alegre. O
>lugar é um estúdio que abre para festas aos domingos à noite, quando geralmente
>há shows de bandas dos mais diferentes estilos. Há uma mesa de sinuca (fichas
>por R$0,50), pista e uma salinha ao fundo para aquele relax consagrado. A ceva
>de 600ml custa R$2,00 , e o público feminino é ligeiramente maior que o
>masculino.
O bar não existe. A sinuca não existe. Os clientes e a cerveja
também. Não existem. De ilusão em ilusão a biografia se revela. O bar
é o verdadeiro eu por trás da máscara do personagem. O buraco é o
vazio de uma existência anônima e solitária numa metrópole moderna. A
cerveja é aquilo que somos realmente.
>---Träsel
A obra de Träsel não é um depositário, é sim um espelho para nosso
aufklärung. E ao mirar nossa alma, que reflexo vemos: a alegria ou a
vergonha?
Deveras!
--- Buarque
O GAROTO COM UM NINHO DE SPAGHETTI NA CABEÇA
--Guilherme Pilla
Excepcionalmente hoje, o COLunista não escreve neste espaço.
AS AVENTURAS DO ALEMÃO DE PALA
--Hermano Freitas
* Coleguinhas
A primeira vez que lembro de tê-la visto foi em um daqueles
intermináveis plantões de depoimento do Daniel Dantas na Justiça
Federal. Estava no meio dos poucos segundos do empurra-empurra em que
os advogados passam pelos repórteres, instantes que fazem valer horas
de espera ou, pelo contrário, condenam as mesmas a terem sido gastas
em vão, quando ela apareceu. Nem baixa nem alta, cabelo preto curto,
o microfone de uma emissora de TV obscura, uma voz severa que emitia
perguntas num sotaque carioca que não admite vacilo. Ia muito direto:
- O seu cliente admite o desvio em contas?
Só depois que arruinava tudo passando por cima de todo mundo
cumprimentava os colegas, da mesma forma brutal com que fazia
perguntas. Fiquei sabendo que seu portfolio inclui uma passagem por
um clássico programa mundo cão, o que explica tudo.
Logo percebi que ela tumultuaria toda e qualquer coletiva de imprensa
em que estivesse. Por mais que a pauta fosse tranqüila e sem nenhuma
necessidade de confronto, lá vinha, atrasado meia hora, aquele
furacão moreno a serviço da informação para gerar um clima tenso. Em
um simples balanço de resultados de uma operação da Receita Federal,
inconformada em ouvir um "não divulgaremos maiores dados para não
prejudicar as investigações", deu início a um tiroteio de queixas.
- Fomos convidados para uma coletiva de imprensa, precisamos de TODOS os dados de que os senhores dispõem. Temos um papel a cumprir
perante nosso PÚBLICO.
É do tipo que se aproveita da boa educação dos outros. Acabou
conseguindo o que queria, ou pelo menos parte, de um tímido auditor
fiscal que nunca imaginara para um inocente convite à imprensa uma
tal incomodação.
A melhor, no entanto, aconteceu por estes dias. Estávamos esperando
para ouvir o presidente do Supremo. Era o melhor, claro, mas vinha
junto no pacote o presidente do Superior Tribunal de Justiça.
Ouvíamos o homem como uma espécie de entrada antes do prato principal
quando chegou o tornado da imprensa televisiva, atrasado como sempre,
mas mais uma vez em cima. (Pensar em ser câmera desta pessoa me fez
ter por um segundo simpatia com a classe, também conhecida como
'motoboys da imprensa'.) Ela tinha certeza de que estava diante do
representante da corte máxima do país e foi logo perguntando de
grampos, sem preliminares, como é seu estilo.
- Ministro, o que o senhor tem a dizer sobre a decisão do STF?
Muito educado, o presidente do STJ respondeu dizendo que não
comentaria uma determinação do STF. É lógico, não é a sua corte, não
existe qualquer motivo para tecer comentário. Inclusive, com isso, já
dava margem a que se entendesse tudo, mas era sutileza demais para
nossa heroína.
- Mas POR QUE o senhor não vai comentar? A SOCIEDADE QUER SABER!
A sociedade ainda não tinha tomado seus remedinhos naquele dia. Em
algum momento alguém deve ter falado a ela sobre seu engano. Se
recompôs e seguiu perguntando outra coisa, segurando o microfone,
achando tudo perfeitamente normal.
*
*
*
Hamlet naturalmente não se chama Hamlet. Este foi o nome que dei a
ele, sequer lembra em absoluto o original. É para preservar a
identidade do repórter, que existe mesmo.
Conheci Hamlet em frente ao Deic. Me chamou logo atenção que ele, um
cara que já foi loiro e agora é grisalho, chamava os homens de
"canalha" e às colegas de "criança", toda vez no tom mais sério que
se pode imaginar.
Hamlet existe tanto que o governador José Serra, o Nosferatu, o
conhece pelo nome. Na terceira vez em que o repórter insistiu na
pergunta, o governador virou-se irritado para Hamlet: "o que é, fala
Hamlet" e respondeu direitinho a pergunta.
Repito, o governador de São Paulo sabia o nome do repórter. Na
verdade, acredito até que chamá-lo pelo nome foi uma forma de
intimidar, porque não duvidaria que o próprio governador saiba da
maior excentricidade do Hamlet: ninguém, absolutamente ninguém, tem
notícia de onde ele mora.
Isso ele contou às gargalhadas, enquanto esperávamos uma coletiva.
- Ligaram para o meu celular da redação. Eu não atendi, normal,
estava fazendo outra coisa. O chefe de reportagem falou 'ah, é? vamos
ver se não vai me atender.' E mandou um carro ir na minha casa me
buscar. Os motoristas todos disseram 'mas a gente nunca pega o Hamlet
em casa, ele sempre combina em um lugar perto, sempre num ponto
diferente. Ninguém sabe onde ele mora'. O cara espumava, ficou três
meses sem falar comigo e ainda me deixou 40 dias morando em Cuiabá.
O Hamlet. Cheguei a ficar orgulhoso quando vi ele se abaixar para ver
o que eu estava falando pra uma assessora do Lula. Como todo diabo
velho, não despreza nenhuma concorrência.
*
*
*
Personas
Me sinto enjoado toda vez que penso ou pronuncio as palavras "caso" e
"Isabella". Não pela brutalidade da história em si - a de Ribeirão
Pires, em que, segundo a polícia, o pai e a madrasta mataram e
picotaram dois irmãos adolescentes e depois enfiaram algumas partes
que não conseguiram ensacar ralo da casa adentro sem dúvida é muito
pior, mas porque realmente a cobertura foi enfastiante e exagerada.
Mas tergiverso.
Um fenômeno que ficou pouco conhecido do público foram as "meninas do
9° DP". Depois de uns dias de cobertura 24/7, em que aqueles furgões
das emissoras ficavam permanentemente estacionados na porta das
delegacias - em especial na do Carandiru, onde o caso foi registrado
- a aglomeração de populares começou a ganhar graça. Percebendo a
oportunidade de aparecer ao vivo durante uma passagem e,
eventualmente, talvez serem "descobertas" pra fama, algumas jovens
começaram a chegar, sempre de duas em duas, toda arrumadas na sua
melhor e mais sensual blusa e minissaia, exibindo uma forma muitas
vezes ainda imatura. Ficavam na multidão meio de lado,
displicentemente, esperando. Para meu espanto, não era apenas no
Carandiru, as meninas começaram a aparecer em todos os lugares onde
havia plantão de caso Isabella - em frente à casa dos Nardoni, em
frente à casa dos pais da madrasta, IML, todo lugar em que havia uma
equipe de TV pronta para entrar ao vivo. Depois de umas semanas
aconteceu o que tinha que acontecer: vi uns câmeras botando a mão na
barriguinha de uma delas e anotando o número, certamente para marcar
um "teste".
*
*
*
Cheguei de Belo Horizonte e, depois de um dia, já tinha deixado tudo
na boca. Batia a dor e pensava em como levantar mais algum dinheiro.
Fiquei antena. Passou por mim uma mina com jeito de que ia até lá.
Segui. Deu um galo e recebeu de volta mais de dez pedras. Foi até o
beco pimpar. Eu fui atrás.
Olhou desconfiada mas, para minha supresa, não disparou. Usei uma
cara de pidão para não deixar correr. Pareceu até gostar de mim,
sorriu.
- Acabou meu dinheiro - disse. Ela logo entendeu o que era.
Estouramos as 15 pedras. Ficamos um tempo por ali. Contei minha
história.
Não sei quanto tempo ficamos nisso, mas já sentia de novo o cutuco.
Ela queria beijo, dei um beijo nela. Quando terminou senti latejar lá
embaixo, mas o crack já tinha me deixado há muito tempo sem condição.
Olhei pra cara dela, era bonita. Dei mais um beijo e peguei com as
duas mãos seu pescoço. Apertei com força. Ela começou a bater, botou
a língua pra fora, ficou rôxa, babou um pouco, soluçou e, no fim, com
uma cara de surpresa, se entregou. Deixei cair no chão. Tirei o
sapato, as meias, a bermuda, a calcinha, a camiseta e o sutiã. Fiquei
olhando o corpo dela. Era bonito aquele monte de pelinhos enrolados.
Eu não acreditava no que tinha feito, mas era muito fácil. Era muito
fácil e eu ia fazer de novo.
(livremente inspirado em depoimento de Leandro Basílio Rodrigues à
delegacia de homicídios de Guarulhos)
*
*
*
Pra alguns sorrirem outros têm que chorar, né. Essa é a vida. Neste
caso da menina que jogaram da janela é que eu fiz dinheiro. Levava as
meninas no táxi de lá pra cá, ia no IML, depois no Deic, depois no
Carandiru. Elas diziam se eu esperava e eu respondia "não tem
problema!", e dava lá, 180 paus. Ê, Nardoni. Neste eu fiz dinheiro. E
pra vocês da imprensa também é bom que vocês ganham, né?
Sensacionalismo.
(livremente inspirado em conversa com um taxista)
--Hermano
I AM IN HERE.
Daniel Pellizzari
Adeus, DFW. E muito obrigado.
-*-
Hoje temos um continho, ó:
//METROID, 1989
Fica longe
daqui, a
montanha gelada
onde
vou
morrer.
Ainda não escolhi. Isso não quer dizer que ela não exista
e muito menos que eu não vá morrer por lá. Aprendi meio
cedo que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Estou
aqui, a cidade está no mapa, estou com vida, a cidade tem
montanhas. Existe um caminho entre mim e a cidade, entre
meu quarto e a montanha, entre minha vida aqui e a minha
morte lá. Isso não significa que só exista um caminho.
Tudo são possibilidades. Uma coisa que dá tontura.
Mas nem por isso vou sair por aí pedindo
conselhos, até porque ninguém tem noção de nada. Não é
porque fiz treze anos mês passado que sei menos coisas
que meu pai, por exemplo. Estou de mal com ele há mais de
um ano. Ele não entende nada. Nada. Mas eu também não. É
outra coisa que aprendi bem cedo. Ser humano é estar
confuso. Não. Ser humano e medíocre é fingir que não
existe confusão nenhuma. Que está tudo bem, que tudo é
fácil. Mas ser humano, humano mesmo, é admitir que não é
assim. Admitir o fingimento e deixar só a confusão. E é
bem isso que eu quero. Acho. Não tenho muita vontade nem
de começar a fingir. E é por isso que vou pra cidade que
tem as montanhas.
E vou de carona. Pegar carona é a coisa mais fácil
do mundo. Parece ainda mais fácil pra quem sabe que vai
morrer, porque aí os riscos não são exatamente riscos.
Mas ia ser bem horrível morrer antes do lugar e hora que
combinei. Mesmo
que eu só tenha combinado comigo.
Imagina. Não que eu já saiba todos os detalhes. Só sei
que vai ser na montanha gelada. Vou chegar perto do cume
e sentar ao lado de alguma pedra. Se tiver alguma pedra
por lá. Deve ter. Aí vou ficar olhando para o branco até
a morte chegar. Acho que antes vou dormir, deve ser o que
acontece quando a gente morre de frio. Depois a neve
cobre o corpo e ninguém fica sabendo de nada. Eu sumo e
pronto. Quando a gente pára e pensa nas possibilidades,
nota que é fácil desaparecer e nunca mais ser encontrado.
Mais fácil que pegar carona.
Eu já tinha pensado nisso tudo várias vezes, nem
lembro como começou. Mas só tive certeza quando meu vô
morreu. Foi ontem. Era umas quatro da tarde e eu estava
jogando Metroid quando ouvi umas risadas na sala. Umas
risadas que não acabavam nunca, cada riso escalava o
final do outro. Uma coisa interminável. Era meu vô, dava
pra notar. E só tinha a gente em casa, mesmo. Mas sei lá,
às vezes o dia tem essas coisas, essas surpresas. Tudo
são possibilidades.
Meu vô era legal. Ninguém sabe de onde ele veio,
só que chegou aqui de navio e tinha catorze anos. Agora é
que ninguém vai ficar sabendo, mesmo. Sempre que ficava
sozinho, cantava umas musiquinhas que pareciam meio
árabes. Ou judaicas, sei lá. Confundo. Sei que confundir
isso é meio ridículo mas confundo, fazer o quê. Quando
ele percebia que eu estava ouvindo, fechava a cara e me
xingava de alguma coisa com aquele sotaque que ninguém
sabia de onde era. Sempre rindo. Ele tinha cheiro de
lustra-móveis, mas cheiros são como idades. Não querem
dizer nada.
Ele era bem magro e tinha uns cabelos
despenteados, mesmo quando penteava. E sempre andava com
um pente no bolso. Dá pra entender? Não tinha jeito.
Dentes bem amarelos. E sempre que eu olhava pras mãos
dele pensava em boxe. Meu vô vivia contando umas coisas
que ninguém queria ouvir. Quase ninguém. Por causa dele,
por exemplo, sei que as mulheres incas esmagavam batatas
cozidas na
cara de todos os homens narigudos que
encontravam na rua. E que uma vez a inquisição espanhola
condenou à
morte todos
os habitantes da Holanda.
Todinhos. E que num dos países da União Soviética, ele
não quis dizer qual, existe uma seita que adora um deus
com cabeça de galo, um deus que tem um dedo a menos e
protege o mundo de um novo dilúvio. E mais um monte de
coisas desse tipo.
Uns dois dias antes ele tinha me contado a
história de um filósofo grego. Um estóico. Acho que esses
eram aqueles caras que viviam dentro de barris. Crísipo,
o nome desse aí. Parece que morreu de tanto rir vendo um
burro comer figos. Aí quando ouvi aquelas risadas,
lembrei disso na hora. Larguei o controle e saí correndo.
Mas não tinha burro nenhum na sala, só meu vô e as
cadeiras de
balanço. Ainda
estava rindo bastante,
cobrindo a dentadura com uma das mãos. Com a outra
segurava uma revista, que estendeu pra mim sem parar de
dar risada.
Era uma revista esotérica, esses negócios que ele
gostava de
ler. Uma
edição especial
da Planeta.
"Arqueologia Fantástica". Aquela eu já tinha lido, tinha
um texto sobre os crânios de cristal. Adoro. Ele me
estendeu a
revista aberta, bem numa página com a
propaganda de um livro sobre o Apocalipse. Dizia que
estava próximo. Sempre dizem isso. É uma possibilidade.
Tinha também uma figura bem grandona de Saturno. Assim, o
planeta. Na hora não entendi muito bem o que uma coisa
tinha a ver com a outra, mas hoje cedo andei pensando
sobre isso e ficou meio óbvio. Saturno o planeta, Saturno
o deus,
Cronos, cronologia, tempo, enfim. Conhecer
mitologia sempre ajuda.
'Não perca tempo!' Eram umas letras bem grandes,
bem pretas. Aí tinha a capa do livro, que quase não dava
pra ver porque se misturava com os anéis de Saturno, e
mais texto numas letras menores. 'O fim está próximo!
Peça já!' Acho que deu pra entender. Muitas exclamações.
Só entendi o motivo de tanta risada quando meu vô apontou
umas letrinhas bem pequenas, assim de lado num dos cantos
da página. Até decorei: 'devido ao grande volume de
pedidos, rogamos por sua paciência em caso de atraso na
entrega do livro'. Era mesmo engraçado.
Meu vô continuava rindo. Acho bom explicar que ele
não ria que nem a maioria das pessoas. Uma vez, acho que
eu tinha uns seis, sete anos, ele me falou que o destino
de todo mundo é virar um idiota. Alguns percebem, outros
não, mas todos acabam virando idiotas. Aí ele falou que o
importante era lembrar sempre disso e tentar ser um
idiota extraordinário. Acho que era por isso que ele ria
daquele jeito. Um riso meio assim engasgado, que começava
aos poucos. Um rá-rá que depois virava um rá-rá-rá e
aquela coisa ia crescendo cada vez mais e ficando mais e
mais e mais e mais alto e descontrolada. Era bem legal.
Larguei a revista no colo dele e fiquei olhando
aquilo. Esperando ele finalmente parar, recuperar o
fôlego e dizer alguma das frases que vivia repetindo,
umas coisas que nunca entendi direito mas gostava de
ouvir assim mesmo. Tipo "multidões são vírgulas que
desistem". Ou "sem misericórdia para quem vomita o
próprio cabelo". Essa parecia tradução ruim, ainda mais
com o sotaque. Mas ele não parava nunca de rir, e aí fez
uns gestos que pareciam mímica. Fiquei olhando pras mãos
dele, lembrando do Mike Tyson. Levei um tempinho pra
entender que ele queria água.
Quando cheguei na porta da cozinha ele parou de
rir. Servi a água, bem gelada, e voltei meio com pressa.
Vi a a revista no chão e meu vô na cadeira de balanço,
quieto, de olhos abertos. Parecia que estava encarando a
samambaia, mas ninguém encara samambaias. Quando cheguei
perto com o copo, ele falou uma coisa. "É como um fósforo
se apagando". Bem assim. "É como um fósforo se apagando".
Aí morreu, levando embora um mundo inteiro.
Achei uma frase meio idiota, mas tudo bem. Não
tinha mesmo como ganhar de "nem os esqueletos são
eternos", minha preferida. Essa eu até anotei. Mas ele
não disse mais nada, mesmo. Parou nessa do fósforo e
ficou encarando a samambaia. Olhei mais uma vez pra
Saturno na revista. "Não perca tempo!" Meu vô vendia
perucas quando era novo.
Aí voltei pro quarto e olhei pra imagem parada na
televisão. Samus Aran em formato de bola. Tourian, última
fase. Não consegui lembrar o telefone do trabalho da
minha mãe. Desliguei o NES, fiquei olhando pra tempestade
de neve do canal 3 fora do ar e bebendo a água que tinha
levado pro meu vô. Bem devagarinho. Engolindo como se
aquilo fosse outra coisa.
-*[10-set-08]
--Daniel Pellizzari
I GIVE YOU MY PEN
--Clarah Averbuck
OI TUDO JOIA
eu só acredito nas coisas que acontecem. as coisas que são
acontecidas não me servem para nada, não me movem e nem me
interessam.
pois uma coisa aconteceu. eu, uma amiga e a catarina fomos naquele
show onde tocariam ben harper e dave matthew's band. fiquei deveras
feliz quando soube que ben tocaria no brasil novamente, pois eu e
meu esposo andávamos ouvindo suzie blue obsessivamente, tocando junto
com as outras músicas que sempre tocamos madrugada adentro e
gostando demais. já tinha acontecido um outro momento desses com o
ben harper, quando debandei de porto alegre e repetia e it's so hard
to do and so easy to say but sometimes you just have to walk away,
sempre pensando na minha irmã que ficou lá, porque oh no - here
comes that sun again and means another day without you my friend and
it hurts me to look into the mirror at myself and it hurts even more
to have to be with somebody else. enfim, fomos eu, minha amiga e a
catarina e mais duas moças também broders e generosas que passaram
aqui para dar uma caroninha amiga porque o show era na casa do grande
caralho e nem dirigir eu sei. meu esposo estava em cuyaba sofrendo de
calor e falta e ausência. pegamos um trânsito do cão, tinha jogo no
estádio do morumbi naquele dia - depois perguntam por que não gosto
de futebol - e depois de uma saga à parte que envolvia dar voltas sem
saber para onde ir no meio da multidão, eu, minha amiga e a catarina
conseguimos finalmente encontrar a entrada de serviço e constatar que
o show do ben estava quase no final. que tristessa. tudo bem, também
gosto muito de dave matthew's band, tive inclusive mais momentos de
repeats obsessivos do que com o ben harper, mas poxa. ouvir apenas
três músicas não era justo. voltamos ao camarim, bebemos aquele jack
daniel's e quando fui pegar um cigarro na bolsa vi que lá repousava
um exemplar do cat life, meu livro traduzido que será lançado na
inglaterra logo mais. pensei hmmmm, vou deixar esse livro pro ben
harper, é capaz dele gostar. escrevi "this is me singin' the blues",
fui até a porta do camarim e entreguei ao rapaz corpulento que lá se
encontrava. e fui ali ver dave matthew's band, que foi incrível, com
direito a ben harper voltando ao palco e eles todos mandando ver em
uma versão de dez minutos de all along the watchtower. catarina nos
meus ombros cantava em uma flor e me enchia de orgulho. acabou e
fomos todos para casa dormir o sono dos bêbados e justos.
* PAUSA PARA MANIFESTO: DEIXEM A TREMA EM PAZ E VIVA O ACENTO
DIFERENCIAL *
a vida tinha voltado ao normal no lar dos averbuck-lincoln, serviços
de delivery, música, amor e diversão. eis que um número desconhecido
faz tocar meu telefone. atendo.
"oi, clarah, aqui é o herbert, eu trabalho com o ben harper"
"ahn, oi"
"parece que você deixou um livro pra ele, né? pois é, ele adorou e
mandou te procurar porque quer te conhecer"
depois fiquei sabendo que ele andava pelo estúdio da TEVÊ com o livro
na mão perguntando se alguém me conhecia. o moço herbert me ligou
mais umas vezes naquele dia, tentando combinar um encontro. eu
sugeri de encontrar o ben no vmb mas ele preferiu que eu fosse junto
com eles todos comer uma pizza. fomos eu e meu esposo. chegamos lá e
o ben estava com o livro na mão. disse:
"man, what's this? this is amazing, you're the female charles
bukowski!"
e ficava recitando trechos na mesa.
"quando eu li essa parte pensei: essa pessoa SABE DA VIDA"
eu estava transbordando em contentamento. perceba, eu vivo em um
lugar onde NINGUÉM ENTENDE NADA. possivelmente você, leitor, não
entende. onde todo mundo julga TUDO ERRADO. onde todo mundo faz tudo
pelos motivos errados. parei de sair de casa e fico aqui no quentinho
onde tudo é claro só com meu esposo e meus amigos porque não suporto
mais. normalmente, quando chegam a mim, é para dizer VOCÊ NÃO PODE
PENSAR ISSO e mais alguns impropérios infundados que mofam dentro
das cabeças pobres das pobres pessoas que não sabem conviver com nada
diferente delas sem apontar um dedo e gritar qualquer merda.
é inútil dizer tudo isso. pensei antes de contar essa história porque
não queria nenhuma mácula de nenhum idiota achando que era algum
deslumbre. eu não trabalho com deslumbre. mas isso também ninguém
entende, porque NINGUÉM ENTENDE NADA. e a melhor das coisas é
encontrar alguém que entenda onde você menos espera. e eu encontrei o
ben harper, que virou meu amigo não porque ele é FAMOSO, mas porque
ele ENTENDE. foi absolutamente do caralho. porque ele entende. porque
ele faz e sente. porque é outro nível de conversa quando a pessoa vem
de um lugar onde não importa se você tem um BLOG ou doze tatuagens ou
seja um bêbado ou uma garota ou um anão. BEYOND SURFACE, my friend. o
mundo é um lugar horrível porque isso é raro. saber que existe gente
assim faz dele um lugar um pouco menos pior e dá uma leveza no peito.
estava acostumada apenas a sentir essa leveza com gente morta. agora,
como ben disse, faz algum bem saber que podemos sofrer juntos, ainda
que não estando no mesmo lugar. o sofrimento vira uma outra coisa e
tudo passa a fazer sentido. misery loves a simphony.
A ÍNDOLE DA MULTIDÃO
Há suficiente traição, ódio,
violência,
Absurdo no ser humano comum
Para abastecer qualquer exército a qualquer
momento.
E Os Melhores Assassinos São Aqueles
Que Pregam Contra o Assassinato.
E Os Melhores No Ódio São Aqueles
Que Pregam AMOR
E OS MELHORES NA GUERRA
-ENFIM- SÃO AQUELES QUE PREGAM
PAZ
Aqueles Que Pregam DEUS
PRECISAM de Deus
Aqueles Que Pregam Paz
Não Têm Paz.
AQUELES QUE PREGAM AMOR
NÃO TÊM AMOR
CUIDADO COM OS PREGADORES
Cuidado Com Os Conhecedores.
Cuidado
Com Aqueles
Que Estão SEMPRE
LENDO
LIVROS
Cuidado Com Aqueles Que Ou Destestam
A Pobreza Ou Orgulham-se Dela
CUIDADO Com Aqueles Rápidos Em Elogiar
Pois Eles Precisam de LOUVOR Em Retorno
CUIDADO Com Aqueles Que Rápidos Em Censurar:
Eles Temem O Que
Desconhecem
Cuidado Com Aqueles Que Procuram Constantemente
Multidões; Eles Não São Nada
Sozinhos
Cuidado
O Homem Vulgar
A Mulher Vulgar
CUIDADO Com O Amor Deles
Seu Amor É Vulgar, Busca
Vulgaridade
Mas Há Força Em Seu Ódio
Há Força Suficiente Em Seu
Ódio Para Matá-lo, Para Matar
Qualquer Um.
Não Esperando Solidão
Não Entendendo Solidão
Eles Tentarão Destruir
Qualquer Coisa
Que Difira
Deles Mesmos
Não Sendo Capazes
De Criar Arte
Eles Não
Entenderão A Arte
Considerarão Seu Fracasso
Como Criadores
Apenas Como Falha
Do Mundo
Não Sendo Capazes De Amar Plenamente
Eles ACREDITARÃO Que Seu Amor É
Incompleto
ENTÃO TE ODIARÃO
E Seu Ódio Será Perfeito
Como Um Diamante Brilhante
Como Uma Faca
Como Uma Montanha
COMO UM TIGRE
COMO Cicuta
Sua Mais Refinada
ARTE
c. bukowski cuspiu
c. averbuck traduziu
* MANIFESTO: NÃO À REFORMA! SIM AO TREMA! VIVA O HÍFEN! UNA-SE À
FORÇA DA RESISTÊNCIA *
--Clarah
**********UNS
****BLOQUINHO
***CURTAMENTE
por Guilherme
*********Caon
Trazendo hoje
"UM BREVE ENSAIO SOBRE A CHINELAGEM AFU"*
(Deixa eu te dizer como começa: abre a cena no pátio da casa dum
cara, num fim de tarde onde ele tá recebendo a parentada pra um
churrasco. O dono da casa, já bebum, começa a discorrer sobre o
universo e coisicas afins.)
Te digo uma coisa só, o Miéle é que era o cara. Mais mestre não
tinha! Com aquele programa dele no cinco, o cara ganhava bem,
dava audiência, todo mundo conhecia ele. Pior, passava o dia
vendo mulher pelada. Chegava lá e dizia "mostra as teta aí minha
filha, pra ver se tá premiado", o filho da puta. E fazia isso
dum jeito tri elegante. É, tou te falando. O cara não parecia um
cafetão, tá ligado. Ele era, mas ele não parecia! Era todo cheio
da pose, aquela vozona grave, parecia um motor de maverick
falando. Foda. Ele tinha aquela manha toda classuda pra tratar o
pessoal, e isso não tem mais. Putaria tem em tudo que é canto.
Tá vendo essa guria do tempo aí? Se bobear, amanhã botam até ela
com os peitos de fora. Antes tu tinha que esperar chegar a
madrugada, e se fosse um guri, que nem tu, a mãe expulsava da
sala pra não ver o coqueteta. E tinha até um apelo cultural, a
coisa. Tinha as representantes de todos os estados. Aprendi que
tinha Amapá vendo aquilo. Tu sabia? Além disso, o cara foi um
pioneiro. Ele já tinha mulher com nome de tudo que era fruta,
antes das mulher-melancia, jaca, lima azeda que tem hoje. Rei,
tou te dizendo, o cara era rei.
Aí agora tem que aguentar esses aí falando sobre essa
desgraceira toda. É claro que a cidade tá violenta, minha filha.
Aqui na frente a prefeitura demorou dois meses pra trocar a
lâmpada do poste, os filhos da puta. O vizinho aqui ligou
berrando pra eles, dizendo que ia chamar o Diário Gaúcho e tudo.
Aí vieram que eram uns doces, fizeram tudo rapidinho. Aí tem
mais esse bando de vagabundo morando por aqui, tá sempre dando
problema. Esses dias levaram o bujão de gás da dona Teresa, ali
na esquina. Foda. Ela diz que foi até o portão, e quando voltou
não tava mais. Tem que botar um merda desses a apanhar até não
poder mais. Sabe o que que precisava nesse jornal? Mostrar uns
presuntos que tomaram uma ruim, que nem no Polícia em ação, tá
ligado? O cara tem é que chinelear esses vagabundos mesmo.
Aposto que mané ia entrar na linha rapidinho. Pega e faz um
troço tipo o programa do Alborghetti. Aquele vídeo que ele fica
dando porrada com um taco na mesa até dar cãibra é foda. Ele
ainda fica gritando "cadê meu pau? cadê meu pau?". Muito bom. Vê
um pedaço dessa costela aí.
..
..
Aí tem essa história que também passou na tevê esses dias, um
guri tá dizendo que foi assaltado por quatro loira de peito de
fora. Tá bom, vou acreditar. O mané fica aí se emaconhando e vem
com essa merda dessa historinha de desculpa pra não ter que
falar que rateou. Imagina, tu vem andando na rua, aí vem quatro
pampacat de peito de fora berrando pra ti "perdeu, playboy!
perdeu"! Ó a cena. Que que tu ia fazer numa hora dessas? Eu
deixava elas levarem até meu cartão do Nacional. Se bobear ia
ficar gritando cadê meu pau? Cadê meu pau? Rará. Ia chegar na
delegacia avisando que eu tinha sido nocauteado por oito peitão,
com um riso de orelha a orelha. Mas do jeito que eu tou fudido
de grana, acho que uma daquelas só chega perto de mim se eu
ganhar na mega-sena. Sifudê.
..
..
Todo mundo que ganha essa bolada diz que ia ajudar fulano, ah vá
tomar no cu. Eu tou cagando, ia era gastar esse dinheiro pra
viver um vidão! Nem me importa se me achassem o cara mais filho
da puta do universo. Sabe o que que eu ia fazer? Sem essa
historinha de mansão, eu ia comprar uma porra dum castelo! Com
aquela água em volta e tudo. Aí, um belo dia, eu ia sair na
janela e ia ter um monte de gente indignada comigo lá fora,
gritando pra mim "fiadaspuuuuuta" porque eu não tinha ajudado
ninguém e eu ia dizer sou sim, mas vem atravessar o riozinho
cheio de jacaré aqui, merda! Vão tudo tomar no cu! Ia botar uma
placa na frente do castelo dizendo "Jorge, ganhou na mega-sena e
tá cagando pra ti". Rára. E ia encher o castelo de coqueteta. Ia
ter todas lá, pêssego, uva, laranja. Se bobear, até o Miéle eu
trazia, só pra ver ele dizendo aquela coisa da teta premiada.
Era muito engraçado, cara, puuuutz! Sabe o que podia ter também?
Uma banheira de coca-cola. Sempre quis ter uma! Imagina só, um
banheiro cheio de mármore por tudo e eu lá peladão fumando um
charuto e mergulhado no refri. Pior! Sabe o que que eu podia
fazer? Botava lá na banheira a coqueteta limão! Aí ia brincar de
pepsi twist, tu ia ver só! É tri bom ter um objetivo na vida.
..
..
*a partir de notícias retiradas de sites da grande mídia.
Feliz dia da marmota pra vocês. Feliz fim da adolescência.
--Caon
COL: ALCOVITARIA PÓS-MODERNA, INC.
--Catarina Cristo
---------- Forwarded message ---------From: Catarina Cristo <[email protected]>
Date: 2008/8/26
Subject: centenário
To: [email protected]
Cardoso,
Em cinco de outubro, quando estivermos todos comemorando o centenário
do Col em edição especial, aqui em casa estaremos comemorando também.
E por causa do Col.
Uma vez vc escreveu em seu blog que tinha vontade de saber o que
acontecia em lugares como Sergipe. Desde esse dia lhe devo esse
email, pra lhe dizer que, em Sergipe, aconteciam coisas como gente
namorando por causa do Col.
E, em outubro, o namoro vira casamento. E eu nem me lembrava que era
o mesmo mês do centenário do Col quando marquei a data. Mas o caos
trabalha a nosso favor.
Eu e Amaral nos conhecemos na Colmunidade, que era divertidíssima.
Era um tempo delicioso. Dois Col por semana, 200 emails por dia e
conversas no ICQ.
Amaral é de Aracaju e eu aqui do Recife. A gente começou conversando
na lista, sobre o Col e muitas outras coisas, fomos pro PVT e o resto
é história. Ele já se mudou pra cá faz quatro anos e, em 25 de
outubro, vira coisa de fato e de direito.
O Col foi uma idéia iluminada. Tenho certeza que foi importante na
vida de vcs que escreviam nele. É uma referência na história de
internet, virou referência na vida profissional de vcs. Fico muito
feliz de ver quanta gente boa saiu dali e tenho orgulho de dizer que
acompanhei isso.
Mas o Col também foi muito importante na vida de muita gente muito
distante. Está na nossa história para sempre. Sempre lembraremos de
onde viemos.
Comemoremos, porque centenário e casamento são coisas a se comemorar.
Um abraço,
--Catarina Cristo
CardosOnline
fanzine por e-mail
edição especial comemorativa do centenário
http://qualquer.org/col
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