execução fiscal
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EXECUÇÃO FISCAL Agostinho Toffoli Tavolaro* Francisco Sérgio Bocamino Rodrigues** 1) À luz da Constituição (art. 5º, inciso LV), seria possível a legislação infraconstitucional reduzir o conceito de “ampla defesa administrativa e judicial”, refletido na legislação ordinária em vigor em 5 de outubro de 1988? Trata-se de conceito flexível, subordinado à legislação ordinária, ou os meios então existentes não poderiam ser restringidos, sob pena de violação à ampla defesa constitucionalmente assegurada? Inicialmente, incumbe afirmar que uma constituição é, na sua origem, o produto de toda uma concepção conjunta de percepções sociológicas, econômicas e políticas que preexistem ao momento em que se formaliza através de um processo de conjunção de vontades de representantes que a votam e lhe dão consistência material. Desse modo, uma constituição acha-se sempre estreitamente vinculada ao momento de sua criação, seja para consubstanciar anseios para o futuro, seja para consolidar os aspectos que a conformaram. Dentre esses elementos conformadores de qualquer constituição figuram os conceitos provenientes das normas de conduta pré-existentes ao momento mesmo de sua concretização, sejam elas costumeiras, escritas ou não. Uma constituição não nasce do nada, mas sim da vivência de quantos contribuíram, no passado, com suas idéias e posturas, para a sua formalização, como documento escrito. * Advogado Sócio Diretor de TAVOLARO E TAVOLARO - ADVOGADOS – Campinas - SP - Brasil. Vice Presidente da IFA – INTERNATIONAL FISCAL ASSOCIATION – 1983/1985. Membro do Comitê Permanente Científico da IFA - INTERNATIONAL FISCAL ASSOCIATION – Amsterdã – Holanda (1990/2000). Presidente da ABDF - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DIREITO FINANCEIRO (1996/1998) – Atual Vice-Presidente – Rio de Janeiro – Brasil. Acadêmico da Cadeira nº 14 da ABDT - ACADEMIA BRASILEIRA DE DIREITO TRIBUTÁRIO – VicePresidente – São Paulo – Brasil. Professor de Direito Comercial Internacional na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas - São Paulo – Brasil. Presidente Honorário da Amcham Campinas de 2004 até hoje. Autor de vários trabalhos e palestras em Direito Tributário. ** Advogado de TAVOLARO E TAVOLARO ADVOGADOS – Campinas – SP – Brasil. 1 Destarte, ainda quando signifiquem ruptura com o passado, sempre trazem ínsitos em si os conceitos que não foram por ela renegados, ocorrendo no plano ideal aquilo que , quando se fala em lei escrita, se denomina recepção. Note-se, no entanto, que aqui não estamos a falar de direito posto, mas de conceitos que se mantêm vivos e operantes, mesmo que não expressamente reproduzidos no texto constitucional. Na verdade, a ruptura com conceitos anteriores se faz nas constituições de modo expresso. Exemplo a ser citado é a constituição dos países comunistas, hoje quase desaparecidos da face da terra (somente Cuba e Albânia parecem ainda adotar o comunismo na velha formula), que expressamente renegaram o direito de propriedade. Assim o novo sistema de normas jurídicas que segundo OTTO BACHOF informam uma constituição em seu sentido material 1 parte sempre de conceitos pré-existentes que configuram o alicerce do labor constitucional. A “ampla defesa administrativa e judicial” é um desses conceitos préexistentes à elaboração da Lei Maior de 1988, que somente admite flexibilidade para mais e não para que possa ser restringido por medidas infraconstitucionais de qualquer natureza. Preceito de direito processual constitucional que é, minudencia, na verdade, o princípio do devido processo da lei (due process of law) que NELSON NERY JUNIOR apontou como “gênero do qual todos os demais princípios constitucionais do processo são espécie”2. A Constituição Federal consagra de forma ampla o princípio do devido processo legal, onde é assegurado, aos litigantes, em processo com os meios e recursos a ela inerentes, que não necessita de lei complementar para ter sua observância no curso do processo. É norma de aplicação imediata. E de aplicação imediata, sem necessidade de lei ordinária que os implemente são também seus consectários, qual o inciso LV do art. 5º. Se lei ordinária lhes sobrevém, há necessariamente de guardar observância dos conceitos pré-existentes e, quando já corporificados em lei , de não a afrontar direta ou indiretamente. Resposta á indagação do Simpósio há, portanto, de ser no sentido de que não se trata de conceito flexível que possa sofrer restrição por lei ordinária ou quejandos quais as mal estimadas medidas provisórias, somente passível de ampliação. 1 2 BACHOF, Otto. Normas Constitucionais Inconstitucionais? Coimbra : Atlântida, 1977, p. 39. NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. S. Paulo : Revista dos Tribunais, 1992, p.25. 2 2 - A Lei 11.382/06, que alterou as disposições do CPC sobre execução de títulos ova extrajudiciais, revogou a Lei 6.830/80? Considerando a resposta ofertada, os embargos à execução fiscal possuem efeito suspensivo? Qual o prazo para sua interposição? A lei 11382/06 veio alterar o Código de Processo Civil no que concerne ao processo de execução, modificando-o para: a) Na nova redação dada ao art. 652 determinar que o executado seja citado para pagar a dívida em 3 dias, devendo o oficial de justiça, se não pago o débito de imediato proceder à penhora dos bens e sua avaliação, podendo o credor, na inicial indicar os bens que deseja ver penhorados fazendo a intimação na pessoa do advogado do executado em primeiro lugar e pessoalmente ao executado não tenha; b) Possibilitar ao exeqüente obter na distribuição, certidão competente, dos bens sujeitos à penhora e arresto, para fins de registro (art. 615-A); c) A expedição de um único mandado para citação, penhora e avaliação. (art. 652); d) Poder o exeqüente indicar na inicial, os bens que pretende ver penhorados ou arrestados. (art. 652, § 2º); e) Dispensar a intimação da penhora ao executado, quando este não é encontrado. (art. 652, § 5º); f) Modificar a ordem de preferência da penhora, relativamente à impenhorabilidade de bens; g) Implantar a chamada penhora on line. (art.659, § 6º); h) Alterar regras relativas à penhora de faturamento da empresa. (art. 655-A, § 3º); i) Possibilitar ao devedor postular o pagamento do débito até 6 vezes, não apresentando embargos à execução e confessando o valor dívida e depositando em juízo 30% do valor do débito. (art. 745- A); j) Opor o executado embargos sem garantia do juízo pela penhora. (art. 736); 3 k) Alterar do prazo de apresentação dos embargos que será de 15 dias, e determinar que a contagem do prazo para embargos, no caso de serem vários os executados, não será contado em dobro, contando o prazo para cada um dos executados, na medida da juntada aos autos, dos respectivos mandados, havendo exceção quando se tratar de cônjuges. (art.738). Estas, em síntese, a nosso ver, são as alterações que foram feitas no processo de execução buscando torná-lo mais célere, não deixando espaço ao devedor para procrastinar o feito. Necessário, aqui, assertar, desde logo a natureza, não das alterações efetuadas, mas sim da lei que vieram alterar, ou seja, o Código de Processo Civil, para afirmá-lo como lei geral, destinada a reger todos os tipos de processo que tratamento específico não tenham ou venham a ter na legislação. Veja-se bem: LEI GERAL, que tem aplicação a todas as ações em que se busque pronunciamento jurisdicional, excepcionadas, naturalmente, as que tenham regência por lei própria. Ora, a execução fiscal se processa de acordo com diploma legal específico – a Lei 6830/80 (LEF), que atendendo á condição especial do credor – a FAZENDA PÚBLICA – lhe dedicou normas próprias, privilegiando-o em inúmeros passos, muitos deles que, como se verá adiante, entendemos já não deveriam se manter face á adequação e modernização dos seus serviços. Lei geral, a Lei 11382/2006 não revogou a lei 6830/80, e para fazer tal afirmação, socorremo-nos da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei 4657/42), cujo artigo 2º contém as normas de direito intertemporal que dão, a nosso ver, supedâneo à asserção ofertada. Assim é que, ao lermos o art. 2º da LICC, já em seu “caput” encontramos a regra que consagra a perenidade de uma lei até que seja ela objeto de revogação ou modificação por outra. Como modificação ou revogação expressa da Lei 6830/80 não existe na Lei 11382/06, cabe verificar se os parágrafos 1º e 2º do art. 2º da LICC comportam que se declare haja ocorrido a modificação ou revogação tácita. A leitura do § 2º denota que nele, afastada desde logo a hipótese de revogação expressa, são contemplados os casos: a) de incompatibilidade dos textos legais, ou b) de regulação total da matéria objeto da lei anterior. 4 Detendo-nos na hipótese de incompatibilidade de ambas as leis, vemos que sua coexistência é perfeitamente possível, eis que uma se destina a regular a execução aparelhada de obrigações de qualquer natureza entre particulares, enquanto que a outra se destina a reger a execução de obrigações tributárias de que é credor o Estado. Diferem, consequentemente, ambas as leis, seja quanto ao objeto da execução, quer quanto aos sujeitos da relação processual. Com efeito, objeto da Lei 11382/06 é a satisfação de obrigação de direito privado decorrente de inadimplemento de obrigação entre particulares, enquanto que o objeto da lei 6830/80 é a satisfação de obrigação tributária, debito decorrente de não pagamento de quantia devida em virtude de obrigação de direito público. E sujeitos da relação processual que se estabelece na ação de execução tanto o sujeito ativo como o sujeito passivo são particulares, enquanto que na ação de execução por debito fiscal o sujeito ativo da relação processual é sempre o Estado, ao passivo que o sujeito passivo é o contribuinte. Reitere-se, ainda, não existir na regulação na Lei 11382/06 a regulação total da matéria objeto da lei 6830/80, como resulta do cotejo de ambos os diplomas, como segue: I - Na LEF consigna-se o prazo de 5 dias para que o executado pague a dívida ou garanta a execução, indicando a forma dessa garantia (arts. 8º e 9º), além de nela se estabelecer a forma de citação do executado e se determinar a intimação da penhora somente ao executado, conforme previsto em seu art. 12 e não ao advogado, disposições como se vê inteiramente diversas das da lei nova. II – O registro da constrição dos bens depende de despacho judicial acolhendo a inicial e não somente da distribuição da ação (LEF –art. 7º, IV). III – Penhora e avaliação dependem de ordem judicial específica A expedição de um único mandado para citação, penhora e avaliação. (art. 652) não se coaduna com a LEF. IV – A citação na LEF é para pagamento ou garantia da execução (art. 8º). V – Na LEF tem o contribuinte a faculdade de indicar os bens à penhora (art. 9º, III), faculdade esta que a Lei 11382/06 defere ao exeqüente. VI – O art. 12 da LEF determina de forma peremptória a expressa intimação da penhora ao executado, enquanto que essa intimação é dispensada pela lei em tela, quando não encontrado o executado. 5 VII - A ordem de preferência da penhora é na LEF mandatória, enquanto que na lei nova é preferencial. VIII – Não existe previsão de penhora “on line” na LEF. IX – As regras relativas à penhora de faturamento da empresa. (art. 655A, § 3º) inexistem na LEF, onde se faz menção, em caso excepcional, à penhora sobre o estabelecimento (art. 11, §1º). X - Oposição pelo executado de embargos sem garantia do juízo pela penhora. (nova redação do CPC art. 736) inexiste na LEF XI – O prazo de apresentação dos embargos é na lei nova de 15 dias, e seu termo inicial é o da juntada aos autos de cada mandado, sendo vários os executados, o que não ocorre na LEF, onde o prazo é de 30 dias e se conta a partir da juntada do último mandado cumprido (LEF art. 16 e CPC art. 241, III). XI - O art. 745 na nova redação restringe as matérias argüíveis nos embargos, de maneira mais drástica do que sucede na LEF (art. 16, § 2º). Como não houve a revogação da Lei de Execução Fiscal pelas modificações do Processo de Execução no Código de Processo Civil, entendemos que os embargos apresentados pelo executado possuem efeito suspensivo. Aqui de se por em relevo diferença substancial entre o previsto nas duas leis quanto à matéria a ser argüida nos embargos, pois ampla no art. 16, § 2º da LEF, pois pode alegar o embargante “toda matéria útil à defesa”, na lei nova existe limitação ás argüições possíveis (art. 745), restrição, aliás, que mesmo no ordenamento processual geral está a merecer reparo, não somente por respeito ao apótema que nos veio da sabedoria dos romanos “odiosa sunt restringenda, benigna amplianda”, mas também e principalmente pelo ditame da lei maior, que expressamente preceitua a ampla defesa com todos os meios e recursos a ela inerentes, cláusula constitucional esta de plena aplicação também à execução, eis que distinção não se faz na Lei Magna entre tipos de ação. A amplitude da matéria de defesa colocada no parágrafo segundo do artigo 16, não pode assim ser restringida pela nova redação do artigo 745 do CPC, vez que se trata de lei especial prevalente sobre a lei de caráter geral. Esse nosso posicionamento traz ainda, como consectário natural a atribuição de efeito suspensivo aos embargos bem como firmar o entendimento de que o prazo para o oferecimento de embargos à execução fiscal bem como seu termo inicial para contagem remanesce o do art. 16 da LEF: 30 dias. 6 3) É válido proceder à penhora “on line” antes de intimado o contribuinte para promover a garantia do juízo? A penhora “on line” constitui-se, a nosso ver, em exercício do poder cautelar que cabe ao juiz, e aliás, sempre coube desde o código de processo de 1939, no sentido de assegurar a utilidade do processo, ou seja de prover á eficácia dos pronunciamentos jurisdicionais dotando-os, na linguagem tão ao gosto dos modernos processualistas, de efetividade. Não se olvide, no entanto, que se trata de medida excepcional, a ser dispensada com extrema prudência, pois barateá-la, transformando-a em panacéia como infelizmente se assiste nos dias de hoje agride um princípio básico do processo, qual o da imparcialidade. Sabido que o primeiro pressuposto de um processo legítimo é o de que seja imparcial o juiz, temos desde logo que o não ouvir-se previamente a parte configura a odiosa supressão de princípio fundamental do processo, pois, como escreveu GOLDSCHIMIDT, quem não confere audiência a ambas as partes, por este só fato já comete uma parcialidade, porque não investigou senão a metade do que devia indagar 3. Se parcial o conhecimento da “ res in judicio deducta” inquina-se de nulidade o processo, pois não se atendeu ao princípio da bilateralidade do processo, ou, em outras palavras, o princípio do contraditório, pois, como alerta IVO DANTAS, o art. 214 do CPC determina: “Para a validade do processo é indispensável a citação inicial do réu”4. Prática nefasta, somente admissível em casos extremos, enseja ainda a penhora “on line" a invasão da privacidade assegurada pelo art. 5º, inciso XI da Lei Magna, pois é infinitamente pequeno o número de magistrados que vai pessoalmente, com sua senha, acessar o sistema Bacen Jud. Quem o faz é um amanuense, cartorário que, se de um lado não tem as garantias de um juiz, de outro sofre pressões as mais diversas, de ordem pessoal, social ou política. Assim, o preceito do Mandamento Máximo converte-se em piada, e de muito mau gosto, pois já conhecido o fato de se ofertarem, em bancas de camelô, dados pessoais das maiores fortunas deste país, e de serem utilizados por políticos e partidos inescrupulosos dados que de outra forma permaneceriam sigilosos. 3 Citado por ARAGONESES ALONSO, Pedro. Proceso y Derecho Procesal. Madrid : Aguillar. 1960, p. 91. 4 DANTAS, Ivo. Constituição & Processo. Curitiba : Juruá. 2007. 2ª ed., p. 361. 7 Na verdade, na forma como vem sido praticada a penhora em apreço, transformou-se em prática espúria, que não atende aos desígnios da justiça, traduzindo o poder do credor sobre o devedor, pouco faltando para que se tenha o Regresso à “manus injectio” dos romanos, em que ao credor era facultado tomar o devedor como servo ou vendê-lo “trans Tiberim” como facultava a tábua III da Lei das XII Tábuas. Faltos os magistrados que a deferem, no mais das vezes, de discernimento e serenidade para aquilatarem os efeitos danosos que trazem ao devedor, causando mossa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade que em nossos dias se reconhece como ínsitos à Constituição. Ínsitos à Constituição, dizemos nós, chamando-os princípios sem adentrar no movediço terreno da terminologia em que patinam os autores buscando classificá-los como princípios, regras ou postulados 5 lembrando com EDUARDO FORTUNATO BIM que ambos fundamentam-se na cláusula do Estado de Direito, sendo-lhe conaturais 6, e que, como nota PAULO BONAVIDES no que se refere à proporcionalidade. “No Brasil a proporcionalidade pode não existir enquanto norma geral de direito escrito, mas existe como norma esparsa no direito constitucional” 7. Sinônimos os termos para GILMAR FERREIRA MENDES, aponta ele, como destaca DENISE LUCENA CAVALCANTE, que a primeira manifestação jurisprudencial de reconhecimento de existência no Brasil desses princípios data de 1953, através de voto do Min. OROZIMBO NONATO 8. O chamamento a juízo é essencial para o estabelecimento da relação processual válida, já na Bíblia existindo quando DEUS, para decidir sobre as conseqüências do pecado original, convoca Adão com o sonoro e tonitruante chamado “ADAM UBI EST?”. Não pode assim ser dispensada a citação em momento crucial de desapossamento de um bem da parte. Justiça pelas próprias mãos, é o que se teria no caso, pouco faltando para que vá o credor ao estabelecimento de crédito, de imediato, se assenhorear do numerário ali existente. 5 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito e MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos detémse com proveito na apreciação da nomenclatura em causa. Os Postulados da Proporcionalidade e da Razoabilidade: Algumas Notas sobre sua Aplicação no Âmbito Tributário. Revista de Direito Tributário da APET, ano III, março de 2006, p. 57. 6 BIM, Eduardo Fortunato. A Inconstitucionalidade das Sanções Políticas Tributárias no Estado de Direito: Violação ao Substantive Due Process of Law (Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade). “ in” Grandes Questões Atuais de Direito Tributário, 8º vol., Coord. VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA. S. Paulo : Dialética , 2004, p. 71. 7 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. S. Paulo : Malheiros, 1997, 7ª ed., p. 395. 8 CAVALCANTE, Denise Lucena. A razoabilidade e a Proporcionalidade na Interpretação Judicial das Normas Tributárias. “in” Temas de Interpretação do Direito Tributário. Org. RICARDO LOBO TORRES. Rio : Renovar. 2003, p. 49. 8 4) Como deve ser interpretada a Súmula 317 do STJ (“É definitiva a execução de título extrajudicial, ainda que pendente de apelação contra sentença que julgue improcedentes os embargos”)? Caso o recurso do devedor seja provido e a Fazenda Pública venha a resultar definitivamente vencida, como deverão ser ressarcidos os prejuízos causados ao contribuinte? Que verbas devem compor esse ressarcimento? O pagamento dessa indenização está sujeito ao disposto no art. 100 da CF? Ao apreciar a matéria relativa à Súmula 317 do STJA, impõe-se inicialmente proceder a algumas colocações sobre a existência da Súmula em nosso ordenamento jurídico. Antes do advento da Emenda Constitucional 45/2004, não se falava em Súmula Vinculante no direito pátrio. Os tribunais, a seu bel prazer, editavam súmulas que não tendo caráter vinculante, eram na prática tidas como de observância obrigatória para o julgador. Qualquer súmula de qualquer tribunal. Sumulou, aplica-se. Essa sistemática, no entanto, sempre nos pareceu de difícil constitucionalidade, gerando o aviltamento dos princípios que informam o direito e a aplicação da justiça, atendendo muito mais à comodidade dos julgadores, ensejando muitas vezes estudo superficial dos autos e conduzindo a decisões precipitadas. Essas súmulas, não obstante inexistência de previsão legal vinham tendo força vinculativa na prática, pois sua existência passou a ser considerada como pressuposto impeditivo do conhecimento de recurso pelas instâncias superiores. Ao editar uma súmula, com força vinculativa na prática, o tribunal faz as vezes do legislador e dá azo a uma série de afrontas ao texto constitucional desafiada que fica a independência e harmonia dos poderes. da Republica. A primeira afronta diz respeito ao princípio da reserva legal, pois somente fazemos algo, ou deixamos de fazer algo, por força de lei. (CF, art. 5º, inciso II), resultando a aplicação das súmulas em desrespeito ás normas que comandam o conhecimento da “res in judicio deducta”. Afronta-se também, com sua aplicação, em inúmeros casos, a competência privativa da União para legislar sobre determinadas matérias (CF, art. 22, inciso I), eis que á súmula de coturno se reconhece força de lei, determinando que determinado julgamento se faça no sentido por ela adotado. 9 Afronta-se, outrossim, a separação dos Poderes da União (CF, art. 2º), legislando na prática quem atribuição constitucional não tem para isso. Ao juiz compete aplicar o direito, não criá-lo. E o princípio do devido processo legal (CF, art. 5º, inciso LV) é também malferido, pois a tarefa jurisdicional se vê abreviada sem maior atenção ao que preceitua o direito material substantivo e adjetivo. Já com a edição da Emenda Constitucional 45/2004, deu-se existência no plano constitucional à figura da Súmula Vinculante, a ser editada pelo Supremo Tribunal Federal, em matéria constitucional. Regulamentando a Emenda Constitucional 45, veio a lume a Lei 11.417/2006, que disciplina a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal. Só o Supremo pode editar súmula com efeito vinculante. Do exposto acima, entendemos que a nenhuma súmula, que não seja editada nos termos da Emenda Constitucional 45 e da Lei 11.417/2006 deva ser aplicada como vinculante pelo julgador, viciada assim “ab ovo” de mácula que entendemos existir desde sua edição, pois nosso ordenamento jurídico não defere ao outro tribunal que não a Suprema Corte a edição de súmulas vinculantes. Destarte, não podem tais súmulas servir de fundamentação, lastro e motivação de decisões judiciais, que assim buscam se forrar da tarefa ingente - mas inafastável da judicatura – de examinar cada caso trazido a juízo em seus detalhes e lhes dar tratamento, a cada um, tratamento específico e individualizado.. A Súmula 317 do Superior Tribunal de Justiça reveste-se assim de uma inconstitucionalidade flagrante, pois ignora o princípio da inocência até o trânsito em julgado da decisão condenatória. Em outras palavras, procura transformar em coisa julgada o que ainda não está definitivamente assentado. Como determinar que uma sentença, sem que haja decisão com seu trânsito em julgado, seja declarada definitiva? E essa inconstitucionalidade fica ainda mais patente, se observarmos que no texto da referida súmula, há expressa referência à locução “ainda que pendente de apelação sentença que julgue improcedentes os embargos”. Como dissemos acima, o executado, quando é citado para responder aos termos da execução fiscal que lhe é proposta, pode se utilizar de meios e recursos inerentes á ampla defesa para demonstrar seu inconformismo, na matéria que apresenta em embargos à execução. 10 Não observar essa possibilidade, a de esgotar todos os recursos os necessários para a sua defesa, que é a tradução do devido processo legal, o julgador aplicando o enunciado da Súmula 317 do STJ, vulnera o preceituado pela Lei Máxima. Existe sempre a possibilidade do julgador ao sentenciar um feito, não dar razão a uma parte, e esse seu julgado ser reformado em superior instância. Somos humanos e carregamos conosco a possibilidade de falharmos, e a superior instância existe para isso, para corrigir eventual falha dos julgadores dos graus anteriores. Se o recurso vier a ser provido, e a execução houver chegado aos seus trâmites finais, e o contribuinte já foi desapossado de seu bem, ou pagou o débito que era indevido, não lhe restará outra alternativa, senão a de mover ação contra o Estado, para ser ressarcido do prejuízo, alegando nessa ação, a inconstitucionalidade da Súmula 317, ante os vícios acima apontados, requerendo ainda, indenização por danos morais, pois sabedor que não era devedor da quantia que lhe era cobrada foi injustamente desapossado de um bem. A indenização a ser pleiteada deveria ser aquela prevista na lei civil, ou seja, restituição do indevidamente pago, mais as despesas, inclusive honorários de advogado em que incorreu o contribuinte, mais os danos materiais e morais por ele sofridos em decorrência da existência da ação judicial. Aliás, para se por cobro à impudência das administrações fiscais, caberia sempre, em cada caso, determinar o magistrado a instauração de inquérito para se apurar a existência do delito de excesso de exação fiscal, que o Código Penal tipifica em seu art. 316, parágrafo primeiro. Entendemos que o pagamento da indenização acima, de jure condendo está sujeito às regras do artigo 100 da Constituição Federal, pois previstos como exceção á regra, somente estão os créditos alimentícios. Assim, legem habemus, não obstante injusta, máxime quando se atenta para a realidade da justiça tardia, que demanda anos e anos para o pagamento final ao credor da Fazenda Pública. Nem se diga que a eventual possibilidade de compensação do crédito com débitos tributários outros do contribuinte amenizaria a situação, conhecida a realidade da morosa e burocrática máquina administrativa, célere em exigir do contribuinte a satisfação de seus créditos e incrivelmente lenta em satisfazer seus próprios débitos, além de criar obstáculos a esse adimplemento e procurar, por fiscalização especial, constranger o contribuinte 11 na busca de outros débitos. A realidade mostra que não obstante disciplinada na Lei 9430/96 a matéria os impedimentos nela constantes, ampliados pela prática diuturna muita vez levam o contribuinte a desistir ou sequer tomar a iniciativa de solicitar a compensação. 5) Pode o fisco a despeito das prerrogativas que cercam a cobrança do crédito tributário, aplicar sanções políticas ao devedor, tais como levar a protesto a certidão da dívida ativa ou determinando a inclusão de seu nome no SERASA? Escreve FANTOZZI que a sanção constitui o elemento predisposto do ordenamento jurídico para assegurar a observância do preceito contido na norma, que, no campo tributário, assegura o respeito das normas tributárias substanciais e instrumentais 9, dividindo-se as sanções, de acordo com seu fundamento em indenizatórias ou punitivas, na lição de VALDÉS COSTA 10 que alerta para a confusa terminologia nesta matéria, de tal modo que no Modelo de Código Tributário para a América Latina (OEA/BID), precisou-se a distinção entre juros (obrigação acessória, de caráter ressarcitório) e multa por mora (de caráter punitivo), nos arts. 61 e 116, havendo CARBONE e TOMASICCHIO categorizado as sanções de caráter aflitivas, substancialmente muito vizinhas das sanções penais e as de caráter reparatório, de natureza civil 11. Relata com precisão ANGELA MARIA DA MOTTA PACHECO o posicionamento dos jus filósofos sobre a conceituação da sanção, (KELSEN, BOBBIO, VERNENGO, LOURIVAL VILANOVA, AFTALION e JOSÉ VILANOVA, ALF ROSS, TERCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR, MIGUEL REALE) 12 discorrendo a seguir sobre o posicionamento das sanções em um dos ramos do direito: penal, tributário ou administrativo, apreciando ainda o posicionamento de HECTOR VILLEGAS 13. FANTOZZI, Augusto. Diritto Tributario. Torino : UTET, 1998, 2ª ed. p.470. VALDÉS COSTA, Ramón. Curso de Derecho Tributário. B. Aires : Depalma, 1996, 2ª ed., p. 15. 11 CARBONE, Carmelo e TOMASICCHIO, Tommaso. Le Sanzioni Fiscali. Torino : UTET,. 1959, p. 30. 12 MOTTA PACHECO, ANGELA MARIA DA. Sanções Tributárias e Sanções Penais Tributárias. S. Paulo : S. Paulo, 1997, p. 46 e seguintes. 13 VILLEGAS, Hector. Havendo escrito o DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO 1965 e reescrito, com a colaboração da equipe da PUC-S.Paulo em 1974 segundo GERALDO ATALIBA informa em seu prefácio , o seu DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO, S.Paulo : Resenha Tributária, em 1974, tradução da equipe acima, voltou ao tema escrevendo a Parte VI – Derecho Tributario Penal do Tratado de Tributación , Tomo I, Derecho Tributario, vol. 2, dir. HORACIO A . GARCÍA BELSUNGE, B. Aires : Astrea, 2003, p. 427/518. 9 10 12 Procurando a Administração Fiscal cercar-se de garantias e cautelas de todo gênero, adota a prática de aplicar sanções políticas, também chamadas de sanções indiretas, na verdade meios de cobrança de tributos que desbordam da execução fiscal aparelhada buscando constranger o contribuinte à satisfação da nem sempre legítima pretensão tributária. Nesse contexto, tem-se, por exemplo, a exigência de certidões negativas de tributos e contribuições federais, que possibilita o CTN ser feita (art.205), sujeita embora a previsão legal, em inúmeras hipóteses, farta a legislação que as demanda para a prática de atos os mais diversos, como o arquivamento nas juntas comerciais e em todos os outros órgãos registrários de documentos de constituição de sociedades e suas alterações, habilitação e licitação promovida por órgão público ou entidade controlada pela União, operações de empréstimo e de financiamento junto a instituição financeira (Lei nº 7711, de 22/12/1988), editadas normas semelhantes por estados e municípios, bem como para o credenciamento de instituições de educação (Decreto 3860/2001) conforme informa MARIA EDNALVA DE LIMA 14. Aparelhada a Fazenda Pública para a execução fiscal, não pode ela pressionar exercer indiretas sanções para obter a satisfação da sua pretensão fiscal, conforme vem decidindo a Suprema Corte de há longa data, sumulado seu entendimento sobre inadmissibilidade de interdição de estabelecimento (Súmula 70), apreensão de mercadorias (Súmula 323) e proibição de aquisição de estampilhas, despacho de mercadorias nas alfândegas e exercício de atividades profissionais (Súmula 547), conforme relata EDUARDO FORTUNATO BIM 15, achegando ainda MELO BARROS decisões outras sobre não concessão de autorização para confecção de talonários fiscais, regimes especiais de fiscalização e negativa de renovação de CNPJ16. Tampouco se nos afiguram constitucionais o protesto da certidão da dívida ativa e a inclusão do nome do devedor no SERASA, padecendo ambas as medidas da inconstitucionalidade já declarada pelo STF. 14 15 16 LIMA, Maria Ednalva de. Inconstitucionalidade e Ilegalidade da Exigência de Certidão Negativa de Débito para Credenciamento e Recredenciamento de Instituição de Educação – Autorização, Reconhecimento e Renovação de Cursos Superiores. “in” Revista Dialética de Direito Tributário, nº 115/99. BIM, Eduardo Fortunato. Op. cit. p. 83. MELO BARROS, Pedro Melchior. Considerações sobre as restrições administrativas impostas aos contribuintes em débito pelo fisco. Jus Navigandi, Teresna, a.8, nº 94, 5 ago/2004. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5546 acesso em 17/mai/2006. 13 Na verdade, medidas enérgicas deveriam ser tomadas pelos contribuintes, ou ainda melhor, pelas entidades que os representam dentro dos vários segmentos da sociedade, contra as autoridades que exacerbam seus poderes, na exata crítica de HUGO DE BRITO MACHADO que indica: “O caminho para inibir as sanções políticas é a ação de indenização por perdas e danos, contra a entidade pública, com pedido de citação também da autoridade responsável pela ilegalidade, tudo com fundamento no art. 37 e seu § 6º da Constituição Federal. A sanção política, conforme o caso, pode causar dano moral, dano material e lucros cessantes, tudo a comportar a respectiva indenização, desde que devidamente demonstrados”17. Não se olvide, ainda, que além da responsabilização da autoridade por direito de regresso como permite o art. 37, § 6º da Constituição (o que jamais vimos em nossa vivência de quase 50 anos de profissão), caberia ainda verificar a ocorrência do crime de excesso de exação. Estranha, aliás, é a posição da Administração Fiscal que não enxerga o fato de que, adotando as medidas em tela, de protesto e inclusão no SERASA, cria obstáculos a que o contribuinte possa exercer suas atividades, deixando assim de gerar o numerário necessário ao pagamento dos tributos reclamados, além de desatender, no caso de empresas e profissionais, ao fato de que cria obstáculo á prática e desenvolvimento de suas atividades e á geração de empregos. Em outras palavras, “mata a galinha dos ovos de ouro”. 6) À luz da Constituição, é possível instituir validamente a execução do crédito tributário por autoridade diversa da jurisdicional? A administração tributária desempenha papel fundamental para que o Estado possa exercer suas funções e atingir os objetivos a que se propõe e que, no caso do Brasil, estão elencados no art. 3º da Constituição Federal, quais sejam o de construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor idade e quaisquer outras formas de discriminação. Atingir esses objetivos, ou, ao menos, lutar por eles, exige que a administração tenha, como disse Otelo a Iago, na locução que lhe deu Shakespeare, que tenha ela “os cordões da bolsa”, de forma a poder proporcionar os fundos necessários a perseguir esses desígnios. 17 MACHADO, Hugo de Brito. Sanções Políticas no Direito Tributário “in” Revista Dialética de Direito Tributário, nº 30/46. 14 Esse papel é afirmado, para as administrações tributárias, pelo art. 37, inciso XXII da Lei Maior, onde se inscreve: “XXII – as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou convênio.” Não somente neste passo se estatui ser a administração tributária atividade essencial ao funcionamento do Estado, mas também no inciso XVIII se reforça a asserção, pois ali se determina: “XVIII – A administração fazendária e seus servidores fiscais terão, dentro de suas áreas de competência e jurisdição, precedência sobre os demais setores administrativos, na forma da lei.” Precedência que significa prioridade, dado que arrecadação e é o sangue que flui nas veias do Estado. o resultado da Papel assim fundamental, essencial e imprescindível, no Estado Democrático de Direito, não pode a decisão sobre as atividades e resultado dessa administração tributária ser atribuída a outra autoridade, senão a judiciária, que se reveste das garantias de independência e imparcialidade, outorgadas a seus membros pelo art. 95 da Constituição, a quem se assegura ainda a autonomia administrativa e financeira, a teor do art. 99, justamente para que possa atuar o Poder Judiciário com o desassombro necessário para executar sua missão, dentro dos parâmetros constitucionais, sem receio ou temor da ingerência dos demais Poderes da nação, em especial do Executivo, que detém os cordões da bolsa. Advirta-se que, a se admitir a atribuição da execução a outras autoridades, desprovidas das garantias constitucionais inerentes ao Poder Judiciário, estaremos a um passo de regredir às priscas eras, em que a arrecadação dos tributos era arrematada por contratadores. A instituição da execução judicial, seja a tributária, seja qualquer outra, por outra autoridade, representaria a nosso ver o fim do Estado Democrático de Direito. 15 CONSIDERAÇÕES GERAIS Já por nos acenada no curso desse trabalho, cabe-nos neste passo afirmar que mesmo a LEF, nos dias atuais, está a merecer reparo, pois a passagem do tempo entre a sua edição, em 1980 e os dias atuais (quase 30 anos) mostra que o aparelhamento das administrações fiscais e suas procuradorias tornou-se infinitamente superior ao da época de sua concepção, atualizadas e compostas por elementos de sólida formação cultural e jurídica, de tal modo que a sua representação judicial apresenta-se como perfeitamente apta a desempenhar suas funções, quase sempre em nível superior á da imensa maioria dos contribuintes. Por esse motivo, privilégios que a lei em tela destina à Fazenda não mais encontram razão de ser, principalmente quando se atenta para o princípio de igualdade das partes na relação processual. RESUMO FINAL Para facilitar os trabalhos do Simpósio, resumimos a seguir nossas respostas às indagações formuladas, como segue: 1) À luz da Constituição (art. 5º, inciso LV), seria possível a legislação infraconstitucional reduzir o conceito de “ampla defesa administrativa e judicial”, refletido na legislação ordinária em vigor em 5 de outubro de 1988? Trata-se de conceito flexível, subordinado à legislação ordinária, ou os meios então existentes não poderiam ser restringidos, sob pena de violação à ampla defesa constitucionalmente assegurada? R – O conceito de ampla defesa administrativa e judicial refletido na legislação ordinária em vigor na data da constituição não pode ser restringido de qualquer forma, podendo, isto sim ser ampliado. Na verdade, é corolário do princípio do devido respeito á lei, consagrado como direito individual no art. 5º da Lei Magna. 2) A Lei 11.382/06, que alterou as disposições do CPC sobre execução de títulos extrajudiciais, revogou a Lei 6.830/80? Considerando a resposta ofertada, os embargos à execução fiscal possuem efeito suspensivo? Qual o prazo para sua interposição? R – Não. A LEF mantém-se íntegra, pois se trata de lei especial que a lei geral – o CPC - não veio alterar. Destarte os embargos à execução fiscal continuam sob sua regência tendo efeito suspensivo, sendo o prazo para sua interposição o previsto na LEF, ou seja, 30 dias. 16 3) É válido proceder à penhora “on line” antes de intimado o contribuinte para promover a garantia do juízo? R – Não. A citação é uma das conquistas do processo moderno, que se constitui em meio de se evitar o conflito pela posse de um determinado bem. Permitir o desapossamento de um bem antes mesmo de se saber da existência da pretensão contrária significa outorgar o poder de fazer justiça com as próprias mãos, aceitável na pré–história, quando o homem das cavernas não tinha organização social que o amparasse, ou nos tempos do velho oeste. Não nos dias atuais, senão em casos excepcionais. 4) Como deve ser interpretada a Súmula 317 do STJ (“É definitiva a execução de título extrajudicial, ainda que pendente de apelação contra sentença que julgue improcedentes os embargos”)? Caso o recurso do devedor seja provido e a Fazenda Pública venha a resultar definitivamente vencida, como deverão ser ressarcidos os prejuízos causados ao contribuinte? Que verbas devem compor esse ressarcimento? O pagamento dessa indenização está sujeito ao disposto no art. 100 da CF? R - A Súmula 317 afigura-se-nos totalmente inconstitucional, pois equivale à usurpação do Poder legislativo pelo Judiciário, transformando em coisa julgada definitiva o que definitivo não é. Os prejuízos causados por sua aplicação deverão ser ressarcidos em sua totalidade, de forma imediata, cabendo formular-se solução legal para sua concretização. As verbas que deverão compor esse ressarcimento deverão atender aos danos materiais, morais e aos lucros cessantes. O mandamento do art. 100 infelizmente não pode ser ignorado, passível, no entanto a verba correspondente de compensação, a ser refinada através de lei ordinária, no âmbito federal, ou mesmo de lei complementar, que entendemos perfeitamente cabível para ter sua aplicação estendida aos demais entes federados. 5) Pode o fisco a despeito das prerrogativas que cercam a cobrança do crédito tributário, aplicar sanções políticas ao devedor, tais como levar a protesto a certidão da dívida ativa ou determinando a inclusão de seu nome no SERASA? R – De modo algum. As sanções políticas não encontram respaldo na Constituição, conforme inúmeras manifestações do Judiciário, devendo, mesmo ser objeto de mais severa repressão. 17 6) À luz da Constituição, é possível instituir validamente a execução do crédito tributário por autoridade diversa da jurisdicional? R – Não. A função jurisdicional caracteriza-se por sua imparcialidade e independência, não se podendo atribuí-la a outrem que não ao Poder Judiciário, guardião e último reduto de defesa dos mandamentos constitucionais que representam o desejo do povo. Campinas, 27 de março de 2008. 18
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