Efeitos das Práticas Restritivas sobre Economia Brasileira, e a

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Efeitos das Práticas Restritivas sobre Economia Brasileira, e a
C at e g o r i a E s t u d a n t e s
de
Graduação
Tema
Defesa da Concorrência
3o Lugar
Efeitos das práticas restritivas sobre a economia
brasileira e a repressão às condutas anticoncorrenciais
Erick Viana Salomão Nassif
Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais e Diretor Jurídico na Dilasa Distribuidora de Bebidas
517
Agradecimentos
Todo escritor deve sua obra a uma infinidade de indivíduos. Aos autores consultados, eternas fontes de conhecimento
e arquitetos de idéias. Aos profissionais de revisão e editoração,
guardiães da qualidade. Aos familiares e amigos, pela paciência
e compreensão.
Agradeço ainda ao Professor Daniel Rocha Corrêa a quem
devo não somente a orientação e instrução necessárias a conclusão desta obra, mas grande parcela do interesse que hoje possuo
pelo direito da economia.
519
Resumo
Esta monografia tem seu conteúdo fundado na análise das diversas práticas
restritivas utilizadas por empresas no Brasil. Foi realizado o levantamento bibliográfico acerca de sua conceituação, efeitos mais comuns e impactos desses efeitos na economia do país. Diante dos dados coletados, foi realizado um estudo de casos julgados
pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), bem como pelas autoridades norte-americanas e europeias de defesa da concorrência, com o objetivo de analisar até que ponto a posição dominante ocupada por determinada empresa influi na
análise da licitude das práticas restritivas por ela adotadas. Os resultados demonstram
que as práticas restritivas adotadas por empresas que se encontram em situação de
posição dominante no mercado são analisadas com maior escrutínio graças ao maior
potencial de impacto na economia. Não obstante a análise mais minuciosa, observase que a regra da razão, que sopesa os prejuízos e as eficiências da prática restritiva
adotada, no contexto do mercado em que se insere ainda é mais utilizada como marco
delimitador da licitude. Este estudo é crucial para determinar a integridade, a solidez
e a justiça do processo de análise das condutas antitruste em nosso país.
Palavras-chave: práticas restritivas; posição dominante; regra da razão.
Defesa
da
Concorrência
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Sumário
1 Introdução
525
2 Conhecimentos prévios relevantes
526
2.1 Práticas restritivas
526
2.1.1 Práticas restritivas verticais
527
2.1.2 Práticas restritivas horizontais
528
2.2 Mercado relevante
529
2.3 Poder de mercado
530
2.4 A regra da razão
532
2.5 Eficiência
535
3 Práticas restritivas mais comuns e seus efeitos
3.1 Formas comuns de práticas restritivas horizontais
537
537
3.1.1 O cartel
537
3.1.2 Preços predatórios
540
3.1.3 Abuso de posição dominante
542
3.1.4 Ilícitos de associações profissionais
543
3.1.5 Outros acordos entre empresas
545
3.2 Formas comuns de práticas restritivas verticais
548
3.2.1 Fixação dos preços ou condições de revenda
548
3.2.2 Restrições territoriais e de base de clientes
549
3.2.3 Acordos de exclusividade
551
3.2.4 Recusa de negociação
553
3.2.5 Venda casada
555
3.2.6 Discriminação de preços
557
4 Análise de casos
559
4.1 AmBev vs. Schincariol
559
4.2 Estados Unidos vs. Microsoft
562
5 Conclusão
565
Referências
566
523
Lista de abreviaturas
Art.
artigo
Cf.
confer
Ed.
edição
Etc.
et cetera
Ltda.
limitada
N.
número
Org.
organizadora
P.
página
Rel.
relator
V.
volume
Vs.
versus
Lista de siglas
Cade
DNPDE
Conselho Administrativo de Defesa Econômica
Departamento Nacional de Proteção e Defesa Econômica
FTC
Federal Trade Comission
PA
Processo administrativo
S.A.
Sociedade anônima
SDE
Secretaria de Direito Econômico
Seae
UE
Ufir
UFMG
UK
Secretaria de Acompanhamento Econômico
União Europeia
Unidade Fiscal de Referência
Universidade Federal de Minas Gerais
United Kingdom
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Efeitos das práticas restritivas sobre a economia brasileira e a repressão às condutas anticoncorrenciais
Erick Viana Salomão Nassif
1 Introdução
Cada vez mais as empresas brasileiras utilizam métodos para obter vantagens
no mercado em que atuam. Essas condutas, muitas vezes, advêm de atos legais e até
mesmo saudáveis, decorrentes da própria concorrência, e que não só impulsionam
o desenvolvimento de produtos como também contribuem para equilibrar a relação
entre empresas e consumidores.
No entanto, a busca por vantagens mercadológicas por vezes se resume a atos
nocivos à concorrência. As práticas restritivas são atos que se encontram em uma área
limítrofe entre a ilicitude e a legalidade. Isso ocorre porque sua utilização, per se não
constitui ilícito, devendo ser coibida apenas quando gera efeitos anticoncorrenciais
que afetam negativamente a economia e o mercado em geral.
São definidas como práticas restritivas horizontais todas aquelas que impliquem acordo entre concorrentes para cooperar entre si. Essa modalidade de restrição
tem sido historicamente vista com maior receio, pois frequentemente traz consigo um
enorme potencial de dano ao consumidor. No entanto, não podemos ignorar o fato de
que tal acordo será válido e até mesmo saudável ao mercado em ocasiões específicas.
Entende-se por práticas restritivas verticais, ao contrário das horizontais, os
acordos entre os agentes que atuam em uma mesma cadeia de produção, desde a
fabricação/colheita, passando pela distribuição e pelo ponto de venda varejista, até
chegar ao consumidor final. Esse acerto entre agentes de uma mesma cadeia poderá
também ser lícito ou ilícito, dependendo da forma como é realizado e dos fins almejados, dentre outros fatores.
Condutas como o cartel e a fixação de preços constituem exemplos clássicos
de práticas restritivas que poderão, ao sabor das circunstâncias e dos efeitos que produzam, ser lícitas ou não. Como esse é um fenômeno relativamente recente em nossa
realidade, seu estudo é fundamental para que as decisões proferidas em processos
que contenham esse tipo de questão possam ser tomadas com o maior número de
informações possíveis.
A compreensão dos efeitos positivos e negativos de uma determinada conduta
classificada como prática restritiva irá garantir a justiça da decisão acerca da matéria
e evitar que se proíbam atos aparentemente nocivos que, em última análise, trariam
benefícios em maior quantidade e/ou qualidade à população.
É inegável a importância da apreciação de tais condutas para o perfeito funcionamento e a perpetuação do mercado, tendo, atualmente, as decisões do Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade) o condão de impactar profundamente a
economia do país. Este trabalho procura entender melhor a adoção das práticas restritivas e a visão dos órgãos de defesa da concorrência como representantes do Estado
no papel de regulador econômico.
Defesa
da
Concorrência
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Esta monografia analisará as diversas práticas restritivas reprimidas pela legislação brasileira, seus efeitos, sua licitude e de que forma o Cade tem atuado para
coibir eventuais abusos que por sua vez geram consequências nefastas para a economia pátria.
Assim, o objetivo deste trabalho é demonstrar a possibilidade de efeitos positivos na adoção de práticas restritivas em determinados cenários econômicos e a necessidade de se contrapor, no caso concreto, os prejuízos e as eficiências advindas da
adoção de tais condutas para que estas sejam consideradas ilícitas, sempre levando em
conta o impacto final sobre o consumidor. Para tanto, consideramos elementos-chave
na compreensão dos temas centrais, como o mecanismo de definição de mercados relevantes, os conceitos de poder, mercado e práticas restritivas, bem como a tendência
atual de utilização da regra da razão em contraposição à regra da ilegalidade per se.
Em um segundo momento, nós nos atemos à verificação dos efeitos potenciais,
tanto positivos quanto negativos, introduzidos na economia com a adoção das práticas
restritivas reprimidas por nosso ordenamento.
Por fim, propomos a análise de alguns julgados atuais que ganharam grande
repercussão social para entendermos in casu o processo de verificação dos efeitos e a
consequente repressão às condutas tidas como ilícitas.
Concluímos que todas as práticas contempladas têm potencial para gerar eficiências em nossa economia, algumas mais que outras, o que impossibilita, em tese, a
adoção da regra da ilegalidade per se na análise da licitude dessas condutas.
2 Conhecimentos prévios relevantes
Esta seção visa abordar alguns conceitos de termos e expressões envolvidos no
trabalho, no entanto, devido à riqueza de detalhes existentes neste apaixonante microcosmo que é a defesa da concorrência, optamos por explanar tão somente o essencial à
compreensão do ponto central em questão, qual seja, o processo de análise da licitude
das práticas restritivas e a influência da posição dominante ocupada pelas empresas
sobre essa análise. É importante ressaltar que cada tópico desta seção daria por si só
um robusto tema de pesquisa, sendo assim optamos pelo anteriormente citado.
2.1 Práticas restritivas
O termo “práticas restritivas” define todo e qualquer ato econômico que importe no acertamento de condutas entre agentes econômicos e leve à restrição da liberdade individual de cada um dos participantes do acordo em prol do interesse coletivo
de todos ou da maioria deles.
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Gordon Marshall (1998, tradução nossa), em seu Dicionário de sociologia, conceitua práticas restritivas como “um acordo ou trato comercial ou industrial que promove a restrição da livre competição, ainda que esteja dentro da legalidade”.1
Raramente as restrições à concorrência são tratadas de forma conjunta, podendo ser observada frequentemente a separação dos atos em dois grandes grupos que os
definem melhor. São eles: práticas restritivas verticais e práticas restritivas horizontais.
2.1.1 Práticas restritivas verticais
O Anexo I da Resolução n. 20 (BRASIL, 1999f) do Cade define brilhantemente
o significado do termo práticas restritivas verticais, lê-se naquele texto:
As práticas restritivas verticais são restrições impostas por produtores/ofertantes de bens ou serviços em determinado mercado (“de origem”) sobre
mercados relacionados verticalmente – a “montante” ou a “jusante” – ao
longo da cadeia produtiva (“mercado-alvo”) (CADE, 1999).2
Como se verifica pela legislação pátria, as restrições verticais não ocorrem
entre agentes que em um cenário econômico normal se veriam em posição de concorrência natural, ao contrário, verifica-se que esses atos são praticados ao longo de
uma cadeia produtiva por agentes que, presumivelmente, operariam sob um regime
de cooperação para maximizar os resultados de sua atividade.
A definição mencionada na lei ensina também que há práticas restritivas que
se desenvolvem tanto do produtor para o consumidor, passando pela estrutura de distribuição e pelo ponto de venda final, como de práticas que se desenrolam no sentido
contrário, ou seja, impostas pelos distribuidores aos produtores. Tal fato é observado
principalmente quando há a constituição de um oligopsônio forte em face de uma
cadeia de produtores mais fraca e menos organizada, o que leva invariavelmente a um
aumento unilateral de poder de mercado por quem detém toda ou grande parte da
capacidade de escoamento/distribuição da produção.
Há diferentes formas de práticas restritivas verticais, bem como diversos efeitos decorrentes de sua prática, sejam eles acidentais sejam propositais. Esse tópico será
tratado mais pontualmente adiante.
1 “ An industrial and commercial agreement or arrangement which operates in restraint of free competition even though it may be
within the law” (MARSHALL, 1998).
2 Denominam-se práticas no mercado a jusante aquelas que seguem o fluxo normal de escoamento da produção, isto é, que se
desenrolam do fornecedor para o comprador. As práticas que seguem sentido inverso, ou seja, impostas pelo comprador ao
fornecedor, são denominadas práticas no mercado a montante.
Defesa
da
Concorrência
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2.1.2 Práticas restritivas horizontais
A definição dessa modalidade de ação econômica é dada pelo Cade da seguinte
forma:
As práticas restritivas horizontais consistem na tentativa de reduzir ou eliminar a concorrência no mercado, seja estabelecendo acordos entre concorrentes no mesmo mercado relevante com respeito a preços ou outras
condições seja praticando preços predatórios. Em ambos os casos visa, de
imediato ou no futuro, em conjunto ou individualmente, ao aumento de
poder de mercado ou à criação de condições necessárias para exercê-lo
com maior facilidade (CADE, 1999).
A “autorização” de uma prática restritiva horizontal na economia sempre foi
vista com receio pelos operadores do direito e pelos analistas econômicos. A própria
natureza do instituto, quando analisada superficialmente, passa a impressão de ilicitude absoluta, de infração sumária à livre concorrência, no entanto cabe aos envolvidos
no processo decisório uma análise mais aprofundada do plano em que essas práticas
são instituídas. A economia moderna apresenta-nos uma gama de cenários tão complexos que, em algumas situações, mesmo as ações concertadas entre concorrentes são
válidas e devem ser consideradas lícitas, ou seja, um mal menor quando contrapostas
com sua não realização.
A prática restritiva horizontal por excelência é o cartel. Por ser considerada
uma infração de enorme potencial lesivo, o combate aos cartéis tem se intensificado
em todo o mundo, em parte pela dificuldade de se enxergar nessa prática algum ganho
efetivo à concorrência. No entanto, devemos nos perguntar se o combate a um cartel
que não gera eficiências nem danos é salutar. Elisa Silva de Assis Ribeiro (2009, p.
140) trata desse assunto:
Deve-se questionar, entretanto, qual é a justificativa de se alocar escassos
recursos públicos em uma investigação de cartel que não possa produzir
danos efetivos ao mercado, como, por exemplo, em uma combinação entre alguns agentes econômicos que atuam em um mercado pulverizado e
facilmente contestável.
E continua:
Esse questionamento ganha importância para a aplicação da lei brasileira
de defesa da concorrência, que consagra expressamente a regra da razão ao
tipificar como infração somente aquela conduta capaz de causar os efeitos
danosos ao mercado previstos em seu art. 20 (RIBEIRO, 2009, p. 140).
Partilhamos do entendimento da autora, mormente no que diz respeito à impossibilidade de configuração da infração à concorrência sem a ocorrência de danos
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a esta. No caso do cartel, é perfeitamente aceitável que fique provada a reunião dos
agentes bem como a conduta concertada. Contudo, entendemos que se o parâmetro
para a definição da ilicitude de uma conduta são os potenciais efeitos gerados no mercado, ainda que acidentais, a inexistência desses efeitos, mesmo que expressamente
pretendidos, não ensejará nenhuma sanção, exatamente pela ausência do dano.
2.2 Mercado relevante
A delimitação do mercado relevante é um dos principais passos na apreciação
de condutas pelo Cade e ocorre em duas frentes: a geográfica, na qual se apura o espaço físico potencialmente impactado pela prática restritiva ou ato de concentração;
e a do produto, que é a demarcação de qual ou quais categorias de produtos serão
afetadas pela mudança.
A definição desse passo na análise processual das questões pelo Cade é dada
na Resolução n. 15/1998 (BRASIL, 1998e) deste órgão, que traz a seguinte redação:
Um mercado relevante do produto compreende todos os produtos/serviços
considerados substituíveis entre si pelo consumidor devido às suas características, preços e utilização.
[...]
Um mercado relevante geográfico compreende a área em que as empresas
ofertam e procuram produtos/serviços em condições de concorrência suficientemente homogêneas em termos de preços, preferências dos consumidores e características dos produtos/serviços. A definição de um mercado
relevante geográfico exige também a identificação dos obstáculos à entrada
de produtos ofertados por firmas situadas fora dessa área (CADE, 1998).
Para Pondé, Fagundes e Possas (2010), mercado relevante é:
[...] o menor mercado, em termos de produto e geográfico, no qual o exercício de poder de mercado é possível, por meio de ações coordenadas ou
unilaterais das empresas. É intenção dessa definição que o mercado relevante seja definido de forma tal que o suposto exercício de poder de mercado que se busca prevenir seja, antes de mais nada, logicamente possível.
Como se pode perceber, um estudo aprofundado do número de empresas
atuantes em determinado setor, da dispersão de market share3 entre elas, das barreiras
à entrada de novos competidores, entre outros fatores, faz-se necessário para uma
correta estimativa do mercado relevante.
3 M
arket share em tradução literal significa “parcela de mercado”, sendo um termo comumente utilizado na economia para definir
a proporção ou a porcentagem de um determinado mercado atendido por uma determinada empresa, definindo-se com isso o
nível de participação de uma empresa na atividade total daquele mercado.
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da
Concorrência
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Nas palavras de Leopoldino da Fonseca (2007, p. 173): “O problema de delimitação do mercado relevante está inserido na questão de mensuração adequada da
concentração de mercado e na identificação da concorrência potencial e efetiva”.
Caso clássico que ilustra a delimitação do mercado relevante geográfico envolve as empresas que atuam no ramo de produção de concreto. O concreto pronto
precisa manter-se em constante movimento para que não seque. Ainda assim, sua vida
útil fora da localização final não ultrapassa duas horas. Após esse período, o concreto
não pode mais ser lançado na construção, portanto as práticas restritivas de uma companhia de usinagem de concreto não irão influenciar os mercados que se encontrem
a mais de 120 minutos de distância da sede desta empresa, pois sua atividade não
alcança esses mercados.
No julgamento do Ato de concentração n. 08012.000529/00-98 (BRASIL,
2001), entre os produtores de cimento Tupi, Votorantim, CP Cimento e Santo Estevão,
debateu-se qual seria o mercado relevante geográfico. As requerentes apresentaram a
região Sudeste como seu mercado relevante por comercializarem apenas nos estados
dessa região. A Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), por sua vez, reduziu o mercado geográfico à cidade de São Paulo, seguindo o entendimento de que
apenas ali as requerentes atuavam simultaneamente. Por fim, o relator acatou a tese
das requerentes por verificar que estas importavam grandes quantidades de cimento
dos outros estados da Região Sudeste, portanto a concentração atingiria o mercado de
cimento também nesses estados em virtude da absorção de parte da oferta de cimento
dessas regiões.
As diretrizes para o cálculo de mercado relevante mais utilizadas são fornecidas no Anexo II, da Resolução n. 20 do Cade (BRASIL, 1999f). O teste aponta a
possibilidade ou não de uma empresa hipotética deter o monopólio da venda de
determinado produto em uma determinada área e elevar o preço deste bem acima do
preço de mercado por meio da resposta dos consumidores ao aumento.
Se, diante do aumento, a provável reação dos consumidores for trocar de produto, ou ainda buscá-lo em outra região livre do monopólio da empresa hipotética,
restará provado que a empresa não possui um poder de mercado significativo sobre
essa área/produto. Assim, conclui-se que o mercado relevante de produtos mede a
eventual possibilidade de substituição de um produto por outro semelhante (considerando-se o preço, a qualidade e a necessidade atendida pelo produto), enquanto o
mercado relevante geográfico mede até onde o poder de mercado pode ser exercido.
2.3 Poder de mercado
O conceito de poder de mercado está fortemente ligado ao conceito de mercado relevante e pode ser definido como a capacidade de uma determinada empresa
de manter os preços de seus produtos acima dos níveis normais de concorrência sem
que isso afete seus lucros em um mercado.
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A conselheira-relatora Lúcia Helena Salgado e Silva (BRASIL, 1998a), em voto
proferido no julgamento do Ato de Concentração n. 84/1996, presta um valioso esclarecimento sobre a matéria. Segundo ela:
O poder de mercado se define pela possibilidade de uma firma agir independentemente de seus competidores e clientes e de comandar preços e
excluir competidores. À determinação do poder de mercado exige-se (a)
a correta definição de mercado relevante, (b) o cálculo das participações e
da concentração de mercado, (c) a verificação da existência de barreiras à
entrada e o grau de contestabilidade pela concorrência potencial; e (d) a
verificação da existência de fontes alternativas de oferta.
Para Calixto Salomão Filho (2007), uma empresa eleva seu poder de mercado
por meio de diversos fatores, como barreiras excessivas à entrada no setor, nível tecnológico acima dos concorrentes (o que se traduz em produto de maior qualidade),
marca forte, além de outros que fortaleçam a posição concorrencial do agente econômico. É razoável afirmar que quanto mais equilibrada for a concorrência, menor será a
possibilidade de determinada companhia se utilizar do poder de mercado. A tentativa
de elevação artificial de preços em um ambiente de forte concorrência faria com que
os consumidores passassem a comprar outras marcas, diminuindo a lucratividade da
empresa que promoveu a mudança.
Em ambientes de concorrência fraca, nos quais não é possível encontrar vários
produtos de um mesmo segmento, a empresa teria maior facilidade de exercício do
poder de mercado e até mesmo do seu abuso, uma vez que a possibilidade de substituir o produto que sofreu aumento artificial é menor.
É importante ressaltar que na análise da substituibilidade de um produto devem ser considerados todos os seus aspectos, tais como qualidade, disponibilidade
e preço. Um produto de mesma qualidade, porém de preço demasiadamente díspar,
nem sempre garantirá a substituibilidade, assim como não a garantem os produtos de
preço e qualidade próximos que não podem ser encontrados no mercado. A Resolução
n. 20 do Cade (BRASIL, 1999f), que regula o procedimento de avaliação dos atos de
concentração, requer especificamente em seu Anexo IV a prestação de informações
acerca da substituibilidade do produto das empresas em processo de concentração.
As requerentes precisam informar, por exemplo, quais são e quem fornece os
produtos substitutos; por que esses produtos são candidatos à substituição; qual preço permitiria ao consumidor tal substituição e qual a disponibilidade desse produto
no mercado, bem como os aumentos nos custos para comercialização do substituto,
como frete, armazenagem, etc.
O simples fato de uma empresa possuir poder de mercado não significa uma
infração à concorrência. O § 4º do art. 173 da Constituição da República contém
uma norma mandamental com o seguinte teor: “§ 4º A lei reprimirá o abuso do poder
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da
Concorrência
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econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao
aumento arbitrário dos lucros” (BRASIL, 2009b, p. 66). A verdadeira infração está no
abuso do poder econômico e não em sua aquisição, mormente quando esta se der de
forma natural por processos mercadológicos legítimos, conforme dispõe o § 1º do art.
20 da Lei n. 8.884/1994, senão vejamos: “§ 1º A conquista de mercado resultante de
processo natural fundado na maior eficiência de agente econômico em relação a seus
competidores não caracteriza o ilícito previsto no inciso II” (BRASIL, 1994). Por óbvio,
travar o desenvolvimento de empresas eficientes para que estas não adquiram poder
de mercado não configura ação lógica, tampouco consoante ao princípio constitucional da livre iniciativa, inscrito no art. 170 daquele diploma.
Esse posicionamento é respaldado pelo voto do conselheiro-relator Luiz Alberto
Esteves Scaloppe (BRASIL, 2005) no Processo Administrativo n. 08012.005561/199972 iniciado pela Seae em face da farmacêutica Novo Nordisk. Vejamos a seguinte
passagem:
Diante disso, não há de ser considerada ilícita a concorrência oferecida por
agente econômico que conquistou seu poder de mercado com base em
uma vantagem competitiva. Em outras palavras, a mera posição dominante
não é punida por si só, porém apenas quando capaz de provocar prejuízo
à livre concorrência, não quando ocorre mera eliminação de concorrentes
por processo natural, revelando-se a empresa a mais capacitada e eficiente
na conquista dos consumidores. No caso em análise, a posição monopolista da representada no mercado relevante resultou de suas próprias eficiências, da inovação do produto por ela oferecido (BRASIL, 2005).
Certo é que, quando ocorre abuso dessa capacidade, sofrem em maior grau os
consumidores que muitas vezes são lançados subitamente em uma situação de impotência ante as arbitrariedades da empresa abusiva, principalmente quando se trata de
produtos de primeira necessidade.
2.4 A regra da razão
A licitude das práticas restritivas, tanto horizontais como verticais, está vinculada, de um lado, aos danos potenciais que fará surgir na concorrência do setor, e de
outro, às eficiências eventualmente trazidas a ele e que, muitas vezes, ultrapassam os
malefícios criados, é a chamada “regra da razão”, princípio geral do direito econômico
que norteia a análise das condutas.
A regra da razão vem do legado introduzido pela Análise Econômica do Direito com a Escola de Chicago. Trata-se da lógica aplicada pelos órgãos judicantes de
infrações à concorrência pela qual uma conduta é considerada ilícita quando seus prejuízos à economia ultrapassam as eficiências geradas no mercado. Nos ensinamentos
de Leonardo Vizeu Figueiredo (2009, p. 221), o instituto é visto da seguinte forma:
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A regra da razão traduz-se, portanto, em instituto de hermenêutica teleológica, por meio da qual a eficácia restritiva de concorrência de determinado ato, a princípio abusivo, é confrontada com seus efeitos futuros,
em seu respectivo mercado relevante. Assim, quando se verificar que tais
efeitos traduzir-se-ão em fatores promotores da concorrência, ou, ainda,
serão efeitos ditos pró-competitivos, tal prática passa a ser razoável, sendo
mantida sua plena validade e eficácia.
Nota-se pela definição do autor que a regra da razão se contrapõe à regra da
ilicitude per se. Por esta última, a análise de algumas condutas previamente taxadas
como ilícitas dispensaria aprofundamento nas condições do mercado e limitar-se-ia
à verificação da ocorrência ou não da conduta tida como ilícita. Uma vez apurada a
ocorrência, restaria configurada a infração. Essa visão torna-se cada vez mais obsoleta diante da complexidade da economia hodierna e da possibilidade de se extrair
ganhos até mesmo de práticas restritivas historicamente consideradas ilícitas per se.
Sobre esse assunto, discorre novamente Elisa Silva de Assis Ribeiro (2009, p. 140):
A Escola de Chicago introduz na aplicação das leis antitruste a importante
contribuição da análise econômica do direito como instrumento de interpretação e, mais ainda, a concepção de que algumas condutas tidas como
ilícitas per se podem gerar ganhos de eficiência ou simplesmente não gerar
prejuízos, não justificando a intervenção do Estado.
O tratado que institui a Comunidade Europeia trata da questão de modo interessante, primeiramente dispõe expressamente em seu art. 81, 1, sobre a ilicitude de:
[...] todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de
empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis de afetar
o comércio entre os Estados membros e que tenham por objetivo ou efeito
impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum [...] (COMUNIDADE EUROPEIA, 2002).
Em primeira análise, poderia nos parecer que a União Europeia optara pela
regra da ilicitude per se. No entanto, passada a proibição inicial, o mesmo art. 81, 3,
traz hipóteses de inaplicabilidade da proibição supracitada desde que atendidas certas
condições, senão vejamos:
3. As disposições no n. 1 podem, todavia, ser declaradas inaplicáveis:
– a qualquer acordo, ou categoria de acordos, entre empresas;
– a qualquer decisão, ou categoria de decisões, de associações de empresas; e
– a qualquer prática concertada, ou categoria de práticas concertadas, que
contribuam para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou
para promover o progresso técnico ou econômico, contanto que aos utilizadores se reserve uma parte equitativa do lucro daí resultante e que:
Defesa
da
Concorrência
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a) não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis à consecução desses objetivos;
b) nem deem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência
relativamente a uma parte substancial dos produtos em causa. (COMUNIDADE EUROPEIA, 2002).
Torna-se patente a utilização da regra da razão na apreciação de todas as práticas concertadas, conforme preceitua o n. 3 do art. 81 do tratado mencionado anteriormente, explicitando com isso a possibilidade de geração de eficiências em todas as
formas de práticas restritivas.
A legislação brasileira reconhece a mesma lógica. A redação do art. 27 da Lei
n. 8.884/1994 traz os tópicos relevantes à imposição da pena decorrente de infração à
concorrência. Os incisos V e VI lançam foco especial sobre a regra da razão, dispõem
que na aplicação de pena se deve levar em conta os efeitos negativos produzidos no
mercado pela conduta da empresa (VI) e o grau de lesão aos consumidores, à concorrência, à economia ou a terceiros (V). Consolida-se o entendimento com a leitura do
art. 54 e § 1º e 2º da mesma lei, que dizem:
Art. 54. Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou
de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços deverão ser submetidos à
apreciação do Cade.
§ 1º O Cade poderá autorizar os atos a que se refere o caput, desde que
atendam às seguintes condições:
I - tenham por objetivo, cumulada ou alternativamente:
aumentar a produtividade;
melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou
propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico;
II - os benefícios decorrentes sejam distribuídos equitativamente entre
os seus participantes, de um lado, e os consumidores ou usuários finais,
de outro;
III - não impliquem eliminação da concorrência de parte substancial de
mercado relevante de bens e serviços;
IV - sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os
objetivos visados.
[...]
§ 2º Também poderão ser considerados legítimos os atos previstos neste
artigo, desde que atendidas pelo menos três das condições previstas nos incisos do parágrafo anterior, quando necessários por motivos preponderantes da economia nacional e do bem comum, e desde que não impliquem
prejuízo ao consumidor ou usuário final (BRASIL, 1994).
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Efeitos das práticas restritivas sobre a economia brasileira e a repressão às condutas anticoncorrenciais
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O Brasil, assim como a UE, redigiu sua legislação de defesa da concorrência
proibindo as condutas para posteriormente criar exceções que, em determinados cenários, serão capazes de excluir a ilicitude da ação.
Nos Estados Unidos, como bem observa Leopoldino da Fonseca (2007), a regra da razão foi adquirindo relevância à medida que os precedentes jurídicos daquele
país se foram consolidando como paradigmas para o julgamento de casos relacionados
às práticas restritivas.
O autor cita ainda o posicionamento dos juízes White e Harlan, ambos da
Suprema Corte americana. Para o primeiro, a aplicação da regra da razão decorre naturalmente do processo de construção da norma, sob o qual é impossível a aplicação da
lei antitruste sem o enfoque da razoabilidade, haja vista que o objetivo final de toda lei
é o interesse público, interesse este que nem sempre será violado por todos os atos de
concentração e/ou práticas restritivas. O segundo entende que a aplicação da regra da
razão traria um grau elevado de subjetivismo e insegurança jurídica ao ordenamento,
alegando: “A defesa da razoável restrição seria feita em qualquer caso e haveria tantas diferentes regras da razoabilidade quantos são os casos, as cortes e os juízes [...]”
(ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA apud LEOPOLDINO DA FONSECA, 2007).
Não obstante o entendimento do juiz Harlan acerca da subjetividade da regra
da razão, persistimos com a convicção de que a ilicitude per se não possui o dinamismo requerido para que uma legislação antitruste seja aplicada atualmente.
2.5 Eficiência
A existência de eficiências econômicas atreladas à utilização de uma prática
restritiva é a grande justificativa utilizada pelas empresas para a licitude de sua conduta. Sucintamente, pode-se definir o conceito de eficiência como toda consequência
positiva de um ponto de vista econômico advinda da efetiva ou potencial aplicação de
um ato econômico4 ao mercado.
A Resolução n. 15 (BRASIL, 1998e) do Cade traz a seguinte definição:
Entende-se por eficiências aquelas reduções de custos de qualquer natureza, estimáveis quantitativamente e intrínsecas ao tipo de operação de que se
trata, que não poderiam ser obtidas apenas por meio de esforço interno.
Salomão Filho (2007) chama a atenção para uma diferenciação na doutrina
moderna. Segundo ele, há uma distinção entre eficiência alocativa e eficiência produtiva. A eficiência alocativa relaciona-se com o modo com que o ganho de bem-estar se
difunde na sociedade e representa a melhora para os consumidores de um determinado produto. Essa melhora pode se dar por meio da redução de preços, do crescimento
da disponibilidade destes, da melhora de serviços pós-venda, etc. Segundo o autor,
4 Por ato econômico entende-se tanto as concentrações empresariais quanto as restrições verticais e/ou horizontais.
Defesa
da
Concorrência
535
“[...] verificar se existe eficiência alocativa é simplesmente determinar se os recursos
estão empregados naquelas atividades que os consumidores mais apreciam ou necessitam” (SALOMÃO FILHO, 2007, p. 198-199).
A eficiência produtiva, por sua vez, é aquela focada na utilização da capacidade e dos recursos produtivos de uma determinada empresa e contempla as reduções
de custos de produção, seja pelo crescimento de escala5 seja pela redução do custo de
pesquisa e desenvolvimento, entre outros fatores.
Teoricamente, não seria relevante para o direito econômico a questão que envolve o destinatário das eficiências geradas, no entanto muito se discute na doutrina
sobre a necessidade da transferência do ganho de bem-estar gerado para as empresas
aos consumidores como requisito para que essa eficiência seja válida no sentido de
tornar lícita a conduta avaliada. Luís Fernando Schuartz (2002, p. 132-133) discorre
sobre o assunto da seguinte forma:
A questão é a seguinte: deveriam as autoridades antitruste se satisfazer com
a demonstração da geração de eficiências internalizáveis ou também é necessário mostrar concretamente seu potencial de conversão em benefícios
aos consumidores?
[...]
Para aqueles que entendem que basta a demonstração de que a conduta
investigada é fonte potencial de eficiências, o interesse se esgota nas prováveis reduções de custo e/ou incrementos da taxa ou ritmo das inovações;
para os que insistem no caráter necessário mas não suficiente desse potencial, as principais variáveis observadas são preço, qualidade e/ou diversidade dos bens e serviços ofertados (efeitos sobre os custos têm aqui uma
função apenas instrumental), i.e. variáveis relacionadas a ganhos imediatos
para o consumidor.
O autor conclui o pensamento expondo sua preferência por uma via mista
entre os dois pontos de vista. Segundo ele, se acatarmos integralmente a necessidade
da distribuição, estará sendo retirada do administrador a necessária autonomia para
gerir seus negócios, o que pode levar à sua ruína. Ao contrário, se não fosse necessária
a distribuição, estaríamos legitimando a concentração de renda nas mãos dos detentores do poder de mercado e indo de encontro ao objetivo da legislação antitruste, que
é a proteção do mercado e, por conseguinte, dos consumidores. Esta última posição é
defendida até mesmo por Salomão Filho (2007).
5 C
omo veremos mais adiante, a escala, tanto na compra quanto na venda de produtos, será um enorme diferencial nos preços
praticados, sendo certo que com uma maior escala mais bem aproveitados serão os recursos dessa empresa.
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3 Práticas restritivas mais comuns e seus efeitos
Esta seção analisará as formas mais frequentes de manifestação de ambas as categorias de práticas restritivas. Optamos pela organização em tópicos, correspondendo
cada um destes a uma forma de prática restritiva, nos quais mostraremos os efeitos
mercadológicos decorrentes da adoção da prática em questão. Trataremos também dos
cenários específicos que poderiam levar à licitude de práticas historicamente vistas
como prejudiciais à concorrência.
3.1 Formas comuns de práticas restritivas horizontais
3.1.1 O cartel
Iniciamos a análise das práticas com aquela que, sem dúvida, causa maiores
estragos e é vista com maior receio. O objetivo é exatamente desconstituir o mito da
ilicitude per se dessa tão infame, porém ocasionalmente necessária, atitude. Brilhante
é a definição do Cade (1999) para o termo, apontando os cartéis como:
Acordos explícitos ou tácitos entre concorrentes do mesmo mercado, envolvendo parte substancial do mercado relevante, em torno de itens como
preços, quotas de produção e distribuição e divisão territorial, na tentativa
de aumentar preços e lucros conjuntamente para níveis mais próximos dos
de monopólio.
A formação de um cartel dá-se quando agentes econômicos concorrentes horizontalmente (atuantes em um mesmo grau da cadeia de produção, distribuição e/
ou comércio) se aliam com o intuito de reduzir o nível de concorrência entre eles, o
que ocasiona o aumento da lucratividade do negócio. Frequentemente o produto da
aliança é a nivelação do preço de um determinado produto no mercado atendido pelas
empresas participantes do cartel. Com o preço nivelado, a possibilidade de substituição do bem por outro semelhante é inversamente proporcional ao número de empresas participantes do acordo, o que força a população a adquirir o bem a preços mais
elevados do que aqueles praticados em ambiente concorrencial saudável.
A formação de um cartel não é tarefa simples. Nem todos os setores da economia apresentam os requisitos necessários para o acordo entre concorrentes. Segundo a
Fundação Getúlio Vargas (2008), a viabilidade de um cartel pressupõe primeiramente
a concentração do poder de mercado nas mãos de poucos agentes econômicos. A alta
fragmentação de market share faz com que o elevado número de concorrentes diminua
a possibilidade de sucesso do cartel em virtude da probabilidade de não adesão de alguns deles. Isso impede o aumento do preço pelas empresas em conluio,6 uma vez que
a elevação provocaria uma substituição em massa dos seus produtos pelos produtos
6 O
conluio é o acertamento entre agentes que passam a atuar em conjunto em um determinado mercado com o objetivo de fraude
a terceiros, neste caso a própria concorrência.
Defesa
da
Concorrência
537
de agentes não cartelizados, que seriam comercializados a preços significativamente
mais baixos.
Ponto unânime da doutrina é que a posse de poder de mercado pelos integrantes do acordo é também indispensável. Nesse sentido, Salomão Filho (2003,
p. 269) entende:
Para que o acerto de preços entre essas empresas possa ser ilícito é preciso
que elas detenham um mínimo poder no mercado. Sem ele o acerto não
apresenta qualquer risco e não pode ser punido, simplesmente porque o resultado mais provável é que as empresas se autodestruirão, perdendo totalmente o mercado, se tentarem alçar seus preços em função desse acordo.
O entendimento de Leopoldino da Fonseca (2007, p. 191) é semelhante:
A lei exige que, para fixar preços através de acordos, os integrantes tenham
dominação de mercado suficiente para, com os acordos firmados, de qualquer forma prejudicar a livre concorrência. Ou seja, será necessário que
tenham poder de mercado.
A existência de altas barreiras à entrada de novos concorrentes no mercado
também é crucial para a sobrevivência do cartel. Se todos os concorrentes de um dado
mercado aceitassem se associar e elevassem seus preços de forma artificial, sem dúvida seus lucros veriam um grande aumento a curto prazo. No entanto, a longo prazo
surgiria a oportunidade para que um agente econômico não cartelizado se instalasse,
oferecendo o produto a preço mais baixo, o que forçaria o cartel a reduzir seus preços,
reconstituindo a concorrência.
Ainda nos reportando à lição da Fundação Getúlio Vargas (2008), é possível
afirmar que para o crescimento de um cartel é necessário ainda que seja possível seu
monitoramento e a instituição de sanções para os integrantes do acordo que decidam
deixá-lo. A redução do preço do produto por apenas um agente econômico cartelizado
ameaçará toda a estrutura do cartel, pois seu produto passa a ser uma opção de compra
mais vantajosa ao consumidor, que em condições normais não pagará o elevado preço
instituído pelo cartel. Da mesma forma, quando o acordo estabelece a divisão de mercados, as constantes invasões por agentes que não obedecem aos limites fixados trarão
prejuízos a outros integrantes do pacto, levando à insatisfação destes e até à saída do
cartel, fazendo ruir todo o acordo.
Por último, é necessário que os produtos dos agentes do acordo sejam relativamente homogêneos no tocante à qualidade, mas esse requisito é relativo. Se vários
concorrentes com qualidades diferentes igualam seus preços no cartel, o de maior
qualidade será mais consumido, trazendo prejuízo certo para as empresas comerciantes dos produtos de qualidade inferior, inviabilizando com isso o cartel. Todavia, se o
aumento for proporcional, todas as empresas podem acabar se beneficiando do acordo.
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Imaginemos os produtos “A”, “B” e “C”. O produto “A” possui a melhor qualidade e tem preço hipotético no valor de 3x; o produto “B”, por sua vez, tem qualidade
intermediária e é vendido a 2x; e o produto “C” almeja um público de renda mais
baixa, portanto é o de menor qualidade, atingindo consequentemente o menor preço,
sendo vendido a 1x. Se todos eles nivelam seus preços a 4x, o produto que anteriormente era vendido a 3x aumentará em muito sua demanda, visto que, dado o mesmo
preço, sua alta qualidade faria diferença na escolha dos consumidores, o que levaria
as demais empresas a abandonarem o cartel. Considere agora outro cenário: se, após
a formação do cartel, o produto “A” passa a ser vendido a 6x, o produto “B” a 4x e o
produto “C” a 2x, permanece inalterada, guardadas as devidas proporções, a relação
custo-benefício, preservando-se a demanda dos três produtos, maximizando-se de
forma ilegal e arbitrária os lucros de todos os participantes do cartel.
Em face dessas informações, podemos concluir que os segmentos que apresentam maior chance de formação de cartéis são aqueles de economia de grande escala,
setores que requerem vultosos investimentos (apresentando com isso maiores barreiras à entrada de novos competidores), produzem um bem relativamente homogêneo
(não sujeito a grandes diferenças em matéria de qualidade) e explorado por poucos
competidores, como, por exemplo, os setores de mineração, exploração de petróleo, cimento, entre outros da chamada economia de escala. Nesse sentido, em voto
proferido no julgamento do Processo Administrativo n. 08000.015337/1997-48 o
conselheiro-relator Ruy Santacruz (BRASIL, 1999a) traz a seguinte menção
Segundo a literatura especializada, no mercado brasileiro de aços planos
comuns estão presentes as condições clássicas para a formação do cartel
de preços. São elas: pequeno número de firmas; produto homogêneo;
elevadas barreiras à entrada; baixo custo de monitoramento do cartel;
ausência de estímulos à deserção; estruturas de custos semelhantes; tecnologia de produção madura e semelhante; estabilidade nas participações
de mercado.
As infrações contra a concorrência desse tipo de conduta são tipificadas no art.
21 da lei antitruste brasileira, mais especificamente nos incisos I, II, III, VIII e XXIX,
sendo este último relevante para essa prática apenas quando resta provada a hipótese
do inciso IV do parágrafo único desse artigo. Várias condutas são ainda tipificadas
como crime contra a economia, consoante o disposto no art. 4º da Lei n. 8.137/1990,
com previsão de penas de reclusão entre dois e cinco anos ou multa.
Por fim, não poderíamos deixar de discorrer sobre os cenários que tornam a
prática de cartel lícita. Dois são os casos mais aceitos pela doutrina: o primeiro deles,
o chamado cartel de crise, ocorre quando um determinado setor essencial à economia do país enfrenta problemas temporários causados por um fator externo e superveniente à atividade em si e que coloca em xeque a própria sobrevivência do setor.
A jurisprudência entende que, diante dessa situação e da imprescindibilidade do cartel
para a manutenção das empresas, torna-se mais vantajoso a todos a instituição deste,
Defesa
da
Concorrência
539
como forma de garantir os preços, do que o colapso da atividade, que traria consigo
alta taxa de desemprego e poderia até mesmo frear a economia do país.
Ribeiro (2009) aponta ainda o caso Appalachian Coals como um exemplo de cartel de crise considerado lícito pelas autoridades norte-americanas, que entenderam ser o
cartel necessário à manutenção de preços que viabilizassem a atividade e que o desaparecimento do setor causaria grandes danos à comunidade e à economia como um todo.
Argumentação semelhante foi utilizada na tentativa de criação da Brasil-Álcool
(BRASIL, 2000). A megaempresa do setor sucroalcooleiro sofria com preços de mercado abaixo do custo para a produção de álcool combustível, e o setor estava em pleno
declínio. A decisão do Cade, no entanto, não aprovou o ato de concentração, sob a
alegação de que os problemas do setor eram estruturais e não temporários.
Outros cenários de cartéis lícitos são admitidos pela doutrina e pela jurisprudência, mormente quando eles ocorrem para troca de informações, evitando-se a
superprodução de bens em um determinado ramo ou ainda para equilibrar o poder de
mercado ante um oligopólio ou oligopsônio.7
3.1.2 Preços predatórios
De forma resumida, podemos definir a prática conhecida por preço predatório
como a conduta de uma empresa que reduz deliberadamente o preço de seus produtos a patamares que inviabilizam a continuidade da atividade, podendo muitas vezes
atingir preços inferiores ao custo do bem. A lógica por trás dessa prática é a eliminação
dos concorrentes por meio do próprio mecanismo da concorrência.
Uma empresa que se encontra em posição relativamente confortável no mercado, que goza de bom fluxo de caixa e tem capital suficiente para suportar por mais
tempo os prejuízos advindos dessa conduta poderá se beneficiar imensamente com
a retirada de concorrentes que não dispõem de tal estrutura. Assim, a empresa reduz
seus preços e opera suportando os prejuízos até que as concorrentes, menos preparadas, se retirem do mercado. A redução do número de concorrentes leva invariavelmente ao aumento do poder de mercado dos agentes remanescentes, que então elevam
seus preços e compensam os prejuízos sofridos. Note-se que, com uma concorrência
assídua, a elevação artificial dos preços teria sido inviável, o que não ocorre uma vez
diminuído o número de agentes do setor. Nas palavras de Ribeiro (2009, p. 144):
A prática de preços predatórios segue uma lógica que, em princípio, parece
bem simples: o sacrifício de hoje em nome do conforto de amanhã. Desse
modo pode facilmente raciocinar o empreendedor que possui uma vantagem
econômica em relação aos seus concorrentes, mas ainda não ocupa uma posição tal no mercado que o possibilite agir livremente: o poder de mercado.
7 P ara mais informações sobre este tópico, ler o voto do relator João Bosco Leopoldino da Fonseca no Ato de Concentração n.
08012.002315/99-50.
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A definição técnica da conduta de acordo com a Resolução n. 20 do Cade
(BRASIL, 1999f) é: “Prática deliberada de preços abaixo do custo variável médio,
visando eliminar concorrentes para, em momento posterior, poder praticar preços e
lucros mais próximos do nível monopolista”.
Entendemos que nesse caso a análise do mercado, e principalmente do custo
médio do produto em questão, é imprescindível para a caracterização do ilícito. Uma
eventual redução drástica de preços que, em princípio, possa indicar o início da ação
predatória poderá ter como fundamento outros motivos. Novas tecnologias e choques
de gestão, por exemplo, são fatores que reconhecidamente implicam alta e repentina
redução de custos. O corte nesse caso não caracteriza conduta ilícita. Ainda que o
preço praticado posicione o produto abaixo do custo médio de seus competidores,
sinaliza apenas ganho de eficiência de um agente em vista dos demais. A conquista natural do poder de mercado, como vimos anteriormente, não é passível de repreensão.
Assim como o cartel, o sucesso de uma manobra predatória depende de pressupostos inerentes ao setor e ao mercado, segundo entendimento de Ribeiro (2009).
Devemos nos lembrar que muitas vezes a barreira que impede a entrada de novos
competidores em um cenário de preço predatório é exatamente o baixo preço. Quando as companhias remanescentes decidirem elevar o patamar para recuperar os lucros
perdidos, essa barreira cairá. Se por acaso outras não a substituírem, como regulamentação estrita do poder público ou ainda por envolver investimentos astronômicos para
a constituição da concorrente, haverá uma avalanche de novos competidores, todos
focados na oportunidade de ingressarem ou reingressarem no mercado com produtos
a preços mais baixos, o que acabaria reconstituindo a concorrência e impedindo a
retomada dos lucros pelas empresas predadoras, real objetivo da prática.
Se na eventual análise da licitude de uma prática como essa restar provada a
impossibilidade de a conduta causar a retirada de competidores, ou ainda de posterior
aumento dos preços, estaremos diante de uma péssima estratégia comercial, mas não
diante de uma infração à concorrência. É o que se pode inferir da seguinte passagem:
Também considerando as dificuldades para o sucesso da conduta de preço
predatório e os altos custos de investigação e constatação, a técnica da análise
invertida parte da convicção a (sic) complexa e, muitas vezes, dispendiosa
análise de custos e preços mostra-se totalmente desnecessária, quando as
condições do mercado inviabilizam a produção dos resultados danosos à
concorrência. Inicia-se a análise, portanto, de tais condições para que, caso
constatada a possibilidade de aquisição de poder por parte da empresa predatória, se questione os custos e os preços (RIBEIRO, 2009, p. 145).
Por último, Figueiredo (2009) nos chama a atenção para detalhe importante:
o preço predatório é prática semelhante ao dumping, mas com este não se confunde.
Este último é configurado apenas em transações internacionais, visto que uma de
suas características é a diferença entre o preço no país de origem e o preço no país
Defesa
da
Concorrência
541
de venda. Quando um agente vende um bem em país diverso daquele em que se deu
sua produção por preço inferior ao praticado no país de origem do produto, terá ele
praticado a conduta conhecida como dumping. Essa prática geralmente ocorre subsidiada pelo governo do país de origem, que compensa o prejuízo do produtor com o
objetivo de captar recursos externos, melhorando a balança comercial. Como se pode
perceber, o preço predatório difere do dumping por ser praticado no âmbito interno
de um mercado com o objetivo de eliminar os competidores desse mesmo mercado,
e não em outro.
3.1.3 Abuso de posição dominante
O conceito de posição dominante parte de uma observação fática da realidade
econômica de um setor ou atividade para designar um status específico a uma ou mais
empresas que se enquadram em uma posição tal que lhes confere a possibilidade de
controle sobre grande parcela de um mercado relevante.
A lei antitruste brasileira não estabelece critérios fixos para o que seja ou não
uma empresa em posição dominante. No entanto, esse status é presumido, de forma
geral, quando há o controle de mais de 20% de um mercado pela mesma empresa ou
grupo de empresas e de forma específica em outros setores aos quais o Cade tem a
faculdade de atribuir percentuais diferidos para a presunção de dominação (§ 3º do
art. 20 da Lei n. 8.884/1994).
Figueiredo (2009) entende que “posição dominante” seria aquela ocupada por
uma empresa ou por um pequeno grupo de empresas que controlassem uma grande
fatia da cadeia produtiva de um determinado setor, entendendo-se por “cadeia produtiva” a produção, a circulação e o consumo dos bens. Segundo o autor, esse controle
conferiria uma vantagem injusta em relação aos demais competidores, uma vez que
seria possível a imposição de vontades arbitrárias do(s) dominante(s).
Segundo a Lei n. 8.884/1994, cometerá infração contra a ordem econômica
quem “exercer de forma abusiva posição dominante” (BRASIL, 1994), regra insculpida
no inciso IV do art. 20 da lei supracitada. Também a Constituição faz menção a essa
prática no parágrafo 4º do art. 173.
Assim como o abuso de poder econômico, o simples fato de uma determinada
empresa ter uma alta participação em um dado mercado relevante, adquirindo status
de posição dominante, não constitui infração à ordem econômica, principalmente se
considerarmos que a posição dominante advém muitas vezes de um processo natural,
desencadeado pela maior eficiência de uma dada empresa do setor. O abuso de que
trata a lei e que deve ser combatido manifesta-se de muitas maneiras diferentes, sendo a principal delas a manipulação artificial de preços, podendo dar-se de forma que
eleve os preços (mais comumente por meio da diminuição da produção, que, por sua
vez, gera escassez) ou os diminua a patamares inferiores ao próprio custo do produto,
o que provoca a retirada de competidores que não suportam a concorrência desleal,
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abrindo caminho para que a empresa dominante possa, após a eliminação da competição, fixar os preços a seu bel-prazer.
Salomão Filho (2003) revela-nos ainda o entendimento de que a análise de
um eventual abuso de posição dominante não deve ter como base única a possibilidade de aumento arbitrário dos lucros da empresa. Não se dispensa essa motivação
como essencial para a maioria das empresas, principalmente no cenário capitalista de
nosso país na atualidade. No entanto, o autor mostra-nos que em economias cujos
administradores não são sócios das empresas e quando sua posição é relativamente
protegida contra a destituição em função da não produção de lucros no curto prazo,
os investimentos tendem a se concentrar na expansão e na consolidação da pessoa
jurídica no mercado, principalmente mediante a aquisição de market share. Assim, sua
preocupação principal nem sempre será a de aumento imediato de lucros.
Quando uma determinada empresa ocupa posição dominante no setor em que
atua, sua responsabilidade de lealdade se acentua. Para Corrêa (2009c, p. 292) “[...] a
empresa em posição dominante tem a responsabilidade de preservar a concorrência”.
Da mesma forma manifesta-se Richard Whish, citado pela Fundação Getúlio Vargas
(2008, p. 123):
O fato de uma firma ter uma posição dominante não constitui um ilícito,
mas, como já foi notado, uma firma em posição dominante tem a responsabilidade especial de não permitir que sua conduta impeça a concorrência
não distorcida no mercado comum.
Devemos nos lembrar que a repressão às práticas restritivas não pressupõe a
verificação de efeitos concretos provocados no mercado, apenas o potencial de gerar
tais efeitos é suficiente para caracterizar a infração, tampouco se requer que a conduta
tenha sido praticada com dolo, a responsabilidade nesse caso é objetiva, conforme se
verifica pela presença da expressão “independentemente de culpa” no caput do art.
20 da Lei n. 8.884/1994, artigo este que arrola os efeitos indesejados, que, ao serem
provocados pela conduta, ensejam aplicação de sanção.
Verifica-se, por exemplo, que em diversos casos as empresas dominantes têm a
obrigação de contratar, pois a não contratação geraria uma barreira de entrada a novos
concorrentes e acentuaria a dominação da empresa, permitindo-lhe controlar um determinado mercado relevante. A não contratação nesse caso é ilícita, especificamente
por ter sido praticada por empresa dominante.8
3.1.4 Ilícitos de associações profissionais
Matéria um tanto quanto polêmica é a definição da conduta ilícita praticada
por associação de profissionais. Em cartilha lançada no ano de 1999, com o intuito de
esclarecer de forma simplificada a legislação antitruste brasileira aos comerciantes, o
8 Mais informações sobre esta matéria estão na subseção concernente à recusa de contratar (3.2.4).
Defesa
da
Concorrência
543
Cade (1999, p. 21) traz a seguinte resposta para a pergunta “O que é ilícito de associação profissional?”:
Qualquer prática que limite injustificadamente a concorrência entre os
profissionais da associação em questão, principalmente mediante conduta
acertada de preços. É exemplo o estabelecimento de preços mínimos para
consulta por parte de médicos de uma associação.
A repressão aos acertos entre profissionais de uma associação é claramente
válida. Obviamente a extensão dessa associação poderá ter tamanho suficiente para
provocar desequilíbrio da concorrência por meio da imposição de preços, como no
exemplo citado na cartilha. Imaginemos que todos os médicos fossem obrigados, pelos
seus respectivos conselhos regionais, à prática de um determinado preço para consultas oftalmológicas, por exemplo. Essa imposição unilateral do conselho não só limita
a liberdade do profissional como se assemelha a verdadeiro cartel, não de empresas,
mas de profissionais liberais que exercem uma determinada atividade.
A hipótese do tabelamento obrigatório de serviços médicos foi considerada em
diversos casos pelo Cade, que decidiu pela ilicitude da prática quando for verificada
a obrigatoriedade de fixação de preços pelos membros da associação. Vejamos um
trecho da decisão do Processo Administrativo n. 011518/1994-06:
Os sindicatos, associações e conselhos não têm a sua atividade caracterizada como intuito de cartelização, pois são entidades sem fim lucrativo
legitimamente dotadas de representatividade para deliberar sobre as condições de trabalho de seus associados. Todavia, são agentes cartelizadores na
medida em que obrigam os prestadores de serviço que são agentes de mercado, sujeitos pois às leis concorrenciais, a estabelecerem preços uniformes
de seus serviços. Esse fato prejudica os dois lados do mercado. Em relação
aos médicos, colocam-se em igualdade de valor serviços que são desiguais,
posicionando num mesmo patamar médicos mais preparados e melhores
prestadores de serviço que outros, da mesma forma, igualando atendimentos de melhor qualidade com outros inferiores. Da parte do consumidor,
é ele desfavorecido ao ser destituído de sua liberdade de escolha, pois não
pode utilizar-se do critério de qualidade e de valor-utilidade para definir
suas preferências em relação ao serviço oferecido (BRASIL, 1999b).
Note-se que nada impede que os sindicatos, os conselhos ou as associações
profissionais criem tabelas sugerindo valores de honorários para os diversos serviços
desempenhados pela classe que representam. Podemos perceber, pelo teor da decisão
supracitada, que o que torna a conduta ilícita é a imposição arbitrária e obrigatória
dessa tabela, prática que muitas das vezes vem acompanhada de boicotes aos profissionais e aos contratantes que se recusam a aderir ao cartel. Isso gera perda de eficiência
para a população, que fica impossibilitada de exercer o direito de escolha do profis-
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Efeitos das práticas restritivas sobre a economia brasileira e a repressão às condutas anticoncorrenciais
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sional/preço de sua preferência, e para os profissionais, que têm cerceada a liberdade
de fixação de seus próprios preços.
A Fundação Getúlio Vargas (2008a) aponta-nos ainda outra forma conhecida
de ilícito praticado por associações profissionais: o aumento das barreiras de ingresso no mercado para o profissional que não se filia à associação, o que muitas vezes
ocorre mediante a imposição de taxas extremamente elevadas de adesão, taxas estas
cujo valor não atende minimamente à proporção com o efetivo custo do serviço que
se propõem a custear, indicando clara distorção do seu objetivo, não só na esfera tributária, mas também na seara econômica; ou ainda mediante a requisição de atributos
subjetivos descabidos que não guardam relação com a competência do profissional.
Faz-se mister ressaltar que a inscrição e a regularidade com as obrigações de algumas
associações profissionais constituem verdadeiros pré-requisitos para o próprio exercício da atividade, de forma que a não participação desta pode obrigar o profissional a
abandonar o mercado.
Mais uma vez, voltando-nos para a regra da razão, não se pode declarar de
pronto a ilicitude de uma eventual recusa pela associação de inclusão de um novo
sócio. Frequentemente notamos a relação entre um participante de determinada associação e um atributo relacionado a ela. Os selos ISO 9000, 9001, etc., por exemplo,
indicam que determinadas empresas atendem a determinados padrões ambientais e de
qualidade que lhes conferem essa marca específica. Nesses casos, a recusa de inclusão
de novo sócio por não atendimento de atributos subjetivos é lícita. Note-se que o objetivo do selo ISO é informar ao consumidor, de forma rápida e garantida, que aquelas
determinadas empresas possuem um padrão de qualidade, beneficiando as empresas
por gozarem de maior credibilidade quanto à confiabilidade de seus produtos e também os consumidores ao fornecer-lhes informação qualitativa rápida. No entanto, para
que essa informação continue sendo confiável, há de se prezar sempre pela fiscalização
das empresas participantes e dos novos integrantes.9
3.1.5 Outros acordos entre empresas
A realidade econômica traz-nos um grande número de possibilidades de colaboração entre empresas ou agentes e, ainda que esta possa parecer apenas uma categoria
genérica, destinada a incluir todas as demais formas de acordos não previstas de forma
específica, não se trata disso. Os “outros acordos entre empresas” de que trata o ordenamento referem-se às: “[...] restrições horizontais que envolvam apenas parte do mercado
relevante e/ou esforços conjuntos temporários voltados à busca de maior eficiência,
especialmente produtiva ou tecnológica” (CADE, 1999).
Não se deve confundir esse tipo de colaboração voltada, como já vimos, para o
desenvolvimento de maior eficiência na atividade em questão com aquela prática concertada do chamado cartel hard-core, no qual o objetivo é sempre a maximização de
9 Para mais informações sobre este assunto, consultar Hovenkamp (1999, p. 231-234).
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lucros. Schuartz (2002, p. 129-130), em obra intitulada Ilícito antitruste e acordo entre
concorrentes, dispõe brilhantemente sobre essa categoria de acertamentos quando diz:
Os acordos de colaboração entre concorrentes formam um subconjunto por
assim dizer privilegiado desse universo. De um lado, eles desfrutam, dado
seu parentesco com o tipo hard-core, de suficiente visibilidade para garantir
a necessária prudência e a correspondente profilaxia jurídica; de outro, eles
são, na sua maioria e apesar desse parentesco, legalmente permitidos. Mais
do que isso: acordos de colaboração entre concorrentes são vistos hoje em
dia cada vez mais não apenas como neutros, ou então “benignos” de um
ponto de vista concorrencial, mas também como pró-competitivos.
Esse ponto de vista é partilhado pelo U.S. Departament of Justice and the
Federal Trade Comission,10 que editou, no ano 2000, o Antitrust guidelines for collaborations among competitors, documento que, como o próprio nome já diz, fixa as linhas
gerais para apreciação da licitude dos acordos entre concorrentes no mercado norteamericano. No preâmbulo desse documento, leem-se os seguintes dizeres:
Para que seja possível competirem nos mercados modernos, os competidores às vezes precisam colaborar. Forças competitivas estão levando as empresas para o caminho de colaborações complexas para atingirem objetivos
como expansão para mercados externos, custeamento de caros esforços de
inovação e redução dos custos de produção, entre outros. Essas colaborações frequentemente não são apenas benignas, mas pró-competitivas. De
fato, nas últimas duas décadas, as agências federais antitruste iniciaram
poucos processos civis contra colaborações de competidores. Todavia, a
percepção de que as leis antitruste são céticas no tocante aos acordos entre
efetivos ou potenciais competidores pode desencorajar o desenvolvimento
de colaborações pró-competitivas11 (tradução nossa).
A discussão sobre as eficiências mostrada na subseção 2.5 deste texto acerca
de quais efeitos devem ser considerados “eficiências” merece ser aqui aprofundada. Do
ponto de vista econômico, toda mudança que implique variação benéfica de indicadores – como rentabilidade da atividade, diminuição de custos em geral, melhora da
produtividade, aproveitamento de capacidade ociosa, entre outros – indicarão ganho
de eficiência na empresa, mas nada garante que esses ganhos serão repassados ao con10 Autoridade norte-americana, atrelada ao Departamento de Justiça, incumbida da defesa da concorrência e da proteção do
consumidor naquele país. Os EUA possuem notoriamente uma extensa política de regulação antitruste, política esta que serve de
base para diversos outros países do mundo, inclusive o Brasil.
11 “In order to compete in modern markets, competitors sometimes need to collaborate. Competitive forces are driving firms toward
complex collaborations to achieve goals such as expanding into foreign markets, funding expensive innovation efforts, and lowering
production and other costs. Such collaborations often are not only benign but procompetitive. Indeed, in the last two decades, the
federal antitrust agencies have brought relatively few civil cases against competitor collaborations. Nevertheless, a perception that
antitrust laws are skeptical about agreements among actual or potential competitors may deter the development of procompetitive
collaborations”.
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Efeitos das práticas restritivas sobre a economia brasileira e a repressão às condutas anticoncorrenciais
Erick Viana Salomão Nassif
sumidor final. Os Guidelines do FTC remete-nos, no tópico destinado à identificação
das eficiências, aos seguintes efeitos:
[...] a colaboração entre competidores permitirá às empresas oferecerem
bens ou serviços mais baratos, de maior valor aos consumidores, ou introduzi-los no mercado mais rapidamente do que em sua ausência12 (U.S.
DEPARTAMENT OF JUSTICE AND THE FEDERAL TRADE COMISSION,
2000, tradução nossa).
A exemplo da linha seguida por Schuartz (2002), parece-nos lógico afirmar
que o repasse dos ganhos não deve ser obrigatoriamente imediato. Os produtores ou
distribuidores não devem beneficiar-se unilateralmente, sob pena de se estar chancelando a acumulação de renda, que não é benéfica ao país, mas é de nossa convicção
que, uma vez mantidos os níveis de qualidade, preço e disponibilidade do produto ao
consumidor, eventuais ganhos podem ser repassados com o tempo. Há uma diferença
entre demonstrar o ganho de eficiência da atividade por meio do acordo e condicionar
sua licitude ao efetivo repasse desse ganho para o consumidor.
Uma clássica colaboração entre concorrentes perfeitamente aceita no ordenamento brasileiro é a associação para compras. Tais associações ocorrem quando um
dado número de empresas forma grupos visando à redução dos custos de transação
e dos preços mediante o aumento de escala de suas compras. A prática de descontos
para compras de grande quantidade é comum no Brasil e possui fundamento econômico. Uma única grande compra terá custo inferior a diversas compras pequenas.
A capacidade logística poderá ser mais bem aproveitada, o custo do transporte para um
único local de entrega é menor, o risco de inadimplência é reduzido, etc. Assim, grande
parte desse aproveitamento é repassado ao comprador na forma de descontos, o que, por
conseguinte, permite que o produto chegue mais barato ao consumidor final.
No Brasil, o grupo AmBev e o grupo Souza Cruz realizam esse tipo de associação desde 2002 por intermédio do Agrega. O projeto tem o condão de fornecer
materiais de aproximadamente 110 categorias diferentes, desde materiais de escritório
até combustíveis. A união das empresas possibilitou que essas compras fossem realizadas em escala muito maior do que alcançariam caso comprassem separadamente, e
por não serem competidoras diretas nem negociarem bens relativos às suas respectivas
atividades-fim (cevada, lúpulo, tabaco, etc.), não há de se falar em colusão ilícita.13
Concluindo, os acordos entre empresas que representam eficiências à economia são, em geral, bem vistos. Entre essas eficiências, pode-se ressaltar os acordos que
visam ao aumento de exportações por produtores de determinado setor, combate a
oligopólios ou oligopsônios manifestos, pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias a serem utilizadas em conjunto, redução de custos de transação, entre outros.
12 “[…] a competitor collaboration may enable firms to offer goods or services that are cheaper, more valuable to consumers, or
brought to market faster than would otherwise be possible”.
13 A criação do Agrega foi aprovada pelo Cade por unanimidade e sem restrição no Ato de Concentração n. 08012.006980/2000-35.
Defesa
da
Concorrência
547
Ressalte-se que a verificação da eficiência deve ser contrabalanceada pela restrição à
concorrência decorrente do acordo.
Entre os efeitos indesejáveis, o principal, e que irá ocorrer em quase todos os
casos, é o aumento do poder de mercado, que poderá levar futuramente ao desequilíbrio entre os agentes. Retomando o exemplo do Agrega, em uma situação extrema as
empresas participantes e o acordo poderiam crescer de tal forma que os fornecedores
dos produtos passassem a direcionar toda a sua produção e venda para esses agentes, o que daria à AmBev e à Souza Cruz um imenso poder de barganha com esses
fornecedores, constituindo um oligopsônio extremamente poderoso em face de seus
fornecedores.
3.2 Formas comuns de práticas restritivas verticais
3.2.1 Fixação dos preços ou condições de revenda
Emanada do inciso XI do art. 21 da Lei n. 8.884/1994, essa prática, como o
próprio nome diz, pode ser definida como a imposição compulsória de preços ou condições comerciais a serem praticados pelos distribuidores ou varejistas de um determinado produto a seus consumidores. Trata-se de controle do produtor sobre a forma
de venda e o preço oferecidos aos consumidores de seus produtos ao longo da cadeia
produtiva. Vejamos a redação do dispositivo que melhor define a prática:
XI - impor, no comércio de bens ou serviços, a distribuidores, varejistas e
representantes, preços de revenda, descontos, condições de pagamento,
quantidades mínimas ou máximas, margem de lucro ou quaisquer outras
condições de comercialização relativos a negócios destes com terceiros
(BRASIL, 1994).
A vantagem para o produtor que impõe essa prática é um tanto quanto óbvia.
Ao garantir baixos preços e condições mercantis que estimulem a compra do produto, ele garantirá a demanda por este, muitas vezes às custas da margem de lucro dos
distribuidores ou varejistas. Frequentemente a prática dos preços ou condições de
revenda almejados pelo produtor são requisitos para o próprio fornecimento de seus
produtos, ao passo que o distribuidor que não os aceita fica impossibilitado de atuar
no mercado, pelo menos em relação a esses produtos.
Novamente nos reportando ao que foi dito no tópico concernente aos “ilícitos
de associações profissionais”, o grande divisor de águas utilizado no Brasil para definição da licitude ou não de fixação de preço de revenda é a obrigatoriedade de sua
manutenção pelo revendedor ou varejista aos seus clientes, associado sempre ao poder
de mercado nas mãos do fornecedor que os impõe.
No Processo Administrativo n. 149/1994, ajuizado pelo Sindicato da Indústria
de Panificação e Confeitaria de São Paulo contra a Indústria de Sorvete Ltda. (Insol),
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Efeitos das práticas restritivas sobre a economia brasileira e a repressão às condutas anticoncorrenciais
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alegou a autora que a Insol fixava preços de revendas tabelados que deveriam ser praticados pelos varejistas, o que restringia a liberdade de cada comerciante para definir
seus próprios preços.
Ficou claro no voto do relator Leônidas Rangel Xausa (BRASIL, 1997b), que a
empresa demandada não possuía condições estruturais para obrigar o tabelamento dos
preços e ainda que não havia sido demonstrada a obrigatoriedade de oferecimento dos
preços, portanto não havia de se falar em ilícito. Ainda segundo o relator, a prática de
sugestão de preço é ainda bem-vinda ao ordenamento quando seu objetivo é informar
ao consumidor o preço justo do bem em questão, deixando o comerciante livre para
definir preço diverso se for de seu interesse.
Outra questão recorrente é a possibilidade de um produtor ou distribuidor estabelecer quotas mínimas ou máximas de venda de um determinado produto. No caso
SDE vs. Cimentos do Brasil S.A., o voto do relator Marcelo Procópio Calliari (BRASIL,
1998c) deixa claro a licitude de tal conduta, senão vejamos:
[...] a fixação de quotas mínimas e máximas de venda é prática usual em
vários mercados e possui uma lógica econômica, eis que as empresas direcionam o foco para faixas de clientes específicas, para as quais estruturam a
logística de vendas (atacado ou varejo). A venda de quantidades pequenas
exige um investimento distinto da oferta de grandes quantidades; já a limitação à venda em quantidades máximas visa proteger o fabricante contra
o risco de ter a produção subordinada a uma encomenda em determinado
período, não dispondo de produtos para outros clientes.
É possível concluirmos que as restrições verticais são mais bem vistas no ordenamento brasileiro. Raramente será falado em ilegalidade per se neste tópico de nossa
obra. Como fica explícito nesta subseção, as restrições verticais cuja prática apresente
justificativa econômica e maiores eficiências que prejuízos tendem a ser aceitas sem
maiores problemas pelas autoridades de defesa da concorrência.
3.2.2 Restrições territoriais e de base de clientes
Consoante a definição adotada pela Resolução n. 20 do Cade (BRASIL, 1999f),
a restrição territorial é verificada quando “o produtor estabelece limitações quanto à
área de atuação dos distribuidores/revendedores [...]”. Trata-se de restringir a liberdade dos distribuidores ou revendedores de determinada marca, forçando-os a fornecer
os produtos em questão apenas aos clientes de certa área geográfica ou apenas a uma
certa classe de clientes. Tal restrição geralmente é acompanhada de uma limitação no
número de distribuidores ou mesmo exclusividade para atuação na área.
Exemplos desse comportamento são frequentemente observados no setor de
bebidas. Os contratos de distribuição de bebidas celebrados entre a AmBev e seus
revendedores no Brasil trazem expressamente a área a ser atendida pelo distribuidor,
Defesa
da
Concorrência
549
constituindo a distribuição fora dessa área infração contratual passível de rescisão
do contrato e interrupção imediata do fornecimento dos produtos. Se de um lado a
imposição dessa prática traz menor concorrência intramarcas, favorecendo em tese
o distribuidor, ela também o restringe à medida que impede a expansão de seus negócios. Ademais, não sendo possível a atuação de mais de um distribuidor em um
determinado espaço geográfico, cria-se uma figura semelhante a um monopólio, uma
vez que há apenas um agente econômico possível para efetuar a venda dos produtos
de determinada marca. Esse monopólio só não é completo porque, ao podar a concorrência intramarcas, acentua-se a concorrência intermarcas. É esse o entendimento
de Daniel Rocha Corrêa (2009c)
Temos convicção de que, do ponto de vista do desenvolvimento de mercado,
a restrição territorial, ainda que absoluta (apenas um agente por marca por área), não
é de grande relevância quando há concorrência intermarcas. Em cenários econômicos
monopolizados, observa-se frequentemente a desaceleração de inovações no próprio
produto e mesmo dos procedimentos de venda. A inexistência de ameaça ao agente
que deixa de evoluir leva naturalmente a um engessamento. Não é isso que ocorre
no caso debatido, porque, diante da ausência de competição entre distribuidores da
mesma marca (intramarca), o aumento da rentabilidade da atividade e o ganho de participação no mercado ficam atrelados quase unicamente ao desempenho do produto
e à operação própria em face dos produtos e das operações das demais marcas. Existe
motivação para que o empresário continue buscando a melhoria de seu produto e de
seu processo de vendas como um todo.
A existência de uma restrição territorial pode ainda apresentar “efeitos colaterais” que, apesar de irrelevantes do ponto de vista concorrencial, trazem grandes
consequências na esfera econômica: trata-se da publicidade. Uma vez ausente a concorrência entre distribuidores, toda a propaganda foca-se no produto, o que confirma
a acentuação da concorrência intermarcas sobre a intramarcas.
Ainda na esteira das eficiências, ensina Salomão Filho (2003) que a restrição territorial tem o condão de evitar a prática de free-riding. O free-riding, ou “carona”, em uma
tradução literal do termo, é representado pelo lojista ou distribuidor, que administra sua
atividade voltada apenas para os serviços essenciais do negócio, não oferecendo um acompanhamento pré ou pós-venda, com pouco ou nenhum investimento em treinamento
pessoal, enfim aquele que gerencia uma atividade mais modesta, a qual apresenta custos
mais baixos, que podem ser repassados ao consumidor na forma de menores preços.
Quanto ao lojista ou distribuidor que se presta a um atendimento especializado, com instalações técnicas e mão de obra capacitada voltada a um melhor desempenho dessa mesma atividade, este frequentemente oferece o serviço a preços mais altos,
exatamente em virtude do valor agregado que os serviços adicionais proporcionam.
O free-riding ocorre quando o consumidor se vale dos serviços pré ou pósvenda oferecidos pela atividade mais bem estruturada sem pagar, no entanto, o preço
cobrado por esse agente, voltando-se exclusivamente na hora da compra para o lojista
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Efeitos das práticas restritivas sobre a economia brasileira e a repressão às condutas anticoncorrenciais
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mais barato. Esse lojista foi então beneficiado pelos serviços prestados pelo outro sem
a contribuição efetiva com os custos por ele suportados.
Os efeitos negativos dessa prática são brilhantemente destacados por Salomão
Filho (2003, p. 298):
A consequência é que, a longo prazo, “A” (o distribuidor especializado de
nosso exemplo) perderá vendas, eventualmente terá que deixar o mercado
e haverá um desestímulo geral aos investimentos em promoção de vendas.
O mesmo se pode dizer em relação a outros possíveis investimentos dos
revendedores, como aqueles em publicidade e serviços pós-venda.
Dois são, para os neoclássicos, os efeitos (inconvenientes) de uma tal situação. Em primeiro lugar, os consumidores ver-se-ão privados de serviços
adicionais (como promoção de vendas e serviços pós-vendas) que para eles
(como se verá, em especial para o consumidor marginal) trazem uma indiscutível utilidade. Há, portanto uma perda de eficiência (no já conhecido
sentido alocativo neoclássico) (grifo nosso).
A restrição territorial eliminaria o free-riding à medida que dificultaria o acesso
ao produto pelo indivíduo que não investe nos serviços adicionais.
Assinala Ribeiro (2009), que essa conduta representa sério risco à concorrência
nos cenários onde não se verifica uma concorrência saudável entre marcas distintas, o
que poderia inclusive facilitar a instauração de um monopólio, pois as mencionadas
acentuações na concorrência intermarcas não se fariam presentes.
3.2.3 Acordos de exclusividade
Pela lição de Leopoldino da Fonseca (2007, p. 199),
[...] pode-se dizer que os contratos de exclusividade são acordos em que os
compradores de determinado bem ou serviço se comprometem a adquirilo com exclusividade de determinado vendedor (ou vice-versa), ficando
assim proibidos de comercializar os bens dos rivais.
É muito comum a verificação prática dessa conduta em comunhão com a restrição territorial, razão pela qual esta última é também conhecida na doutrina como
“exclusividade territorial”. O mesmo autor citado anteriormente diz ainda que:
Através de uma cláusula de concessão exclusiva um fornecedor se compromete a licenciar somente um distribuidor, num determinado território, podendo ocorrer a contrapartida de um comprometimento recíproco do distribuidor de somente comercializar os produtos do fornecedor
(LEOPOLDINO DA FONSECA, 2007, p. 199).
Defesa
da
Concorrência
551
Essa modalidade de restrição contratual poderá, em alguns casos, erguer barreiras significativas à entrada de novos produtores, uma vez que é requerido dos novos
agentes a estruturação de toda uma cadeia de distribuição em virtude da impossibilidade de aproveitamento das distribuidoras já existentes, por se tratarem de canais
exclusivistas de determinadas marcas.
Ressalta a Resolução n. 20 do Cade (BRASIL, 1999f), com boa margem de
razão, que a exclusividade poderá também excluir competidores ou impedir a entrada
deles quando se desenvolve a montante na cadeia produtiva. Imaginemos o produtor
que impõe uma cláusula de exclusividade a seus fornecedores de insumo, forçando-os
a vender apenas para ele. Os demais fabricantes de produtos que se utilizam da mesma
matéria-prima ver-se-iam subitamente sem uma fonte confiável que lhes permitisse continuar a produção. O mesmo ocorre quando um grande distribuidor (ou um
oligopsônio de distribuidores, como é mais comumente observado) força contratualmente o produtor a vender exclusivamente a ele toda a sua produção. Assim, sem ter
o que distribuir, os demais concorrentes se veem obrigados a se retirar do mercado.
Essas incertezas relativas à continuidade do fornecimento de insumos, à qualidade destes ou ainda a preços representam custos de transação cuja redução é, para
Salomão Filho (2003, p. 248), muitas vezes utilizada como justificativa para a estruturação vertical de um setor:
A exclusividade assume um papel de destaque nesse mundo dominado
pela eficiência. Incluída em um contrato de fornecimento e distribuição,
ela é capaz de eliminar muitas das fontes de incerteza do empresário, possibilitando a diminuição dos custos de transação. Permite, portanto, que as
transações continuem a se realizar no mercado, dando, ao mesmo tempo,
segurança jurídica e econômica às partes contratantes.
Talvez por esse motivo, observa-se um crescente movimento de verticalização
de um setor depois de introduzida a verticalização do primeiro concorrente. A possibilidade de cláusulas de exclusividade bloquearem o acesso à rede de distribuição ou
de insumos é muito grande, motivo pelo qual todos os competidores se estruturam
dessa forma, na tentativa de garantir a existência de agentes econômicos em todas as
fases de sua cadeia de produção, evitando com isso o aumento de custos de transação.
Essa crescente verticalização traz alguns problemas no campo jurídico. Se as
primeiras verticalizações são aprovadas mas as subsequentes não, cria-se uma real possibilidade de instauração de monopólio por meio do desaparecimento de concorrentes
de outras marcas.
Ademais, em um cenário em que todos, ou boa parte dos agentes do setor,
funcionam verticalizados, atendendo exclusivamente às suas próprias marcas, fica praticamente impossível a entrada de novos produtores, distribuidores e até lojistas independentes por não possuírem acesso às redes dos outros estágios da cadeia de produção.
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Questão controversa foi analisada no caso União Catarinense de Veículos vs.
Fiat do Brasil S.A. (BRASIL, 1999c). Ficou definido nesse precedente que a concessão
para que um determinado agente atue como revendedor de veículos Fiat que exija do
concessionário índice mínimo de fidelidade na compra de peças e acessórios é ilegal.
A decisão reitera a possibilidade de o fabricante exigir um índice mínimo de fidelidade
apenas na compra de automóveis, mas garante ao concessionário o direito à “comercialização de implementos e componentes novos produzidos por terceiros, bem como
de veículos e implementos usados de qualquer marca”.
Por fim, Salomão Filho sustenta a tese de que a exclusividade de distribuição
cumulada com a restrição territorial incentiva os investimentos em serviços adicionais ao consumidor, uma vez que o produtor se vê livre para “licenciar” apenas ao
distribuidor que preencha determinados padrões qualitativos. Em contrapartida, os
investimentos realizados para garantia desses serviços, bem como outros em publicidade, treinamento, etc., são protegidos de eventuais free-riders, que, em tese, não terão
acesso aos produtos dessa marca.
3.2.4 Recusa de negociação
A recusa de negociação (refusal to deal) consiste na delimitação por um produtor ou consumidor acerca dos parceiros com os quais irá negociar. O Cade (1999)
assinala sabiamente que essa conduta poderá ter um efeito semelhante aos acordos
de exclusividade. Quando é celebrado um acordo de exclusividade, o agente fecha-se
para as marcas rivais, concordando em distribuir apenas os produtos de uma delas.
Em tese ocorre também uma recusa de negociação, pois esse distribuidor se recusa a
comprar os produtos das marcas que são rivais daquele da qual ele é exclusivista. As
duas práticas são ainda muito utilizadas em conjunto. O produtor estabelece a cláusula de exclusividade com o distribuidor e, ao mesmo tempo, nega-se a fornecer os
produtos para os distribuidores que não sejam exclusivistas. Isso garante uma espécie
de parceria recíproca voltada à blindagem da rede de distribuição, que passa a ser
exclusiva daquela marca.
Uma segunda modalidade dessa prática frequentemente denunciada aos órgãos de defesa da concorrência é a recusa súbita de contratar. Por diversas vezes e
mormente quando um distribuidor é exclusivista de uma determinada marca, toda
a sua infraestrutura é voltada para ela: seus veículos são pintados e adesivados com
a logomarca, os uniformes dos funcionários e até mesmo a fachada da sede trazem
as cores da marca. Um grande capital é investido para a formação da logística dessa
marca. A súbita recusa de fornecimento a esse distribuidor gerará imensos prejuízos,
podendo até mesmo levá-lo à ruína financeira.
No Brasil, o entendimento majoritário dos órgãos de defesa da concorrência
é no sentido de que esse tipo de recusa de contratar não é de competência do Cade,
exceto quando for de magnitude tal que cause lesão ao princípio da livre concorrência. É o que ocorreria, por exemplo, se a eliminação desse distribuidor facilitasse a
instauração de um monopólio em sua antiga área de atuação. A eventual reparação do
Defesa
da
Concorrência
553
distribuidor que se sente individualmente lesado deve ser pleiteada na justiça comum.
Este é também o ensinamento de Leopoldino da Fonseca (2007).
Um grande conflito de direitos surge na análise da licitude de uma recusa de
contratar. De um lado há o princípio constitucional da liberdade de iniciativa, que,
a priori, confere a todos os agentes econômicos a liberdade de contratar ou não com
quaisquer agentes que os interessem. No lado oposto há outro princípio constitucional: o da liberdade de concorrência, que será, em algumas hipóteses, violado pelo
exercício irrestrito da liberdade de iniciativa. Salomão Filho (2003, p. 234) faz um
importante esclarecimento acerca dessa discussão:
[...] Geralmente essas hipóteses coincidem com os casos de monopólio
natural ou com outros casos em que a situação de dominação tem razões
estruturais (e não comportamentais), e não há razão para se presumir que
os agentes econômicos consigam, por si, dar solução a essas falhas. Assim,
a concorrência é introduzida coercitivamente por via regulatória ou tenderá a desaparecer.
Ao abordar o tema sob o enfoque da política tecnológica, Corrêa (2009,
p. 117) diz ainda: “Às vezes a livre concorrência restringirá a autonomia contratual
do detentor de tecnologia para impor-lhe o dever de contratar, quando a recusa em
contratar permitir-lhe dominar o mercado”.
Corrêa (2009b p. 117) cita os casos 6 e 7/1973 entre o Instituto Chemioterapico Italiano S.p.A. et Commercial Solvents Corporation vs. Comission of The European
Communities:
Nessa decisão, verificamos que, se uma empresa em posição dominante
num mercado de origem recusa o fornecimento de produtos ou serviços a
um concorrente em um mercado-alvo a ponto de eliminar toda a competição nesse mercado, a recusa será ilícita.
No campo jurisprudencial brasileiro, cita-se como caso interessante o Processo Administrativo n. 44/1992 entre Comércio de Pneus Adriano Ltda. e Outros vs.
Indústria de Pneumáticos Firestone (BRASIL, 1998d). O processo foi iniciado por diversas microempresas e empresas de pequeno porte que se insurgiram contra a recusa
de contratar da fabricante de pneus, que se recusou a fornecer-lhes os produtos sem
a intermediação de revendedoras da marca. Elas alegaram que o ambiente de distribuição era altamente oligopolizado, o que resultava em preços altos ao varejista final.
A recusa de negociar nesse caso foi considerada lícita tão somente pela inviabilidade econômica de pequenas vendas. Esse caso remete-nos também à licitude da
fixação de quotas mínimas e máximas de consumo discutida anteriormente nesta obra.
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3.2.5 Venda casada
A venda casada, ou tying, é caracterizada quando um agente econômico condiciona a venda de um produto (produto ligador) à aquisição conjunta de outro produto
ou serviço (produto ligado). O objetivo da prática é forçar o consumidor a adquirir um
produto de baixa liquidez e geralmente com menor demanda no mercado por meio
da impossibilidade de adquirir o produto mais procurado sem a compra do menos
procurado.
A lei antitruste brasileira tipifica expressamente essa conduta em seu art.
21, inciso XXIII, ao taxar como ilícita a conduta de: “XXIII - subordinar a
venda de um bem à aquisição de outro ou à utilização de um serviço, ou
subordinar a prestação de um serviço à utilização de outro ou à aquisição
de um bem (BRASIL, 1994)”.
Salomão Filho (2003, p. 225) chama a atenção para outra forma de venda
casada:
Venda casada não é só aquela em que é obrigatória a compra dos produtos
em conjunto. Ela também existe quando o preço cobrado pelo produto
vendido separadamente é exorbitante, isto é, não corresponde nem aproximadamente ao acréscimo de custo causado ao vendedor pela separação
dos produtos.
O autor aponta que a imposição do preço elevado constrange o consumidor
a adquirir o conjunto por um motivo econômico. O custo do produto separado é tão
alto que o conjunto se torna economicamente mais atrativo.
O caso clássico de tying pode ser exemplificado por uma livraria na qual a
compra de um best-seller do autor da moda esteja condicionada à compra de um livro
menos conhecido de um autor iniciante. Se a venda do best-seller não for oferecida em
separado, haverá clara prática de venda casada.
Salomão Filho (2003) chama a atenção ainda para o fato de que um dos requisitos que pressupõem a viabilidade do preço predatório também se aplica à possibilidade de venda casada, qual seja, a existência de elevadas barreiras de entrada no
mercado dos produtos que estão sendo vendidos conjuntamente. Isso ocorre porque,
ao unir a venda, verifica-se uma elevação dos preços ao consumidor, mormente para
aquele que deseja adquirir apenas um dos produtos, não se interessando pelo outro.
A possibilidade de que outra empresa se instale nesse mercado, passando a produzir
e a comercializar o produto mais demandado em separado, é grande, o que traria
diminuição de lucros ao vendedor dos produtos unidos, levando eventualmente à
extinção da prática por todos eles. Mas se as barreiras à entrada no setor são grandes,
a instalação do novo competidor fica comprometida, possibilitando a exploração da
prática por um longo tempo.
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da
Concorrência
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A Resolução n. 20 do Cade (BRASIL, 1999f) indica um efeito negativo comum
da venda casada. Ao combinar obrigatoriamente dois produtos, o comportamento do
consumidor muda na direção de consumi-los sempre em conjunto. Caso seja essa a
preferência principal da maioria deles, um eventual novo competidor precisará produzir os dois, e não apenas um deles, o que leva ao aumento dos investimentos para
início das operações, excluindo grande parcela de agentes que não dispõem do capital
para arcar com o incremento.
Cumpre ressaltar ainda o que não é caracterizado como venda casada. No julgamento de averiguação preliminar ajuizada pelo Sindicato das Empresas de Conservação de Veículos, Lava-Rápidos e Similares do Estado de São Paulo contra os Postos
de Combustíveis do Estado de São Paulo,14 alegou a representante que os representados agiam em deslealdade de concorrência ao oferecer gratuitamente o serviço de
lavagem de carros condicionado à compra de combustíveis. O Cade entendeu que
não havia de se falar em venda casada ou deslealdade de concorrência, sendo a prática
mero ato de marketing voltado à atração de clientes, principalmente por ser a lavagem
gratuita e opcional.
A venda casada que tem por objetivo a garantia da qualidade dos produtos
do fornecedor também não é ilícita, e é o que ocorre frequentemente nos contratos
de franquia. Salomão Filho (2003) diz que a venda casada nesse caso é essencial para
que o franqueador proteja a reputação de sua marca. A venda casada da franquia
juntamente com os produtos a serem vendidos pelo franqueado garante a qualidade
dos produtos e a padronização dos processos de venda, além de evitar o free-riding,
uma vez que o franqueado não poderá utilizar-se da reputação da marca (reputação
esta que geralmente possui imenso valor econômico) para comercializar produtos que
poderão inclusive denegrir a imagem da franquia como um todo.
Respaldando esse entendimento, decidiu o conselheiro-relator Renault de
Freitas Castro, na representação 169/1993 apresentada pelo Posto Trevo de Búzios
contra a Esso Brasileira de Petróleo Ltda. (BRASIL, 1997c). O representante insurgiuse contra a decisão da Esso de condicionar o fornecimento de combustíveis aditivados
à compra conjunta pelo representante de filtro a ser acoplado à bomba de abastecimento. A decisão ratificou a licitude da conduta da representada, mormente após
verificar que inexistiam no mercado outros produtores do filtro a ser instalado e que
o objetivo deste era a proteção do consumidor final por meio da possibilidade de se
atestar a qualidade do produto.
Por fim, a formação de “pacotes”, “conjuntos” ou kits de produtos não configura ilícito quando o produto puder também ser adquirido separadamente, ainda
que por preço superior ao que teria no kit. Esse tipo de prática é também conhecida
como bundling.
14 Averiguação Preliminar n. 08000.005928/1997-06.
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3.2.6 Discriminação de preços
A discriminação de preços pode ser verificada quando um agente econômico ocupante de posição anterior na cadeia de produção estabelece, para
um mesmo produto, preços de venda diferentes para distribuidores ou
consumidores diferentes. A tipificação dessa prática encontra-se insculpida
no inciso XII do art. 21 da Lei n. 8.884/1994, que traz a seguinte redação:
“XII - discriminar adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços por
meio da fixação diferenciada de preços, ou de condições operacionais de
venda ou prestação de serviços” (BRASIL, 1994).
O grau de ilicitude dessa prática é, atualmente, um tema controverso. Sabe-se
que diversos motivos podem ensejar a cobrança diferenciada de preços para consumidores ou grupos de consumidores diversos. Como simples exemplo cita-se o volume
de compra. Os custos de transação envolvidos em compras de maior escala são significativamente menores que os de pequenas compras. Com o aumento do número
de pequenos compradores, aumenta-se o risco de inadimplência, o custo de logística,
etc. Assim, há justificativa economicamente plausível para a oferta de preços menores
a compradores em maior escala. Nesse sentido decidiu o conselheiro-relator Marcelo
Procópio Calliari (1998) no Processo Administrativo n. 96/1992, ajuizado por DNPDE
ex officio contra Itapetininga Agroindustrial S.A.
Outro claro exemplo de legalidade dessa prática foi dado no julgamento da
Averiguação Preliminar n. 08000.023469/1996-53 iniciada por uma pessoa física contra a Empresa Porto Seguro Cia. de Seguros Gerais. A representante insurgiu-se contra
a prática de preços diferenciados de seguro para um bem de mesmo valor em função das características subjetivas do beneficiário. A representação foi arquivada sob o
voto do conselheiro-relator Paulo Dyrceu Pinheiro (BRASIL, 1998b), que entendeu ser
aquela uma prática legal adotada por todas as empresas do setor, não configurando,
portanto, qualquer infração à concorrência.
Ainda no campo jurisprudencial, o voto do conselheiro-relator Mércio Felsky
(BRASIL, 1999e) no Processo Administrativo n. 94/1992, ajuizado ex officio em face
da Camargo Corrêa Industrial S.A., declara sem sombra de dúvida a legalidade da discriminação de preços em virtude da classificação da clientela. Restou provado nesses
autos que a Camargo Corrêa praticava preços mais baixos para os distribuidores do
que para os consumidores finais. A prática foi justificada primeiramente pelo fato de
o volume adquirido pelos distribuidores ser imensamente superior àquele adquirido
por lojistas; e em segundo lugar, pelo benefício indireto aos pequenos consumidores
finais, que aproveitavam parte do desconto conferido ao distribuidor (em virtude da
compra em escala), ainda que não efetuassem a compra de grande quantidade.
A ilicitude dessa conduta, segundo Salomão Filho (2003), reside exatamente
quando a diferença de preços é praticada sem que haja motivo para tal. Quando o
cenário econômico falha em oferecer o motivo da diferença, não nos resta outra justi-
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da
Concorrência
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ficativa válida que não a intenção de dominação do mercado por meio da exclusão de
concorrentes. Para ele, o elemento caracterizador do ilícito é essa intenção, consubstanciada no acordo que confere vantagens a um ou a alguns distribuidores, trazendo
manifestos prejuízos aos demais. Por óbvio, se um distribuidor é agraciado com preços
mais baixos na negociação com o produtor, sua negociação com o varejista também
será mais interessante que a dos demais distribuidores, o que os forçará a retirarem-se
do mercado.
Sobre essa ilicitude, pronuncia-se o relator ao julgar o Agravo de Instrumento n. 1.0024.06.984815-8/001(1) ajuizado com base no Processo Administrativo n.
08012.004086/2000-21, apresentado pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil
de Grandes Estruturas no Estado de São Paulo e outros em face da Gerdau S.A., Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira e Siderúrgica Barra Mansa S.A., da seguinte forma:
No referido procedimento administrativo, bem fundamentado com ampla
pesquisa e avaliação de mercado, contando ainda com parecer do Ministério Público Federal, o Cade reconheceu a ocorrência da formação de cartel
entre as siderúrgicas produtoras de vergalhões de aço, sendo que os preços
cotados para clientes independentes que não compõem a carteira fixa destas siderúrgicas são acima dos praticados para os clientes e distribuidores
fixos, aparentando controle de mercado.
E ainda:
Segundo deflui dos autos, a prática de preços diferenciados para se evitar concorrência pode ocasionar a exclusão das agravadas do mercado, de
modo que se deve determinar o retorno da situação ao status quo ante, a fim
de que possam as agravadas permanecer com a concorrência no mercado,
pois aqui presente o perigo na irreversibilidade da medida, ou mesmo a
ineficácia do provimento jurisdicional tardio (MINAS GERAIS, 2006).
Um segundo efeito dessa discriminação é a elevação das barreiras de entrada
de novos competidores. Assim como a benesse dada a um dos distribuidores coloca os
demais em relação de desvantagem, eventualmente os conduzindo para fora do mercado, essa mesma vantagem impede a entrada de novos concorrentes no mesmo nível
da cadeia de produção. Caso esses novos concorrentes adentrassem ao mercado, verse-iam nas mesmas desvantagens dos que ali estavam anteriormente e foram forçados
a retirar-se. O resultado seriam cadeias de produção exclusivas de uma marca, ou das
marcas de um determinado produtor, completamente integradas verticalmente, como
forma de garantir a continuidade do fornecimento e a justiça dos preços.
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4 Análise de casos
Antes de concluirmos este trabalho, faz-se necessária a análise de alguns casoschave cujos julgamentos demonstram claramente a relevância da posição dominante
ocupada pelas empresas no processo de apreciação das condutas adotadas por elas.
Veremos a seguir decisões dos órgãos de defesa da concorrência no Brasil por ser a
legislação pátria o objeto principal de nosso estudo. Serão analisadas tanto as decisões
nacionais quanto as decisões dos EUA como forma de se contrapor o modo de análise
da licitude das condutas nos dois países, tendo em vista a diferença nos ordenamentos
que embasam tais decisões, bem como a influência da legislação americana nos demais
ordenamentos.
4.1 AmBev vs. Schincariol15
O emblemático caso AmBev vs. Schincariol culminou em julho do ano passado na maior multa já aplicada na história do Conselho Administrativo de Defesa
Econômica.
O processo iniciado por intermédio de representação da Schincariol acusava
a representada de diversas práticas lesivas à concorrência, mas o cerne da reclamação
consistia na utilização pela representada de programas de fidelização denominados
“Festeja” e “Tô Contigo”, por meio dos quais a AmBev oferecia uma espécie de pontuação aos pontos de venda finais em troca da prática de descontos ao consumidor final
e de exclusividade, ou share AmBev muito mais elevado que o de suas concorrentes
no ponto de venda.
Segundo alegação da Schincariol, a prática gerava efeitos nefastos na economia
na medida em que impedia que o ponto de venda fixasse seu próprio preço, elevando
consideravelmente as barreiras à entrada de novos competidores, bem como o escoamento da produção dos competidores já existentes em virtude da exclusividade do
ponto de venda.
Ademais, foi investigado se a redução dos preços da “cerveja de combate” da
AmBev, a Antarctica, estaria ligada à conduta de preços predatórios ou se consistia
mero planejamento de concorrência agressiva.
Em resposta a ofício da SDE que pedia mais informações sobre o programa
“Tô Contigo”, a AmBev defendeu-se informando que a exclusividade de venda de
produtos da representada não era requisito para inclusão no programa, tampouco que
esse programa estava ligado a outros da empresa. Alegou que os descontos praticados
aos pontos de venda que aderiam ao programa não eram extremamente discrepantes
a ponto de intervir na economia como um todo, não passando de 3%.
15 Processo Administrativo n. 08000.003805/2004-10 (BRASIL, 2009a).
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da
Concorrência
559
Como forma de elucidação da questão, o Cade realizou uma pesquisa com 180
pontos de venda em São Paulo para determinar com os bares e os estabelecimentos
similares o procedimento e as implicações do programa “Tô Contigo”. No resultado,
salienta-se que 67% dos pontos de venda conheciam o programa, metade de todos eles
participava do programa e metade dos que participavam considerou que existia, pela
AmBev, a exigência de exclusividade para continuar no programa.
A defesa da representada apresentou diversos pareceres, entre eles o de Calixto
Salomão Filho, que concluiu pela inexistência de infração à concorrência, tendo em
vista não ser a prática da exclusividade compulsória nem mesmo requisito à adesão
do ponto de venda ao programa citado.
O parecer da SDE aponta claramente o contrário. A Secretaria entendeu que
parcela substancial da amostragem pesquisada compreendia a exclusividade como
obrigatória para a adesão ao programa. A Secretaria de Direito Econômico (2007,
p. 81) assinala:
De fato, os depoimentos indicam que a exclusividade de vendas é uma
condição para a participação no Programa “Tô Contigo”, sendo que essa
exigência pode ser flexibilizada, para alguns pontos de vendas, por meio da
permissão para que adquiram pequenas quantidades de marcas de cervejas
concorrentes.
Por fim, opinou a SDE pela condenação da representada nas práticas de limitar
ou impedir o acesso de novas empresas ao mercado; criar dificuldades à constituição,
ao funcionamento ou ao desenvolvimento de empresa concorrente ou de fornecedor,
adquirente ou financiador de bens ou serviços e, por fim, impedir o acesso de concorrente às fontes de insumo, matérias-primas, equipamentos ou tecnologia, bem como
aos canais de distribuição. A procuradoria do Cade, de forma semelhante, pediu a
condenação da reclamada por abuso de poder econômico.
Em brilhante voto, o conselheiro-relator inicia a apreciação da questão definindo o mercado relevante geográfico em separado para as diversas regiões do país.16
O mercado relevante de produto foi fixado como o das cervejas distribuídas “nos canais bar e tradicional”, uma vez que restou provada a abrangência do programa apenas
para garrafas retornáveis de cerveja, e não para latas ou ainda estabelecimentos de
autosserviço.17
Seguindo na definição do cenário econômico, o relator descreve o mercado de
cervejas nos canais de distribuição em questão como apresentando altas barreiras à
16 As regiões do país não correspondiam exatamente a cada mercado, sendo cada mercado definido da seguinte forma: mercado
1 – RS, SC e PR; mercado 2 – SP, RJ, MG, ES, GO e DF; mercado 3 – MT e MS; mercado 4 – BA, SE, AL, PE, PB, RN, CE, PI, MA,
AC, PA, TO e AP; e mercado 5 – AM, AC, RO e RR.
17 Por autosserviço entende-se aqueles estabelecimentos que possuem caixas para processamento de vários pedidos de um só
cliente ao mesmo tempo, ou seja, os supermercados e similares.
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entrada, criadas principalmente pelos altos investimentos em propaganda que visam a
criar e a fixar uma identidade para cada marca, que, por sua vez, apela a um públicoalvo distinto.
O requisito do poder de mercado fora também analisado e prontamente reconhecido, apontando inclusive uma média de market share da AmBev a título nacional
na casa dos 69 pontos percentuais.
Adentrando o mérito da lide, assinala o relator que a prática de descontos por
“patamares” de compra, como os que eram oferecidos aos participantes do programa
“Tô Contigo”, tem o condão de propiciar o que se convencionou chamar de efeito
sucção. O efeito sucção ocorre quando um comprador de certa quantidade aumenta
sua quantidade normal de compra para atingir o patamar estabelecido e, consequentemente, obter o desconto. Ocorre que ao comprar mais cervejas desse produtor que
ofereceu o desconto, o lojista deixa de comprar a cerveja do concorrente, principalmente porque muitas vezes sua demanda permanece inalterada, o que provocaria
excedente caso não diminuísse a compra do produto concorrente.
O relator cita ainda o caso Intel vs. AMD, no qual a primeira, detentora de
aproximadamente 70% do mercado mundial de processadores, ofereceu descontos
substanciais a uma determinada rede varejista exigindo em contrapartida que ela comprasse a totalidade, ou a quase totalidade, de seus processadores na Intel. A empresa foi condenada ao pagamento de multa bilionária. Os julgadores entenderam que
mesmo o preço final sendo menor para o consumidor com o fechamento de mercado
causado pela Intel, este perderia a faculdade de optar entre as marcas que mais lhe
atendiam, ficando adstritos a consumir os processadores Intel.
Retornando ao caso AmBev, após a análise dos possíveis efeitos da prática, o
órgão de defesa da concorrência passa a analisar o funcionamento do programa em
questão para chegar a uma conclusão se este possui o condão de infringir a concorrência ou se era, em verdade, mera ação mercadológica lícita. O julgador entendeu
em primeiro lugar que o programa não consistia em mera recompensa dos pontos
de vendas que adquiriam produtos AmBev. Ele utilizou como fundamento para tal
observação os depoimentos de bares entrevistados em pesquisa do Ibope, a qual indicava que metade deles via, como exigência de contrapartida, a necessidade de vendas
exclusivas das marcas AmBev.
A prova documental colhida em inspeção realizada na sede da representada
também respaldou as alegações de alguns pontos de venda que entendiam a necessidade de exclusividade nas vendas. Por fim, o Cade considerou que ainda que a exclusividade não fosse sistematicamente requerida para todas as adesões, ela o era para
muitas delas, prevalecendo sempre uma falta de informação do participante acerca das
condições do programa.
Defesa
da
Concorrência
561
Outro ponto importante destacado no voto do relator deixa bem claro que
existia uma espécie de retaliação aos bares que vendiam elevadas quantidades de outras marcas, levando à sua eventual exclusão do “Tô Contigo”.
Em passagem que justifica claramente a condenação da prática, diz o relator
(BRASÍLIA, 2009a):
Por meio do programa “Tô Contigo”, a AmBev consegue induzir os estabelecimentos a não oferecerem outras marcas, criando incentivos para que
concentrem toda a sua demanda em marcas da AmBev. Dentre as marcas
concorrentes, nenhuma consegue chegar sequer aos 50% de penetração
nos estabelecimentos, sendo a Kaiser a marca que obteve maior participação, com presença em 47 do universo abrangido pela pesquisa. Assim,
afigura-se a real possibilidade de que uma parte relevante dos consumidores tenha preferência estrita pelas marcas AmBev.
[...]
Assim, o programa tem por efeito possível uma mudança no padrão de
competição: da competição na margem para a competição pelo ponto de
venda todo, isto é, competição pelo lote. No entanto, mesmo que os rivais
da AmBev sejam mais eficientes não conseguem competir nesse padrão
específico (competir pelo lote), pois a força do portfólio de marcas é tão
grande que a demanda se torna rígida quanto a tais produtos. [...].
Com relação às possíveis eficiências, nenhuma foi verificada pelo órgão judicante, não se perceberam reduções em custos de transação, não havia investimentos
em propaganda ou pós-venda a se proteger.
Por fim, a fixação da multa foi definida com base no faturamento anual da
empresa (2%), o que levou ao valor recorde de R$ 352.693.696,58, além de multa
diária no valor de 50.000 Ufir (R$ 53.000,00).
4.2 Estados Unidos vs. Microsoft18
A empresa fundada por Bill Gates foi alvo de inúmeros processos antitruste ao
longo de sua bem-sucedida campanha para se consolidar como a maior empresa de
programas de computador do mundo.
Em maio de 1998, a União, seguida por diversos estados americanos, ajuizou
contra a Microsoft uma série de ações alegando violações ao Sherman Act. As alegações
foram eventualmente agrupadas de modo que se chegasse a apenas um veredito para
todas as supostas infrações.
18 ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA (1999. 147 F.3d 935).
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Quatro foram as principais acusações contra a gigante do setor de informática:
manutenção de contratos de exclusividade ilegais; venda casada ilegal do navegador
Internet Explorer com seus sistemas operacionais Windows; manutenção ilegal de
monopólio no setor de sistemas operacionais para computadores; e tentativa ilegal de
monopolizar o setor de navegadores de internet.
Dentre todas as acusações, a que ocupava o palanque central sem dúvida era
a da prática de tying entre o navegador e o sistema operacional. Em defesa própria,
a Microsoft alegou que os produtos eram um só, não poderiam ser separados, e que
os efeitos do agrupamento de produtos eram benéficos aos consumidores, uma vez
que estes poderiam usufruir gratuitamente do navegador com a compra do sistema
operacional.
As defesas da empresa foram sumariamente rechaçadas, a acusação demonstrou que os produtos não eram os mesmos, pois havia uma versão do Internet
Explorer para computadores de arquiteturas e sistemas operacionais distintos, como
o Mac da companhia Apple. Outra prova decisiva no processo foi a elevação do custo
do Windows após a introdução do navegador, o que demonstrou que este não era
oferecido gratuitamente, pelo contrário, seu custo estava simplesmente embutido
no valor do pacote.
A Microsoft foi acusada de agir de má-fé e utilizar-se de uma política concorrencial conhecida como Adotar, Expandir e Extinguir.19 Essa conduta teria sido responsável pela condenação no processo de tying, levando a Microsoft a tomar a posição
de navegador mais utilizado, até então ocupada pelo Netscape Navigator.
Em suas “conclusões sobre os fatos”,20 o juiz Thomas Penfield Jackson assinalou a seguinte passagem que demonstra claramente a tentativa de exclusão:
Os diretores da Microsoft se preocuparam com o fato de que o simples
desenvolvimento de seu próprio e atrativo navegador, a sua precificação
em zero e sua promoção vigorosa não desviaria utilização suficiente do Navigator para neutralizá-lo como plataforma. Eles acreditaram que um navegador comparável, ainda que oferecido gratuitamente, não seria suficientemente convincente para que a base de usuários do Netscape retraísse. Esta
crença se deve, ao menos em parte, ao fato de que o Navigator já possui
uma grande base instalada e se tornou praticamente um sinônimo de Internet na opinião pública. Se a Microsoft queria elevar a utilização do Internet
Explorer, e diminuir a do Navigator, seus administradores acreditaram que
19 “Embrace, extend and extinguish”. A célebre frase que descreve a política da Microsoft para com padrões de programas novos era
continuamente utilizada na empresa. A estratégia pode ser resumida em adotar os padrões de empresas externas (third parties),
integrar as funcionalidades do padrão criado aos programas próprios da Microsoft para, então, aos poucos, minar a necessidade
do programa original, criando desinteresse dos usuários na utilização destes.
20 Os “findings of fact ” constituem uma importante seção das decisões sobre casos antitruste no direito americano. Trata-se da
análise de mérito sobre os fatos alegados pelas partes.
Defesa
da
Concorrência
563
precisariam restringir o acesso do Netscape aos canais de distribuição que
levaram de forma mais eficiente à sua utilização21 (ESTADOS UNIDOS DA
AMÉRICA, 1999, tradução nossa).
O objetivo da Microsoft não era apenas o da concorrência no setor de navegadores de internet. A empresa sabia que sua posição dominante, praticamente monopolista,
representava uma imensa barreira à entrada de novos competidores. Essa barreira é
novamente expressa na decisão do juiz Jackson quando este chega à seguinte conclusão:
O interesse dos consumidores em um sistema operacional para PC advém
principalmente da habilidade deste sistema de rodar aplicativos. O consumidor deseja um sistema operacional que rode não apenas os tipos de
aplicações que ele conhece ou quer usar, mas também aqueles tipos nos
quais ele poderá se interessar posteriormente. Ademais, o consumidor sabe
que ao escolher um sistema operacional com demanda suficiente para dar
suporte a múltiplos aplicativos em cada categoria de produtos, ele terá menos chances de estar restrito, no futuro, à utilização de um programa cujas
características o desapontem. Finalmente, o usuário mediano sabe que, de
forma geral, os aplicativos melhoram através de versões sucessivas. Sendo
assim, ele deseja um sistema operacional para o qual sucessivas gerações
de seus aplicativos favoritos serão lançados. O fato de que um número
imensamente maior de aplicativos é programado para o Windows ao invés
de outros sistemas operacionais do PC atrai consumidores ao Windows,
já que isto os assegura de que seus interesses serão correspondidos desde
que utilizem os produtos da Microsoft (ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA,
1999, tradução nossa).22
Em novembro de 2001, um acordo foi alcançado no processo. A Microsoft
deveria dividir os códigos-fonte de seus programas e ainda apontar uma comissão
técnica de três pessoas que teriam acesso total e irrestrito a seus livros, servidores e
códigos-fonte a fim de garantir a fiscalização do cumprimento do acordo.
21 “Decision-makers at Microsoft worried that simply developing its own attractive browser product, pricing it at zero, and promoting
it vigorously would not divert enough browser usage from Navigator to neutralize it as a platform. They believed that a comparable
browser product offered at no charge would still not be compelling enough to consumers to detract substantially from Navigator’s existing share of browser usage. This belief was due, at least in part, to the fact that Navigator already enjoyed a very large
installed base and had become nearly synonymous with the Web in the public’s consciousness. If Microsoft was going to raise
Internet Explorer’s share of browser usage and lower Navigator’s share, executives at Microsoft believed they needed to constrict
Netscape’s access to the distribution channels that led most efficiently to browser usage.”
22 “Consumer interest in a PC operating system derives primarily from the ability of that system to run applications. The consumer
wants an operating system that runs not only types of applications that he knows he will want to use, but also those types in
which he might develop an interest later. Also, the consumer knows that if he chooses an operating system with enough demand
to support multiple applications in each product category, he will be less likely to find himself straitened later by having to use
an application whose features disappoint him. Finally, the average user knows that, generally speaking, applications improve
through successive versions. He thus wants an operating system for which successive generations of his favorite applications
will be released – promptly at that. The fact that a vastly larger number of applications are written for Windows than for other PC
operating systems attracts consumers to Windows, because it reassures them that their interests will be met as long as they use
Microsoft’s product”.
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O julgamento final da corte americana condenou a Microsoft, impondo diversas obrigações, como, por exemplo, incluir em seus sistemas operacionais, de modo
fácil e visível, a possibilidade de definição de quaisquer aplicativos como padrões de
sistema. Essa função foi adicionada ao painel de controle do Windows XP via atualização de sistema e continua instalada em todos os sistemas posteriores. A medida visa
a garantir ampla liberdade ao consumidor do sistema operacional, permitindo que
softwares de terceiros fossem integrados ao sistema operacional, mitigando a prática
de tying da Microsoft.
5 Conclusão
Este trabalho possibilitou-nos chegar a algumas conclusões importantes acerca dos efeitos das práticas restritivas em nossa economia, bem como às situações em
que são lícitas e ao processo de análise destas.
A evolução natural do direito antitruste em todo o mundo já tende para a
impossibilidade de aplicação da ilicitude per se. Independentemente da conduta adotada pelo agente, uma análise estrutural do cenário econômico relevante é sempre
necessária para determinar os potenciais efeitos negativos da prática, não devendo
ser adotadas medidas repressivas na ausência destes. A regra da razão é sem dúvida o
parâmetro que mais se coaduna com a intenção da legislação antitruste, cujo objetivo
último é a proteção dos consumidores e da concorrência em si.
Ainda nesse contexto, notamos que o fato de uma empresa ocupar posição
dominante em um determinado mercado lhe traz uma carga majorada de responsabilidade com seus concorrentes. Essa responsabilidade advém do modo como a lei prevê
a ilicitude das condutas. Discorremos anteriormente sobre não haver necessidade da
verificação de dolo ou mesmo culpa para que uma conduta seja punível pela legislação
antitruste. Ora, se a mera verificação de potenciais efeitos negativos é suficiente e se
a magnitude do impacto desses efeitos cresce de forma diretamente proporcional ao
poder de mercado, podemos chegar à simples conclusão de que a empresa em posição
dominante é mais ameaçadora à concorrência se comparada com empresas cujo poder
de mercado é menos expressivo.
Dentre as eficiências que acompanham as práticas restritivas em geral, podemos mencionar: (a) a redução dos custos de transação; (b) o incentivo ao investimento
em propaganda, melhoria do produto em si bem como do processo de vendas; (c) a
realocação de poder de mercado em setores nos quais há grande desequilíbrio entre
os agentes ao longo da cadeia produtiva; (d) diminuição dos custos com pesquisa e
desenvolvimento; (e) manutenção da reputação da empresa bem como padrão de qualidade aceitáveis; e (f) aumentos de escala em compras, vendas e exportações.
Por sua vez, é seguro concluir que entre as ineficiências possivelmente produzidas por práticas restritivas estão: (a) aumento de barreiras à entrada de novos
competidores; (b) exclusão de concorrentes; (c) aumento de preços ao consumidor
Defesa
da
Concorrência
565
final; (d) diminuição da liberdade de escolha (tanto de consumidores quanto de fornecedores); e (e) aumento “artificial” de poder de mercado.
Algumas práticas restritivas só produzem efeitos, sejam eles reais ou potenciais
na economia, se utilizadas por empresa que detenha um alto nível de poder de mercado. Tomemos como exemplo uma recusa de negociação. Se há apenas um produtor
em determinado segmento do mercado, sua recusa de fornecer para mais de um distribuidor será o suficiente para instaurar um monopólio no nível de distribuição. Noutro
giro, se existem outros produtores e este que se recusa não é detentor de expressivo
poder de mercado, tal negativa de negociação dificilmente será hábil para impedir a
atividade de outros distribuidores, preservando-se a possibilidade de concorrência
nesse grau da cadeia produtiva.
Por fim, concluímos que o mercado é incapaz de conter, por si só, a adoção
de condutas anticoncorrenciais e de acordos entre agentes com potencial de causar
danos ao consumidor, tornando-se imprescindível a atuação dos órgãos de defesa da
concorrência na identificação e na repressão a esses acordos e condutas.
O ato de prever é sempre um processo complexo. A projeção de efeitos requer
o conhecimento de variáveis que nem sempre estão à disposição do julgador Assim,
uma análise in casu que leve em consideração o maior número de informações possíveis sobre o cenário relevante será sempre a mais adequada para a determinação da
licitude de condutas.
Referências
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Bosco Leopoldino da Fonseca. Brasília, 8 nov. 2000.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo
n. 08000. 015337/1994-48. Representante: SDE ex officio. Representada: Cia.
Siderúrgica Nacional – CSN, Cia. Siderúrgica Paulista – Cosipa e Usiminas
Siderúrgicas de Minas Gerais S.A. Relator: Ruy Santacruz. Brasília, 2 dez. 1999a.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo
n. 08000.011518/1994-06. Representante: Ciefas – Comitê de Integração de
Entidades Fechadas de Assistência à Saúde. Representada: Caixa de Assistência dos
Funcionários da Empresa Energética de Sergipe S.A. Relator: Conselheiro João Bosco
Leopoldino da Fonseca. Brasília, 28 jul. 1999b.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo
n. 08000.017766/1995-33. Representante: União Catarinense de Veículos.
Representada: Fiat do Brasil S.A. Relatora: Lúcia Helena Salgado e Silva. Brasília, 2
dez. 1999c.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo
n. 08000.019008/1995-96. Representante: Organização Médica Clinihauer Ltda.
Representada: Unimed – Toledo– Cooperativa de Trabalho Médico. Relator: Mércio
Felsky. Brasília, 10 fev. 1999d.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo n.
94/1992. Representante: DNPDE ex officio. Representada: Camargo Corrêa Industrial
S.A. Relator: Mércio Felsky. Brasília, 25 maio 1999e.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Resolução n. 20 de 9 de
junho de 1999. Dispõe, de forma complementar, sobre o Processo Administrativo,
nos termos do art. 51 da Lei n.8.884/1994. Diário Oficial, Brasília, 28 jun. 1999f.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Ato de Concentração n.
84/1996. Requerentes: Mahle GmbH e Cofap – Companhia Fabricadora de Peças.
Relator: Lúcia Helena Salgado e Silva. Brasília, 22 set. 1998a.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Averiguação Preliminar n.
08000.023469/1996-53. Representante: Silvia Rosetto. Representada: Empresa Porto
Seguro Cia. de Seguros Gerais. Relator: Paulo Dyrceu Pinheiro. Brasília, 28 jan.
1998b.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo n.
0103/1992. Representante: DNPDE, ex officio. Representada: Cimentos do Brasil S.A.
– Cibrasa. Relator: Marcelo Procópio Calliari. Brasília, 23 set. 1998c.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo n.
44/1992 . Representante: Comércio de Pneus Adriano Ltda., Borracharia Estação,
Padock Comércio de Pneus Ltda., Eskina dos Pneus, Comércio de Escapamentos
Defesa
da
Concorrência
567
Catarina Ltda. e Recapeadora Eldorado. Representada: Indústria de Pneumáticos
Firestone. Relator: Antônio Carlos Fonseca da Silva. Brasília, 20 abr. 1998d.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Resolução n. 15, de 19 de
agosto de 1998. Disciplina as formalidades e os procedimentos no Cade relativos aos
atos de que trata o art. 54 da Lei n. 8.884, de 11 de junho de 1994. Diário Oficial,
Brasília, 28 ago. 1998e.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Averiguação Preliminar
n. 08000.005928/1997-06. Representante: Sescove – Sindicato das Empresas
de Conservação de Veículos, Lava-Rápidos e Similares do Estado de São Paulo.
Representada: Postos de Combustíveis do Estado de São Paulo. Relator: Paulo
Dyrceu Pinheiro. Brasília, 5 nov. 1997a.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativo n.
0149/1994. Representante: Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria de
São Paulo. Representada: Insol – Indústria de Sorvete Ltda. Relator: Leônidas Rangel
Xausa. Brasília, 19 nov. 1997b.
______. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Representação n. 169/1993.
Representante: Posto Trevo de Búzios. Representada: Esso Brasileira de Petróleo
Ltda. Relator: Renault de Freitas Castro. Brasília, 10 dez. 1997c.
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n. 53/1992. Representante: Ministério Público do Estado de Sergipe. Representada:
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