Origem das Espécies Origem da Vida Design Inteligente

Transcrição

Origem das Espécies Origem da Vida Design Inteligente
Origem das Espécies
Origem da Vida
Design Inteligente
Graça F. Lütz
Março de 2009
ii
Sumário
1 Introdução
Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
1
1
2 Origem das Espécies
2.1 Conceito de Espécie . . . . . . . . . . . . . .
2.2 Histórico de “A Origem das Espécies” . . . .
2.3 Sı́ntese Evolutiva Moderna ou Neodarwinismo
2.4 Especiação . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
2.5 Discussão sobre os tópicos anteriores . . . . .
Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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3
3
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4
4
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6
3 Origem da Vida
3.1 Definição de vida . . . . . . . . . . .
3.2 Teorias sobre a Origem da Vida . . .
3.2.1 Histórico . . . . . . . . . . .
3.2.2 Origem através de Replicação
3.2.3 Origem Metabólica . . . . . .
3.3 Discussão sobre os tópicos anteriores
Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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4 Design Inteligente
4.1 O que é design inteligente? . . . . . . . . . . . . . .
4.2 Breve histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4.3 Agenda Polı́tica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4.4 Complexidade Irredutı́vel e Complexidade Especı́fica
4.5 Discussão sobre os tópicos anteriores . . . . . . . . .
Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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19
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5 Conclusões
Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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iii
Capı́tulo 1
Introdução
Em 2006, a vencedora de um concurso promovido pela
Universidade de Pittsburgh foi uma equipe de especialistas
em informática. O segundo lugar foi para uma equipe de
fı́sicos. O concurso tinha como objetivo a interpretação de
“scans” do cérebro de voluntários, feitos por ressonância
magnética funcional, enquanto estes assistiam a um filme.
Com base nos resultados do tomógrafo, os concorrentes deveriam tentar interpretar os pensamentos dos voluntários
enquanto assistiam ao filme. Os vencedores utilizaram
um algoritmo que conseguiu acertar em 84% os pensamentos dos voluntários. A segunda colocação foi conquistada mediante a redução do problema “a uma questão
matemática”, segundo Greg Stephens, fı́sico da Universidade de Princenton, Nova Jersey [1]. Por que o concurso
foi vencido por pessoas sem experiência em neurofisiologia
enquanto pesquisadores do cérebro alcançaram colocações
bem mais modestas?
A resposta só pode estar na diferença de metodologia
que eles utilizaram, ou seja, recorreram a métodos matemáticos. Galileu acreditava que o Universo foi escrito
em linguagem matemática [2]. As teorias existentes na
Fı́sica hoje são todas modelos matemáticos.
Existem alguns exemplos antigos, na Fı́sica, do que
acontece quando se raciocina a respeito de um assunto
de forma qualitiva e tudo parece bem explicado até que
se usa um modelo matemático e a realidade sobre aquele
assunto vem à tona.
Anteriomente a 1859, a solução imaginada para a
questão da precessão do periélio de Mercúrio baseava-se
na idéia de que os planetas próximos poderiam causar
uma espécie de arrastão gravitacional em sua órbita. Em
1859, LeVerrier expandiu uma solução clássica do problema da precessão de Mercúrio. Esta solução mostrou
que havia uma margem de 38 segundos de arco, na época,
que não era abrangida pelas equações de Newton e de Kepler. Várias explicações surgiram como hipóteses, mas o
problema só foi resolvido, posteriormente, como resultado
de equações da Relatividade Geral [3].
Explicações qualitativas podem resolver, aparentemente, muitas questões, mas quando se usa um modelo
matemático, em que se pode lidar com um nı́vel muito
superior de detalhamento, estas explicações que pareciam
tão boas podem se demonstrar insuficientes.
Os temas da origem das espécies e origem da vida, sobre os quais discorrerei, têm recebido tratamento indireto
e experimental por parte dos cientistas que se dedicam a
estas pesquisas. Indireto porque não se pode lidar diretamente com a origem da vida e a da maioria das espécies que
hoje existem, uma vez que estes são eventos passados aos
quais não se tem acesso direto. Experimental porque se fazem experimentos que possam acrescentar conhecimentos
sobre estes temas e, apesar de se fazerem alguns modelos matemáticos para abordar aspectos especı́ficos deles,
não se tem, em Biologia Evolutiva, nenhum modelo matemático evolutivo abrangente que contenha formalmente
os postulados da teoria. A teoria não pode vir antes do
modelo matemático e depois tentar-se fazer algum modelo
matemático encaixar-se nela. A teoria tem de ser baseada
em estruturas matemáticas, se é que se deseja a eficiência
e confiabilidade do método cientı́fico.
Glossário
Modelos matemáticos
Um modelo é uma forma de representar caracterı́sticas de alguma coisa. Por exemplo, um texto
que descreve algo pode ser considerado um modelo.
Uma maquete também é um modelo. Modelos formais ou cientı́ficos são representações que usam rigorosamente uma linguagem e uma metodologia da
Matemática. Modelos formais também são chamados
de modelos matemáticos. 1
Neurofisiologia
Estudo do funcionamento do sistema nervoso. 1
Periélio
É o ponto da órbita de um corpo que está mais
próximo do Sol. 1
Precessão
Em astronomia, diz respeito a uma mudança lenta e
contı́nua, induzida por gravidade, no eixo rotacional
ou órbita de um corpo. 1
Relatividade Geral
Teoria cientı́fica baseada no cálculo tensorial
que descreve o comportamento macroscópico do
espaçotempo. 1
Ressonância magnética funcional
É um tipo de ressonância magnética por imagem. A
1
2
Glossário
ressonância magnética por imagem utiliza um campo
magnético poderoso e pulsos de frequência de rádio
para coletar informações que permitam produzir imagens de órgãos, tecidos moles, ossos e outras estruturas em um computador. A ressonância magnética
funcional é um procedimento que utiliza a ressonância
magnética por imagem para medir o aumento de
fluxo sanguı́neo nos vasos de determinadas regiões do
cérebro que estão em atividade. 1
Teorias
A palavra ‘teoria’ é praticamente um sinônimo da
palavra ‘modelo’. A diferença é que normalmente
usamos a palavra ‘teoria’ para significar modelos
muito abrangentes (que descrevem muitas coisas).
Por exemplo, a Teoria Eletromagnética descreve os
fenômenos eletromagnéticos. Podemos, por exemplo,
usar esta teoria para fazer um modelo mais especı́fico
que represente um circuito de rádio, TV ou computador. 1
Tomógrafo
Um aparelho utilizado em tomografia é um
tomógrafo. A tomografia produz imagens de secções
das estruturas. 1
Capı́tulo 2
Origem das Espécies
2.1
Conceito de Espécie
xuadas) identificáveis por uma combinação única de
estados de caracteres em indivı́duos comparáveis.”
Anteriormente a Darwin, os organismos eram agrupados
por semelhanças, as espécies eram consideradas distintas
e imutáveis. Carolus Linnaeus, no século dezoito, fez uma
classificação dos organismos de acordo com diferenças em
seus aparelhos reprodutivos [4]. Atualmente existem três
diferentes conceitos de espécie [5]:
Crı́ticas feitas a este conceito consideram que faltam
limites para identificação, que se podem encontrar caracteres para identificar quase qualquer população ou
organismo em diferentes espécies, principalmente se
forem usadas técnicas moleculares. O efeito disto é
um aumento no número de espécies.
1. Conceito biológico de espécie: “Espécies são grupos de populações naturais que cruzam entre si, de
fato ou potencialmente, e são reprodutivamente isolados de outros grupos” (Mayr, 1940) [6].
2.2
Um exemplo que mostra que a definição atual não é
precisa é o caso de espécies em anel. Estas espécies
fazem parte de populações que variam ao longo de
um clino, ou seja, populações que vivem em uma área
contı́nua que varia gradualmente dando origem a diferentes caracterı́sticas nas populações que vivem ao
longo dele. Espécies vizinhas podem cruzar entre si,
mas as que vivem nas extremidades do anel não podem cruzar. O problema seria se deve-se definir o anel
inteiro como uma espécie única ou cada população
como uma espécie distinta.
Histórico de “A Origem das
Espécies”
Em 1859, foi publicado o livro de Charles Darwin, A Origem das Espécies (em inglês: On the Origin of Species by
Means of Natural Selection, or The Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life [7]. Na introdução de seu
livro, Darwin descreve como chegou a ele e às conclusões
ali expressas.
Darwin relata que, durante sua viagem a bordo do Beagle, alguns fatos pareciam lançar “alguma luz sobre a
origem das espécies”. Em seu retorno, pareceu-lhe que
algo poderia ser feito a respeito desta questão por pacientemente reunir fatos e refletir sobre eles. Após cinco
anos, ele se permitiu “especular sobre o assunto” e redigiu algumas notas que ampliou em 1844 em um esboço
das conclusões. Três anos mais tarde, sua obra estava
quase finalizada. Ele informou que seu “resumo” estava
“necessariamente imperfeito” e que ele não podia fornecer
“referências e autoridades” para suas declarações, em que,
sem dúvida, seriam encontrados “erros”. Ele sentia necessidade de publicar, posteriormente, em “detalhes todos os
fatos, com referências”, sobre os quais suas “conclusões estavam baseadas”. Ele estava cônscio de que “escassamente
um único ponto foi discutido neste volume a respeito do
qual não podem ser aduzidos fatos”.
Darwin inicia sua reflexões sobre a origem das espécies
descrevendo as variações induzidas pelo homem em
espécies de plantas e animais domésticos. Em seu próximo
capı́tulo ele relata a ampla variação que ocorre dentro das
espécies na natureza, dificultando, muitas vezes, o classificá-las como variações ou outras espécies. Ele sugere que
estas variações fariam parte do processo de surgimento de
novas espécies. A seguir, é delineada a luta pela existência,
baseada nas idéias de Malthus, com a conclusão de que
2. Conceito evolutivo de espécie: “Espécie evolutiva é uma linhagem (uma sequência de populações
de ancestrais-descendentes) evoluindo separadamente
de outras e com suas próprias tendências e função evolutiva unitária.” (Simpson, 1961.) Esta definição foi
um pouco alterada por Wiley em 1978: “Uma espécie
é uma linhagem única de populações de organismos
de ancestrais e descendentes que mantêm sua identidade separada de outras linhagens e que tem suas
próprias tendências e destino histórico.”
Este conceito tem recebido crı́ticas por se considerar
que as expressões “tendências evolutivas” e “destino
histórico” são muito vagas para serem testáveis.
3. Conceito filogenético de espécie: “Uma espécie é
o menor grupo identificável de organismos individuais
dentro do qual existe um padrão parental de ancestralidade e descendência.” (Cracraft, 1983.) Uma
versão um pouco modificada foi proposta por Nixon
e Wheeler, em 1990, em que uma espécie é “o menor
agregado de populações (sexuadas) ou linhagens (ase3
4
pequenas mudanças em uma espécie, de algum modo favoráveis, seriam retidas e passadas às próximas gerações,
configurando-se assim uma “seleção natural”, que seria realizada pela natureza ao invés da seleção artificial realizada pelo homem. A luta pela existência levaria à inevitável extinção de espécies menos adaptadas. O processo da seleção natural de espécies mais adaptadas seria
contı́nuo e lento, acumulando variações ao longo de extensos perı́odos geológicos. Durante sua viagem no Beagle,
Darwin leu o livro Princı́pios da Geologia de Charles Lyell,
que propunha longos perı́odos de tempo de mudanças graduais para o estabelecimento das configurações geológicas.
Entre os sexos, a seleção ocorreria não devido a uma
luta pela existência, mas a uma disputa entre os machos
pelas fêmeas, sendo vitoriosos e produzindo descendência
mais numerosa os machos mais fortes ou aqueles portando
caracterı́sticas mais atraentes para as fêmeas. Isto determinaria que estas caracterı́sticas fossem fortalecidas na
espécie enquanto as dos machos menos bem sucedidos enfraquecidas e, talvez, até extintas. O isolamento geográfico
seria um elemento importante na seleção natural, pois detendo a imigração de variedades mais adaptadas e a competição, premitiria a uma outra variedade ser lentamente
aprimorada e produzir uma nova espécie. A seleção natural levaria a divergência de caracter: quanto mais seres
vivos existissem na mesma área, mais eles divergiriam em
estrutura, hábitos e constituição. Na luta das espécies
para aumentaram seus números, quanto mais diversificados os descendentes se tornassem melhores seriam suas
chances de sobrevivência.
Como motivo para não se encontrarem espécies intermediárias no registro geológico, Darwin alega a extrema
imperfeição deste registro. Comenta as dificuldades de
preservação dos fósseis. Partes moles não podem ser preservadas, partes duras como conchas e ossos se desfazem
quando depositadas no fundo do oceano, onde sedimento
não se acumula. Restos que são envolvidos por areia ou
cascalhos são dissolvidos por percolação da água da chuva
por ocasião do erguimento do leito. O sedimento acumulado deveria ser extremamente espesso, sólido ou formado
por extensas massas para resistir à incessante ação das
ondas quando erguido e sofrendo posteriores oscilações de
nı́vel. Uma camada fossı́fera espessa e extensa só poderia se acumular durante um perı́odo de subsidência, mas
o mesmo movimento de subsidência tenderia a afundar
a área fazendo derivar o sedimento. Seria necessário um
equilı́brio exato entre a subsidência e o suprimento de sedimento para preservar o registro.
Em sua revisão do livro, no último capı́tulo, Darwin declara que acreditava que todos os animais descendiam de,
no máximo, quatro ou cinco progenitores e as plantas de
um número menor ou igual. Ele escreve que, a partir das
semelhanças entre todos os seres vivos, tais como composição quı́mica, estrutura celular e leis de crescimento e
reprodução, ele infere que provavelmente todos os seres
orgânicos tenham descendido de uma única forma primordial.
CAPÍTULO 2. ORIGEM DAS ESPÉCIES
2.3
Sı́ntese Evolutiva Moderna ou
Neodarwinismo
A sı́ntese evolutiva moderna ou neodarwinismo representa
a unificação do prı́ncipio darwiniano da seleção natural com a genética mendeliana. O desenvolvimento da
genética de populações, à luz dos prı́ncipios de Darwin de
lenta e contı́nua variação e seleção natural, através das
contribuições de R.A. Fisher, J.B.S. Haldane, e Sewall
Wright, foi crucial para o desenvolvimento da sı́ntese moderna. A sı́ntese foi sendo formulada entre as décadas de
1930 e 1940. Em 1937, Theodosius Dobzhansky publicou
o primeiro trabalho considerado neodarwiniano, Genetics
and the Origin of Species. Este trabalho foi importante
em aproximar geneticistas de população com naturalistas
de campo. Em 1942, Ernst Mayr deu sua contribuição
à sı́ntese publicando a obra Systematics and the Origin
of Species. Nesta obra ele enfatiza a importância da especiação alopátrica e se demonstra cético em relação à
especiação simpátrica. Ele também introduz o conceito
moderno de espécie (conceito biológico). George Gaylord
Simpson reconcilia a sı́ntese moderna com a Palentologia
em seu livro Tempo and Mode in Evolution, publicado em
1944. G. Ledyard Stebbins contribuiu para fazer a sı́ntese
abranger a botânica em sua obra Variation and Evolution
in Plants de 1950 [8].
Segundo a sı́ntese moderna a variação entre as populações ocorre através de mutações e recombinação. A
evolução se dá quando ocorre uma mudança na frequência
dos alelos devido a deriva genética, fluxo gênico, seleção
natural e pressão de mutação direcional. A seleção natural atua sobre o fenótipo preservando caracterı́sticas favoráveis. Se o fenótipo que representa uma caracterı́stica
favorável tiver correspondência no genótipo, então este aumentará sua frequência na próxima geração.
2.4
Especiação
Especiação seria o processo evolutivo através do qual se
formam as espécies. Ocorreria através da transformação
gradual de uma espécie em outra (anagênese) ou por uma
espécie se dividir em duas (cladogênese). Idéias antigas,
anteriores ao Darwinismo, provinientes de uma filosofia
essencialista, preconizavam mudanças repentinas nos organismos de uma geração para outra. Isto ficou conhecido como saltacionismo. Segundo Ernst Mayr (1992), “a
especiação é explicada ou por evolução filética gradual,
com as lacunas entre as espécies ocorrendo devido a deficiência do registro fóssil ou por especiação saltacionista
simpátrica. De fato, a maioria dos paleontologistas adotou
as duas opções. A aceitação do Gradualismo filético não
requer a aceitação de uma taxa constante de mudança evolucionária. A taxa pode se acelerar ou ficar mais lenta, mas
a mudança leva inexoravelmente à contı́nua transformação
de uma linhagem” [9]. O mecanismo através do qual se
daria a especiação consistiria no isolamento geográfico de
uma subpopulação de uma espécie, devido a barreiras dividindo o ambiente, tais como rios mudando o seu curso,
2.5. DISCUSSÃO SOBRE OS TÓPICOS ANTERIORES
surgimento de montanhas, etc., ou na alteração do nicho
ou do comportamento desta subpopulação, de tal forma
que isto resultaria no isolamento reprodutivo desta subpopulação em relação ao restante da população. Mutações
cumulativas acabariam por mudar o genótipo e o fenótipo
desta subpopulação de tal forma que ao se encontrar com
sua população original, indivı́duos deste grupo já não seriam compatı́veis reprodutivamente com os daquela. O
isolamento geográfico e reprodutivo de uma subpopulação
é um dos quatro modos pelo qual se daria a especiação e
é conhecido como especiação alopátrica.
A especiação peripátrica é semelhante à alopátrica, com
a diferença de que na peripátrica a subpopulação é muito
menor do que a população original. Este tipo de especiação relaciona-se com o efeito fundador, o qual é um tipo
de efeito gargalo, ou seja, por haver poucos fundadores na
subpopulação ocorre uma diminuição da variabilidade em
relação à população maior. Há também maior chance de
endogamia e de um aumento no nı́vel de defeitos provinientes de genes recessivos. Em uma população pequena,
a deriva genética tem um maior efeito do que a seleção
natural sobre as variações na população.
Na especiação parapátrica não ocorre o isolamento geográfico, mas subgrupos de uma população podem ocupar
nichos diferentes impedindo o fluxo gênico.
Na especiação simpátrica as populações se diferenciam
enquanto ocupam a mesma área. Como exemplos têm-se
insetos que se tornam dependentes de plantas hospedeiras diferentes e plantas que desenvolvem poliploidia e não
podem mais se reproduzir com as espécies que lhes deram
origem.
Fatores que concorrem para o isolamento reprodutivo
entre duas espécies são, por exemplo, mudanças no comportamento de corte de uma população em relação a outra, habitats diferentes, inadequação antômica de órgãos
reprodutivos, mudança no ciclo reprodutivo, impossibilidade de desenvolvimento de um embrião hı́brido ou, se ele
se desenvolver, morrerá rápido ou será infértil.
Hibridação ou transposição de genes também poderiam
levar a novas espécies mais adaptadas [10].
A especiação através de equilı́brio pontuado surgiu
como uma extensão da especiação alopátrica, especialmente a peripátrica, e foi um conceito inicialmente proposto por Ernest Mayr, que se tornou conhecido através
do trabalho de Niles Eldredge e Stephen Jay Gould em
1972 [11]. Esta proposta vê a especiação ocorrendo de
forma rápida em eventos precedidos e sucedidos por longos perı́odos de estase ou pouca variação das espécies.
Esta especiação ocorreria em grupos pequenos e perifericamente isolados onde as pressões seletivas seriam intensas porque estas regiões estariam no limite de tolerância
da população. As variações favoráveis se espalhariam rapidamente por esta população pequena. Indivı́duos desta
população, posteriormente, surgiriam por migração no local da população originária, mas seria muito improvável
serem encontrados fósseis no local periférico devido ao tamanho da população e rapidez das mudanças [12].
A matéria prima para a especiação bem sucedida seriam
caracterı́sticas favoráveis em determinado ambiente sur-
5
gidas através de mutações que fossem fixadas e passadas
para as próximas gerações. Mas no final da década de 1960
e inı́cio da de 1970, Motoo Kimura propôs a teoria neutra
de evolução molecular, segundo a qual, a maior parte da
variabilidade genética das espécies é seletivamente neutra
e não altera a adaptabilidade destas. Um exemplo disto
seria o que é chamado de degeneração do código genético,
ou seja, diferentes conjuntos de três nucleotı́deos podem
codificar o mesmo aminoácido de forma que a proteı́na final permanecerá a mesma [13]. A maioria destas mutações
neutras ocorreria por deriva genética. A teoria neutra é
o fundamento de uma técnica que relaciona o número de
diferenças moleculares ao tempo em que as espécies divergiram.
Atualmente, com o sequenciamento do genoma de muitas espécies, dados estatı́sticos sugerem a pesquisadores
de evolução que a teoria neutra teria subestimado o papel
da seleção natural. Uma pesquisa sobre evolução experimental, publicada em 2001 [14], com duas espécies de bacteriófagos, vı́rus que infectam bactérias, demonstrou, aparentemente, um processo rápido de evolução por seleção
natural quando os bacteriófagos tiveram de se adaptar a
um ambiente anormalmente quente. Entre as mutações
que ocorreram no DNA, algumas permitiram a adaptação
ao ambiente quente.
Os eventos evolutivos levando as espécies a se diferenciarem são classificados em micro e macroevolução. Microevoulação seriam mudanças na frequência genética de uma
população ou espécie em um número reduzido de gerações
[15]. Macroevolução seriam eventos evolutivos ocorrendo
a partir do nı́vel de espécie para cima e transcorreria em
uma escala de tempo muito maior como uma sucessão de
eventos de microevolução [16]. Um exemplo de macroevolução seria o surgimento de penas nas aves.
2.5
Discussão sobre os tópicos anteriores
Uma questão importante, que deveria ser levada em conta
ao se questionar sobre a origem das espécies, é o que é
uma espécie. Se a definição existente tiver excessões ou
for vaga, ela não é uma boa definição que possa ser usada
de forma eficiente. Como foi visto, as definições atuais são
imprecisas, mas mesmo assim, se considerarmos este tipo
de investigação como lidando com a origem dos grupos de
seres vivos, esbarraremos em outro problema conceitual,
que seria a definição de vida.
Deixando de lado as definições e considerando a obra de
Charles Darwin, A Origem das Espécies, é inegável que ela
é extremamente coerente, produto de amplas observações
da natureza e profundas reflexões, das quais ele conseguiu extrair alguns fatos e princı́pios bem estabelecidos,
como variações, seleção natural e caracterı́sticas fixadas e
herdáveis nos organismos.
Por mais que o raciocı́nio de Darwin tenha sido brilhante e encontre correspondência na natureza, sua obra
não pode ser chamada de teoria, do ponto de vista rigorosamente cientı́fico, senão no sentido popular da palavra.
6
Isto porque, como já foi mencionado, uma teoria, cientificamente falando, é uma estrutura matemática. Outras
definições para a palavra teoria nos fariam cair no terreno
inseguro das racionalizações e paradigmas humanos elevados a categoria de verdades absolutas que não podem
ser contestadas unicamente porque alguns seres humanos
acreditam que seu raciocı́nio é melhor do que o dos outros.
Darwin, no entanto, na introdução da “Origem”, se
mostrou consciente de que suas reflexões eram especulações, como ele mesmo disse, de que sua obra estava
imperfeita e incompleta e de que faltavam fatos para aduzirem suas idéias. Por mais que algumas idéias pareçam
boas, é preciso que se tenha em mente que quando as coisas são devidamente formalizadas em uma estrutura matemática, surgem muitos dados que não se consegue prever
com o raciocı́nio não formal.
Uma declaração de Darwin, por exemplo, que hoje é tratada como um fato que não pode ser contraditado, pelo
menos não se admite outra explicação, é a de que todos
os seres orgânicos teriam descendido de poucas ou de uma
única forma primordial. Ele conclui isto baseado nas semelhanças entre todos os organismos. Isto é uma hipótese,
que não foi devidamente testada, diga-se de passagem,
pode ser uma boa hipótese, mas é apenas isto.
Existem muitas observações, experimentos, técnicas e
modelos computacionais e matemáticos sendo relizados
para esclarecer mecanismos de especiação, seleção, proximidade e divergência entre espécies (baseadas no genoma,
por exemplo). Mas quanto eu saiba, não existe nenhum
experimento, modelo computacional ou matemático demonstrando (que não seria a mesma coisa que mostrar que
é possı́vel) que todos os organismos vivos têm um único
ancestral comum.
Dez trilhões de cientistas acreditando em uma idéia não
tornam esta idéia mais cientı́fica do que qualquer outra se
ela não pode ser demonstrada.
Glossário
Glossário
Deriva genética
É a mudança na frequência com que um variante de
um gene (alelo) ocorre em uma população. Isto ocorre
porque os descendentes têm uma mostra aleatória dos
genes dos pais e por causa do acaso em determinar se
eles sobreviverão e se reproduzirão. 4
DNA
É um ácido nucleico que contém as instruções
genéticas usadas no desenvolvimento e funcionamento
de todos os organismos vivos conhecidos e alguns
vı́rus. 5
Endogamia
Um sistema onde os acasalamentos ocorrem entre indivı́duos aparentados. 5
Especiação alopátrica
Ocorre quando grandes populações ficam isoladas fisicamente por uma barreira e envolve isolamento reprodutivo, pois quando a barreira desaparecer, os indivı́duos das populações separadas já não podem cruzar entre si. 4
Especiação simpátrica
Quando populações começam a se diferenciar enquanto habitam a mesma área sem barreira geográfica
ao ponto de não mais poderem se cruzar. Pode ocorrer por mudança nos hábitos alimentares, ou em plantas que desenvolvem poliploidia, etc. 4
Espécies em anel
Populações que vivem ao longo de um clino curvo e
podem cruzar com as populações vizinhas. No ponto
onde o inı́cio da curva encontra o fim, as populações
que vivem nestas duas extremidades não podem cruzar entre si. As espécies em anel são as que podem
cruzar umas com as outras. 3
Espécies intermediárias
Alelos
Espécies que foram transições evolutivas entre uma
São membros de um par ou um conjunto de diferentes
espécie ancestral e uma espécie descendente. 4
formas de um gene. Seres humanos possuem duas
cópias de cada cromossomo (diploidia), sendo uma Estase
do pai e outra da mãe. Os genes que codificam para
Perı́odos, durante a evolução, em que as espécies se
os mesmos tipos de caracterı́sticas em cada um dos
mantêm relativamente sem mudanças. 5
cromossomos são alelos. 4
Aminoácido
Molécula orgânica composta de carbono, hidrogênio,
oxigênio e nitrogênio. O aminoácidos se unem para
formar as proteı́nas. 5
Fenótipo
É o conjunto de caracterı́sticas observáveis em um organismo, como aspectos fı́sicos, comportamento, etc.
4
Clino
Mudança gradual de uma caracterı́stica ou traço em
uma espécie ao longo de uma área. 3
Filogenético
Relacionado a filogenia. Filogenia é o termo comumente utilizado para hipóteses de relações evolutivas
(ou seja, relações filogenéticas) de um grupo de organismos, isto é, determinar as relações ancestrais entre
espécies conhecidas (ambas as que vivem e as extintas). 3
Corte
Consiste em comportamentos utilizados por animais
para encontrar parceiros e se reproduzir. 5
Glossário
7
Filosofia essencialista
Nicho
É um ponto de vista em que qualquer entidade de
Nicho ecológico é o modo de vida de cada espécie no
um tipo especı́fico possui um determinado conjunto
seu habitat. 5
de caracterı́sticas. 4
Nucleotı́deos
Fluxo gênico
Monômeros que formam as moléculas DNA e RNA,
Transferência de genes de uma população para outra.
compostos de uma base nitrogenada, uma penOcorre por migração. 4
tose (desoxirribose ou ribose) e um grupo fosfato.
Monômeros são moléculas menores que ligam-se entre
Fósseis
si formando uma maior (polı́mero). 5
São os restos preservados ou traços de animais, plantas e outros organismos do passado remoto. 4
Paradigmas
Um paradigma é um padrão a ser seguido, um presGenes recessivos
suposto filosófico, um conhecimento que origina o esGene recessivo é aquele que só produz a sua caratudo de um campo cientı́fico, etc. 6
terı́stica quando o seu alelo está presente nos dois
pares de cromossomos do mesmo tipo (homólogos). Poliploidia
5
Quando um organismo tem mais do que um par de
cromossomos de cada tipo. 5
Genótipo
É o conjunto de genes responsável pelas carac- Pressão de mutação direcional
terı́sticas de um indivı́duo. 4
Mutação não aleatória em um genoma com uma direcionalidade para produzir mais altos ou mais baixos
Gradualismo filético
conteúdos de guanina e citosina no DNA. Esta pressão
É a hipótese de que as espécies continuam a se adaptar
gera mutações mais em regiões neutras do genoma do
a novos desafios ao longo de sua história tornando-se
que em regiões funcionalmente significativas. 4
novas espécies gradualmente. 4
Recombinação genética
Hibridação
É o processo pela qual um trecho de material genético
Cruzamento entre duas espécies resultando em des(DNA em um cromossomo) se quebra e une-se a outro
cendentes hı́bridos. 5
trecho de material genético (DNA em outro cromosHipótese
somo). 4
Uma afirmação que se faz sobre alguma coisa que
Registro geológico
pode ser verdadeira ou falsa. 6
Refere-se a totalidade das camadas do estrato roHı́brido
choso: depósitos derramados por vulcanismo ou por
Organismo produzido pelo cruzamento entre duas
detritos de intemperismo, como barro, areia, etc., inespécies. 5
cluindo os fósseis e a informação sobre a história da
Terra, com seu clima, geografia, geologia e evolução
Luta pela existência
da vida. 4
Quando os organismos produzem mais descendentes
do que o ambiente pode manter, pois recursos como Saltacionismo
o alimento são limitados, eles competem pela sobreA crença de que a evolução opera por um desenvolvivivência. 3
mento repentino de novas espécies ou caracterı́sticas
biológicas de uma geração para outra. 4
Malthus
Thomas Robert Malthus foi um economista polı́tico Seleção natural
É o mecanismo pelo qual caracterı́sticas favoráveis
e demógrafo inglês que viveu entre 1766 e 1834. Sua
que podem ser herdadas se tornam mais comuns em
contribuição principal foi a de atrair a atenção para os
gerações sucessivas, enquanto as desfavoráveis se torriscos do crescimento populacional. Ele argumentava
nam menos comuns. 4
que a população pode crescer muito mais do que os
recursos do planeta têm condições de sustentar. 3
Subsidência
Rebaixamento da superfı́cie da Terra em relação ao
Migração
nı́vel do mar. 4
Ocorre quando uma população de seres vivos se move
de uma região para outra em busca de melhores
condições de vida. 5
Transposição de genes
Partes do genoma que mudam de um sı́tio para outro.
Mutações
5
São mudanças permanentes na sequência de DNA de
um gene. 4
8
Glossário
Capı́tulo 3
Origem da Vida
3.1
Definição de vida
Segundo Dyson [21], para Oparin, a ordem dos eventos
na origem da vida teria sido com células se formando primeiro (coacervados), depois enzimas e, em terceiro lugar,
genes.
Em 1953, Miller realizou um experimento que visava testar as idéias de Oparin e Haldane sobre a origem da vida.
Ele simulou a atmosfera primitiva, bastante redutora, com
hidrogênio e presença de metano, amônia e vapor de água,
os quais, passando através de descargas elétricas, produziam aminoácidos [22]. Estes aminoácidos tinham de ser
retirados do ambiente em que eram produzidos para que
não fossem degradados pela mesma fonte que os produzia.
Atualmente não se acredita mais que a atmosfera fosse
redutora na Terra primitiva, mas neutra. Acreditava-se
em uma atmosfera redutora devido a observação de radioastrônomos de que nossa galáxia é densamente povoada
por nuvens moleculares contendo grandes quantidades de
hidrogênio, água, amônia, monóxido de carbono, metanol, ácido cianı́drico e outras moléculas redutoras. Surgiram evidências de que, se a atmosfera já houvesse sido
redutora, ela teria desaparecido por ocasião do bombardeamento da Terra por meteoritos há cerca de 3,8 eons.
Uma das evidências seria a de rochas sedimentares datadas
de 3,8 eons, compostas de carbonatos e formas oxidadas
de ferro que não poderiam se formar sob condições redutoras. Outra evidência seria a raridade de gases inertes
como neon na atual atmosfera da Terra. O neon é um elemento muito abundante no universo e em nuvens como a
que teria formado a Terra. Se a Terra tivesse tido uma atmosfera redutora, quando ela se tornou neutra ou oxidante
por ocasião do aparecimento do oxigênio, o neon teria permanecido e seria tão abundante quanto o nitrogênio [21].
A “teoria” de Oparin para a origem da vida foi popular entre os cientistas por cerca de meio século, conforme
Dyson [21] “não porque houvesse qualquer evidência para
apoiá-la, mas, antes, porque ela parecia ser a única alternativa para o criacionismo bı́blico”.
Existem hoje, basicamente, duas hipóteses para a origem da vida através da evolução quı́mica das moléculas:
origem através da replicação e origem metabólica.
Antes de considerarmos as diferentes perspectivas e modelos sobre a origem da vida, voltemos um pouco nossa
atenção para algumas definições de vida encontradas entre aqueles que trabalham com ciências.
“Um ser vivo é qualquer sistema autônomo com capacidades evolutivas ilimitadas” [17].
Cientistas da NASA definiram a vida como “um sistema
quı́mico auto-sustentável capaz de evolução darwiniana”
[18].
Fı́sicos como John Bernal, Erwin Schrödinger, Eugene
Wigner e John Avery definiram vida como “um membro da classe de fenômenos que são abertos ou sistemas
contı́nuos capazes de diminuir sua entropia interna às expensas de substâncias ou de energia livre tirada do ambiente e subsequentemente rejeitada em uma forma degradada” [19].
Radu Popa, geobiólogo, autor de Between Probability
and Necessity: Searching for the Definition and Origin
of Life disse: “Não existe nenhuma definição com a qual
eu concorde”. Procurando por definições na literatura cientı́fica, ele encontrou mais de trezentas ou quatrocentas
definições [18].
3.2
3.2.1
Teorias sobre a Origem da
Vida
Histórico
No inı́cio do século XIX muitos ainda acreditavam na
geração espontânea da vida, segundo a qual seres vivos
podem surgir de matéria inanimada, como camundongos
a partir de roupas sujas e trigo, por exemplo. Na década
de 1860, Louis Pasteur, através de seus experimentos com
caldo nutritivo em balões de vidro do tipo “pescoço de
cisne” demonstrou o princı́pio de que vida provém de vida
[20].
Ainda assim, a idéia de que estes experimentos não demonstraram que a vida não poderia surgir espontaneamente em outras circunstâncias não foi descartada, em 3.2.2 Origem através de Replicação
1924, Oparin publicou seu livro The Origin of Life. Ele
propôs que “a vida começou por meio de sucessiva acu- Até o final da década de 1960, os pesquisadores da origem
mulação de cada vez mais complicadas populações mole- da vida através da evolução quı́mica das moléculas se deculares dentro de gotı́culas de um coacervado” [21].
paravam com o dilema: quem surgiu primeiro, proteı́nas
9
10
CAPÍTULO 3. ORIGEM DA VIDA
ou ácidos nucléicos? — isto porque proteı́nas dependem de
ácidos nucléicos (DNA e RNA) para sua formação e ácidos
nucléicos dependem da ação de proteı́nas enzimáticas para
serem sintetizados e exercerem suas funções.
Ainda na década de 1960, Carl Woese, Francis Crick
e Leslie Orgel propuseram que a molécula de RNA, além
de sua função informacional, poderia exercer uma função
catalı́tica (como proteı́nas enzimáticas) [23].
Na década de 1970, Harold White III defendia a idéia
de uma vida primitiva baseada em RNA [24].
Durante a década de 1980, Thomas R. Cech e Sidney Altman, trabalhando independentemente, descobriram que a molécula de RNA podia dobrar-se de formas complexas e catalizar reações bioquı́micas, o que antes se acreditava ser função unicamente de proteı́nas enzimáticas. Estas moléculas passaram a ser chamadas de
ribozimas [25].
O dilema de quem surgiu primeiro parecia prestes a ser
solucionado: já que a molécula de RNA é semelhante a de
DNA e também pode exercer função enzimática, ela poderia ter sido a primeira molécula decodificadora da vida
a existir. Mais tarde, ela teria dado lugar a um mundo de
DNA e proteı́nas como o que conhecemos hoje.
Em seu artigo de 2004, Prebiotic Chemistry and the Origin of the RNA World [26], Orgel descreve como seria “o
mundo de RNA” de acordo com “o sonho do biólogo molecular”:
Primeiro bases nucleosı́dicas e açúcares teriam se formado por reações prebióticas na Terra primitiva ou teriam
sido trazidos por meteoritos ou cometas. Em seguida, nucleotı́deos teriam se formado a partir de bases, açúcares,
fosfatos inorgânicos ou polifosfatos e depois se acumulado “adequadamente” em estado puro em alguma pequena poça “especial”. Um mineral catalisador no fundo
da poça, como montmorilonita, por exemplo, teria catalisado a formação de longos polinucleotideos fita-unica, dos
quais alguns teriam sido convertidos a fitas duplas complementares por sı́ntese dirigida por molde. Desta forma,
uma biblioteca de RNAs dupla fita teria se acumulado na
Terra primitiva.
Então, ao menos um dentre os RNAs dupla fita desenrolado (fita única) teria produzido uma ribozima capaz de
copiar a si própria e a seu complemento. Repetidas cópias
da ribozima e de seu complemento teriam levado a crescimento exponencial da população. Neste cenário a seleção
natural teria assumido o controle.
Em sua revisão, Orgel, resume mais ou menos desta
forma os problemas com este cenário idealizado para uma
sı́ntese prebiótica de RNA:
• a sı́ntese de ribose leva a uma complexa mistura de
açúcares, com ribose sendo apenas um constituinte
menos expressivo na maioria das reações;
• a sı́ntese de purinas a partir de ribose e uma base é
ineficiente e a única sı́ntese de pirimidinas é obtida a
partir de arabinose–3’–fosfato, que pode ser considerada “marginalmente” prebiótica;
• a fosforilação de nucleosı́deos leva a uma mistura complexa de mono e polifosfatos isoméricos;
• a polimerização de nucleosı́deos–5’–fosfato leva a um
produto com ligações fosfodiéster mistas;
• os fosforimidazolı́deos usados nas sı́nteses orientadas
por molde para se obter cadeias de polinucleotı́deos
não são prováveis moléculas prebióticas.
“O principal obstáculo para se entender a origem da
vida baseada em RNA é identificar um mecanismo plausı́vel para vencer a bagunça produzida pela quı́mica prebiótica” — declarou Joyce em seu artigo em 2002 [27].
Orgel também concluiu que, para a maioria dos pesquisadores da origem da vida, a sı́ntese prebiótica de RNA
parece improvável. Acredita-se que um outro polı́mero,
possivelmente mais simples, possa ter surgido primeiro e
dado origem ao mundo de RNA, ou mesmo uma substância
inorgânica, como algum tipo de argila. Contudo, ele
mesmo afirma que “nenhum sistema precursor [para o
RNA] convincente foi descrito” [26].
Robert Shapiro, um defensor da origem da vida através
do metabolismo, assim descreve a perplexidade com que
se defrontaram os proponentes do mundo de RNA [28]:
“Os aspectos atrativos do Mundo de RNA incentivaram Gerald Joyce do Scripps Research Institute e Leslie Orgel do Salk Institute a retratá-lo como “o sonho
do biólogo molecular” em um volume devotado a este
tópico. Eles também usaram o termo “o pesadelo do
quı́mico prebiótico” para descrever outra parte do quadro:
Como este primeiro RNA auto-replicante surgiu? Enormes obstáculos bloqueiam o quadro de Gilbert da origem
da vida, o suficiente para levar outro ganhador do prêmio
Nobel, Christian De Duve da Rockefeller University, a perguntar retoricamente: ‘Deus fez o RNA?’ ”
Comentando os problemas para a origem da vida a partir da formação prebiótica de RNA, Robert Shapiro [28]
diz que:
• Os blocos construtores de RNA são moléculas
orgânicas complexas que contêm um açúcar, um fosfato e uma de quatro bases nitrogenadas. Cada nucleotı́deo contém 9 ou 10 átomos de carbono, numerosos átomos de nitrogênio e oxigênio e o grupo fosfato
conectados em preciso padrão tridimensional. Existem muitas combinações possı́veis para estas conexões
podendo produzir milhares de nucleotı́deos plausı́veis
que se uniriam no lugar dos que são padrão mas que
não estão representados no RNA. Este número é pequeno em comparação com as centenas de milhares
ou milhões de moléculas orgânicas estáveis do mesmo
tamanho que não são nucleotı́deos.
• Alguns cientistas, em um tipo de vitalismo molecular,
acreditam que a natureza tem uma tendência inata
para produzir preferencialmente os blocos construtores da vida ao invés de outras moléculas também derivadas das regras da quı́mica orgânica. Esta idéia
se inspirou no experimento de Miller de produção de
aminoácidos e na descoberta de mais de 80 tipos diferentes de aminoácidos no meteorito Murchison que
caiu na Austrália em 1969. Extrapolando a partir
3.2. TEORIAS SOBRE A ORIGEM DA VIDA
destes resultados, alguns presumem que todos os blocos da vida podem ser formados com experimentos
como o de Miller e estariam presentes em meteoritos
e outros corpos extraterrestres.
• Os resultados de trabalhos com meteoritos levaram
os cientistas a uma diferente conclusão: a natureza
tem uma propensão a formar moléculas com poucos
átomos de carbono. Quando moléculas com mais carbonos são produzidas, elas tendem a ser insolúveis e
pobres em hidrogênio. Padrões similares ocorrem nos
resultados de experimentos com descarga elétrica.
• Os aminoácidos produzidos e encontrados nestes experimentos são muito menos complexos do que nucleotı́deos. Os mais simples dos vinte que são blocos
para a vida possuem apenas dois carbonos. Dezessete dos vinte possuem seis carbonos ou menos. Os
aminoácidos e outras substâncias produzidos no experimento de Miller continham dois ou três carbonos.
Nenhum nucleotı́deo ou nucleosı́deo já foi produzido
em experimentos com descarga elétrica ou encontrado
em meteoritos.
• Para resgatar o conceito de RNA primeiro (na origem da vida), seus defensores criaram uma disciplina
chamada sı́ntese prebiótica. Eles tentaram mostrar
que RNA e seus componentes podem ser criados em
laboratório em uma sequência de reações cuidadosamente controladas, realizadas em água a temperaturas observadas na Terra. Tal sequência inicia com
compostos de carbono que tenham sido produzidos
em experimentos com descarga elétrica ou encontrados em meteoritos. Substâncias orgânicas de uma
das fontes acima, em qualquer quantidade e mesmo
como parte de uma mistura complexa, são classificadas como prebióticas e podem então ser usadas
de forma pura, em qualquer quantidade, em outra
reação prebiótica. Os produtos desta reação também
são considerados prebióticos e utilizados no próximo
passo da sequência.
• Sequências de reações deste tipo fazem parte da
prática do campo tradicional da quı́mica orgânica
sintética em que podem ser utilizados quilogramas de
material inicial para se obter miligramas do produto.
Isto demonstra que seres humanos podem produzir
substâncias encontradas na natureza ainda que ineficientemente. Infelizmente, nem quı́micos nem laboratórios estavam presentes na Terra primitiva para
produzirem RNA.
• Um exemplo de sı́ntese prebiótica apareceu publicado
na Nature em 1995 e divulgado pelo New York Times.
A base citosina do RNA foi preparada aquecendo-se
a 100◦ C duas substâncias em um tubo de vidro selado por cerca de um dia. Um dos reagentes, cianoacetaldeı́do, é uma substância reativa capaz de se
combinar com outras substâncias comuns que podem
ter estado presentes na Terra primitiva. Estes competidores foram excluı́dos. Uma concentração extre-
11
mamente alta foi necessária para induzir o outro reagente, uréia, a reagir em uma taxa suficiente para
a reação ter sucesso. O produto, citosina, podia se
auto-destruir por simples reação com a água.Quando
a concentração de uréia era diminuida ou se permitia
que a reação prosseguisse por mais tempo, qualquer
citosina produzida era subsequentemente destruı́da.
Nossas células lidam com isto mantendo um grupo de
enzimas especializadas em reparo do DNA. A excepcionalmente alta concentração de uréia na Natureza foi
racionalizada invocando-se uma visão de lagoa seca
na Terra primitiva. Shapiro calculou que uma grande
lagoa teria de evaporar até o tamanho de uma poça
sem perda de seu conteúdo para chegar a esta concentração. “Não existe algo assim na Terra hoje.”
• A alegação da lagoa seca não é única. Em um espı́rito
semelhante, outros quı́micos prebióticos têm invocado
lagos glaciais congelados, reservatórios de água fresca
em flancos de montanha, correntes fluindo, praias, desertos secos, aquı́feros vulcânicos e o oceano global
inteiro (congelados ou aquecidos quando necessário)
para apoiar seu requisito de que a “sopa de nucleotı́deos” necessária para a sı́ntese de RNA teria
existido na Terra primitiva.
• Devido a estas dificuldades, muitos quı́micos fogem
da hipótese do RNA primeiro, outros, entretanto, optaram por uma saı́da que leva a azares semelhantes.
Nestas teorias revisadas, um replicador mais simples
surgiu primeiro e governou a vida em um “mundo préRNA”. Foram propostas variações em que as bases, o
açúcar ou toda a espinha dorsal do RNA foram substituı́dos por substâncias mais simples, mais acessı́veis
a quı́mica prebiótica. Presaume-se que este primeiro
replicador também teria as capacidades catalı́ticas do
RNA. Como não existe qualquer traço deste primitivo
replicador na biologia moderna, o RNA deve ter assumido todas as suas funções em algum ponto posterior
a sua emergência.
• O aparecimento espontâneo de tal replicador sem
o auxı́lio de um quı́mico enfrenta implausibilidades
que tornam diminutas as envolvidas na preparação
de uma mera sopa de nucleotı́deos. Presumindose que uma sopa enriquecida com os blocos construtores de todos estes replicadores se tivesse reunido, sob condições favoráveis a sua formação em cadeias, aglomerados de blocos defeituos presentes poderiam arruinar a habilidade da cadeia de agir como
um replicador. A mais simples unidade falha seria
um terminador, um componente que teria apena um
“braço”disponı́vel para conecção ao invés de dois para
apoiar o crescimento da cadeia.
• Não existe nenhum motivo para imaginar que uma natureza indiferente não combinaria unidades ao acaso,
produzindo uma imensa variedade de curtos hı́bridos,
cadeias terminadas, ao invés de uma muito mais longa
com uma geometria de espinha dorsal uniforme ne-
12
CAPÍTULO 3. ORIGEM DA VIDA
cessária para manter as funções de replicação e caDe acordo com Dyson [21], para muitos cientistas ametalı́ticas.
ricanos, imaginar que o metabolismo possa ter surgido antes da replicação não faz sentido porque a idéia inerente
Shapiro faz as seguintes anologias com relação aos es- a metabolismo seria a de processos quı́micos dirigidos por
forços para se obter RNA ou um mais simples replicador um aparato genético de ácidos nucléicos. Para os alemães,
nas condições da Terra primitiva [28]:
entretanto, a palavra para metabolismo, stoffwechsel, em
“A analogia que vem a mente é a de um jogador de inglês stuffchange (transformação de substância), significa
golfe, que tendo jogado uma bola através de uma rota de qualquer processo quı́mico que ocorra em células, dirigido
18 buracos, então presume que a bola também jogaria a por aparato genético ou não.
si mesma por esta rota na ausência dele. Ele demonstrou
A idéia básica do metabolismo primeiro seria a de ciclo
a possibilidade do evento; só é necessário imaginar que de reações quı́micas que acabaria por produzir compostos
alguma combinação de forças naturais (terremotos, ventos, mais complexos.
tornados e inundações, por exemplo) poderiam produzir
Robert Shapiro fez uma lista de cinco requistos comuns
o mesmo resultado, dado tempo suficiente. Nenhuma lei às teorias sobre a origem da vida baseada no metabolismo
fı́sica precisa ser violada para a formação espontânea de [28]:
RNA acontecer, mas as chances contra isto são imensas,
de forma que a sugestão implica em que o mundo não
• Necessidade de uma fronteira separando vida
vivo tem um desejo inato de gerar RNA. A maioria dos
e não vida: a segunda lei da termodinâmica permite
cientistas da origem da vida que ainda apoiam a teoria
que a entropia diminua em uma determinada região
do RNA primeiro ou aceitam este conceito (implicita, se
contanto que ocorra um aumento maior do lado de
não explicitamente) ou acham que as chances imensamente
fora. Uma fronteira manteria esta separação como
desfavoráveis foram simplesmente vencidas por boa sorte.”
a que ocorre em células vivas com suas membranas
“Imagine um gorila (braços muito longos são nede dupla camada de lipı́deos. Estruturas semelhancessários) em um imenso teclado conectado a um processates a membranas foram encontradas em meteoritos.
dor de palavras. O teclado contém não apenas os sı́mbolos
Alguns pesquisadores propuseram membranas de sulusados nas linguagens inglesa e européia, mas também um
feto de ferro, superfı́cies minerais (em que interações
enorme excesso extraı́do de todas as outras linguagens coeletrostáticas segregam moléculas selecionadas de seu
nhecidas e todos os conjuntos de sı́mbolos armazenados
ambiente), pequenos reservatórios de água e aerosóis
em um tı́pico computador. As chances de uma reunião
como fronteiras entre um metabolismo primitivo e seu
espontânea de um replicador no ‘pool’ que eu descrevi
ambiente.
acima pode ser comparada àquelas do gorila compor, em
• Uma fonte de energia para dirigir os processos
inglês, uma receita coerente para a preparação de chili com
de organização: seres vivos podem usar carbohidracarne. Com considerações semelhantes em mente, Gerald
tos e gorduras, minerais, energia solar, etc. Reações
F. Joyce do Scripps Research Institute e Leslie Orgel do
redox poderiam ser usadas como fonte de energia em
Salk Institute concluiram que o aparecimento espontâneo
um metabolismo primitivo.
de cadeias de RNA na terra sem vida ‘teria sido um quase
milagre’. Eu estenderia esta conclusão a todos os propos• Mecanismo que acople a liberação de energia
tos substitutos de RNA que mencionei acima.”
aos processos de organização que produzem e
mantêm a vida: supõem-se que existam na natureza
suficientes reações acopladas e catalisadores primiti3.2.3 Origem Metabólica
vos que tenham iniciado a vida.
Como alternativa para a hipótese de que a vida teve
origem com moléculas complexas como proteı́nas, DNA,
• Uma rede quı́mica precisa ser formada para
RNA ou outras semelhantes, alguns cientistas optaram
permitir adaptação e evolução: imagine que uma
pela hipótese de que a vida teria tido inı́cio por meio de
reação redox energeticamente favorável de um minepequenas moléculas produzidas mas facilmente na natural de ocorrência natural esteja ligada à conversão de
reza.
um composto orgânico A em um composto B dentro
Robert Shapiro, professor de quı́mica e cientista pesde um compartimento. A reação favorável do minequisador senior na New York University, é um destes. Seral, que aumenta a entropia e libera energia, dirige a
gundo ele, este grupo de teorias utiliza uma definição de
transformação de A em B. Esta transformação chave
vida termodinâmica ao invés de genética, de acordo com
é chamada de reação propulsora, pois serve como o
a estabelecida por Carl Sagan na Enciclopédia Britânica
motor que mobiliza o processo de organização. Se
[28]: “Uma região localizada que aumenta em ordem (diB se reconverte em A ou escapa do compartimento,
minui em entropia) através de ciclos dirigidos por um
isto seria um desvio do caminho que leva a maior
fluxo de energia seria considerada viva.” Esta abordaorganização. Por outro lado, uma via quı́mica com
gem das moléculas pequenas tem por base as idéias do
multiplos passos — de B para C para D para A —
biólogo soviético Alexander Oparin. Alguns dos nomes
reconverte B em A e os passos nesse processo circupor trás destas teorias são: Freeman Dyson, Christian De
lar (ou ciclo) seriam favorecidos porque reabastecem
Duve, Stuart Kauffman, Doron Lancet, Harold Morowitz
o suprimento de A, permitindo a contı́nua descarga
e Günter Wächtershäuser.
de energia pela reação do mineral.
3.2. TEORIAS SOBRE A ORIGEM DA VIDA
O ciclo pode ser visualizado como uma linha ferroviária circular, a fonte de energia mantém os trens
por uma via. Cada estação pode ser o entrocamento
de várias linhas, como uma que conecta a estação D
a outra estação E. Os trens podem viajar em uma ou
outra direção ao longo desta linha, diminuindo ou aumentando o tráfego do ciclo, maximizando a liberação
de energia que acompanha a reação propulsora.
O ciclo poderia se adaptar a circunstâncias variando,
como acontece com o caminho percorrido pela água
que escapa de um hidrante vazando até o esgoto mais
próximo. Se folhas caı́das bloqueiam o caminho, a
água recua até que outra rota seja encontrada para
contornar o obstáculo. Da mesma forma, se uma mudança na acidez ou alguma outra circunstância ambiental impedir um passo na via de B para A, haveria
um recuo até que outra rota fosse encontrada. Outras mudanças deste tipo converteriam o ciclo original em uma rede. Esta exploração do tipo tentativa
e erro na “paisagem” quı́mica poderia revelar compostos que catalisassem passos importantes no ciclo,
aumentando a eficiência com que a rede utilizaria a
fonte de energia.
• A rede deve crescer e se reproduzir: Para sobreviver e crescer, a rede deve adquirir material a uma
taxa que compense as rotas que o removem. A difusão de materiais da rede, do compartimento para o
mundo externo, é favorecida pela entropia e ocorrerá
em alguma extensão, especialmente no inı́cio da vida
em que a fronteira é rudimentar e estabelecida pelo
ambiente ao invés de por membranas celulares muito
eficientes como as disponı́veis hoje após bilhões de
anos de evolução. Reações secundárias podem produzir gases ou formar breu que escaparão da solução. Se
todos esses processos excederem a taxa em que a rede
ganha material, ela se extinguirá. A exaustão do combustı́vel externo teria o mesmo efeito. Na Terra primitiva, muitos inı́cios deste tipo poderiam ter ocorrido,
envolvendo muitas reações propulsoras alternativas e
fontes externas de energia, até que uma particularmente resistente persistiria e se sutentaria.
Um sistema de reprodução deveria finalmente se desenvolver. Se a rede estivesse dentro de uma membrana lipı́dica, forças fı́sicas poderiam dividi-la após
ter crescido o suficiente. Um sistema funcionando
em um compartimento dentro de um mineral poderia
transbordar para compartimentos adjacentes. Esta
separação em unidades protegeria o sistema da extinção total por um evento destrutivo localizado. As
unidades independentes poderiam evoluir por diferentes caminhos e competir umas com as outras por
matéria bruta. Terı́amos feito a transição da vida que
emerge da matéria não viva por meio da ação de uma
fonte de energia disponı́vel para a vida que se adapta
ao seu ambiente pela evolução darwiniana.
13
mas pouco trabalho experimental foi apresentado para
apoiá-lo. Dyson e Kauffman propuseram modelos matemáticos, o que seria um bom começo, apesar de eles
serem um tanto vagos. Wächtershäuser e seus colegas,
segundo Shapiro, produziram a maior quantidade de novos dados por meio de trabalhos experimentais. Demonstraram porções de um ciclo envolvendo combinações e separações de aminoácidos na presença de sulfetos metálicos
como catalisadores e oxidação de monóxido de carbono a
dióxido como fonte de energia. Wächtershäuser também
formulou a hipótese de que o ácido acético, que faz parte
do ciclo do ácido cı́trico do metabolismo celular, teria uma
função na produção de proteı́nas. Isto incluiria alguns passos como: liberação de ácido acético por meio de catálise
por ı́on metálico; adição de carbono à molécula de ácido
acético para produzir piruvato; adição de amônia para
formar aminoácidos; produção de peptı́deos e depois de
proteı́nas [29].
Shapiro também diz que ainda não foi demonstrada a
operação de um ciclo completo que validasse a abordagem das pequenas moléculas do metabolismo primeiro.
Também não se compreende que eventos especı́ficos teriam
levado aos organismos atuais baseados em DNA, RNA e
proteı́nas.
Orgel (2000) [30], examinando a plausibilidade de teorias que postulam organização quı́mica complexa a partir
de ciclos metabólicos de moléculas pequenas, sem a participação de replicação, por polı́meros genéticos como RNA,
chegou a algumas conclusões. Como exemplo deste tipo
de organização, ele analisa um ciclo proposto por Wächtershäuser que aconteceria na superfı́cie de minerais de
sulfeto de ferro, o reverso do ciclo do ácido cı́trico. Ele
conclui que:
• É necessária muita habilidade sintética para desenvolver mesmo o mais simples dos ciclos. Haverá um
longo tempo antes que os quı́micos orgânicos possam
adaptar o ciclo do ácido cı́trico redutor (reverso) a um
sistema de reação “pote-único”1 . A reação da formose, que seria o sistema quı́mico mais próximo de
um ciclo, em uma versão supersimplificada do mais
simples dos ciclos possı́veis, constituiria um ciclo metabólico autocatalı́tico simples se este ciclo pudesse
ser realizado com eficiência suficiente para permitir
crescimento exponencial. A substância de entrada seria formaldeı́do, os intermediários glicolaldeı́do, gliceraldeı́do, di-hidroxiacetona e tetroses. Olhar mais
de perto esta supersimplificada versão do mais simples modelo da reação da formose revelará as formidáveis dificuldades que o desenvolvimento de um ciclo metabólico complexo, não enzimático, em solução
aquosa enfrentará.
A reação da formose não ocorre em uma taxa
apreciável sob condições neutras, e, mesmo em altos pHs, é ineficiente na ausência de um catalisador
como um ı́on metálico divalente. Cada passo de um
ciclo proposto deve ocorrer a uma taxa razoável e isto
1 A expressão “pote-único”, provavelmente, significa o ciclo inteiro
Shapiro diz que muitas publicações foram produzidas
propondo esquemas particulares do metabolismo primeiro, em um único ambiente sob as mesmas condições.
14
CAPÍTULO 3. ORIGEM DA VIDA
dependerá da disponibilidade de um apropriado catalisador. Se uma das reações do ciclo não ocorre espontaneamente ou pela influência de um catalisador
prebiótico plausı́vel, será necessária outra hipótese
para manter a relevância do ciclo para a origem da
vida. Se várias reações precisam de “ajuda”, medidas
desesperadas serão necessárias.
• Uma possı́vel hipótese salvadora para um ciclo metabólico não enzimático em solução aquosa seria a de
que as moléculas carreadoras do ciclo seriam também
os catalisadores para as reações difı́ceis (ciclo autocatalı́tico). Mas reações catalı́ticas deste tipo em
solução aquosa são virtualmente desconhecidas. Não
existe razão para crer, por exemplo, que qualquer intermediário do ciclo do ácido cı́trico catalisaria qualquer reação do ciclo do ácido cı́trico. O motivo disto é
que interações não covalentes entre moléculas pequenas em solução aquosa são geralmente muito fracas
para permitir acelerações catalı́ticas extensas e regioespecı́ficas.
• Postular uma reação catalisada ao acaso, por um ı́on
metálico, pode ser razoável, mas um conjunto delas,
é apelar para a mágica.
• Outro problema além do de reações que não ocorrem rápido o suficiente para tornar um ciclo prático
seriam as reações alternativas possı́veis que complicariam ou interromperiam o ciclo. Mesmo para um ciclo
genérico simples não seria razoável postular a presença de suficientes catalisadores prebióticos estereoespecı́ficos que tornassem possı́vel uma sequência particular de reações estereoespecı́ficas. Sem a ajuda de
enzimas ou outros catalisadores “projetados” não relacionados aos substratos do ciclo, parece improvável
que ciclos estereoespecı́ficos, mesmo os mais simples,
pudessem existir.
• Uma hipótese proposta por Wächtershäuser — de ciclos não enzimáticos ocorrendo na superfı́cie de minerais de sulfeto de ferro — poderia, se correta, vencer
as dificuldades acima. A afirmação de que um ciclo
completo se auto-organizaria e operaria autonomamente em uma superfı́cie de FeS/FeS2 é razoável? A
escolha deste sitema de FeS/FeS2 como suporte para
etapas redutoras do ciclo do ácido cı́trico é particularmente apropriada, mas não para o ciclo completo.
Minerais catalisadores podem, algumas vezes, confinar as reações de um substrato adsorvido com elevada estereoespecificidade a um de vários caminhos
que seriam seguidos na ausência do mineral. Entretanto, na ausência de apoio de evidências experimentais, não existe justificativa para a predição de que
um mineral em particular catalizará um conjunto de
muito diferentes reações. A situação não seria diferente se os participantes de um esquema de reações
cı́clicas complexas fossem sintetizados in situ sobre
uma superfı́cie mineral. Se os produtos forem móveis
na superfı́cie, a situação é idêntica a de moléculas adsorvidas. Se eles não forem, deve-se postular uma
série de notáveis coincidências para se concluir que
todas as reações são catalisadas no mesmo mineral e
que cada produto intermediário é formado na posição
e orientação corretas para se tornar o substrato da
próxima reação regioespecı́fica do ciclo.
• Ainda que membros de um grupo de minerais pudesse
cada um catalizar uma etapa de um ciclo complexo,
não parece provável que o ciclo se auto-organizaria
em suas superfı́cies. Qualquer grupo de minerais
que incluı́sse catalisadores para cada etapa do ciclo,
incluiria, provavelmente, catalisadores para reações
que interromperiam o ciclo. Transporte eficiente
dos intermediários de um mineral catalı́tico para outro também apresentaria sérios problemas. Quanta
auto-organização pode-se esperar em uma superfı́cie
mineral na ausência de catalisadores informacionais
evoluı́dos? Claramente, de uma superfı́cie simples se
poderia esperar que catalisasse uma série de reações
do mesmo tipo, como uma série de reações aldol ou
o reverso das reações aldol, do tipo das envolvidas na
reação da formose, ou uma série de reduções como as
envolvidas no ciclo do ácido cı́trico redutor. Não é
claro se qualquer superfı́cie poderia catalisar duas ou
mais reações quı́micas não relacionadas.
Orgel analisou o ciclo proposto por Wächtershäuser porque, como afirmou Shapiro, existem poucos trabalhos experientais além dos que este pesquisador produziu. E o
fato de ele não ter conseguido um ciclo completo faz todo o
sentido em vista das conclusões de Orgel. Estas conclusões
são na verdade bem genéricas e se aplicam a todos os ciclos
deste tipo. Os problemas com catalisadores para todas as
etapas ou autocatalise, reações alternativas que interromperiam o ciclo, etc., são problemas que os ciclos propostos
para o surgimento do metabolismo primeiro enfrentariam
em geral. Portanto, não é de admirar que existam poucos
trabalhos experimentais deste tipo.
3.3
Discussão sobre os tópicos anteriores
Ainda que a idéia de geração espôntânea tenha sido descartada no século XIX, a busca pela origem da vida através
da evolução quı́mica das moléculas (a hipótese básica de
Oparin na qual se acreditou por meio século por falta de
outras opções) é uma metamorfose dela em forma adulta.
A palavra “espontânea” aparece frequentemente em artigos relacionados com a origem da vida e é utilizada por
pesquisadores como Orgel, Shapiro e outros. A idéia sofreu
metamorfose e se revestiu dos conhecimentos acumulados
em Quı́mica, Fı́sica, Biologia e Informática.
O que Orgel torna evidente em seu artigo [30] avaliando
a parte experimental da hipótese metabólica, é que mesmo
“uma origem mais simples para a vida”, como proposta
por Shapiro [28], é ainda muito complexa para ocorrer de
forma “espontânea”, seguindo as regras quı́micas.
Contudo, se fosse alcançada a sı́ntese de um ciclo metabólico completo do tipo proposto pelos defensores do
Glossário
15
metabolismo primeiro o que isto significaria? “Que sese desfizeram. Outros uniram-se de outras formas e
res humanos podem produzir, ainda que ineficientemente,
a moléculas inorgânicas, formando coacervados comsubstâncias encontradas na natureza”, como disse Robert
plexos. Fonte: Wikipedia.. 9
Shapiro [28]. Mas, como ele acrescentou: “Nem quı́micos
nem laboratórios estavam presentes na Terra primitiva” Crescimento exponencial
Na Matemática, crescimento exponencial (ou
[28].
geométrico) ocorre quando a taxa de crescimento
Outra questão seria a levantada por Shapiro no final de
de uma função é sempre proporcional ao tamanho
seu artigo: “Um entendimento dos passos iniciais que levaatual da função. Isto implica em que para qualquer
ram a vida não revelariam os eventos especı́ficos que levaquantidade crescendo exponencialmente, quanto
ram aos atuais organismos familiares baseados em DNA,
maior essa quantidade, mais rápido crescerá. 10
RNA e proteı́nas” [28].
Concluindo, como disse Orgel, sobre a probalidade de
auto-organização de um ciclo complexo (como o ciclo do Divalente
Na quı́mica, valência é um número que indica a caácido cı́clico redutor): “embora logicamente possı́vel, é
pacidade que um átomo de um elemento tem de se
muito improvável” [30].
combinar com outros átomos, capacidade essa que é
E como disse Shapiro sobre a formação espontânea de
medida pelo número de elétrons que um átomo pode
RNA: “Nenhuma lei fı́sica precisa ser quebrada para a
dar, receber, ou compartilhar de forma a constituir
formação espontânea de RNA acontecer, mas as chances
uma ligação quı́mica. Um ı́on divalente pode doar ou
contra ela são tão imensas, que a sugestão implica em que
receber dois elétrons. 13
o mundo não vivo têm um desejo inato de gerar RNA”
[28].
Finalmente, parafraseando Futuyma, na minha velha Entropia
edição dos tempos da faculdade: “Assim, a origem da vida
Definição da Mecânica Estatı́stica: S = k ln(n),
continua não premiando os esforços dos quı́micos” [31].
sendo S a entropia de um sistema, k a constante de
Boltzmann, ln o logaritmo natural, n o número de
microestados correspondentes a um macroestado no
Glossário
qual o sistema se encontra. Ver mais detalhes em [32].
9
In situ
Em quı́mica, in situ refere-se normalmente “na mistura de reação”, como por exemplo, a sı́ntese de Fosforilação
É a adição de um grupo fosfato a uma molécula. 10
moléculas instáveis que somente podem ser processadas em misturas, não podendo ser isoladas). 14
Função catalı́tica
É a função de realizar cátalise, ou seja, mudar a veAdsorvido
locidade de uma reação quı́mica devido à adição de
Adsorção é a adesão de moléculas de um fluido (o
uma substância catalisadora que praticamente não se
adsorvido) a uma superfı́cie sólida (o adsorvente); o
transforma ao final da reação. 10
grau de adsorção depende da temperatura, da pressão
e da área da superfı́cie - os sólidos porosos como o
Isoméricos
carvão são ótimos adsorventes. 14
Compostos em que ocorre isomeria. Isômeros são
compostos que possuem fórmulas moleculares iguais,
Bases nucleosı́dicas
mas propriedades quı́micas diferentes, devido às
São moléculas de nucleotı́deos sem o fosfato, contendo
fórmulas estruturais diferentes. Este fenômeno é seapenas o açúcar (ribose ou desoxirribose) mais uma
melhante ao da existência de palavras diferentes pela
das bases nitrogenadas. 10
permutação de letras, como por exemplo: Amor e
Roma (mesmas letras, diferentes arrumações e na
Ciclo do ácido cı́trico
isomeria: mesmas fórmulas moleculares, diferentes
Corresponde a uma série de reações quı́micas que
fórmulas estruturais. 10
faz parte do metabolismo celular de organismos
aeróbicos.). 13
Ligações fosfodiéster
Coacervado
A ligação fosfodiéster é importante para a estrutura
É um aglomerado de moléculas proteicas envolvidas
do DNA e do RNA, uma vez que estabelece as ligações
por moléculas de água. Essas moléculas foram enentre os nucleotı́deos. A ligação é feita entre o grupo
volvidas pela água devido ao potencial de ionização
quı́mico chamado hidroxila (OH) ligado ao terceiro
presente em alguma de suas partes. Acredita-se, porcarbono da pentose (ribose ou desoxirribose) de um
tanto, que a origem dos coarcevados (e consequentenucleotı́deo e o fosfato do nucleotı́deo seguinte ligado
mente da vida) tenha se dado no mar. Segundo a
ao carbono 5 da pentose do mesmo. Por convenção,
Teoria de Oparin existiam coacervados formados de
as sequências são representadas na orientação 5’ 3’..
diversas maneiras. Os mais instáveis quebraram e
10
16
Glossário
Lipı́deos
enolato de cetona a um aldeı́do para formar uma βSão biomoléculas insolúveis em água, e solúveis em
hidroxicetona ou aldol (aldeı́do + álcool), uma unisolventes orgânicos, como o álcool, benzina, éter e
dade estrutural encontrada em muitas moléculas de
clorofórmio. A famı́lia de compostos designados por
ocorrência natural e em produtos farmacêuticos. 14
lı́pidos é muito vasta. Nos organismos ele têm, entre
outras, as funções de reserva de energia e fazem parte Reações bioquı́micas
São reações quı́micas envolvidas nos processos
da estrutura de membranas celulares. 12
biólogicos dos seres vivos. 10
Metabólica
Reações prebióticas
Diz respeito ao metabolismo, que é um conjunto de
São reações que se considera possı́veis ocorrer antes
reações quı́micas que ocorrem nos organismos a fim de
do surgimento da vida, sem moléculas orgânicas commanterem a vida. O metabolismo permite a produção
plexas, como proteı́nas e ácidos nucléicos, passı́veis de
de energia e a construção de moléculas essenciais
se realizar nas condições da Terra primitiva. 10
para que os organismos possam crescer, se reproduzir,
manter suas estruturas e responder a seu ambiente. 9 Reações redox
As reações de redução-oxidação (também conhecidas
como reações redox) são reações de transferência de
pHs
elétrons. Para que ocorra uma reação redox, no sisO pH refere-se a uma medida que indica se uma
tema deve haver uma espécie que ceda elétrons e ousolução lı́quida é ácida (pH < 7), neutra (pH = 7),
tra espécie que as aceite. O redutor é aquela espécie
ou básica/alcalina (pH > 7). Uma solução neutra só
◦
quı́mica que tende a ceder elétrons de sua estrutura
tem o valor de pH = 7 a 25 C, o que implica variações
quı́mica ao meio, ficando com uma carga positiva
do valor medido conforme a temperatura. 13
maior à que tinha. O oxidante é a espécie que tende a
Pirimidinas
captar esses elétrons, ficando com carga positiva meCompostos orgânicos semelhantes ao benzeno, mas
nor à que tinha. 12
com um anel heterocı́clico: dois átomos de nitrogênio
substituem o carbono nas posições 1 e 3. Três das Redutora
Em reações de oxiredução, as espécies quı́micas que
bases dos ácidos nucléicos são pirimidinas: citosina,
doam elétrons são redutoras. 9
timina e uracila. 10
Regioespecı́ficas
Piruvato
Um reação quı́mica é regioespecı́fica se a produção de
É um composto que faz parte da reação que dá inı́cio
um isômero estrutural é favorecida em detrimento de
ao ciclo do ácido cı́trico. 13
todos os outros. 14
Proteı́nas
Moléculas orgânicas de estrutura complexa. São com- Replicação
É o processo de copiar uma molécula de DNA (ou
postas de aminoácidos que se combinam para formar
RNA) usando uma das fitas como molde. 9
peptı́deos (mais de dois aminoácidos) e polipeptı́deos
(muitos aminoácidos), os quais se dobram de diferenReverso do ciclo do ácido cı́trico
tes formas e podem se associar a outras moléculas ou
É um ciclo em que as reações quı́micas que ocorrem no
proteı́nas para formar a molécula de proteı́na funciociclo do ácido cı́trico se realizam em sentido inverso.
nal. As diferentes proteı́nas nos organismos têm difePor exemplo, no ciclo do ácido cı́trico normal o cirentes funções: estrutural, defesa, enzimática, etc. A
clo inicia quando piruvato é convertido a acetilCoA.
função enzimática é muito importante porque ela perNo ciclo reverso, o ciclo termina quando acetilCoA é
mite que reações quı́micas que, de outra forma, não
convertida a piruvato. 13
ocorreriam ou seriam muito lentas possam ocorrer a
uma velocidade razoável. 9
RNA
A molécula de RNA é muito semelhante à de DNA. As
Purinas
diferenças estão no número de filamentos (geralmente
Bases nitrogenadas compostas por um anel aromático
apenas um na de RNA), no açúcar, que é a ribose ao
duplo de purina. Duas das bases dos ácidos nucléicos
invés da desoxirribose e em uma das quatro bases: na
são purinas: adenina e guanina. 10
molécula de RNA a timina é substituı́da por uracil.
10
Reagentes
Um reagente quı́mico é uma espécie quı́mica usada
Sı́ntese dirigida por molde
numa reação quı́mica. 11
Uma sı́ntese, em quı́mica, é o processo de construção
Reações aldol
de uma molécula, no caso da dirigida por molde, uma
Reação aldol é uma reação em quı́mica orgânica em
molécula vai servir de modelo para ser copiada. É o
que um carbono se liga a outro carbono. Em sua
que acontece com as moléculas de DNA nas células
forma usual, ela envolve a adição nucleofı́lica de um
vivas. 10
Glossário
Termodinâmica
É o ramo da Fı́sica que estuda os efeitos da mudança
em temperatura, pressão e volume em sistemas fı́sicos
na escala macroscópica. 12
Vitalismo
Uma doutrina em que os processos da vida não são
explicáveis pelas leis da quı́mica e da fı́sica somente
e de que a vida é de algum modo auto-determinante.
O vitalismo invoca explicitamente um princı́pio vital.
10
Íon metálico
Um ı́on é uma espécie quı́mica eletricamente carregada, geralmente um átomo ou molécula que perdeu
ou ganhou elétrons. Um metal, assim como qualquer outra substância ou matéria, é formado por elementos quı́micos sendo geralmente descrito como um
aglomerado de átomos com caráter metálico em que
os elétrons da camada de valência fluem livremente.
Os metais são um dos três grupos dos elementos distinguidos por suas propriedades de ionização e de
ligação, junto com metalóides e não-metais. 13
17
18
Glossário
Capı́tulo 4
Design Inteligente
4.1
O que é design inteligente?
“Design inteligente refere-se a um programa de pesquisa
cientı́fica bem como a uma comunidade de cientistas,
filósofos e outros acadêmicos que buscam evidência de design na natureza. A teoria do design inteligente afirma
que certos aspectos do universo e das coisas vivas são melhor explicadas por uma causa inteligente, não por um
processo não direcionado como a seleção natural. Através
do estudo e análise dos componentes de um sistema, um
teórico do design é capaz de determinar se várias estruturas naturais são produto do acaso, de lei natural, design inteligente ou alguma combinação disso. Esta pesquisa é conduzida observando-se os tipos de informação
produzida quando agentes inteligentes atuam. Os cientistas buscam então encontrar objetos que possuam aqueles
mesmos tipos de propriedades de informação que usualmente sabemos provir de inteligência. O design inteligente
tem aplicado estes métodos cientı́ficos para detectar design em estruturas biológicas irredutivelmente complexas,
na informação complexa e especı́fica contida no DNA, na
arquitetura fı́sica sustentadora da vida do universo e na
geologicamente rápida origem da diversidade biológica no
registro fóssil durante a explosão cambriana há aproximadamente 530 milhões de anos atrás.”
Esta é a definição de design inteligente por um dos sites
do Discovery Institute e o Center for Science and Culture
(Centro para Ciência e Cultura) [33], que são instituições
que promovem as idéias do design inteligente.
4.2
Breve histórico
Em 1993 ocorre uma reunião, em Pajaro Dunes na Califórnia, que constitui um marco para os futuros fundadores do movimento do design inteligente, incluindo Phillip
Johnson, Michael Behe e outros [34].
O Discovery Institute, uma organização “think tank”
(relacionada a questões polı́ticas, econômicas, cientı́ficas e
tecnológicas) é fundado em 1994 para apoiar o movimento
do design inteligente [35].
Michael Behe publica o livro Darwin’s Black Box (A
Caixa Preta de Darwin) em 1996, no qual introduz o conceito de “complexidade irredutı́vel” e torna popular a expressão “design inteligente” [34].
Em 1998, William Dembski publica a série de livros The
Design Inference (A Inferência de Design) em que introduz
os conceitos de filtro-explicativo e complexidade especı́fica
[34].
Desde a década de 1980 várias disputas têm acontecido
nos tribunais americanos acerca do ensino de idéias criacionistas e, posteriormente, design inteligente e evolução nas
escolas públicas. Nestas dispustas o movimento do design
tem perdido devido a alegação de que o design inteligente
não é ciência, mas promove uma religião e, portanto estaria em desacordo com a Cláusula de Estabelecimento da
Primeira Emenda da Constituição dos EUA, que, juntamente com a cláusula do livre exercı́cio, diz: “O Congresso
não fará nenhuma lei com respeito ao estabelecimento de
uma religião, ou proibindo o livre exercı́cio dela” [34] [36].
Em 1999, A Junta Escolar do estado do Kansas votou
contra incluir questões de macroevolução na avaliação no
estado. Em 2001, o congresso dos Estados Unidos aprovou
o “Ato Nenhuma Criança Deixada Atrás”, um projeto de
lei para a educação elementar e secundária que foi acompanhado pela seguinte emenda:
“Os membros do comitê reconhecem que uma educação
cientı́fica de qualidade deveria preparar os estudantes
para distinguir os dados e teorias testáveis da ciência de
afirmações religiosas ou filosóficas que são feitas em nome
da ciência. Quando são ensinados tópicos que possam
gerar controvérsia (como a evolução biológica) o curriculum deveria auxiliar os estudantes a entender a completa
abrangência das concepções cientı́ficas que existem, por
que tais tópicos podem gerar controvérsia e como as decobertas cientı́ficas podem afetar profundamente a sociedade” [34].
Com relação a declaração nesta emenda, de que o ensino
de evolução biológica pode gerar controvérsia, os defensores do design inteligente têm proposto um ensino da controvérsia que mostre evidências e argumentos cientı́ficos a
favor e contra a evolução [37].
4.3
Agenda Polı́tica
A declaração de missão do Discovery Institute diz o seguinte:
“A missão do Discovery Institute é construir uma visão
positiva da prática do futuro. O Instituto descobre e
promove idéas na tradição do senso comum do governo
representativo, do livre mercado e da liberdade indivi-
19
20
dual. Nossa missão é promovida através de livros, reportagens, testemunho legislativo, artigos, conferências e
debates públicos, mais cobertura pela mı́dia e publicações
do próprio Instituto e website na internet.
“Os projetos atuais exploram os campos da tecnologia,
ciência e cultura, reforma da lei, defesa nacional, o ambiente e a economia, o futuro das instituições democráticas,
transporte, religião e vida pública, gastos do governo com
benefı́cios sociais, questões estrangeiras e cooperação dentro da região bi-nacional da ‘Cascadia’. Os esforços dos
associados e equipe do Discovery, sediado em Seattle, são
crucialmente auxiliados pelos membros do Instituto, comissão de diretores e patrocinadores” [38].
Foi veiculado na internet um documento sobre um projeto do Discovery Institute conhecido como “The wedge
estrategy“ (A Estratégia da Cunha), composta de três fases [39]:
1. Fase I. Pesquisa cientı́fica, escritos e publicidade.
2. Fase II. Publicidade e produzir opinião.
3. Fase III. Confrontação Cultural e Renovação.
O objetivo da estratégia é assim explicado:
“As consequências sociais do materialismo têm sido devastadoras. Como sintomas, estas consequências certamente merecem tratamento. Entretanto, estamos convencidos de que a fim de derrotar o materialismo, devemos
cortá-lo em sua fonte. Esta fonte é o materialismo cientı́fico. Esta é precisamente nossa estratégia. Se vemos
a ciência materialista predominante como uma árvore gigante, nossa estratégia planeja funcionar como uma ‘cunha’ que, conquanto relativamente pequena, pode dividir
o tronco quando aplicada em seus pontos mais fracos. O
próprio inı́cio desta estratégia, o ‘corte fino da cunha’, foi a
crı́tica de Phillip Johnson do Darwinismo iniciada em 1991
em Darwinism on Trial (Darwinismo em Julgamento) e
prosseguida em Reason in the balance e Defeating Darwinism by Opening Minds (Razão na Balança e Derrotando
o Darwinismo por Abrir Mentes). O muito bem sucedido
Darwin’s Black Box A Caixa Preta de Darwin de Michael
Behe seguiu-se a obra de Johnson. Estamos ampliando
este impulso, expandindo a cunha com uma alternativa
cientı́fica positiva às teoria cientı́ficas materialistas, a qual
veio a ser chamada de a teoria do design inteligente (DI). A
teoria do design promete reverter a asfixiante dominância
da visão de mundo materialista e substitui-la por uma
ciência consoante as convicções cristãs e teı́sticas.”
Um dos patrocinadores do Discovery Institute, Howard
F. Ahmanson Jr., segundo a mı́dia, está ou esteve envolvido com o movimento Reconstrucionismo Cristão, que
propõe um governo teocrático e se opõe a separação entre
igreja e estado [40] [41]. Contudo, o Discovery Institute
nega qualquer identificação com estas idéias e com esforços
para ensinar criacionismo ou religião nas escolas públicas,
mas afirma que seu propósito é “opor-se a idéia de que
a ciência apoia a filosofia não cientı́fica do materialismo”
[42] [43].
CAPÍTULO 4. DESIGN INTELIGENTE
4.4
Complexidade Irredutı́vel
Complexidade Especı́fica
e
Complexidade irredutı́vel é definida por Michael Behe
como “um sistema único composto de várias partes combinadas e interagindo que contribuem para a função básica,
em que a remoção de qualquer uma das partes faz o sistema efetivamente parar de funcionar” [44].
Este tipo de sistema não pode ser produzido por seleção
natural.
“Um sitema complexo irredutı́vel não pode ser produzido diretamente por modificações leves, numerosas e sucessivas de um sistema precursor, porque qualquer precursor para um sistema irredutivelmente complexo em que
está faltando uma parte é não funcional por definição”
[45].
Inúmeros artigos foram colocados na internet por cientistas evolucionistas contrapondo-se a idéia de complexidade irredutı́vel. Existe um vı́deo de Richard Dawkins, no
youtube, demonstrando a construção de um olho passo a
passo e os benefı́cios de cada pequeno acréscimo [46]. Há
também uma animação com a reconstrução de um flagelo
por etapas e cada vantagem dos acréscimos [47]. O flagelo
e o aporte de proteı́nas nos compartimentos subcelulares
de uma célula foram alguns dos exemplos de complexidade
irredutı́vel mencionados por Behe [48].
Dembski argumenta em Irreducible Complexity Revisited (Complexidade Irredutı́vel Revista) que a definição de
Behe de complexidade irredutı́vel é mais sutil do que a
princı́pio possa parecer. Mais adiante, ele declara que
“ao tentar coordenar sucessivas mudanças evolutivas necessárias para produzir máquinas bioquı́micas irredutivelmente complexas, o mecanismo darwiniano, consequentemente, encontra uma série de obstáculos probabilı́sticos
desanimadores” [49]. Estes obstáculos incluiriam:
1. “Disponibilidade. As partes necessárias para evoluir
um sistema bioquı́mico complexo como o flagelo bacteriano estão igualmente disponı́veis?
2. “Sincronização. Estas partes disponı́veis estão no
tempo correto de modo que elas possam ser incorporadas quando necessário nas estruturas evoluindo?
3. “Localização. Mesmo com partes que estão disponı́veis no tempo correto para inclusão em um sistema evoluindo, podem as partes escapar dos sistemas
em que elas estão integradas atualmente e se tornarem disponı́veis para o ‘sı́tio de construção’ do sistema
evoluindo?
4. “Reações cruzadas interferindo. Dado que as partes
corretas podem ser reunidas no tempo correto no lugar correto, como podem as partes erradas, que de
outro modo entupiriam a produção, ser excluı́das do
‘sı́tio de construção’ do sistema evoluindo?
5. “Compatibilidade de Interface. As partes que estão
sendo recrutadas para inclusão no sistema evoluindo são mutuamente compatı́veis no sentido de
Glossário
21
combinarem-se ou fazer interfaces bem ajustadas de
Uma investigação empı́rica é um modo de testar
modo que, uma vez estando apropriadamente posici- hipóteses usando observação ou experimento. Se é possı́vel
onadas, as partes trabalhem juntas para formar um propor-se um teste que demonstre que algo é falso, então
sitema funcionando?
este algo é falseável.
Em primeiro lugar: A origem da vida e o ancestral co6. “ Ordem de Montagem. Mesmo com todas as partes mum são fatos que podem ser observados? Se eles não
corretas, e apenas estas, alcançando o lugar correto no podem ser observados diretamente, não podem ser consitempo correto, e mesmo com plena compatibilidade derados fatos.
de interface, elas serão montadas na ordem correta
Segundo: É possı́vel fazer-se um experimento que depara formar um sistema funcionando?
monstre que a origem da vida, com toda a certeza, só pode
7. “Configuração. Mesmo com todas as partes sincro- ter ocorrido de determinada forma? É possı́vel concluir-se
nizadas para serem montadas na ordem correta, elas através de experimento que a única explicação possı́vel
serão arranjadas do modo correto para formarem um para as semelhanças estruturais e moleculares entre os
seres vivos é partilharem um ancestral comum? Se isto
sistema funcionando?”
não é possı́vel, não importa o quão provável pareça, estas
William A. Dembski utiliza a seguinte analogia para ex- hipóteses não são testáveis.
Terceiro: Se estas hipóteses não são testáveis, elas não
plicar complexidade especı́fica:
são
falseáveis. Se elas não são falseáveis, então, pelas
“Uma única letra do alfabeto é especı́fica sem ser comconclusões
da justiça americana, elas não tem a ver com
plexa (isto é, conforma-se a um padrão dado independenciência,
mas
são filosofia ou um tipo de crença de intelectemente, mas é simples). Uma longa sequência de letras
tuais
ligados
a ciência, não importa quantos milhares ou
randômicas é complexa sem ser especı́fica (isto é, requer
milhões
de
experimentos
se façam tendo elas como motivo.
um complicado conjunto de instruções para se caracterizar, mas não se conforma a nenhum modelo dado independentemente). Um soneto de Shakespear é tanto complexo
Glossário
quanto especı́fico” [50].
No livro No Free Lunch: Why specified complexity can- Algoritmo
not be purchased without intelligence (Sem almoço grátis:
Um algoritmo é uma sequência finita de instruções
Por que complexidade especı́fica não pode ser “comprada”
bem definidas e não ambı́guas, cada uma das quais
sem inteligência) [51], Dembski propõe um algoritmo para
pode ser executada mecanicamente num perı́odo de
testar design inteligente. Este algoritmo se divide em: netempo finito e com uma quantidade de esforço finita.
cessidade e contingência, ou seja, algo pode funcionar de
21
um determinado modo por que isto precisa ser assim ou
ser contigente e ter mais de uma possibilidade de funcio- Contingência
namento. A contingência pode ser irrestrita e produto de
Em filosofia e lógica, contingência é o status de
puro acaso ou ser restrita. Se for restrita, estas restrições
proposições que não são necessariamente verdadeiras
podem ser em função de leis ou algoritmos, como no caso
nem necessariamente falsas. 21
da evolução, ou produto de design inteligente.
Algumas das crı́ticas feitas a este algoritmo são que é
Explosão cambriana
possı́vel se concluir que algo é produto de design quando
A explosão Cambriana é considerada um evento na
o é de uma lei ou algoritmo e de que Dembsky não testa
história da vida, registrado por fósseis depositados em
a possibilidade de lei ou algoritmo em seus exemplos de
extratos de cerca de 550 milhões de anos, durante o
design [52] [53].
perı́odo Cambriano, quando subitamente teria havido
uma explosão na biodiversidade do planeta. 19
4.5
Discussão sobre os tópicos anteriores
Falseável
Falseabilidade (ou refutabilidade) é um conceito importante na filosofia da ciência (epistemologia). Para
uma asserção ser refutável ou falseável, em princı́pio
será possı́vel fazer uma observação ou fazer uma experiência fı́sica que tente mostrar que essa asserção é
falsa. Karl Raimund Popper (Viena, 28 de Julho de
1902 — Londres, 17 de Setembro de 1994) é conhecido
pela sua defesa do falsificacionismo como um critério
da demarcação entre a ciência e a não-ciência. 21
Nos Estados Unidos, os tribunais que decidiram casos de
ensino de evolução contra o ensino ou menção da criação
ou design inteligente como alternativas, o fizeram por concluir que criação “simplesmente não é ciência”. O mesmo
ocorreu com design inteligente. Os motivos para esta conclusão é “porque ela [criação]depende de ‘intervenção sobrenatural’, que não pode ser explicada por causas naturais, ou ser provada mediante investigação empı́rica e,
portanto, não é testável nem falseável” [54].
Filtro explicativo
Mas será que o ancestral comum pode ser provado meÉ um método, formulado por William Dembski, para
diante investigação empı́rica? É testável e falseável? E a
detectar design. Para se verificar se algo é produto
origem da vida?
de design, ele deve passar pelo filtro explicativo que
22
Glossário
consiste de três etapas. A grosso modo, o que está
sendo testado deve responder a três perguntas: (1)
Uma lei explica isto? (2) O acaso explica? e (3) O
design explica?. 19
Flagelo
Em Biologia, chamam-se flagelos a apêndices das
células vivas, em forma de filamentos, que servem
para a sua locomoção (no caso de organismos unicelulares - flagelados) ou para promover o movimento
da água ou outros fluidos no interior do organismo,
quer no processo da alimentação, quer na excreção.
20
Teı́sticas
O Teı́smo (do grego Theós, “deus”) sustenta a crença
no Deus revelado aos homens através das Escrituras
Sagradas, de maneira universal, sem o intermédio dos
homens e da religião em geral. Trata-se de um conceito introduzido em 1678, por Ralph Cudworth que
se opõe ao ateı́smo. 20
Think tank
Um think tank (expressão inglesa que significa “catalizador de idéias”) é uma instituição, organização
ou grupo de investigação que produz conhecimento e
oferece idéias sobre assuntos relacionados a polı́tica,
comércio, indústria, estratégia, ciência, tecnologia ou
mesmo assuntos militares. 19
Capı́tulo 5
Conclusões
Como vimos, embora a ”teoria” de Darwin contenha
mecanismos observáveis e testáveis, como seleção natural
e modificações com herança, a idéia do ancestral comum,
embora plausı́vel, não é testável.
A hipótese do ancestral comum baseia-se nas semelhanças estruturais (morfológicas e moleculares) entre os
organismos vivos como evidências. Esta hipótese contém
outra (não testada) embutida: um ancestral comum é a
única explicação para estas semelhanças.
A hipótese de que a vida se originou de forma espontânea, ou seja, apenas através da operação de leis da
quı́mica e da fı́sica, sem intervenção inteligente, também
não é testável, é uma posição filosófica que ganhou status
de ciência.
Existem apenas dois modos de se provar a hipótese do
ancestral comum e a da origem da vida. Uma seria construir uma máquina do tempo e encontrar um meio de testemunhar os fatos e documentá-los. Outra seria realizandose experimentos que não só comprovassem a viabilidade
das hipóteses como garantissem que as soluções encontradas são as únicas possı́veis. Até lá, estas hipóteses são
apenas hipóteses e acreditar nelas é uma visão filosófica.
Mas por ser a visão filosófica da maioria dos cientistas
adquiriu o direito de ser ensinada com exclusão de outras
posturas nas aulas de ciências.
Alguns modelos matemáticos fenomenológicos têm sido
elaborados para tratar de fenômenos evolutivos e extrair
dados. Contudo, nenhum modelo baseado em primeiros princı́pios, com ampla abrangência e preditivos, como
os da Relatividade Geral e Restrita, Mecânica Quântica,
Termodinâmica, etc., já foi construı́do sobre evolução
biológica. Isto me faz retornar ao exemplo da precessão
do periélio de Mercúrio, em que hipóteses qualitativas e
cálculos matemáticos foram elaborados para explicá-la. O
problema só foi resolvido quando uma teoria abrangente
como a Relatividade Geral foi elaborada. Este tipo de
solução foge ao senso comum, não pode ser formulada
usando-se apenas a lógica e o raciocı́nio comuns, mesmo
que treinados pelo uso de experimentação.
Se uma teoria como esta fosse elaborada em Biologia,
não é possı́vel prever-se que tipos de realidades nas quais
não pensamos poderiam surgir como soluções.
Mas em Biologia ainda está se tentando entender origins
de entidades que não tem nem definição cientı́fica como
“espécie” e vida. Ou seja, coisas das quais ainda não se
sabe nem o mı́nimo.
Carol Cleland, que ensina filosofia na Universidade do
Colorado e trabalha no Instituto de Astrobiologia da
NASA como filósofa residente tem algumas idéias interessantes sobre o significado de vida [18]: “Os cientistas
deveriam simplesmente desistir de procurar uma definição
de vida. Eles nem podem começar a entender o que a
vida realmente é , ela afirma, até que encontrem formas
de vida profundamente diferentes daquelas que conhecemos aqui na Terra. Apenas quando compararmos vida
alienı́gena com a vida em nosso planeta entenderemos a
verdadeira natureza desta coisa ubı́qua e efêmera. Cleland
acredita que os biólogos precisam construir uma teoria da
vida, assim como os quı́micos construiram uma teoria dos
elementos e os fı́sicos construiram uma teoria do eletromagnetismo. As definições, ela argumenta, preocupam-se
apenas com linguagem e conceitos, não com verdadeiro
entendimento. Levando a semântica a sério, Cleland está
requisitando nada menos do que uma revolução cientı́fica.
Apenas quando mudarmos o modo como pensamos sobre
a vida, ela argumenta, seu verdadeiro estudo começará”
[18].
De fato, uma teoria sobre a vida deveria ser por onde
começar o estudo de Biologia.
A idéia de complexidade irredutı́vel e as formas como
se demonstrou que ela não ocorre ainda são apenas
ótimos exercı́cios de imaginação. Dembski levantou alguns obstáculos plausı́veis que poderiam impedir a aparentemente tão fácil evolução dos ditos sistemas complexos. E como se pode perceber, foram obstáculos dessa
classe (guardadas as devidas diferenças) que impediram a
demonstração de um mundo de RNA. Resta todas estas
idéias sairem do domı́nio da imaginação e alcançarem o
padrão de uma verdadeira teoria.
Ainda com relação ao estudo do ancestral comum e da
origem da vida, embora não se possa acessar diretamente
estes eventos, é possı́vel testar-se evidências e mapear diferentes soluções. O mesmo aplica-se a idéia de Deus ou
um Designer: não podemos ter acesso direto a seu estudo,
mas podemos rastrear evidências. Pesquisas demonstraram que uma região do cérebro localizada no lobo temporal, se estimulada, pode produzir experiências religiosas, como um senso da presença de Deus [55]. Scans do
cérebro de pessoas meditando ou orando revelam que estas práticas podem mudar o cérebro funcionalmente alterando sua atividade [56] [57]. Muitos acreditam que por
sermos criados por Deus, temos os meios, que incluem as
23
24
conexões do cérebro, para conhecê-lo. Embora se possa
dar outras explicações para este tipo de conexão, esta é
uma das hipóteses válidas. Talvez não se possa provar
a Deus cientificamente, mas pode-se investigar evidências
dEle.
Glossário
Modelo baseado em primeiros prı́ncipios
Um modelo construı́do somente a partir de leis
fı́sicas bem estabelecidas, aplicadas a um contexto especı́fico. 23
Modelos matemáticos fenomenológicos
Um modelo que expressa matematicamente os resultados de fenômenos observados sem basear-se em primeiros princı́pios (leis fı́sicas fundamentais). Exemplo: a descrição matemática de núcleons como sendo
um conjunto de quarks confinados em um poço de potencial parabólico, sem preocupar-se com a origem e
funcionamento mais detalhado desse potencial. 23
Glossário
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