Entrar na mente dos consumidores

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Entrar na mente dos consumidores
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1. Entrar na mente dos consumidores
Nos tempos das geladeiras brancas e dos carros pretos era fácil. Hoje, em um
mercado em constante mutação, entrar na mente dos consumidores é mágica
perseguida por toda e qualquer empresa.
A cada 24 horas novos produtos e serviços são lançados no mundo todo para um
número de consumidores que não cresce na mesma proporção. Portanto, gerar valor e
atratividade passou a ser questão de vida ou morte dentro das empresas. A questão
não é despertar a necessidade de determinado público-alvo de comprar o seu
novíssimo liquidificador, mas sim fazer com que o consumidor opte pelo seu
liquidificador dentre as dezenas existentes.
Quando falamos em conhecer o consumidor, não estamos falando apenas em saber
onde ele mora (tarefa básica da segmentação), saber se ele tem poder aquisitivo para
adquirir o seu produto e assim por diante.
Apenas isto não é suficiente. É preciso mergulhar mais a fundo em seus desejos e
necessidades, conhecê-lo de perto, buscar informações detalhadas sobre seus hábitos
de consumo e como toma decisões. O que o leva do interesse à ação?
Entrar na mente do consumidor é conhecê-lo melhor do que ele próprio. A afirmação
de que muitas vezes o consumidor não sabe o que quer é cada vez mais verdadeira.
Pesquisar, perguntar e intuir faz parte da atividade de compreender esse consumidor
volátil e pouco fiel. A criatividade e a psicologia ajudam o administrador de marketing a
colher informações e a usá-las de acordo com os seus objetivos.
As empresas que obtém sucesso atualmente são aquelas capazes de entregar uma
verdadeira experiência de compra para seus clientes, e não aquelas que se
comprometem a somente entregar produtos. Ficou mais difícil vender e,
principalmente, fazer com que o comprador repita a compra.
A entrega de experiência só é válida quando percebida positivamente pelo cliente, e
só é possível entregar tal experiência se o administrador de marketing domina as
preferências de seu público-alvo.
Vamos ver algumas tentativas de vendas feitas por empresas, que acabaram não
dando muito certo.
A rede Pizza Hut tentou entrar no Brasil com sua pizza tipo torta, sucesso nos EUA, e
enfrentou forte rejeição. A empresa não conhecia a cultura do país, que tem uma das
maiores variedades de produtores de pizza e consumidores sofisticados com desejos
muito específicos.
A Wal-Mart, gigante norte-americana do setor de varejo, quando inaugurou sua
primeira loja no Brasil, no início dos anos 90, trouxe botas de ski e tacos de golfe para
serem vendidos aqui. Fracasso de vendas. A empresa deixou de considerar a
influência de características geográfica e climática do seu novo mercado.
Uma conhecida empresa química multinacional resolveu presentear alguns clientes
importantes com um fim de semana, com direito a acompanhante, na Costa do
Sauípe. Qual não foi a surpresa dos organizadores quando o seu cliente mais
importante disse: “Acredito que vocês estão gastando um bom dinheiro comigo, mas
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sinceramente eu preferiria que vocês revertessem esse presente em desconto na
minha próxima compra”. A empresa precisava conhecer o que realmente representa
valor para o consumidor do seu segmento.
Há muitos exemplos como estes no mercado. Eles fazem parte das tentativas de
acertos e erros feitas pelas empresas e não há como não existirem. Os riscos estarão
sempre presentes, uma vez que os consumidores são um “mistério”. Mas como saber
se vai dar certo ou não sem arriscar?
O administrador de marketing é responsável por transformar interesses por parte do
futuro cliente, e expectativa de compra por parte da empresa, com base em todas
essas informações de comportamento de compra, em uma relação ganha-ganha
duradoura.
Um estudo patrocinado pela Volkswagen no 1º semestre de 2003 tentou descobrir o
que o consumidor busca de fato na hora de comprar um carro novo.
O estudo identificou quatro tipos de consumidor conforme mostra a tabela.
RETRATO DO CONSUMIDOR
Pesquisas mostram atitudes e perfil do comprador de carros novos
Classificação
Relação com o carro
Entusiasta
Valoriza o status, o sucesso. É bem
informado e gosta de modelos grandes,
com mais tecnologia e potência, que
chamem atenção e tragam prestígio.
Sensível
Quer conforto, praticidade, não está
preocupado em ter um modelo exclusivo,
nem é profundo conhecedor de carros, é
sensato.
Guiado
pela Ama o carro, sente-se jovem, adora
imagem
dirigir.
Quer
um
modelo
que
impressione, que não seja muito caro,
mas tenha design bonito.
Essencialista
Valoriza
o
custo/benefício,
quer
economia e é extremamente racional.
Prefere os compactos mais baratos,
adora cuidar do carro e busca marcas
tradicionais.
Exemplo de
Produto
Audi, BMW, MercedesBenz
Fox, Meriva, Scénic
Polo, Golf, C3, Corsa,
EcoSport, 206
Gol, Palio, Celta
De posse da classificação, a montadora redirecionou suas ações publicitárias e
lançamentos para os próximos três anos. Este tipo de estudo envolve uma operação
detalhada na busca de informações que visam munir a equipe de dados com o
objetivo direto de cativar o potencial cliente a sentir atratividade pelos seus produtos.
Um outro exemplo que podemos citar é o da empresa Harley Davidson.
A empresa fabricante de motocicletas norte-americanas tem todas as suas ações
voltadas a criar e principalmente maximizar um vínculo emocional com os seus
clientes. Em certa ocasião, perguntado como a fábrica mensurava a retenção de seus
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clientes, um funcionário respondeu: “Verificamos a porcentagem de clientes que tem o
nome Harley tatuado no corpo”.
Isso é entrar na mente dos consumidores.
Conhecê-lo a fundo, o que gosta, o seu jeito de ser, sua personalidade, seus desejos
até mesmo inconscientes.
Com isso, a possibilidade de satisfazê-lo torna-se mais real.
1.2 - Modelo ideal de comportamento do consumidor
Não existe um modelo de sucesso a ser seguido nem uma fórmula mágica que
propicie às empresas conhecer profundamente cada cliente seu. O primeiro desafio,
por mais óbvio que pareça, é conhecer o mercado em que se está inserido.
O estudo do Comportamento do Consumidor é uma ciência recente, apoiada em
outras que também surgiram no último século. A Psicologia, a Sociologia, a
Antropologia, o Behaviorismo, a Economia, cada uma adota um enfoque diferente para
explicar o comportamento.
Vamos entender a fundamentação básica de cada uma.
Modelo Psicológico
Entre as diversas correntes de teoria psicológica, vamos destacar duas das mais
usadas, a Freudiana e a de Maslow.
Segundo Freud, o aparelho psíquico (psyche) é composto por três entidades:
id: fonte primitiva da energia impulsora psíquica, inconsciente, regida pelos
princípios de prazer e morte
ego: elemento intelectual, racional, consciente, regido pelo princípio da
realidade
superego: representação interna dos valores, proibições e morais da
sociedade.
Neste modelo, nosso comportamento é resultado da luta do id, que busca prazer, e do
superego, que busca o comportamento socialmente aceitável. O terceiro elemento, o
ego, é o componente que vai decidir a quem obedecer. Em alguns casos, fazemos o
que desejamos, em outros, o que achamos que os outros esperam de nós, o que é
“aceitável”.
Uma característica da personalidade, neste modelo, é que, quando não podemos
atender a um determinado impulso, podemos ficar frustrados ou podemos usar um
substituto que traga o mesmo tipo de satisfação.
Por exemplo, uma pessoa pode substituir a busca de um prazer que considera
socialmente inaceitável por outro prazer aceitável, como o derivado de uma cerveja,
um sorvete, um carro esporte,etc.
Segundo Freud, ele gostaria de estar rodeado de belas mulheres, mas ao invés de
persegui-las com um comportamento anti-social, ele acaba consumindo aquela cerveja
que mostra seu consumidor na mesma situação.
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Ao longo da semana, ele se priva dos mais diversos prazeres para poder ganhar o
salário e o status que seu trabalho lhe dá e no fim de semana ele vai almoçar naquele
restaurante especial, que custa muito caro, mas os pratos são deliciosos. Afinal, ele
“merece” esse gasto com ele.
Ele gostaria de ter uma amante, mas sabe que essa atitude não seria socialmente
aceita, e como alternativa, ele compra um carro esporte pelo qual pode mostrar toda
sua “potência”.
Na teoria de Maslow, o comportamento humano está voltado para a satisfação de um
conjunto de cinco necessidades básicas,que possuem um ordem hierárquica entre
eles.
Somente quando conseguimos satisfazer as necessidades de um nível é que nos
voltamos para a satisfação de necessidades do nível superior a seguir.
Por exemplo, somente quando temos comida e abrigo é que começamos a pensar em
buscar o afeto de uma outra pessoa.
Alguns produtos e serviços podem estar voltados para a manutenção do nível de
satisfação destas necessidades, como os planos de seguro, como os de vida, que
garantem a sobrevivência da família, ou seguro residencial, que garante o abrigo. A
etapa seguinte é obter status e estima de seus pares para finalmente pensar em autorealização.
Hoje quem tem poder aquisitivo para consumo, de modo geral já tem suas
necessidades básicas satisfeitas (fome e sede), por isso, muito da motivação de
consumo e do apelo usado em comunicação de marketing costuma estar associado
com a busca de afeto e status. Cervejas, cigarros, chocolates, sorvetes, carros,
celulares, todos os produtos que tenham uma exposição junto ao grupo a que o
consumidor pertence, costumam usar esta estratégia.
Para aqueles que já têm a maioria das suas necessidades satisfeitas, os apelos
voltados para auto-realização passam a ser mais fortes. Um exemplo interessante é o
do posicionamento da moto Honda XR-250 Tornado, cujo slogan no lançamento foi
“Para quem vive no asfalto, mas é apaixonado por terra”. Essa mensagem coloca esse
modelo claramente como a opção para aqueles que já têm sua vida estabilizada no
“asfalto” da cidade (emprego, família, amigos) e que agora vai curtir seu hobby, sair da
trilha comum, viver a natureza.
Modelo Sociológico
A Sociologia estuda como uma pessoa e os grupos a que ela pertence influenciam seu
comportamento. O primeiro grande grupo influenciador é a família. De modo geral, os
filhos reproduzem o comportamento que observam nos pais, a não ser nos casos em
que existe conflito forte entre eles e os filhos fazem um esforço deliberado para se
diferenciar.
Outro grupo é o dos amigos. De modo geral, as pessoas aprovam o comportamento
daqueles que admiram ou com quem têm afinidades, e imitam esse comportamento.
Já em relação àqueles que rejeitam, elas tentam se dissociar deles, adotando
comportamentos opostos.
Um exemplo interessante é um anúncio da MTV americana voltado para anunciantes,
cujo slogan é “Compre esse jovem de 24 anos e ganhe todos seus amigos de graça”.
Com isso, ela está destacando que sua audiência é composta de influenciadores e
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líderes de opinião que, comprando espaço para seus anúncios nessa emissora, a
empresa também estará atingindo seus amigos, que serão influenciados.
Outros influenciadores são pessoas que reconhecemos como especialistas técnicos
no assunto. Já é um anúncio clássico aquele em que aparece um dentista, dizendo
que recomenda determinada pasta de dentes, ou médico indicando um remédio.
Pelé, eleito atleta do século, costuma endossar uma série de produtos ligados à boa
forma física, de vitaminas e equipamentos de musculação, e até o Viagra.
Modelo Antropológico
A Antropologia estuda a influência da sociedade de um indivíduo sobre seu
comportamento. Seus conceitos são de grande importância, principalmente para
aqueles que lidam com mercados multiculturais, que pode envolver diferentes países e
mesmo diferentes regiões, como no caso do Brasil, onde observamos
comportamentos diferentes nas diferentes regiões.
Alguns estudos mostram, por exemplo, que o relevo de uma região pode influenciar
seus hábitos alimentares. Em regiões onde a água é abundante, como nas planícies,
os pratos tendem a ser cozidos, enquanto que nas regiões altas, os pratos tendem a
ser assados.
É importante conhecer as características e limitações culturais de um certo mercado,
por que o administrador de marketing deverá saber trabalhar dentro delas. Dificilmente
uma ação de marketing pode efetuar grandes mudanças culturais a curto prazo.
O McDonalds, por exemplo, quando veio para o Brasil, concentrou seus esforços entre
as crianças, que ainda estavam criando seus hábitos alimentares, ao invés dos
adultos, cujos hábitos já estavam consolidados. Com o tempo, essas crianças
cresceram, acostumando pouco a pouco com seus produtos, e ensinaram seus filhos
a consumir seus hambúrgueres.
Uma classificação muito usada é a de culturas de alto e de baixo contexto.
Cultura de baixo contexto são aquelas em que as pessoas se comunicam de forma
direta e objetiva, baseadas principalmente em comunicação verbal. É o caso de
americanos e alemães que vão direto ao assunto nas negociações e não gostam de
“enrolação” ou de contatos extra-profissionais.
Nas culturas de alto contexto, existe uma parcela maior de comunicação não verbal e
relacionamento social entre as pessoas. É o caso das culturas latinas, como a
brasileira, em que, para se iniciar uma negociação, as pessoas primeiro devem
desenvolver um relacionamento pessoal, e os gestos e atitudes são tão importantes
quanto as palavras.
O administrador de marketing deve saber identificar o grau de contexto de seus
clientes e atuar de acordo, ou poderá sofrer fortes resistências.
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Modelo Behaviorista
Trata-se de outra escola que estuda o comportamento aprendido ou condicionado. No
condicionamento, associamos um estímulo a uma resposta. Por exemplo, aprendemos
a frear quando a lanterna de freio do carro à frente acende, a ligar a TV no mesmo
horário para assistir a continuação da mini-série, a levantar e ir para a cozinha quando
o plim-plim da Globo indica a entrada do bloco de comerciais e a voltar para nosso
assento quando ouvimos o plim-plim pela segunda vez.
Essa escola considera o ser humano como uma “caixa preta”. Não importam as
características individuais da pessoa, apenas que vamos dar um certo impulso ou
incentivo e obter a resposta desejada.
Esses impulsos e incentivos são muito usados na comunicação quando uma empresa
busca associá-los ao consumo de seu produto. Uma marca de cerveja, por exemplo,
pode buscar associar as situações de encontro com amigos em um bar com o
consumo de seu produto usando o slogan “a cerveja dos bons momentos” ou “a
cerveja dos amigos”, para que o cliente, sempre que estiver naquela situação, lembre
em primeiro lugar da sua marca.
A outra escola é a da Aprendizagem ou Cognitiva, que diz que aprendemos por meio
da assimilação e interpretação das informações que recebemos.
Assim, o fabricante de celular, por exemplo, inclui o manual de operações junto ao
produto para que possamos aprender quais são os recursos disponíveis no aparelho e
melhor usá-lo.
O professor apresenta os conceitos e exemplos para que os alunos pensem no que
viram e ouviram e tirem suas conclusões.
Geralmente produtos de apelo mais racional costumam usar conceitos desta escola.
Quando a HP, por exemplo, anuncia suas impressoras, ela dá destaque a suas
características de desempenho, como velocidade de impressão, para que o cliente se
coloque na situação de uso, se imagine produzindo rapidamente suas cópias e
conclua que esse modelo é a melhor solução para seu caso.
Modelo Econômico
Para os economistas, o ser humano é racional, busca informações detalhadas sobre
as diversas opções disponíveis, avalia com base em pesos associados a importância e
valor e decide de modo a maximizar o benefício que irá receber para o valor ou custo
que deverá despender.
Sendo racional, toda vez que tomar uma decisão usará os mesmos critérios e,
portanto, tomará a mesma decisão.
Essa escola funciona bem para explicar a compra de produtos e serviços de valor
mais alto, quando o risco de uma decisão errada é grande: refrigeradores, automóveis,
televisores etc.
O cliente coleta diversas informações, conversa com diversas fontes, organiza e
compara os resultados obtidos, até sentir confiança de que resolveu suas dúvidas, e
então toma sua decisão, ponderando tudo que conseguiu levantar.
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Na verdade, nosso comportamento é resultado de nossas características de
personalidade, de condicionamento, do que aprendemos, de avaliação racional, de
influência da sociedade, de nossos amigos e da nossa cultura.
Ou seja, nosso comportamento é formado pela mistura das idéias de todas as escolas
que vimos. Cada uma dessas escolas de pensamento explica certos aspectos do
comportamento e precisamos conhecer um pouco de cada uma delas para poder
conhecer nosso consumidor.
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