Jornal da Imagem

Transcrição

Jornal da Imagem
Parte integrante da Edição nº 355 – Março de 2008
Jornal da Imagem
Caderno 2
Este encarte contém casos diversos enviados pelos leitores do Jornal da Imagem
Caso 1
• H
istória clínica
Paciente do
sexo masculino,
42 anos. Dor
na face anterior
dos joelhos há
dois meses. Nega
história de trauma.
Antecedentes
pessoais: HIV
positivo. Exame
clínico: suspeita
de condromalácia
patelar.
Figura 1 –
Imagem
sagital
ponderada
em T2 com
supressão
de gordura
evidencia
elevação
difusa do
sinal da
gordura
de Hoffa
(asterisco)
Figura 2 – Imagem axial ponderada
em T2 com supressão de gordura
evidencia elevação difusa do sinal da
gordura de Hoffa (asterisco)
Figura 3 – Imagem axial ponderada em
T2 com supressão de gordura evidencia
cartilagens normais na patela e tróclea
femoral (cabeças de seta)
Caso 2
• H
istória clínica
Homem de
29 anos, com
tosse e dispnéia
progressivas,
agravadas nos
últimos 30 dias.
Figura 1 – Radiografia simples
de tórax demonstrando
opacidades parenquimatosas
nas bases pulmonares
Figuras 2 a 4 – TCAR
demonstrando opacidades
pulmonares em vidro
fosco associadas a septos
interlobulares espessados
(padrão de “pavimentação
em mosaico”)
Jornal da Imagem
2
São Paulo | março | 2008
Caso 1
Caso cedido pelos Drs. Conrado F. A. Cavalcanti, Marcelo Bordalo Rodrigues e Rafael B. Lourenço
Hoffite difusa associada ao HIV
Diagnóstico
Hoffite difusa associada ao HIV.
Discussão
O coxim gorduroso infra-patelar foi
descrito em 1904 por Albert Hoffa,
juntamente com a entidade doença
de Hoffa. A gordura de Hoffa é uma
estrutura intra-capsular, porém, extrasinovial. Ela provê suporte mecânico e
tem papel importante na estabilização
da articulação do joelho.
Os métodos de imagem e principalmente a Ressonância Magnética permitiram o diagnóstico de vários processos patológicos na gordura de Hoffa,
tanto intrínsecos (doença de Hoffa,
condroma intra-capsular, fibrose póscirúrgica) quanto extrínsecos (sinovite
vilonodular pigmentada, condromatose sinovial, lipoma arborescente,
artrites inflamatórias e infecciosas,
corpos livres, gânglions císticos). Estes
processos costumam acometer a gordura de Hoffa de maneira localizada e
em regiões específicas, de acordo com
a etiologia do processo.
Recentemente foi evidenciada a relação
entre elevação difusa do sinal da gordura
de Hoffa (em exames de ressonância
magnética) e pacientes com dor no joelho
e HIV-positivo. As seqüências fluidos
sensíveis (T2 com supressão de gordura
e STIR) são as mais indicadas, especialmente no plano sagital.
A fisiopatologia desta alteração difusa
da gordura de Hoffa ainda não foi bem
estabelecida; se ocasionada pelo próprio
Caso 2
HIV ou pela terapia anti-retroviral, em
que efeitos colaterais como redistribuição de tecido adiposo, resistência a
insulina, redução da gordura subcutânea
e acúmulo de gordura visceral são relativamente freqüentes.
Referência bibliográfica
1.Torshizy H, Pathria MN, Chung CB.
Inflammation of Hoffa’s fat pad in the
setting of HIV: magnetic resonance
imaging findings in six patients. Skeletal
Radiol 2007;36:35-40.
Caso cedido pela Dra. Júlia Capobianco e pelo Dr. Gustavo Meirelles
Proteinose Alveolar Pulmonar
Diagnóstico
Proteinose Alveolar Pulmonar.
Discussão
A proteinose alveolar pulmonar (PAP)
é uma afecção rara, caracterizada pelo
acúmulo de material lipoproteináceo
nos alvéolos com reação inflamatória no
interstício adjacente. Predomina no sexo
masculino, com uma taxa homem:mulher
variando de 2:1 a 4:1. O pico de incidência
é na terceira e quarta décadas de vida.
Pode se apresentar sob três formas
clínicas distintas: primária congênita, primária adquirida, que inclui mais de 90 %
dos casos, e secundária, que está associada
a diversas condições como infecções, cânceres hematológicos, imunossupressão e
inalação de poeira inorgânica (ex: sílica).
A apresentação clínica é variável. Os
sintomas mais freqüentes são dispnéia
aos esforços e tosse. O teste de função
pulmonar revela tipicamente um distúrbio
restritivo com redução da capacidade
pulmonar total e da capacidade de difusão
de monóxido de carbono. Nos exames
laboratoriais o aumento de desidrogenase
láctica é comum e pode ser um marcador
prognóstico.
A radiografia de tórax pode ser
normal ou revelar um padrão de consolidação alveolar, geralmente bilateral
(figura 1), de limites mal definidos,
freqüentemente com predomínio perihilar, com conformação de “asa de
morcego”, lembrando edema pulmonar,
mas sem cardiomegalia ou derrame
pleural. A tomografia computadorizada
de alta resolução (TCAR) mostra mais
claramente a extensão da doença, mas
os achados não são patognomônicos,
podendo ser encontrados em outras doenças. Os principais achados na TCAR
são vidro fosco e/ou consolidações
esparsas, usualmente predominando
nos lobos inferiores. As opacidades em
vidro fosco por vezes estão associadas a
septos interlobulares espessados, padrão
este denominado de “pavimentação em
mosaico”. (figuras 2 a 4). Este padrão
foi inicialmente descrito para a PAP, mas
não é especifico, embora possa ajudar a
direcionar o diagnóstico.
Os principais diagnósticos diferenciais são infecção, edema pulmonar,
pneumonia por hipersensibilidade,
hemorragia pulmonar e carcinoma
bronquioloalveolar. A análise do lavado
broncoalveolar, associada a uma suspeita clínica e radiológica, estabelece o
diagnóstico em cerca de 75% dos casos.
A biopsia pulmonar a céu aberto ainda
permanece sendo o método de escolha
para diagnóstico definitivo, mas pode-se
prescindir desta na maioria das formas
não complicadas da doença.
O tratamento preconizado varia conforme a forma clínica. Para a congênita
a terapia é usualmente de suporte; para a
secundária deve-se tratar a doença causal. A
forma primária adquirida vem sendo tratada com sucesso por lavagem pulmonar.
Referências bibliográficas
1.Trapnell BC, Whitsett JA, Nakata K.
Pulmonary alveolar proteinosis. N Engl
J Med. 2003;349(26):2527-39.
2.Wang BM, Stern EJ, Schmidt RA, Pierson DJ. Diagnosing pulmonary alveolar
proteinosis: a review and an update.
Chest 1997;111:460-6.
3.Shah PL, Hansell D, Lawson PR, Reid
KB, Morgan C. Pulmonary alveolar
proteinosis: clinical aspects and current
concepts on pathogenesis. Thorax. 2000;
55(1):67-77.
4.Seymour JF, Presneill JJ. Pulmonary
alveolar proteinosis: progress in the first
44 years. Am J Respir Crit Care Med
2002;166:215-35.
5.Godwin D.J., Muller N.L., Takasugi J.E.,
Pulmonary Alveolar Proteinosis: CT Findings. Radiology 1988; 169:609-613.
6.Johkoh T, Itoh H, Muller NL, et al.
Crazy-paving appearance at thin-section
CT: spectrum of disease and pathologic
findings. Radiology 1999;211:155-60.
Caderno 2
3
São Paulo | MARÇO | 2008
Caso 3
Figura 3
– Seqüências
axiais ponderadas
em T1 e T2 FAT:
lesão cística
envolvendo
e estreitando
a artéria
poplítea
Figura 1 – Ultra-sonografia com Doppler:
lesão cística envolvendo a artéria poplítea e
determinando redução de seu calibre
• H
istória
clínica
Paciente do
sexo feminino
de 51 anos.
Claudicação
intermitente
há cerca de
seis meses.
Figura 2 – Arteriografia: estreitamento de contornos regulares na
transição femoropoplítea.
Demais segmentos normais
Figura 4 – Seqüências
sagitais ponderadas em
T2 FAT demonstrando a
estreita relação da lesão
cística com a cápsula
articular póstero-lateral
Figura 5 – Seqüências
axiais pós contraste
demonstrando a
natureza cística da
lesão e a redução
do calibre da artéria
poplítea
Caso 4
• H
istória clínica
Masculino, 26 anos,
há um ano refere
traumano quadril
durante corrida
de aventura, com
componente em
hiperextensão.
Refere fisioterapia
neste período com
melhora parcial dos
sintomas, porém
sem condições
de retornar às
atividades físicas
anteriores. Exame
físico: dor a extensão
e flexão com rotação
interna do quadril.
Suspeita clínica:
lesão labral.
Figura 1 – Discreta irregularidade de
contornos na borda anterior do acetábulo
Figura 2 – Corte longitudinal no US evidencia irregularidade
na margem anterior do acetábulo, com atenuação do feixe
sonoro, no local de inserção da cápsula articular
Figura 3 – Corte transverso no US mostra aspecto normal
da borda acetabular à D e aspecto irregular à E
Figuras 4, 5 e 6 – Artro-RM
nos planos axial e sagital
T1FS mostrando a
irregularidade de contornos
com avulsão da borda
óssea anterior do acetábulo
no local da inserção do
ligamento iliofemoral
Jornal da Imagem
4
São Paulo | março | 2008
Caso 3
Caso cedido pelos Drs. Alípio Gomes Ormond Filho, Marco Túlio Gonzalez,
Carlos Homsi e Xavier Stump. Hospital Oswaldo Cruz e HCor
Doença Cística da Adventícia
Diagnóstico
Doença Cística da Adventícia.
Discussão
A doença cística da adventícia é uma
entidade rara, mas que não deve ser
esquecida no exame de doentes com
sintomas de claudicação, principalmente em indivíduos jovens. Representa
cerca de 0,1 % das doenças arteriais
e, na maioria das vezes, é observada
em pacientes jovens entre a 3º e 5º
décadas, sem fatores de risco para
doença aterosclerótica, podendo,
entretanto, acometer pessoas idosas,
sendo a artéria poplítea o segmento
mais acometido.
A doença se caracteriza pelo desenvolvimento de cistos de conteúdo
gelatinoso dentro da adventícia, causando estenose localizada ou oclusão
da luz arterial. A teoria mais aceita é a
teoria articular ou sinovial. Nesta teoria
os cistos teriam origem articular, ou
seja, tratam-se de cistos mucóides (ou
gânglion císticos) que se comunicam
com a articulação e se estendem até a
artéria poplítea através da adventícia de
pequenas artérias pericapsulares. Outras
teorias, com a microtraumatica (degeneração tecido conjuntivo) e a teoria
embriológica (células mesenquimais pluripotente) são bem menos prováveis.
O diagnóstico pode ser realizado tan-
Caso 4
to pela Ultra-Sonografia com Doppler
quanto pela Ressonância Magnética
através da identificação da lesão cística
envolvendo e estreitando a artéria envolvida. Freqüentemente a artéria não
mostra sinais de aterosclerose e o grau
de estenose pode variar com a realização de manobras dinâmicas (flexão e
extensão) durante o estudo ultra-sonográfico ou angiográfico. Pode-se realizar
a punção desta lesão cística, porém, as
chances de recidiva são altas, por isso
o tratamento cirúrgico é preferido. O
diagnóstico diferencial a ser lembrado
em indivíduos jovens com claudicação
intermitente é o da síndrome do aprisionamento da artéria poplítea.
Referências bibliográficas
1.Spinner RJ, Scheithauer BW. Coexisting
secondary intraneural and vascular adventitial ganglion cysts of joint origin:
a causal rather than a coincidental relationship supporting an articular theory.
2. Skeletal Radiol (2006) 35: 734–744.
3.MalghemJ, Vande berg BC,Lebon C,
Lecouvert FE, Maldague BE. Ganglion
cysts of the knee: articular communication revealed by delayed radiography and CT after arthrography. AJR
1998;170:1579-1583.
4.Spinner RJ, AtkinsonJL. Peroneal intraneural ganglia: the importance of the
articular branch. A unifying theory.J
Neurosurg. 2003 Aug;99(2):330-43.
Caso cedido pelo Dr. Marcelo N. Simão. CEDIRP, Ribeirão Preto-SP
Avulsão óssea da inserção proximal
do ligamento iliofemoral
Diagnóstico
Avulsão óssea da inserção proximal do
ligamento iliofemoral.
Discussão
A cápsula articular do quadril é uma
forte estrutura fibrosa, porém relativamente frouxa, permitindo uma grande
amplitude de movimentos na articulação,
menor apenas que o ombro. O ligamento
iliofemoral promove o reforço capsular
anterior e conecta a face anterior do acetábulo, com inserção próxima a espinha
ilíaca antero-inferior ao fêmur, onde insere na região da linha inter-trocantérica,
é considerado o ligamento mais resistente do corpo, atua na restrição à hiperextensão articular e também é conhecido
como ligamento de Bigelow. Avulsões
das inserções ligamentares no quadril
são raras na ausência de luxações prévias,
mas podem acontecer após pequenos
traumas relacionados ao movimento
contrário ao que o ligamento funciona
como fator de restrição, isto é, com
movimento de hiperextensão forçada
no caso do ligamento iliofemoral.
Referências bibliográficas
1.Bruce W, Higgs RJ, Munidasa D,
Hunjan JS, Van der Wall H. Acute
osteochondral injuries of the hip. Clin
Nucl Med. 2002 Aug;27(8):547-9.
2.Resnick, D.; Kang, H. S. Internal
derangements of joints: emphasis on
MRI. Saunders.1997.cap.15.